Insper Instituto de Ensino e Pesquisa Programa de Mestrado Profissional em Economia Lucas Aron Bertges Zona do euro: Um jogo de promessas não críveis São Paulo 2013 1 Lucas Aron Bertges Zona do euro: Um jogo de promessas não críveis Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Economia do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Finanças e Macroeconomia Aplicadas. Orientador: Prof. Dr. José Heleno Faro – Insper. São Paulo 2013 2 Bertges, Lucas Aron Zona do euro: Um jogo de promessas não críveis / Lucas Aron Bertges; orientador José Heleno Faro – São Paulo: Insper, 2013. 47 f. Dissertação (Mestrado – Programa de Mestrado Profissional em Economia. Área de concentração: Finanças e Macroeconomia Aplicadas) – Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. 1. Teoria dos Jogos; 2. União Monetária; 3. Euro; 4. Cooperação; 5. Racionalidade 3 FOLHA DE APROVAÇÃO Lucas Aron Bertges Zona do euro: Um jogo de promessas não críveis Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Economia do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Finanças e Macroeconomia Aplicadas. Aprovado em: Banca Examinadora Prof. Dr. José Heleno Faro Orientador Instituição: Insper Assinatura: ____________________________ Prof. Dr. Eduardo Correia Instituição: Insper Assinatura: ____________________________ Prof. Dr. Geraldo Edmundo Silva Júnior Instituição: UFSCAR/Sorocaba Assinatura: ____________________________ 4 AGRADECIMENTOS Uma pessoa só consegue caminhar com liberdade quando apoiada pelos seus familiares. Acredito que tudo que venho alcançando no decorrer de minha vida eu não teria conseguido sem o apoio de meu pai, de minha mãe, meus tios e avós. Mas também tenho forte convicção de que tudo que atingi não teria nenhum valor se não tivesse essas pessoas ao meu lado para que eu pudesse compartilhar. Gostaria de agradecer em especial a minha mãe por todo carinho demonstrado para me ensinar e me formar como eu sou hoje. Agradecer ao meu pai por me ensinar a respeitar a todos e a ter confiança. Em especial, dos meus tios, agradeço imensamente a meu padrinho Dr. Sérgio Ribas por toda paciência no decorrer destes últimos anos. Agradeço ao professor Dr. José Heleno Faro por toda orientação, ajuda e tempo dedicado na elaboração deste trabalho. Seu conhecimento e direcionamento fizeram este árduo caminho ficar mais suave. Para não pecar com nomes, agradeço a todos meus amigos que entenderam a necessidade da minha dedicação para execução deste trabalho. Àqueles que sempre contribuem para melhorar minha vida e formar ainda melhor meu caráter. 5 RESUMO BERTGES, Lucas Aron. Zona do Euro: Um jogo de promessas não críveis. 2013. 47 f. Tese (Mestrado) - Curso de Economia, Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2013. A crise financeira de 2008 causou impactos na economia como um todo. Neste cenário, a União Europeia viu a necessidade de socorro a economias periféricas, em especial à Grécia. Este estudo busca entender o comportamento da Grécia e da União Monetária Europeia após a formação do Euro em relação ao cumprimento das normas acordadas no tratado de Maastricht. O trabalho se baseia em Teoria dos Jogos para argumentação sobre os resultados sugerindo que as ações dos dois agentes econômicos foram pautadas em atitudes racionais, onde os agentes tomaram ações condizentes com o que se era esperado. Palavras-chave: Teoria dos Jogos; União Monetária; Euro; Cooperação; Racionalidade. 6 ABSTRACT The financial crisis of 2008 has impacted the economy all around the world. In this scenario, the European Union saw the need to rescue the peripheral economies, particularly Greece. This study seeks to understand the behavior both of Greece and the European Monetary Union after the formation of the Euro in relation to compliance with the standards agreed in the Maastricht Treaty. The work is based on Game Theory to discuss the results suggesting that the actions of the both economic agents were guided by rational attitudes, where they took actions consistent with what was expected. Keywords: Game Theory, Monetary Union, Euro; Cooperation; Rationality. 7 LISTA DE FIGURAS Figura 01 - Países membros da União Europeia............................................................. 16 Figura 02 - Dilema dos prisioneiros ............................................................................... 28 Figura 03 - Jogo de Trembling Hand ............................................................................. 28 Figura 04 - Jogos repetidos, indução à cooperação ........................................................ 31 Figura 05 - Jogo da Zona do Euro, forma extensiva ...................................................... 35 Figura 06 - Jogo da zona do Euro, etapa Pré União ....................................................... 38 Figura 07 - Jogo da zona do Euro, etapa Pós União ....................................................... 39 Figura 08 - Jogo da zona do Euro, matriz completa ....................................................... 40 Figura 09 - Jogo da zona do Euro, forma extensiva ....................................................... 41 Figura 10 - Jogo da zona do Euro, etapa Pós União, análise de repetição ..................... 42 8 LISTA DE QUADROS Quadro 01 - Países membros da União Europeia ........................................................... 17 9 LISTA DE TABELAS Tabela 01 - Taxa de inflação média dos 12 primeiros países da zona do Euro .............. 15 10 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 01 - Taxa de Inflação de 1991 a 2010 ............................................................... 22 Gráfico 02 - Dívida Pública (% PIB) de 1995 a 2012 .................................................... 23 11 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 12 2. REVISÃO DA LITERATURA ............................................................................... 14 2.1. Sumário histórico .................................................................................................... 14 2.2. Sumário econômico ................................................................................................. 18 3. CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA ......................................................... 22 4. METODOLOGIA: Modelo de interação estratégica entre Grécia e União Monetária Europeia .......................................................................................................................... 25 4.1. Jogo não cooperativo ............................................................................................... 26 4.2. Nós de decisão ......................................................................................................... 26 4.3. Tipos de informação em jogos ................................................................................ 26 4.4. Equilíbrio de Nash ................................................................................................... 26 4.5. Equilíbrio por eliminação de estratégias estritamente dominadas .......................... 27 4.6. Equilíbrio de Nash Trembling Hand ....................................................................... 28 4.7. Jogo simultâneo ....................................................................................................... 29 4.8. Indução reversa e Equilíbrio de Nash em subjogo perfeito .................................... 29 4.9. Jogos sequenciais .................................................................................................... 29 4.10. Jogos repetidos ................................................................................................. 30 4.11. Estratégias coercitivas ...................................................................................... 30 4.11.1. 5. Teorema Popular de Folk (Nash Folk Theorem) .......................................... 31 MODELO ................................................................................................................ 33 5.1. Ações ....................................................................................................................... 33 5.1.1. Ações do governo da Grécia ............................................................................ 33 5.1.2. Ações da União ................................................................................................ 34 5.2. Hipóteses do modelo e crenças comuns .................................................................. 34 6. RESULTADOS ....................................................................................................... 36 6.1. Interações estratégicas na etapa Pré ........................................................................ 36 6.2. Interações estratégicas na etapa Pós ........................................................................ 38 6.3. Interações estratégicas no jogo completo ................................................................ 40 6.4. Jogo repetitivo, estudo sobre a cooperação dos agentes ......................................... 41 7. CONCLUSÃO ........................................................................................................ 44 8. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ........................................................................ 46 12 1. INTRODUÇÃO Em uma união monetária, os governos abrem mão de sua autonomia na condução de política monetária, perdendo, assim, uma poderosa ferramenta na condução da política econômica do país em momentos de desaquecimento econômico ou crises. A maturidade dos países para a adesão a uma moeda única pode ser bastante questionada, principalmente em um ambiente econômico abalado por uma crise financeira. Em um cenário onde o Moral Hazzard era bastante citado pelos economistas em resposta ao socorro do governo dos EUA a seus bancos, a Grécia continuou com seus elevados déficits governamentais, levando o país a atual crise econômica. Existem, na literatura econômica, estudos sobre os incentivos dos países em desviar das metas de inflação dentro de uma união monetária. Schuknecht et al. afirma que, após a criação do Euro, houve um relaxamento nas regras acordadas no tratado de Maastricht. Tal tratado previa cinco metas para os países aspirantes a compor a zona de moeda comum europeia: 1. Meta de inflação: o país não poderia apresentar uma inflação superior a 1,5 pontos percentuais da média das três taxas de inflação mais baixas das nações membras da União Europeia. 2. Taxas de juros de longo prazo: as taxas de juros de longo prazo não poderiam ser maiores que 2 pontos percentuais daquela representada pela média das taxas de juros dos países com as três menores taxas de inflação. 3. Adesão ao Mecanismo de Taxa de Câmbio: as taxas de câmbio dos países não poderiam ter sofrido grandes desvalorizações em dois anos predecessores a entrada do país a zona do Euro. 4. Déficit orçamentário: o budget para o déficit dos gastos do Governo não poderiam ultrapassar 3% do seu PIB. 5. Dívida pública: a dívida pública não poderia ultrapassar 60% do PIB do país. O trabalho busca mostrar, fundamentado em Teoria dos Jogos, que o governo grego tomou ações de forma consciente respaldado na crença de que os países da União 13 Europeia iriam ajudar seu país financeiramente, mesmo tendo a União Europeia “ameaçado” não ajudar este país. Sobre a hipótese de alteração na estrutura de payoffs dos países antes e após a adesão à zona do Euro, é encontrado um único Equilíbrio de Nash no subjogo após a criação do Euro, o qual demonstra que a promessa de não ajudar não era crível e, portanto, a Grécia atuou de modo racional ao desviar dos acordos, garantindo a si melhores payoffs, o que pode ser visto como um modelo que racionaliza os fatos observados. A importância de realizar um estudo como este é a de demonstrar que as ações tomadas, tanto pelo governo da Grécia como pelos outros países da união monetária foram decisões tomadas de maneira racional, ou seja, as consequências das ações tomadas foram levadas em conta no momento de decisão dos agentes. 14 2. REVISÃO DA LITERATURA Com o intuito de deixar o contexto autocontido neste trabalho, explorando a retrospectiva histórica de modo mais intuitivo, este item será quebrado em duas seções. A primeira seção conta com um sumário histórico, buscando ambientar o leitor em todo processo de desenvolvimento e consolidação da União Monetária Europeia. A segunda seção apresenta um sumário econômico, buscando na literatura estudos que analisem o processo de criação da união monetária e seu desempenho durante a crise financeira de 2008. 2.1. Sumário histórico A concepção da União Europeia teve início após a Segunda Grande Guerra, tendo como intuito principal minimizar as chances de que os países se confrontassem novamente de modo tão violento. A princípio, eram seis os países membros, sendo eles a Alemanha Ocidental, a Bélgica, a França, a Itália, o país de Luxemburgo e os Países Baixos. Estes seis países colocaram, sob o Tratado CECA de 1951, suas indústrias de aço e carvão sob supervisão comum, visando controlar para que a corrida armamentista não se voltasse um contra outro. Após o êxito do Tratado CECA, tais países expandiram para outros setores econômicos formas de cooperação, assinando o Tratado de Roma em 1957, surgindo a Comunidade Econômica Europeia (CEE), que criava um mercado comum com união aduaneira, possibilitando a livre circulação de pessoas, mercadorias e serviços entre os países membros. Em 1972, é dado o primeiro passo para a futura criação do Euro. Os países membro da CEE decidiram garantir suas estabilidades monetárias através de limitação da taxa de flutuação de suas moedas. Em 1973, Dinamarca, Irlanda e Reino Unido passam a integrar a CEE e, em 1981, a Grécia adere ao grupo. Em 1986, Espanha e Portugal entram para a CEE. Em 1991, houve a decisão tomada pelo Conselho Europeu para a formação de uma moeda comum para os países membros da União Europeia na cidade de Maastricht, nos Países Baixos. Em 1992, houve a assinatura do Tratado da União Europeia, a Comunidade Econômica Europeia é substituída pela União Europeia (UE). Neste tratado, foram estabelecidas regras para composição de uma futura moeda comum para 15 os países membros da UE. Em 1995, mais três países aderem à UE, Áustria, Finlândia e Suécia. A União Europeia é constituída por 15 países agora. Em 1999, onze países adotaram o Euro como moeda única para suas transações comerciais e financeiras, sendo eles Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Países Baixos e Portugal. A Grécia veio aderir ao Euro em 2001, enquanto Dinamarca, Reino Unido e Suécia decidiram ficar fora da zona do Euro. Antes da formação da União Monetária Europeia, alguns países conseguiam manter suas taxas de inflação relativamente baixas, enquanto os demais acabavam apresentando elevadas taxas de inflação. Na tabela abaixo, estão representadas as taxas de inflação anual média do período de 1971 a 2010 por país da zona do Euro. Tabela 01 - Taxa de inflação média anual dos 12 primeiros países da zona do Euro País Grécia Espanha Irlanda Portugal Luxemburgo Itália Bélgica Países Baixos Áustria França Alemanha Finlândia 1971 - 1980 15,98% 17,12% 7,58% 20,79% 7,40% 15,45% 8,21% 8,13% 6,99% 10,77% 5,63% 12,41% 1981 - 1990 21,32% 10,38% 8,59% 18,99% 4,95% 10,78% 5,06% 2,71% 3,91% 7,00% 2,90% 7,37% 1991 - 2000 10,34% 4,32% 2,81% 5,63% 2,42% 4,18% 2,28% 2,71% 2,56% 1,91% 2,68% 2,07% 2001 – 2010 3,68% 3,11% 2,75% 2,74% 2,51% 2,41% 2,31% 2,25% 2,16% 1,89% 1,72% 1,69% Fonte: OECD, dados organizados pelo autor. Pode ser observado que, mesmo países que acabavam expressando elevadas taxas de inflação no período apresentado, passaram a convergir para índices mais baixos de inflação. Entretanto, uma vez que a adesão a uma moeda comum elimina a possibilidade de países individualmente executarem políticas monetárias, torna-se interessante fazer uma análise sobre o desenvolvimento da política fiscal destes países. 16 Para adesão à união monetária, um país da União Europeia teria que se adequar aos critérios de convergência considerados no tratado de Maastricht, que foi assinado em 1991 na cidade de mesmo nome localizada nos Países Baixos. Em Maio de 1998, 11 países haviam satisfeito os critérios de convergência, sendo eles Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Irlanda, Luxemburgo e Portugal. A Grécia não satisfez a estes critérios neste período, conseguindo satisfazê-los um pouco depois aderindo à união monetária em 2002. Três países que, embora tenham atendido aos critérios estabelecidos, decidiram não aderir ao Euro, sendo eles Dinamarca, Reino Unido e Suécia. Eslovênia, Chipre, Malta, Eslováquia e Estônia foram aderindo ao Euro nos anos subsequentes. Figura 01 - Países membros da União Europeia Países Membros da Zona do Euro Países Fora da Zona do Euro Países Fora da União Europeia Fonte: União Europeia 17 Quadro 01 - Países membros da União Europeia Países membros da União Europeia (2012) Membros da zona do Euro Fora da zona do Euro Alemanha¹ Espanha¹ Itália¹ Bulgária Reino Unido Áustria¹ Estônia Luxemburgo¹ Dinamarca Rep. Tcheca Bélgica¹ Finlândia¹ Malta Hungria Romênia Chipre França¹ Países Baixos¹ Letônia Suécia Eslováquia Grécia¹ Portugal¹ Lituânia Eslovênia Irlanda¹ Polônia ¹ Países iniciais. Fonte: União Europeia Segundo publicação da Comissão Europeia, todos os países membros da União Europeia integram a União Econômica e Monetária (UEM), independente dos estados terem, ou não, adotado o Euro como moeda corrente. A UEM é regida por diversas instituições europeias e instituições nacionais, cada qual com sua função determinada. Cabe ao Parlamento Europeu representar a população dos países membros da União Europeia, debatendo sobre a legislação regente, garantir que as instituições da União Europeia funcionem de maneira democrática e aprovar, em conjunto com o Conselho da União Europeia, o orçamento da União. O Conselho Europeu é responsável pela definição do direcionamento e das políticas da União Europeia. O Conselho Europeu não exerce nenhum poder legislativo. O Conselho da União Europeia, composto pelos ministros da Economia e das Finanças de todos estados membro da União Europeia, exerce a função de aprovar a legislação da União Europeia, além de realizar a coordenação das políticas econômicas gerais dos Estados membros, ser responsável pelo acordo com países fora da União Europeia, realizar a aprovação, em conjunto com o Parlamento Europeu, do orçamento da União Europeia, definir a política externa e a defesa dos países membros e, por fim, atuar na coordenação das forças policiais e dos tribunais das diferentes nações que compõem a União Europeia. Para questões relacionadas ao Euro, existe o Eurogrupo, formado pelos ministros das Finanças dos países da zona do Euro. A Comissão Europeia realiza papel de assegurar a execução das políticas da União Europeia, tal como também busca 18 representar e defender o conjunto de interesses dos países da União Europeia. Por fim, o Banco Central Europeu, sediado na cidade alemã de Frankfurt, é o responsável pela gestão da política econômica e da política monetária do Euro, buscando a estabilidade dos preços na União Europeia. 2.2. Sumário econômico Existem várias situações em que fazer uso de uma política monetária expansionista, ou contracionista, é a ferramenta mais rápida para se ajustar o mercado no curto prazo, por exemplo, o reajuste nas taxas cambiais pode fazer com que o país consiga controlar um pouco melhor o déficit de sua balança comercial. Países que compõem uma união monetária podem estar vivenciando diferentes situações econômicas, necessitando, assim, de diferentes “políticas monetárias” para ajustar sua economia. Em seu livro, Grauwe (2012) cita como exemplo didático um caso hipotético onde um país, no caso a França, enfrenta uma contração na demanda, enquanto outro país, no exemplo a Alemanha, enfrenta uma expansão na demanda. Referindo-se à União Monetária Europeia, Grauwe (2012) descreve dois tipos de governos possíveis para o gerenciamento da política monetária do bloco: o governo “hard-nosed” e o governo “wet”. Segundo ele, o primeiro tipo seria aquele onde o Banco Central do país está mais preocupado em manter as taxas de inflação mais controladas, mesmo que o mercado de trabalho esteja sofrendo com uma elevada taxa de desemprego, enquanto o segundo tipo preocupar-se-ia um pouco mais com a produção econômica em detrimento das taxas de inflação. Por questões de credibilidade, que são bastante importantes na hora de se mensurar os custos de adesão a uma união monetária, o euro acabou sendo criado sobre a política “hard-nosed”, onde países que passaram por períodos com altas taxas de inflação puderam adquirir ganhos em cima da reputação do Banco Central da Alemanha. Grauwe (2012) propõe uma explicação de como o modelo do Banco Central alemão prevaleceu como o modelo do Banco Central Europeu, ressaltando que este não era o modelo predominante nos bancos centrais dos países europeus na época de discussão da união monetária. O autor cita duas possíveis razões para que isso tenha ocorrido, a primeira sendo ligada ao desenvolvimento do pensamento econômico em prol da contra revolução 19 monetarista e a segunda devido ao posicionamento estratégico da Alemanha durante o processo que levaria a União Monetária Europeia. Para aceitar a união monetária, as autoridades monetárias alemãs insistiram em um Banco Central que atribuísse maior importância a estabilidade dos preços do que seu próprio Banco Central já realizava. Deste modo, o Banco Central Europeu acabou sendo estabelecido sobre uma forte orientação de defesa de estabilidade nos preços em detrimento de uma preocupação com a responsabilidade de realizar a manutenção da produção e controlar a flutuação no nível de desemprego dos países membros do Euro. Imaginando que estes dois países encontram-se em uma união monetária, participem da zona do Euro, ficaria difícil para o Banco Central conseguir ajustar com uma política monetária estes dois cenários distintos. Se utilizasse de uma política monetária expansionista, a França conseguiria, no curto prazo, ter seu ajuste de demanda, entretanto, a Alemanha enfrentaria inflação sem grandes melhorias no seu cenário econômico. Grauwe (2012) afirma que haveria um equilíbrio econômico automático entre dois países membros de uma união monetária que estivessem vivenciando ciclos contrários, desde que houvesse flexibilidade nos salários, ou mobilidade da força de trabalho. Tal opinião é corroborada no trabalho de Lane (2006) que enfatiza que o custo de entrar em uma união monetária é menor quanto mais integrado for o mercado de trabalho. Grauwe (2012) continua esclarecendo que se existisse rigidez nos salários, ou se a mobilidade da força de trabalho fosse limitada, seria mais difícil para países em uma união monetária ajustar choques de demanda assimétricos do que aqueles países fora de uma união monetária. Ciobanu (2008) escreve um artigo no qual examina os benefícios e os custos da adesão de um país em uma União Monetária analisando o impacto sobre o desenvolvimento macroeconômico de um país que resolve aderir à moeda comum. A autora estuda se a união monetária promoveu uma maior integração econômica entre os países participantes, com aumento nas trocas comerciais e nas transações financeiras e se as estruturas macroeconômicas, inflação e gastos do governo, passaram a ter comportamentos semelhantes entre os países membros do Euro. 20 Ciobanu (2008) afirma que a introdução do Euro causou mudanças extremas nos países da Europa, tanto em sua esfera econômica, quanto em sua esfera social e em sua estrutura política. Segundo Lane (2006), o custo de se atender às regras do tratado de Maastricht foram maiores nos países de economia mais periférica, como Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha. Tal observação também é levantada no trabalho de Grauwe (2012, p. 65), onde ele destaca: Only in catching up countries like Ireland, Spain, Portugal and Greece did the real interest rate come down significantly. In these countries (with the exception of Portugal) that we observe an acceleration of economic growth as predicted by theory. Como benefícios, tanto Ciobanu (2008) e Grauwe (2012) citam que, com a adesão à uma união monetária, as incertezas geradas sobre a volatilidade das taxas de câmbio acabam sendo eliminadas, o que leva a um aumento no comércio entre os países que compõem a união, pois, além da incerteza ser eliminada, custos com conversão de moeda também são eliminados. Além disso, citam que uma união monetária deve induzir a uma maior integração do mercado financeiro dos países participantes, provocando, de tal maneira, uma evolução nas transações ocorridas. Grauwe (2012), em um de seus exemplos, explora a possibilidade de cidadãos de um país que passa por um momento próspero em sua economia poderem realizar investimentos financeiros em países que passam por uma recessão, pois os títulos deste país poderiam lhe parecer mais atrativos e o risco da variação cambial, assim como as taxas envolvidas nas conversões da moeda deixariam de existir. Ciobanu (2008) cita como principal custo para um país em se associar a uma união monetária a perda da possibilidade de exercer política monetária de curto prazo de modo independente, por exemplo, um país passa a não conseguir realizar mudanças nas taxas cambias, caso haja um desequilíbrio macroeconômico. Ciobanu (2008) afirma que o dólar funciona bem nos Estados Unidos devido à fácil mobilidade dos trabalhadores de um estado que passe por uma crise para outro que se encontre numa posição mais avantajada, cita ainda um trabalho onde é relatado que a mobilidade dos trabalhadores na Europa é entre duas e três vezes mais baixa do que o 21 que se é observado nos Estados Unidos, ressaltando que nos países europeus existem maiores barreiras em torno do idioma, mercados mobiliários inflexíveis e, para a autora, o movimento de trabalhadores somente havia se tornado possível há pouco tempo. Para sedimentar seu argumento, Ciobanu (2008) cita que, em Setembro de 1992, tanto a Itália quanto o Reino Unido decidiram abandonar o Mecanismo de Taxa de Conversão do Sistema Monetário Europeu para conseguirem sair de um período de depressão econômica através da depreciação das suas devidas moedas. Se estes países estivessem dentro de uma união monetária, tal movimento não seria possível. Dixit (2000) analisa os incentivos de um país para se desviar das metas de inflação dentro de uma união monetária. Assumindo que tal união seja permanente, ou seja, uma vez adepto, o país não pode escolher deixar o grupo e o grupo não pode escolher expulsar este país, o autor demonstra que há grandes incentivos a um país em desviar de manter pleno compromisso com as regras do grupo. Ainda nesta linha, Chari e Kohoe (2008) analisam o problema do free-rider na política fiscal dos membros de uma união monetária, revelando que a falta de compromisso na política monetária entre os países membros leva a free-rider em políticas não monetárias. Neste contexto, enxerga-se a necessidade de um estudo sobre o comportamento dos países da zona do Euro após a consolidação da União Monetária. Demonstra-se que houve um momento de convergência dos países da União Europeia para as metas acordadas no tratado de Maastricht, mas que, após a criação do Euro e, principalmente, com a crise financeira de 2008, passou a haver uma divergência das regras estabelecidas. É preciso entender se as promessas realizadas pelos países em se manter firmes com as metas acordadas para adesão a uma união monetária, dado que existem indícios na literatura de que se é esperado o desvio às regras estabelecidas. Além disso, faz-se necessário o entendimento sobre as ameaças de punição do bloco como um todo a países que não cumpram com o estabelecido. 22 3. CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA Foram coletados dados anuais de inflação, taxa de juros, déficit corrente e dívida pública através da Comissão Europeia (Ameco), do Banco Mundial (WorldBank), da OECD (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Para desenvolvimento do trabalho, foram compilados os dados dos países que inicialmente compuseram a união monetária europeia: Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Países Baixos e Portugal. Os dados selecionados foram analisados para ver se o país cumpriu, ou não, as regras do tratado de Maastricht tanto em um período anterior à adesão ao Euro quanto em um período posterior. O primeiro critério do tratado de Maastricht relacionava-se a inflação, onde os países não poderiam apresentar índices superiores a 1,5 pontos percentuais acima da média das três melhores taxas de inflação dos países do grupo. Em 1990, 5 países se encontrariam fora desta meta. Número que caiu para 1 em 1999, a Grécia, que logo em 2000 conseguiu atingir a meta e só entrou no euro em 2001. Já em 2003, quatro países já não cumpriam com esta meta. Taxa de Inflação Gráfico 01 - Taxa de Inflação de 1991 a 2010 25% 20% 15% 10% 5% 0% 1990 1995 Grécia Espanha Países Baixos 2000 Luxemburgo França Finlândia 2005 Bélgica Itália Alemanha 2010 Áustria Portugal Irlanda Fonte: OECD O segundo critério do tratado era sobre as taxas de juros de longo prazo. Em 1999, todos os países se adequavam neste critério e assim se mantiveram até o ano de 23 2010, quando três países furaram esta regra. Em 2012, eram cinco dos doze países que não conseguiram manter suas taxas de juros de longo prazo num limite inferior a 2 pontos percentuais acima da média das taxas apresentadas pelos três países com melhor índice de inflação. O terceiro critério relacionava-se à taxa de câmbio. Uma vez que houve a adesão ao euro, este critério não tem porque ser estudado. O quarto critério do tratado dizia que o déficit corrente do governo não poderia passar de 3% do PIB do país. Os dados mostram que não houve comprometimento dos países com esta meta sendo que, em 1999, apenas um país não cumpriu esta regra, número este que subiu para seis em 2003 e, em 2010, atingiu 10 países fora da meta. O quinto e último critério do Tratado estabelecia que a dívida pública não poderia passar 60% do PIB. Em 1999, Bélgica, Grécia e Itália eram os únicos três países que estavam distantes de atingir esta meta, todos os demais apresentavam dívidas dentro da casa dos 60%. Em 2010, oito países encontravam sua dívida acima do patamar de 60%. A Alemanha possuía mais de 80% do PIB de em dívida pública. Em 2012, este número subiu para dez. Dívida pública (% PIB) Gráfico 02 - Dívida Pública (% PIB) de 1995 a 2012 180% 160% 140% 120% 100% 80% 60% 40% 20% 0% Grécia Itália Portugal Irlanda Bélgica França Espanha Alemanha Áustria Países Baixos Finlândia Luxemburgo Fonte: AMECO 24 Os dados sugerem um descolamento das regras acordadas no tratado de Maastricht, principalmente com o início da crise em 2008. Deste modo, utilizando-se de Teoria dos Jogos, pretende-se analisar o comportamento e os incentivos dos países em se manterem cumprindo as metas iniciais para a criação da zona do Euro. 25 4. METODOLOGIA: Modelo de interação estratégica entre Grécia e União Monetária Europeia A abordagem deste trabalho será baseada em Teoria dos Jogos. Aqui, serão descritos os conceitos-chave de Teoria dos Jogos que serão aplicados neste trabalho. Para tanto, serão utilizados conceitos básicos que podem ser encontrados em Tadelis (2013) e Fiani (2006). Tais conceitos, no entanto, serão apresentados evitando-se o formalismo e rigor matemático, mas de um modo que permita o leitor acompanhar a análise a ser apresentada. Serão analisados os incentivos que o governo da Grécia pode possuir no momento em que teve de decidir por demonstrar a intenção de atender às regras estipuladas no tratado de Maastricht para entrar na zona do Euro e os incentivos gerados após a adesão em se manter ou desviar destas mesmas regras. Deste modo, o problema a ser estudado pode ser dividido em duas etapas. A primeira parte seria antes da União Monetária (Pré União) e segunda etapa seria depois da criação da zona do Euro (Pós União). Para solução do jogo, tanto Pré União, quanto Pós União, é necessário analisar se há Equilíbrio de Nash perfeito em subjogos. Dentre os axiomas básicos existentes para se entender uma tomada de decisão racional dos agentes, faz-se necessário entender o axioma sobre preferências completas e transitivas, que define que os agentes possuem preferências sobre todos os conjuntos de estratégias e possuem uma relação ordinal entre elas, ou seja, eles são capazes de distinguir qual resultado estratégico lhe proporcionará um maior payoff. Deve ser ressaltado que o entendimento sobre uma abordagem racional só serve para ordenar as opções dos possíveis payoffs para relações um mesmo agente. É importante lembrar que qualquer preferência completa e transitiva sobre um conjunto finito possui representação por uma função de utilidade, ver de Castro e Faro (2005). Uma das hipóteses atribuídas ao modelo é a da mudança na relação de preferências dos jogadores antes e depois da efetivação da União Monetária Europeia. Tal alteração na estrutura de payoffs, que será melhor abordada no desenvolver deste trabalho, altera o resultado do jogo, levando a um equilíbrio na segunda etapa diferente do equilíbrio encontrado na primeira fase do jogo, mesmo quando os agentes se deparam com o mesmo conjunto de ações. 26 4.1. Jogo não cooperativo O modelo tratado no presente trabalho é considerado um jogo não cooperativo, ou seja, um jogo onde os agentes não conseguem impor compromissos garantidos para um equilíbrio onde haja cooperação. Desta forma, não existe maneira de coerção para que um agente execute uma ação previamente acordada entre os jogadores. Deve ser ressaltado, no entanto, que existe uma literatura de jogos Cooperativos que oferece uma possibilidade alternativa de modelagem que não é desenvolvida neste trabalho. Um jogo simples pode ser definido com os seguintes conjuntos I, I , onde o conjunto , i = 1, ..., representaria o conjunto de estratégias possíveis para o jogador i. Cada jogador i apresenta, também, uma função de utilidade S = e : S IR , onde , atrelada ao resultado de interação entre as estratégias os demais jogadores. O conjunto de estratégias determinada para os demais agentes é denotado como . Assim, o jogo fica determinado por: 4.2. Nós de decisão Pode ser definido como nó de decisão todo “momento” cujo jogador é chamado para executar uma escolha de ação. Ainda existe um nó definido como nó terminal, que seria o final da árvore de payoffs, onde nenhum jogador terá mais de escolher sua ação, mas todos terão conhecimento dos seus payoffs. 4.3. Tipos de informação em jogos Existem dois tipos de jogo em se tratando do critério de informação. Os jogos podem possuir informação completa, o que implica que todos os agentes no jogo saibam de todas as ações possíveis de todos jogadores, saibam de todas os resultados de payoffs derivado dos resultados do jogo, saibam as preferências de cada e todos jogadores sobre seus payoffs, ou seja, todas as informações são de conhecimento comum. Já um jogo de informação incompleta prevê que as características de um, ou todos os jogadores não são de conhecimento comum, ou seja, as preferências de um agente não são explícitas no jogo, existe apenas uma crença sobre sua natureza. 4.4. Equilíbrio de Nash O Equilíbrio de Nash é determinado por um perfil de estratégias onde um desvio unilateral de um dos jogadores não lhe traga benefício algum, ou seja, é um resultado 27 das interações estratégicas onde nenhum jogador tem incentivos a mudar sua ação individualmente. Define-se Equilíbrio de Nash como um sistema de crenças e ações onde cada jogador acredita estar jogando com a melhor resposta para suas crenças e, ainda, os jogadores possuem conhecimento correto das crenças. Como ressaltado em Bueno e Faro (2004) o Equilíbrio de Nash determina que as estratégias dos agentes estejam condizentes com as crenças acerca das ações dos demais agentes, isso implicaria que para o bom desenvolvimento da modelagem, é mandatório o completo detalhamento de todos os atributos do jogo: jogadores, ações, hipóteses e crenças sobre o modelo. 4.5. Equilíbrio por eliminação de estratégias estritamente dominadas Diz-se que uma estratégia existir outra estratégia para o jogador i é estritamente dominada se tal que se é obtida uma utilidade melhor ao agente quaisquer que sejam as ações do outro jogador. De modo ilustrativo, dominada por é estritamente caso exista a seguinte situação: ( ) ( ) Em resumo, uma estratégia é estritamente dominante para determinado jogador quando não existe nenhuma outra melhor resposta a qualquer ação dos demais agentes envolvidos no jogo. Este fato pode ser ilustrado no exemplo abaixo, onde a ação de C (Confessar) é a melhor resposta para o Jogador 1, independente da ação escolhida pelo Jogador 2, isto é, se o Jogador 2 jogar NC (Não Confessar), a melhor estratégia do Jogador 1 é jogar C, obtendo payoff de 2, ao invés de 1, caso NC. Já se o Jogador 2 jogar C, a melhor resposta para o Jogador 1 é jogar C, obtendo 0, contra -1 que teria ganho jogando NC. Deste modo, independente da ação do Jogador 2, o Jogador 1 possui C como estratégia estritamente dominante, e sempre irá preferir esta ação a NC. 28 Figura 02 – Dilema dos prisioneiros Jogador 2 Jogador 1 NC C NC 1,1 -1,2 C 2,-1 0,0 Deste jogo, nota-se que, para ambos os jogadores, a ação de não cooperar (NC) é estritamente dominada por confessar, pois tem-se que (C,NC) (NC, NC) e (C,C) (C,NC). Assim sendo, um agente racional, decidindo maximizar sua utilidade, nunca viria a escolher a ação de não confessar em jogos não cooperativos, exceto em se havendo métodos coercitivos induzindo a uma cooperação dos jogadores. 4.6. Equilíbrio de Nash Trembling Hand Existe ainda um conceito para eliminação de equilíbrios de Nash não críveis, não no sentido de racionalidade, mas no sentido de não tolerar pequenos erros, ou seja, no sentido de ser mais robusto, pois impede que um jogador jogue com uma estratégia fracamente dominada. Tome um jogo com dois jogadores com a seguinte matriz de payoffs: Figura 03 – Jogo de Trembling Hand Jogador 2 Jogador 1 A B a 1, 1 2,0 b 0,2 2, 2 ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) Imaginando, agora, que o Jogador 1 está jogando com uma estratégia mista, jogando “a” com probabilidade (1-µ) e “b” com probabilidade µ, onde 0 < µ < 1. Deste ( modo, o payoff esperado para o Jogador 2 jogando “A” seria Caso o Jogador 2 jogue “B”, seu resultado esperado será . Isso implicaria que, para qualquer valor de ( ) ) o Jogador 2 estaria sempre 29 melhor caso decidisse jogar “A”. De modo análogo, o Jogador 1 também encontraria este resultado para a ação “a”. Então o equilíbrio de Nash Trembling Hand seria a interação estratégica que resultasse na combinação das estratégias fracamente dominantes para cada jogador (a, A). 4.7. Jogo simultâneo Define-se como jogo simultâneo quando um jogador é chamado a executar sua ação sem ter conhecimento da decisão do outro jogador no nó imediatamente anterior à sua ação. Isto acaba implicando que, em um jogo simultâneo, o equilíbrio não pode ser encontrado através do uso da técnica de indução reversa, conceito que será elucidado mais a frente, e o jogo terá de ser analisado através de outros métodos, como a eliminação de estratégias estritamente dominadas. 4.8. Indução reversa e Equilíbrio de Nash em subjogo perfeito O procedimento de indução reversa serve para análise de jogos na forma extensiva. Para a utilização desta técnica, é necessário analisar o jogo de trás para frente, indo dos payoffs dos resultados estratégicos na ponta “final” do jogo, ou seja, dos nós terminais. Do último nó, assumindo racionalidade nas ações dos agentes, estuda-se qual a será a ação do jogador responsável, então, o outro jogador já possui o conhecimento de qual será a ação tomada caso aquele nó seja o resultado de sua própria ação. Analisando-se desta maneira em todos os nós, “elimina-se” as ações que não serão executadas dados os passos do jogo, portanto faz-se uma análise retroativa até que o primeiro nó de decisão contemple um único resultado possível ao jogo dadas as análises das estratégias dos jogadores. O resultado desta análise determina o conjunto de Equilíbrio de Nash perfeito em subjogos. Esta metodologia permite a eliminação de Equilíbrios de Nash não críveis em jogos sequenciais. Equilíbrios não críveis são os resultados das interações estratégicas que são Equilíbrios de Nash quando analisada a matriz completa do jogo, como se todas as ações tivessem de ser definidas no nó inicial do jogo. Em jogos sequenciais, os agentes são chamados a jogar em partes distintas do tempo, ou seja, o conjunto de informações que eles detêm em cada etapa pode ser diferente, alterando assim as suas decisões mesmo deparando-se com o mesmo conjunto de ações. 4.9. Jogos sequenciais Em jogos sequenciais, o processo de interação estratégica ocorre com os jogadores tendo conhecimento de todo conjunto de informação até determinado nó, ou 30 seja, os jogadores jogam sabendo o que foi definido na etapa anterior, mantendo conhecimento histórico de todas as decisões tomadas até o momento. Um jogo sequencial pode apresentar ações distintas em cada nó, mas também pode ser o resultado da repetição do mesmo jogo determinadas vezes. 4.10. Jogos repetidos Os jogos repetidos são jogos onde ocorre a mesma iteração estratégica diversas vezes e constituem uma subclasse dos jogos sequenciais. O agente que será chamado a jogar possui todo o conjunto de informação sobre todos os resultados passados do jogo. Em um jogo de repetição finita no tempo, o resultado de equilíbrio é trivial, é dado pelo mesmo resultado caso os agentes jogassem apenas uma vez, pois eles detêm o conhecimento de quando o jogo terminará, o que acaba eliminando quaisquer incentivos à cooperação. Já um jogo repetido infinitas vezes permite que existam estratégias que induzam à cooperação, por exemplo, a Estratégia do Gatilho (ou Grim). 4.11. Estratégias coercitivas Tomando como exemplo um jogo onde o Equilíbrio de Nash não guie a um resultado de cooperação entre os agentes, por exemplo, o jogo do dilema dos prisioneiros exemplificado acima. Sabe-se que o equilíbrio do jogo é determinado pelo resultado das ações (Confessar, Confessar). Entretanto, existe, neste caso, a possibilidade de que ambos agentes melhorem sua situação, o que é conhecido como melhoria de Pareto. Para tanto basta que exista cooperação nas ações dos agentes. No caso deste jogo ser jogado apenas uma única vez, não existindo possibilidade de coerção para que os agentes fossem obrigados a jogar com determinada estratégia, o Equilíbrio de Nash seria o resultado do jogo. Entretanto, caso o jogo fosse repetido um número infinito de vezes, os jogadores poderiam utilizar estratégias coercitivas como a do Gatilho, ou a Tit for Tat. A estratégia do Gatilho é uma estratégia punitiva severa, pois determina que, a partir do momento que um jogador descumprir com a ação acordada, o outro agente irá buscará punir nas demais etapas do jogo. Ilustrativamente, no jogo do dilema dos prisioneiros, se um jogador confessar o crime, nos demais jogos todos os jogadores irão confessar. A estratégia Tit for Tat, ou “olho por olho”, prevê que a decisão da etapa seguinte do jogo estará baseada na ação do outro jogador na etapa atual. Por exemplo, se o jogador 1 colaborar em t0, em t1 o jogador 2 colaborará, caso em t0 o jogador 1 não colabore, em t1 o jogador 2 irá puni-lo não colaborando. 31 4.11.1. Teorema Popular de Folk (Nash Folk Theorem) Para calcular qual é o ponto que determina os resultados factíveis do jogo de repetição infinita, é utilizada a metodologia minimax. Calcula-se o máximo de payoff que o Jogador 1, por exemplo, pode adquirir em cada ação do Jogador 2, e depois analisa-se qual a ação do Jogador 1 tem o menor payoff. Realizando este mesmo procedimento ao outro agente, extrai-se qual seria o resultado do jogo. ( ) Ilustrativamente, se o Jogador 1 jogar Não Confessar, o melhor payoff para o Jogador 2 é resultado de Confessar (2). Caso o Jogador 1 jogue Confessar, o melhor payoff para o Jogador 2 também é resultado de Confessar (0). O mínimo dos payoffs resultantes é 0, então a ação do Jogador 2 para a estratégia de Gatilho é Confessar quando o Jogador 1 desviar da ação de cooperação. Como o jogo é simétrico, o resultado é análogo para o outro jogador. Segundo o Teorema Popular de Folk, se um jogador for paciente o bastante, ou seja, possuir um coeficiente de impaciência 1(δ) próximo de 1, qualquer payoff originado superior ao valor minimax pode ser entendido como um Equilíbrio de Nash em um jogo infinitamente repetitivo, ou seja, no exemplo dado anteriormente, seria obtido o ponto de minimax com o payoff resultante em 0 para ambos jogadores. Qualquer valor acima deste até o valor máximo gerado pelas interações estratégicas de cada jogador pode ser entendido como um equilíbrio factível em um jogo infinitamente repetido. Figura 04 – Jogos repetidos, indução à cooperação Jogador 2 Jogador 1 D 2 C 1 -2 -1 A -1 1 NC C NC 1,1 -1,2 2 C 2,-1 0,0 0 2 0 2 B 0 -2 1 δ sendo o fator de desconto intemporal da utilidade do agente, tal que, onde t = 0, 1,... T. 0 0 32 O polígono acima, formado pelos pontos A, B, C e D, representa os possíveis resultados do jogo do Dilema dos Prisioneiros segundo o Teorema Popular de Folk, formalmente, este conjunto é a envoltória convexa dos payoffs. A área hachurada representa os resultados factíveis num jogo repetido infinitas vezes caso os jogadores fossem bastante pacientes (com um fator de desconto δ igual a 1), ou após uma normalização. Assim sendo, é possível utilizar a estratégias coercitivas para mover-se do Equilíbrio de Nash de um jogo de apenas uma rodada (representado pelo ponto A) para o ponto C, bastando que o valor presente do resultado dos agentes jogando Não Cooperar supere o valor presente do desvio desta ação no primeiro momento, e os demais jogos no resultado (Confessar, Confessar). 33 5. MODELO Para este estudo, serão determinados dois agentes para interagir de forma estratégica de modo a simplificar o entendimento sobre as suas ações. Serão escolhidos o Governo Grego, denominado Grécia, e os demais países da União Monetária, doravante União. É importante destacar aqui que o responsável pela condução da política econômica, e fiscal de um país é seu governo e por isso destaca-se como um dos agentes o “governo” da Grécia. Outro ponto importante a se atentar é que governos democráticos, como é o sistema político grego, tendem a exercer maiores preferências sobre estratégias de curto prazo, pois buscam garantir sua manutenção em eventuais eleições próximas e, portanto, a todo o momento em que forem analisadas as matrizes de payoff neste trabalho, serão discutidas as preferências estabelecidas para o curto prazo. 5.1. Ações As ações dos jogadores são definidas a partir de cada nó de decisão do jogo, sendo que, conforme esclarecido acima, num jogo de decisão simultânea, não existe o conhecimento sobre a ação do outro jogador no mesmo período da jogada, portanto o jogador deve proceder de acordo com suas crenças sobre todos os atributos do jogo. 5.1.1. Ações do governo da Grécia Existirão dois momentos nos quais a Grécia será chamada para jogar, suas ações tanto no período Pré União Monetária, quanto no período Pós União Monetária são as mesmas, o que muda são os incentivos e as crenças que o governo grego possui sobre o jogo. Detalhadamente, a Grécia pode tomar a ação de Cumprir (C), que deve ser entendido de maneira não estrita, ou seja, não deve ser entendida como o atendimento às metas acordadas, e sim como a demonstração de cooperação do governo em se atingir tais metas, convergir suas variáveis macroeconômicas com o que se está proposto no tratado de Maastricht. Outra ação que cabe à Grécia é o de Não Cumprir (NC), com a qual a Grécia continuaria conduzindo suas políticas fiscal e monetária de maneira independente, não buscando convergir com as regras estabelecidas no tratado. Deste modo, a Grécia poderia conduzir suas políticas de acordo com os movimentos cíclicos de sua própria economia. 34 O não cumprimento das metas acordadas no período Pré União Monetária não impede a Grécia de participar da zona do Euro, mas poderia postergar sua entrada até que este país demonstrasse convergência com as regras atendidas. 5.1.2. Ações da União Do outro lado do jogo, tem-se o agente União. As ações da União também são as mesmas nos dois períodos, entretanto a forma que podem ser aplicadas se distingue. Na etapa Pré União, a punição caso haja o não cumprimento por parte do jogador Grécia é postergar a entrada deste país até que ele convirja para as metas acordadas. Já na segunda etapa, a punição seria a expulsão do país que não cumprisse com as regras estabelecidas no tratado de Maastricht. A União conta com o seguinte conjunto de ações: cumprir com o tratado e punir a Grécia caso este país não demonstre ações que sejam consistentes com a convergência às metas acordadas (CP), a União pode cumprir com o tratado e não punir a Grécia caso este país não cumpra com sua parte no acordo (CNP), e a União pode não cumprir com as regras do tratado (NC). Neste último caso, a criação do Euro não seria sustentável e o jogo acabaria sem o estabelecimento da União Monetária Europeia. Resumidamente, o conjunto de ações da União é composto por: (Cumprir e Punir, Cumprir e Não Punir, Não Cumprir). O entendimento sobre a punição nos dois estágios do jogo deve ser detalhado. Na etapa Pré União Monetária, a entrada da Grécia ficaria postergada até que este país demonstrasse convergência com as metas estabelecidas, Já na etapa Pós, tratar-se-ia de não socorrer a Grécia em quaisquer necessidades econômicas que este país enfrentasse, de modo que este país não visse outra saída senão o seu desligamento da União Monetária. 5.2. Hipóteses do modelo e crenças comuns Os jogadores entendem que a União Monetária só será atingida se, e somente se, a União cumprir com as regras do tratado de Maastricht. Também é de conhecimento comum que a punição da União, caso a Grécia não cumpra com as metas estabelecidas, na fase Pré, não é o impedimento da entrada deste país no grupo do Euro, mas o adiamento, ou uma série de sanções punitivas, enquanto a punição na fase Pós pode acabar sendo a expulsão do país da zona do Euro. Esta última hipótese do modelo serve para determinar que, independente do comportamento da Grécia, este país será aceito na zona do Euro. 35 Figura 05 – Jogo da Zona do Euro, forma extensiva C CP CNP NC NC C NC C NC Pré Pós 36 6. RESULTADOS Para melhor entendimento dos possíveis resultados do jogo, é necessário o estudo das combinações estratégicas dos jogadores em cada período do tempo. Em se tratando de um jogo finito, pode se analisar o resultado final de maneira aditiva no tempo, ou seja, a taxa de desconto não traria mudanças no equilíbrio encontrado, de modo que o resultado do jogo pode ser calculado como a soma dos payoffs resultantes em cada etapa do jogo. 6.1. Interações estratégicas na etapa Pré Existem seis resultados factíveis para o jogo: R = {(C,CP); (C,CNP); (C,NC); (NC,CP); (NC,CNP); (NC,NC)} Deve se entender que existe indiferença entre jogar Cumprir e Punir e Cumprir e Não Punir caso a ação da Grécia seja Cumprir. Tal resultado deriva do fato de não haver motivos para punição de um país que não tenha desviado do acordo, portanto é esperado que a Grécia e a União não possuam alteração nos seus payoffs com um ou outro resultado. Em suma, tem-se indiferença entre os resultados destas duas interações estratégicas. Fixando ainda a ação do governo grego em Cumprir, há ainda um resultado possível a ser detalhado, o caso da União jogar Não Cumprir. É esperada que a União Monetária acabe não sendo estabelecida, pois haveria falta de credibilidade na sustentação da moeda pelos investidores internacionais. É evidente, também que tanto a União quanto a Grécia se encontrariam em uma posição menos favorável do que se a União tivesse cumprido com as metas de modo a resultar na criação da zona do Euro. Com o não estabelecimento da moeda comum, nenhum dos agentes poderia vir a gozar dos benefícios gerados pela União Monetária. Os outros resultados factíveis derivam das ações da União com o governo Grego não cumprindo as metas acordadas. Neste ponto, vale ressaltar a premissa do modelo de que a zona do euro é estabelecida de modo independente da ação da Grécia, bastando apenas o cumprimento do acordo pela União. O resultado Não Cumprir, Cumprir e Punir não deve ser entendido como a não inclusão da Grécia na União Monetária, mas sim como um retardo à sua entrada, ou uma obrigação deste país a convergir com as metas estabelecidas de maneira mais austera. 37 No caso de a Grécia Não Cumprir e a União Cumprir e Punir, entende-se que a União estaria com um payoff um pouco menor que no resultado do jogo (Cumprir, Cumprir e Punir), pois a União teria não só um membro a menos como também o mercado enxergaria sinais de que as metas acordadas eram de difícil manutenção, principalmente para os países periféricos da economia europeia. Já a Grécia se encontraria em uma posição menos favorável quando comparada com o mesmo resultado, pois a punição poderia ser o adiantamento da sua entrada, ou a aplicação de sanções e restrições que lhe levariam a ter de atingir as metas do acordo de maneira mais abrupta. Outro resultado factível seria o (Não Cumprir, Cumprir e Não Punir). Claramente, neste caso a Grécia se viria em uma situação mais favorável que o resultado (Cumprir, Cumprir e Punir), pois além de poder gozar dos benefícios de uma união monetária, o seu governo poderia executar políticas expansionistas de curto prazo, beneficiando sua imagem com sua população. Já para a União, seria um resultado um pouco pior do que o extraído do equilíbrio (Não Cumprir, Cumprir e Punir), pois, embora ela pudesse desfrutar dos benefícios da criação da União Monetária, teria um free-rider no grupo, sendo sucetível a Moral Hazzard, caso outros governos vissem que não fazer esforço não geraria punição. Um último resultado factível para etapa Pré União seria onde ambos jogadores não cumprissem com as metas acordadas. Neste caso, não haveria criação da União Monetária Europeia. O agente União encontrar-se-ia em posição similar ao resultado (Cumprir, Não Cumprir), enquanto o jogador Grécia estaria melhor do que neste equilíbrio, pois não teria realizado os esforços para o atingimento das metas, porém estaria em uma posição menos favorável caso a União Monetária tivesse sido efetivada. Desta maneira, dado que a relação de preferências dos agentes pode ser representada por uma função de utilidade, ou seja, é desenvolvida para expressar uma abordagem ordinal das preferências, estipula-se a seguinte matriz de resultados possíveis, de modo a deixar a interpretação dos resultados mais intuitiva. Denotando por a relação de preferências da Grécia e por a relação de preferências da União no período Pré, observa-se as seguintes relações: ( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) ( ) ( ) ) ( ( ) ) 38 Figura 06 – jogo da zona do Euro, etapa Pré União União Grécia CP C NC CNP NC 10, 10 10, 10 0,5 2,9 12,7 5,5 Analisando este jogo através da metodologia de eliminação de estratégias fracamente dominadas, pode ser observado que o jogador União não possui incentivos a Jogar CNP, tampouco NC, sendo ambas ações dominadas pela ação CP. Deste modo, o governo grego tem a opção de Cumprir, extraindo um payoff de 10, ou Não Cumprir, extraindo um payoff de 2. Fica fácil de ver que o único Equilíbrio de Nash do jogo é o resultado (Cumprir, Cumprir e Punir) resultando nos payoffs (10, 10). 6.2. Interações estratégicas na etapa Pós No período Pós União Monetária, entende-se que a ação coercitiva deva ser rigorosa o suficiente para evitar que os países que já conseguiram fazer parte da zona do Euro tenham incentivos para abandonar as metas acordadas no tratado de Maastricht. O que muda do estágio Pré União Monetária para a etapa Pós União Monetária são as crenças que os jogadores detém sobre a credibilidade de uma punição rigorosa da União, ou seja, existe uma mudança nos incentivos e nos payoffs esperados de cada jogador para o mesmo conjunto de ações do jogo Pré União. São esperadas alterações nos payoffs dos agentes apenas quando o governo grego não cumprir com as metas acordadas, pois o seu não cumprimento é que poderia gerar uma instabilidade no mercado financeiro internacional, resultando em possíveis ataques especulativos contra as nações menos ricas do grupo. Caso o governo da Grécia não cumpra com as regras, este país ficará suscetível a especulações do mercado financeiro internacional, além do que os investidores poderiam dirigir seus ataques às economias periféricas da União Monetária, apostando que estas também não conseguiriam cumprir com as metas acordadas, ou seja, haveria risco de “contágio” da Grécia para estes países, como Portugal, Espanha etc. Analisando-se cada resultado factível onde são esperadas mudanças nos payoffs em relação à primeira etapa do jogo, espera-se que os ganhos auferidos pelo resultado (Não Cumprir, Cumprir e Punir) gere um retorno menor a ambos agentes quando se comparado ao resultado (Cumprir, Cumprir e Punir), Equilíbrio de Nash da primeira 39 fase. Como explorado acima, a punição da União à Grécia poderia gerar instabilidade no mercado, fazendo com que especuladores apostassem contra as economias mais frágeis. Outro resultado afetado por esta mudança de incentivos seria o da combinação das ações grega de Não Cumprir e da União de Cumprir e Não Punir. Embora o mercado possa operar contra os países mais fracos da União, neste ponto, a União demonstra interesse em ajudar os países periféricos do grupo, de modo a sustentar a manutenção da União Monetária. De tal maneira, é esperado que o governo grego encontrasse um payoff melhor do que o resultado de (Cumprir, Cumprir e Punir), pois poderia executar de políticas de curto prazo, beneficiando-se frente à sua população, e ainda gozaria de ajuda dos outros países do bloco. Entretanto, para a União é esperado um retorno menos favorável, entre os resultados de (Não Cumprir, Não Cumprir) e (Cumprir, Cumprir e Punir), pois este agente teria de exercer força e dispender de recursos para garantir a estabilidade econômica da zona do Euro. Ele teria de mostrar garantias de que conseguiria sustentar os países mais frágeis contra possíveis ataques especulativos. Para melhor compreensão e análise dos possíveis resultados, ilustra-se abaixo a matriz com as preferências ordenadas dos agentes. Conforme explicado acima, supõemse, sem perda de generalidade, que não existiriam esperadas mudanças nos payoffs dos jogadores caso a Grécia cumpra com as metas, ou caso a União não cumpra com as regas do tratado de Maastricht, pois, de fato, uma das hipóteses é de que mesmas para e são as ao condicionar a ação C para a Grécia ou a ação NC para a União. Denotando por a relação de preferências da Grécia e por a relação de preferências da União no período Pós, observa-se as seguintes relações: ( ) ( ( ) ) ( ( ) ( ) ( ) ( ) ( Figura 07 – Jogo da zona do Euro, etapa Pós União União CP Grécia ( ) C NC CNP NC 10, 10 10,10 0,5 2,2 14,6 5,5 ) ) ( ( ) ) 40 Existem dois equilíbrios de Nash nesta etapa do jogo, o primeiro consiste no resultado (C, CP) e (NC, CNP). Note que a estratégia CP é fracamente dominada para a União, logo este equilíbrio não pode ser Treabling Hand. De fato, assumindo que o jogador União jogue com uma estratégia mista (1- α, α, 0), com 0 < α < 1. O payoff ( esperado para a Grécia caso ela jogasse C seria jogasse NC seria ( ) ) já caso ela . Deste modo, para valores de α > ⁄ , a Grécia preferiria jogar a estratégia pura NC. Agora, caso o jogador Grécia jogue com uma estratégia mista (1- α, α), com 0 < α < 1. O payoff esperado para o jogador ( União caso ele jogasse CP seria ( CNP seria ) ) payoff esperado seria de já caso ela jogasse , por fim, caso ele desejasse jogar NC, seu ( ) . Deste modo, para o jogador União, o melhor resultado esperado seria jogar CNP, independente do valor de . Consequentemente, equilíbrio de Nash Trembling Hand para este jogo seria o resultado (NC, CNP). 6.3. Interações estratégicas no jogo completo Resta ainda a realização da análise da matriz do jogo em sua forma estendida, para se verificar a existência de equilíbrios de Nash não triviais. Partindo do pressuposto de preferência aditiva no tempo e do pressuposto de que o não cumprimento por parte da União na primeira etapa do jogo fazem com que os payoffs sejam repetidos na segunda fase do jogo, o resultado é representado matriz abaixo. Figura 08 – Jogo da zona do Euro, matriz completa Grécia União CP,CP CP,CNP CP,NC C,C 20 , 20 20 , 20 10 , 15 20 , 20 C,NC 12 , 12 24 , 16 15 , 15 NC,C 12 , 19 12 , 19 4 , 11 16 , 15 NC,NC CNP,CP CNP,CNP CNP,NC NC,CP NC,CNP NC,NC 20 , 20 10 , 15 0 , 10 0 , 10 0 , 10 12 , 12 24 , 16 15 , 15 0 , 10 0 , 10 0 , 10 2 , 14 22 , 17 22 , 17 12 , 12 10 , 10 10 , 10 10 , 10 7 , 14 14 , 9 26 , 13 17 , 12 10 , 10 10 , 10 10 , 10 41 Figura 09 – Jogo da zona do Euro, forma extensiva (20, 20) (24,16) C CP CNP NC NC C NC C NC Pré Pós Desta matriz, nota-se a existência de dois equilíbrios de Nash. Um sendo a combinação dos resultados dos jogos nas etapas Pré e Pós União Monetária {(Cumprir, Não Cumprir), (Cumprir Punir, Cumprir Não Punir)}, outro caracterizado pela combinação de {(Cumprir, Cumprir), (Cumprir Punir, Cumprir Punir)}. Este último equilíbrio é não crível2, pois, quando a Grécia, é chamada a jogar, no segundo período, ela tem ciência da alteração na matriz de payoffs, assim como a União têm, portanto os jogadores atuarão nas ações que resultarão no equilíbrio (NC, CNP) para a segunda etapa do jogo. 6.4. Jogo repetitivo, estudo sobre a cooperação dos agentes Ainda resta uma análise adicional. Sabendo-se que, uma vez formada a União Monetária, a etapa do jogo Pós poderá se repetir indefinidas vezes, faz-se necessário o entendimento da possibilidade de existência de cooperação. Para esta análise, será utilizada a estratégia severa de punição, ou seja, a estratégia do Gatilho, onde os 2 O sentido de crível no jogo de entrada é diferente do sentido de ser crível no sentido robusto discutido no item 4.6. Equilíbrio de Nash Treabling Hand. 42 jogadores se moverão para o equilíbrio punitivo caso haja desvios do equilíbrio cooperativo. Figura 10 – Jogo da zona do Euro, etapa Pós União, análise de repetição União União F 6 5 E C 2 A Grécia B 10 C NC CP CNP NC 10,10 10,10 0,5 10 2,2 14,6 5,5 6 10 14 5 6 D 5 2 5 10 14 Grécia Através do Teorema Popular de Folk, sabe-se que polígono ABCD representa o conjunto de resultados possíveis dentro de um jogo infinitamente repetido, onde o ponto E foi encontrado através dos valores minimax dos resultados das interações estratégicas dos jogadores. O ponto A representa o único Equilíbrio de Nash de subjogo perfeito. Utilizando-se de estratégias punitivas para coerção à Grécia, a União Europeia dispõe da área hachurada, ou seja, existe possibilidade de elaboração de estratégias punitivas para a União Monetária para induzir o jogo ao resultado Cumprir, Cumprir e Punir (ponto B da figura acima), tal ponto é equilíbrio não crível para o jogo repetido obtido a partir da etapa Pós. Os pontos A e B representam os equilíbrios que são ótimos no sentido de Pareto relacionados à etapa Pós quando se é analisado o jogo em dois períodos (ver figura 06). Essa análise se estende ao segmento AB pelo Teorema Popular de Folk como um todo pois em qualquer ponto deste segmento a União só consegue obter um resultado melhor em detrimento de uma piora na situação da Grécia, assim como a Grécia só consegue obter um melhor payoff quando observado uma piora para a União. Para ilustrar um equilíbrio que não seja crível, considere a seguinte estratégia: o jogador União sempre joga CP caso observe a ação C, ou NC do jogador Grécia. O jogador Grécia começa jogando NC e joga C sempre que observar a ação CP do agente União. Esta estratégia constitui um equilíbrio se a União for suficientemente paciente, ou seja, caso o fator de impaciência seja tal que: 43 2 + 10 + 10 + ··· ≥ 6 + 6 Chegando ao resultado de que ≥ +6 + ··· ⁄ . Mas, como comentado anteriormente, este é um equilíbrio não crível a pequenos erros. Ademais, uma última observação sobre os resultados factíveis refere-se à face do polígono formado pelo segmento AB, tais pontos fazem parte do conjunto de ótimos de Pareto do jogo infinitamente repetido, ou seja, não existe a possibilidade de que haja melhoria de payoff de um jogador sem provocar uma diminuição no payoff do outro jogador. 44 7. CONCLUSÃO A fragilidade da União Europeia foi discutida no trabalho de Schuknecht et al. (2011), que acabam ressaltando que, logo que o Euro foi implementado, houve relaxamento nas regras dos países em cumprir o tratado de Maastricht. Na literatura Pré-crise, um dos fatores citados no trabalho de Pisani-Ferry (2012) como fragilidade para a União Monetária era a independência sobre as dívidas públicas. Nesta linha, um dos países que mais defendia este ponto, a Alemanha, foi uma das principais responsáveis ao socorro à Grécia quando este país viu-se em uma posição bastante desconfortável em relação às suas dívidas. O rumo que a União Monetária Europeia tomará a partir do fim da crise tem de ser estudado com bastante cautela, quaisquer que sejam suas ações, a estabilidade desta união está bastante relacionada a como os investidores verão o Euro e como os países membros, principalmente os mais fracos, verão a ajuda prestada à Grécia durante a crise. Sob as hipóteses colocadas no modelo do presente trabalho, entende-se que os países agiram racionalmente de modo a buscar a maximização dos seus resultados. Caso a Grécia tenha tomado como não crível a ameaça de não receber ajuda do restante dos países da União Europeia, o descumprimento das metas do tratado de Maastricht não foi nada além de uma decisão racional dos líderes econômicos deste país. E, uma vez constatada a fragilidade a qual a zona do Euro estava exposta por causa da dívida grega, não coube outra ação à União Europeia senão intervir e auxiliar a Grécia. A ajuda ao país grego foi uma medida tomada pelos países europeus com a finalidade de manter estável a economia do bloco como um todo, não havendo, neste sentido, credibilidade na “independência sobre as dívidas públicas”. Além disso, buscou-se demonstrar que na repetição do jogo, no estado Pós União, o agente União pode induzir a um equilíbrio cooperativo dispondo de estratégias de coerção. Certamente uma análise mais crítica sobre este fato deve ser fundamentada no sentido de explorar quais os payoffs percebidos pelos agentes quando estes estiverem buscando a maximização de sua utilidade no longo prazo, deixando de executar ações que lhes promovam benefícios de curto prazo. Entende-se que tanto a União Europeia quanto a Grécia teriam seus payoffs alterados em uma análise de longo prazo, pois os incentivos dos jogadores iriam se alterar. 45 O objetivo deste trabalho foi o de mostrar a fragilidade na União Monetária Europeia. Embora ainda seja cedo para se atribuir a não expulsão da Grécia ao custo associado à União Europeia em fazê-lo, não se pode desconsiderar ajuda prestada a este país em todo um contexto sobre Moral Hazzard discutido durante toda a crise financeira de 2008. 46 8. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA BENOÎT, Jean-pierri; KRISHNA, Vijay. The Folk Theorems for Repeated Games: A Synthesis. Economic Research Reports, Nova Iorque, p.1-36, mar. 1996. BUENO, Newton Paulo; FARO, José Heleno. Economia e Instituições no Governo Kubitschek. Revista de Economia Política, [s.i.], v. 24, n. 1, p.136-149, jan. 2004. CHARI, Varadarajan V.; KEHOE, Patrick J.. Time inconsistency and free riding in a monetary union. 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