Ética e pesquisa em Saúde Mental Maio/2010 Diretrizes e Normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos fundamenta-se nos principais documentos internacionais que emanaram declarações e diretrizes sobre pesquisas que envolvem seres humanos: o Código de Nuremberg (1947), a Declaração dos Direitos do Homem (1948), a Declaração de Helsinque (1964 e suas versões posteriores de 1975, 1983 e 1989), o Acordo Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (ONU, 1966, aprovado pelo Congresso Nacional Brasileiro em 1992), as Propostas de Diretrizes Éticas Internacionais para Pesquisas Biomédicas Envolvendo Seres Humanos (CIOMS/OMS 1982 e 1993) e as Diretrizes Internacionais para Revisão Ética de Estudos Epidemiológicos (CIOMS, 1991). Antecedentes (décadas de 20, 30 e 40) → crescimento de estudos e experimentos com seres humanos que desconsideram o bemestar dos participantes: - principalmente na Alemanha Nazista, com os prisioneiros dos campos de concentração; - mas também nas democracias ocidentais: Tuskegee syphilis study (EUA, 1932-1972) estudo do curso evolutivo da sífilis não tratada em população rural negra Código de Nuremberg: Tribunal Internacional de Nuremberg (1947); Declaração dos Direitos do Homem (1948); Declaração de posteriores); Relatório Belmont; Helsinki (1964 e versões Propostas de Diretrizes Éticas Internacionais para Pesquisas Biomédicas Envolvendo Seres Humanos (CIOMS/OMS 1982 e 1993) e as Diretrizes Internacionais para Revisão Ética de Estudos Epidemiológicos (CIOMS, 1991). O consentimento voluntário do ser humano é absolutamente essencial → as pessoas que serão submetidas ao experimento devem ser legalmente capazes de dar consentimento → têm livre direito de escolha sem qualquer intervenção (força, fraude, mentira, coação, astúcia etc) → devem ter conhecimento suficiente do assunto em estudo (natureza, duração, propósito) para tomarem uma decisão O experimento deve ser tal que produza resultados vantajosos para a sociedade, que não possam ser buscados por outros métodos de estudo, mas não podem ser feitos de maneira casuística ou desnecessariamente. O experimento deve ser conduzido de maneira a evitar todo sofrimento e danos desnecessários , quer físicos, quer materiais (morte, inavildez, etc.) → o participante do experimento deve ter a liberdade de se retirar no decorrer do experimento assim como o pesquisador deve estar preparado para suspender os procedimentos experimentais em qualquer estágio Associação Médica Mundial - 18a. Assembléia Médica Mundial revisões em 1975, 1983, 1989, 1996, 2000, 2002, 2004 e 2008. Pactuação do Código Internacional de Ética Médica; Estabelecimento de princípios para realização de pesquisas clínicas; Protocolo de pesquisa incluindo os procedimentos que envolvem seres humanos, com envio a Comitê independente do pesquisador e do orgão patrocinador. populações vulneráveis e necessidade de proteção especial resultados negativos e inconclusivos, bem como positivos, devem ser publicados ou tornados acessíveis ao público. fontes de financiamento, afiliações institucionais e conflitos de interesse devem ser declarados uso de placebo e pós-estudo Estabelecimento de princípios éticos e diretrizes para a proteção de sujeitos humanos de pesquisas Pela primeira vez estabelecida a referência a princípios éticos básicos: 1) Respeito à pessoa; 2) Beneficiência; 3) Justiça Respeito à pessoa 2 exigências morais: reconhecimento da autonomia e proteção daqueles autonomia diminuída Beneficência não causar dano; maximizar possíveis benefícios e minimizar possíveis danos Justiça “uma injustiça ocorre quando é negado algum benefício a que a pessoa tem o direito ou quando algum fardo é imposto indevidamente”. P.ex. : o fardo de servir como sujeito de pesquisa imposto a alguma população e os benefícios usufruídos exclusivamente por outros - Aplicação dos princípios básicos: Consentimento informado compreensão e voluntariado) - Balanço entre riscos e benefícios - Justiça na seleção de participantes (informação, o caráter voluntário exige condições livres de coerção (ameaça para obter adesão) e influência indevida (sujeitos vulneráveis, remuneração indevida, relações hierárquicas Debate a respeito das propostas de Diretrizes Éticas Internacionais para Pesquisas Biomédicas Envolvendo Seres Humanos (CIOMS/WHO, 1982, 1993 e 2002) e as Diretrizes Internacionais para Revisão Ética de Estudos Epidemiológicos (CIOMS, 1991 e 2009); A matriz disciplinar para a regulação da ética em pesquisa no Brasil foram as Ciências Biomédicas. 1: 2: 3: 4: 5: 6: 15 grupos de diretrizes: Consentimento Informado Individual Informações Essenciais para os Possíveis Sujeitos da Pesquisa Obrigações do pesquisador a respeito do Consentimento Informado Indução a participação Pesquisa envolvendo crianças Pesquisa envolvendo pessoas com distúrbios mentais ou comportamentais 7: Pesquisa envolvendo prisioneiros 8: Pesquisa envolvendo indivíduos de comunidades sub-desenvolvidas 9: Consentimento informado em estudos epidemiológicos 10: Distribuição equitativa de riscos e benefícios 11: Seleção de gestantes e nutrizes como sujeitos de pesquisa 12: Salvaguardas à confidencialidade 13: Direito dos sujeitos à compensação 14: Constituição e responsabilidades dos comitês de revisão ética 15: Obrigações dos países patrocinador e anfitrião CIOMS, 2002 Titles and Categories of Draft Guidelines Ethical Justification Guideline 1: Ethical justification of biomedical research involving human subjects Ethical Review Guideline 2: Ethical review committees Guideline 3: Ethical review of externally sponsored research Informed Consent Guideline 4: Individual informed consent Guideline 5: Obtaining informed consent: Essential information for prospective research subjects Guideline 6: Obtaining informed consent: Obligations of sponsors and investigators Guideline 7: Inducement to participate Guideline 8: Benefits and risks of study participation Guideline 9: Justification of risk in research involving individuals who are not capable of giving informed consent Guideline 10: Research in populations and communities with limited resources Guideline 11: Control groups in clinical trials services Vulnerable Groups Guideline 12: Equitable distribution of burdens and benefits Guideline 13: Research involving vulnerable persons Guideline 14: Research involving children Guideline 15: Research involving individuals who by reason of mental or behavioural disorders are not capable of giving adequately informed consent Women as research participants Guideline 16: Women as research participants Guideline 17: Pregnant women as research participants Guideline 18: Safeguarding confidentiality Guideline 19: Right of subjects to compensation Guideline 20: Strengthening capacity for ethical and scientific review and biomedical research Guideline 21: Obligations of external sponsors to provide health-care Elaboração da Resolução 196/96 → representa um marco no direcionamento das pesquisas envolvendo seres humanos no Brasil; Harmonização das diretrizes internacionais com os princípios bioéticos: autonomia, beneficiência, não-maleficiência e justiça; 1)Autonomia: respeito ao direito de escolha da pessoa em participar do estudo ou não. 2)Beneficiência: uma ação feita no benefício de outros. O Princípio da Beneficência é que estabelece esta obrigação moral de agir em benefício dos outros. 3) Não-maleficiência: O Princípio da NãoMaleficência é o mais controverso de todos. Muito autores o incluem no Princípio da Beneficência. Justificam esta posição por acharem que ao evitar o dano intencional o indivíduo já está, na realidade, visando o bem do outro. "Pratique duas coisas ao lidar com as doenças; auxilie ou não prejudique o paciente”(Hipócrates, 430 a.C) 4) Justiça: "Quem deve receber os benefícios da pesquisa e correr os riscos que ela acarreta ? Este princípio parte do pressuposto que as pessoas são iguais e devem ter direitos iguais a) consentimento livre e esclarecido dos indivíduos-alvo e a proteção a grupos vulneráveis e aos legalmente incapazes (autonomia). b) ponderação entre riscos e benefícios, tanto atuais como potenciais, individuais ou coletivos (beneficência), comprometendo-se com o máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos; c) garantia de que danos previsíveis serão evitados ( não maleficência); d) relevância social da pesquisa com vantagens significativas para os sujeitos da pesquisa e minimização do ônus para os sujeitos vulneráveis, o que garante a igual consideração dos interesses envolvidos, não perdendo o sentido de sua destinação sóciohumanitária ( justiça e eqüidade). Adoção de tais princípios na prática da pesquisa, representados pelas diretrizes internacionais e pela regulamentação nacional, simboliza apenas o primeiro passo para a proteção dos participantes envolvidos. Necessidade de implantação de um sistema de avaliação e acompanhamento das pesquisas realizadas no país (CONEP e SISNEP); Importância da discussão sobre a ética no sentido de haver o fortalecimento da sociedade como instância de mediação moral e controle social das pesquisas; Urgência de uma formação voltada para a ética em pesquisa TCLE a) a justificativa, os objetivos e os procedimentos que serão utilizados na pesquisa; b) os desconfortos e riscos possíveis e os benefícios esperados; c) os métodos alternativos existentes; d) a forma de acompanhamento e assistência, assim como seus responsáveis; e) a garantia de esclarecimento, antes e durante o curso da pesquisa, sobre a metodologia, informando a possibilidade de inclusão em grupo controle ou placebo; f) a liberdade do sujeito se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma e sem prejuízo ao seu cuidado; g) a garantia do sigilo que assegure a privacidade dos sujeitos quanto aos dados confidenciais envolvidos na pesquisa; h) as formas de ressarcimento das despesas decorrentes da participação na pesquisa; e i) as formas de indenização diante de eventuais danos decorrentes da pesquisa. Grupos vulneráveis: portadores de transtorno mental, crianças e adolescentes, grupos indígenas, pessoas sem capacidade (mental) de consentimento; “Indivíduos ou grupos vulneráveis não devem ser sujeitos de pesquisa quando a informação desejada possa ser obtida através de sujeitos com plena autonomia, a menos que a investigação possa trazer benefícios diretos aos vulneráveis. Nestes casos, o direito dos indivíduos ou grupos que queiram participar da pesquisa deve ser assegurado, desde que seja garantida a proteção à sua vulnerabilidade e incapacidade legalmente definida” Sujeitos de pesquisa: participante pesquisado(a), individual ou coletivamente, de caráter voluntário, vedada qualquer forma de remuneração (possível ressarcimento: cobertura de despesas decorrentes de participação na pesquisa) Protocolo de Pesquisa Documento contemplando a descrição da pesquisa em seus aspectos fundamentais, informações relativas ao sujeito da pesquisa, à qualificação dos pesquisadores e à todas as instâncias responsáveis. folha de rosto: título do projeto, nome, número da carteira de identidade, CPF, telefone e endereço para correspondência do pesquisador responsável e do patrocinador, nome e assinaturas dos dirigentes da instituição e/ou organização; descrição da pesquisa, compreendendo os seguintes itens: a) descrição dos propósitos e das hipóteses a serem testadas; b) antecedentes científicos e dados que justifiquem a pesquisa. c) descrição detalhada e ordenada do projeto de pesquisa (material e métodos, casuística, resultados esperados e bibliografia); d) análise crítica de riscos e benefícios; e) duração total da pesquisa, a partir da aprovação; f) explicitaçao das responsabilidades do pesquisador, da instituição, do promotor e do patrocinador; g) explicitação de critérios para suspender ou encerrar a pesquisa; h) local da pesquisa: detalhar as instalações dos serviços, centros, comunidades e instituições nas quais se processarão as várias etapas da pesquisa; i) demonstrativo da existência de infra-estrutura necessária ao desenvolvimento da pesquisa e para atender eventuais problemas dela resultantes, com a concordância documentada da instituição; j) orçamento financeiro detalhado da pesquisa: recursos, fontes e destinação, bem como a forma e o valor da remuneração do pesquisador; l) explicitação de acordo preexistente quanto à propriedade das informações geradas, demonstrando a inexistência de qualquer cláusula restritiva quanto à divulgação pública dos resultados, a menos que se trate de caso de obtenção de patenteamento; neste caso, os resultados devem se tornar públicos, tão logo se encerre a etapa de patenteamento; m) declaração de que os resultados da pesquisa serão tornados públicos, sejam eles favoráveis ou não; e n) declaração sobre o uso e destinação do material e/ou dados coletados. informações relativas ao sujeito da pesquisa: a) descrever as características da população a estudar: tamanho, faixa etária, sexo, cor (classificação do IBGE), estado geral de saúde, classes e grupos sociais, etc. Expor as razões para a utilização de grupos vulneráveis; b) descrever os métodos que afetem diretamente os sujeitos da pesquisa; c) identificar as fontes de material de pesquisa, tais como espécimens, registros e dados a serem obtidos de seres humanos. Indicar se esse material será obtido especificamente para os propósitos da pesquisa ou se será usado para outros fins; d) descrever os planos para o recrutamento de indivíduos e os procedimentos a serem seguidos. Fornecer critérios de inclusão e exclusão; e) apresentar o formulário ou termo de consentimento, específico para a pesquisa, para a apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa, incluindo informações sobre as circunstâncias sob as quais o consentimento será obtido, quem irá tratar de obtê-lo e a natureza da informação a ser fornecida aos sujeitos da pesquisa; f) descrever qualquer risco, avaliando sua possibilidade e gravidade; g) descrever as medidas para proteção ou minimização de qualquer risco eventual. Quando apropriado, descrever as medidas para assegurar os necessários cuidados à saúde, no caso de danos aos indivíduos. Descrever também os procedimentos para monitoramento da coleta de dados para prover a segurança dos indivíduos, incluindo as medidas de proteção à confidencialidade; e h) apresentar previsão de ressarcimento de gastos aos sujeitos da pesquisa. A importância referente não poderá ser de tal monta que possa interferir na autonomia da decisão do indivíduo ou responsável de participar ou não da pesquisa. VI.4 - qualificação dos pesquisadores: "Curriculum vitae" do pesquisador responsável e dos demais participantes. VI.5 - termo de compromisso do pesquisador responsável e da instituição de cumprir os termos desta Resolução. SISNEP (http://portal2.saude.gov.br/sisnep/pesquisador/) Folha de Rosto Protocolo de pesquisa Trâmite CEP CONEP CONEP protocolos de pesquisa em áreas temáticas especiais tais como: 1- genética humana; 2- reprodução humana; 3- farmácos, medicamentos, vacinas e testes diagnósticos novos (fases I, II e III) ou não registrados no país (ainda que fase IV), ou quando a pesquisa for referente a seu uso com modalidades, indicações, doses ou vias de administração diferentes daquelas estabelecidas, incluindo seu emprego em combinações; 4- equipamentos, insumos e dispositivos para a saúde novos, ou não registrados no país; 5- novos procedimentos ainda não consagrados na literatura; 6- populações indígenas; 7- projetos que envolvam aspectos de biossegurança; 8- pesquisas coordenadas do exterior ou com participação estrangeira e pesquisas que envolvam remessa de material biológico para o exterior; e 9- projetos que, a critério do CEP, devidamente justificado, sejam julgados merecedores de análise pela CONEP; Pesquisas envolvendo seres humanos Pesquisas em seres humanos (pesquisas com intervenção direta no corpo; pesquisas epidemiológicas) X Pesquisas com seres humanos (pesquisas qualitativas em saúde – estabelecem parceria entre pesquisador e participante para chegar à compreensão de determinada realidade ) Pesquisa em seres humanos – ensaios clínicos Romero, , p.36 A utilização de placebo ou ausência de tratamento é aceitável em estudos em que não existam intervenções comprovadas de uso corrente; ou Onde, por razões metodológicas convincentes e cientificamente sólidas, a utilização de placebo se fizer necessária para determinar a eficácia ou segurança de uma intervenção e os pacientes que receberem o placebo ou ausência de tratamento não estejam sujeitos a nenhum risco de dano sério ou irreversível. Cuidado extremo deve ser tomado para se evitar o abuso dessa opção. Andrade, Minamisava, Silva & Martelli, 2007, p.69 Na conclusão do estudo, os pacientes nele incluídos têm o direito de ser informados sobre o resultado e compartilhar os benefícios decorrentes do estudo, por exemplo, acesso a intervenções identificadas no estudo como benéficas ou a outros cuidados apropriados ou benefícios. Diz respeito à tentativa de apreensão dos fenômenos em seus locais naturais, com o intuito de compreendê-los ou interpretálos. As pesquisas qualitativas em saúde, referem-se à investigações provenientes das ciências humanas e sociais no contexto da saúde. São geralmente, realizadas para pensar as políticas públicas de saúde. Compreensão dos comportamentos relacionados ao processo saúde-doença (exemplos); Inserção do pesquisador no contexto cultural de determinada população ou grupo social; Consideração do universo de significados e representações dos grupos humanos; Subjetividade do pesquisador e sua interação com os participantes como sendo parte do processo de construção do objeto de análise e método. Fenomenologia, Etnografia e Teoria crítica como principais correntes teóricometodológicas Técnicas de coleta de dados: - Observação participante; - Entrevistas semi-estruturadas; - Grupos focais Pesquisa Participativa Como avaliar os efeitos benéficos, ou não maléficos, de um projeto de pesquisa com seres humanos que implica interação comunicativa entre pessoas? Construção do consentimento na relação pesquisador/participante o consentimento livre e esclarecido assinado previamente pelo participante, onde todas as cláusulas são contratadas, está longe de corresponder ao compromisso mútuo que vai se estabelecendo entre pesquisador e participante Por que o consentimento tem que ser por escrito? Por que prévio?