Faculdade de Ciências Sociais e Humanas Universidade Nova de Lisboa A INSUSTENTÁVEL INÉRCIA DO CIDADÃO – A [NÃO] PARTICIPAÇÃO PÚBLICA COMO CONTRIBUTO PARA A PRESERVAÇÃO DO LITORAL O Estudo de Caso do Projecto Coastwatch Lurdes Maria dos Santos Soares Mestrado em Ecologia Humana e Problemas Sociais Contemporâneos Lisboa 2007 Dissertação apresentada à Faculdade Ciências Sociais e Humanas para obtenção do grau de Mestre Esta dissertação foi elaborada em 2006 e 2007, sob a orientação da Professora Doutora Iva Pires, da Faculdade de Ciências Sociais Universidade Nova de Lisboa e Humanas – AGRADECIMENTOS “Acima de tudo, na vida, temos necessidade de alguém que nos obrigue a realizar aquilo de que somos capazes. É este o papel da amizade” (autor desconhecido). Por isso quero agradecer a todos os que de uma forma ou de outra, me ajudaram na concretização desta dissertação: À minha orientadora que me fez acreditar que a tarefa seria fácil. Ao Carlos Costa, pela amizade, paciência, encorajamento e inspiração. À Luanha Saraiva minha amiga e companheira de momentos difíceis. Jamais esquecerei que permaneceu ao meu lado quando estive triste, ouviu-me mesmo quando não consegui falar, caminhou comigo em silêncio e com ternura sorriu, obrigando-me a encetar novas caminhadas. À Teresa Venceslau pela amizade, inspiração e presença, mesmo quando ausente. À Lúcia e ao Pedro por todo o apoio que me deram, nos momentos de crise, sempre prontos a orar por mim. À Margarida Jogo, pela força e jeito “descomplicado” de me obrigar a estar na vida. Ao Francisco Andrade, à Adelaide Ferreira e à Maria Andrade por estarem aí. À Bia que mesmo à distância me apoiou e acreditou que chegaria ao fim. A todos os meus amigos que tiveram paciência para ouvir os meus “não”, nem sempre com o melhor dos humores. Aos investigadores com quem trabalhei nestes anos, ao serviço do Coastwatch, cujo profissionalismo foi modelo inspirador, em especial ao Carlos Reis, ao César Andrade e à Conceição Freitas. Ao Nuno que me incentivou de forma a sentir que era tarefa fácil, quando a vontade era desistir… À Graça Brito e ao Daniel Vendas pela disponibilidade e boa vontade. À Margarida Nicolau e Fernando Alves. Aos coordenadores regionais, participantes e todos os envolvidos no projecto Coastwatch que responderam ao questionário e trabalharam comigo. À Dr.ª Margarida Oliveira que me estendeu a mão e me fez encontrar a minha essência. À Arq. ª Margarida Almodôvar e Eng.ª Guida Henriques do Instituto Nacional da Água À Dr.ª Isabel Raposo e ao Jorge Neves da Agência Portuguesa do Ambiente À Dr.ª Teresa Leonardo do Instituto Conservação da Natureza e Biodiversidade Ao GEOTA Aos que me esqueci de mencionar e a todos os que directa ou indirectamente contribuíram, de alguma forma, para que esta dissertação chegasse ao fim. Por fim queria dedicar esta dissertação à minha mãe, embora não esteja presente, que no dia em que entrei para a 1ª classe me disse, ao sair de casa “Filha faz uma boa letra que haverá sempre quem a leia…”. Obrigado a todos por estarem aí… Lurdes Soares RESUMO O envolvimento dos cidadãos com vista a assegurar influência nos processos de decisão é, efectivamente, um processo essencial numa sociedade desenvolvida; mas como qualquer mudança gera sempre resistência. Em Portugal, apesar de podermos falar em sinais de mudança, assiste-se, nalguns casos a uma inércia do cidadão em muitos processos. Outros há, em que a manifestação perante determinada situação não poderá ser enquadrada num verdadeiro exercício de cidadania por ser fruto da defesa de interesses particulares e, desse modo, ser mais reactiva que pró-activa. Porém, em qualquer análise do percurso da participação pública em Portugal não pode ser esquecido os cinquenta anos de autoritarismo do regime político anterior que não deixam de se fazer sentir nesta lenta consolidação de uma democracia participativa. Assim, se é verdade que até há bem pouco tempo eram válidos os pontos de vista de que: “a sociedade portuguesa mantém sinais claros de um défice de participação cívica (Cabral, 2000), conservando-se, por outro lado, entre as autoridades locais e centrais, uma tendência marcadamente centralista, pouco aberta à interacção com os cidadãos (Vasconcelos, 2001)”, também é verdade que este cenário, por força das contingências políticas, socio-económicas ou até mesmo culturais, dá sinais de uma evolução positiva. Desde a década de 70 até aos nossos dias muito trabalho foi desenvolvido. Foram criadas as estruturas legais à escala nacional e europeia – sem duvida que a entrada de Portugal na União Europeia foi uma forte alavanca no processo de participação pública – assim como métodos de participação para que o cidadão se manifeste e dê os seus contributos nos processos de decisão que directamente lhe dizem respeito. Do conjunto de medidas tomadas em prol da participação pública a Convenção de Aarhus foi, sem sombra de dúvida, um importante instrumento, na medida em que veio introduzir uma série de legislação de apoio ao cidadão e “obrigar” os responsáveis de cada país a desenvolverem medidas com este fim. As directrizes incluídas neste documento são um forte contributo para uma tomada de consciência dos diferentes actores sociais, relativamente aos papéis que cabe a cada um desempenhar na promoção do desenvolvimento sustentável. Assim, na análise da participação pública dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), é possível observar a evolução da participação dos cidadãos nos processos de decisão. Se, com rigor, não se pode deixar de afirmar que a participação é fortemente cingida a interesses particulares, nomeadamente ao nível dos apoios de praia, também é verdade que desde o POOC Caminha – Espinho, até ao de Vilamoura -Vila Real de Santo António, houve uma evolução positiva no envolvimento dos cidadãos, em número e na forma de participação. O estudo de caso – o Projecto Coastwatch – consolida a ideia de que os projectos de educação ambiental são um forte contributo para sensibilizar e desenvolver práticas de cidadania. As potencialidades do Coastwatch têm sido aproveitadas por diversas entidades que usam o projecto como forma de pôr em prática princípios que conduzem os participantes a participar activamente na temática do ordenamento do território em áreas costeiras. Apesar dos seus dezoito anos de existência o projecto conseguiu reestruturar-se e alargar fronteiras, para já até ao Brasil e em breve para outros países de expressão lusófona, como Cabo Verde, Angola e Moçambique, comprovando as potencialidades do projecto como difusor da cidadania ambiental e das práticas de participação. ABSTRACT The involvement of citizens with the goal of assuring some influence in the processes of decision is, in fact, an essential process in a developed society, but, as any change, always entails some resistance. In Portugal, although some signs of change are already noticeable, there is, in some cases, some inertia of the citizens in many processes. In other cases, the reactions in face of certain situations cannot be acknowledged as real exercises of citizenship, because they result from private interests, and thus appear to be more reactive than proactive. However, any analysis of the evolution of the public participation in Portugal cannot ignore the 50 years of previous authoritarian political regime, whose effects still linger in this slow consolidation of a participating democracy. Thus, if it is true that, until quite recently, the following points of view were valid: “the Portuguese society maintains clear signs of a deficit of civic participation (Cabral, 2000), retaining, on the other hand, a marked tendency of centralization among local and central authorities, little open to an interaction with the citizens (Vasconcelos, 2001)”, it is also true that this state of affairs, due to political, socio-economical and even cultural contingencies, shows signs of a positive evolution. A lot of work was developed since the 1970’s up to our days. Legal structures were created both at a national and European scale – the adhesion of Portugal to the European Union was undoubtedly a powerful lever in the process of public participation – as well as methods of participation allowing for the citizen to speak up and contribute to the decision processes that concern him directly. Amongst the set of measures taken in behalf of the participation, the Aarhus Convention was, without a doubt, a most important tool for this goal, since it introduced a series of legal instruments to support the citizens and “force” the responsible representatives of each country to develop measures with this goal in mind. The directives included in this document are a great contribution to a raise of awareness of the different social actors in what regards the role that each one is supposed to play in the promotion of the sustainable development. Therefore, in the analysis of the public participation on the Coastal Strip Ordering Plans (POOC), it is possible to observe the evolution of the citizens’ participation in the decision processes. If, rigorously speaking, one cannot disregard that the participation is practically restricted to personal interests, namely at the level of the beach infrastructures, it is also true that, from the POOC of Caminha – Espinho up to that of Vilamoura – Vila Real de Santo António, there was an evolution in the citizens’ involvement, both in number and form of participation, with better informed citizens. The case study – the Coastwatch Project – consolidates the idea that the environmental education projects represented a powerful contribution to raise the awareness and develop citizenship practices. Several entities took advantage of the potential of the Coastwatch and used the project as a means to put in practice some principles that lead the participants to actively participate in the theme of territory ordering in coastal areas, as can be verified by the enquiries that were carried out. In spite of its 18 years of existence, the project was able to restructure itself and expand beyond borders, for the time being to Brazil and soon to other Portuguese-speaking countries, such as Cape Verde, Angola and Mozambique, thus proving the project’s potential as a purveyor of environmental citizenship and participation practices. ÍNDICE GERAL RESUMO .........................................................................................................................6 ABSTRACT......................................................................................................................8 ÍNDICE GERAL..............................................................................................................10 ÍNDICE DE QUADROS..................................................................................................12 ÍNDICE DE FIGURAS ....................................................................................................13 LISTA DE SIGLAS .........................................................................................................15 INTRODUÇÃO.................................................................................................................1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA DA DISSERTAÇÃO NO ÂMBITO DO MESTRADO ........................4 1. DA EMERGÊNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.........................................................................................................12 1.1 O PERCURSO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ...............................................................12 1.2 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – UMA ABORDAGEM HISTÓRICA .........................17 1.3 AS DIMENSÕES DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ...........................................27 1.4 – ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ....................................31 1.4.1 ESTRATÉGIA DA UNIÃO EUROPEIA PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL .31 1.4.2 ESTRATÉGIA NACIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................34 2. INSTRUMENTOS POLÍTICOS E CIDADANIA AMBIENTAL EM PORTUGAL..........38 2.1 Políticas ambientais e estímulo à participação pública na UE.........................40 2.2 POLÍTICAS AMBIENTAIS EM PORTUGAL..................................................................45 2.2.1 PLANOS DE ORDENAMENTO DA ORLA COSTEIRA............................................55 2.2.2 GESTÃO INTEGRADA DAS ZONAS COSTEIRAS ................................................64 2.3 PARTICIPAÇÃO PÚBLICA NA PRESERVAÇÃO DO LITORAL .........................................66 2.3.1 O ASSOCIATIVISMO EM PORTUGAL ...............................................................69 2.3.2 O EXEMPLO DOS PLANOS DE ORDENAMENTO DA ORLA COSTEIRA .....................73 2.4 PARTICIPAÇÃO SOCIAL ........................................................................................79 2.4.1 O INCENTIVO DAS ONG À PARTICIPAÇÃO PÚBLICA ...........................................79 2.4.2 DOIS EXEMPLOS PRÁTICOS DE DINAMIZAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO PÚBLICA .........86 3. CASO DE ESTUDO: O PROJECTO COASTWATCH...............................................93 3.1 O COASTWATCH NA EUROPA ..............................................................................93 3.2 COASTWATCH EM PORTUGAL ..............................................................................95 3.2.1 OBJECTIVOS ...............................................................................................95 3.2.2 Metodologia ..............................................................................................98 3.3 IMPLEMENTAÇÃO DO PROJECTO ........................................................................105 3.3.1 O QUESTIONÁRIO......................................................................................105 3.3.2 PRODUÇÃO DE MATERIAIS DE APOIO ..........................................................108 3.3.3 O PROJECTO COASTWATCH NO ENSINO FORMAL ........................................109 3.4 AVALIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO NO PROJECTO COASTWATCH ................................112 3.4.1 METODOLOGIA ..........................................................................................112 3.4.2 ANÁLISE DOS INQUÉRITOS AOS PARTICIPANTES NO PROJECTO COASTWATCH .113 3.5 FRAGILIDADES DO PROJECTO COASTWATCH ......................................................121 3.6 POTENCIALIDADES DO PROJECTO COASTWATCH ................................................125 3.7 PROPOSTAS DE ALTERAÇÃO DO QUESTIONÁRIO .................................................127 3.8 INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL - O MODELO DPSIR ...........131 3.8.1 APLICAÇÃO DO MODELO DPSIR NA ANÁLISE DE INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA GESTÃO DO LITORAL ................................................133 3.9 PERSPECTIVAS DE DESENVOLVIMENTO DO PROJECTO COASTWATCH INTERCONTINENTAL .....................................................................................................135 3.9.1 COASTWATCH BRASIL ...............................................................................135 4. CONCLUSÕES .......................................................................................................137 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................141 ANEXOS ......................................................................................................................146 ÍNDICE DE QUADROS Quadro I – Marcos no percurso da Educação Ambiental em Portugal ..........................14 Quadro II – Alguns Princípios do Direito do Ambiente ...................................................24 Quadro III – Objectivos de Desenvolvimento do Milénio da ONU..................................25 Quadro IV – Principais problemas visados na EDS – UE (2001)...................................33 Quadro V - A União Europeia e o Desenvolvimento Sustentável (2007/13) ..................34 Quadro VI – Integração de Portugal no processo europeu e global de DS ...................35 Quadro VII – Medidas por domínios de intervenção ......................................................46 Quadro VIII – Participações nos processos de AIA .......................................................50 Quadro IX – Instrumentos de Gestão Territorial (IGT) ...................................................54 Quadro X – Princípios e Objectivos Fundamentais da GIZC .........................................66 Quadro XI – Planos Ordenamento da Orla Costeira......................................................74 Quadro XII- Resumo das principais instituições com responsabilidade na gestão da zona costeira..................................................................................................................74 Quadro XIII – Possíveis Pontos comuns aos POOC .....................................................76 Quadro XIV – Títulos das campanhas Coastwatch........................................................97 Quadro XV - Excerto da Divisão dos Blocos por NUT (exemplo) ................................100 Quadro XVI - Excerto da Base de dados Coastwatch .................................................102 Quadro XVII – Distribuição de Alertas emitidos pela Protecção Civil...........................123 Quadro XVIII – Indicadores percepção de Risco .........................................................130 Quadro XIX - Indicadores Ambientais ..........................................................................131 Quadro XX – Indicadores de DS na Gestão do Litoral.................................................133 ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Dimensões do Desenvolvimento Sustentável ...............................................27 Figura 2 - Esquema sobre a Zona Costeira Adoptado na União Europeia ...................56 Figura 3 - Mapa de jurisdição do litoral ..........................................................................57 Figura 4 – Limites da faixa terrestre e marítima de protecção .......................................60 Figura 5 – Regiões geológico-estruturais de Portugal Continental e POOC..................61 Figura 6 - Entidades envolvidas nos processos de elaboração dos POOC ...................62 Figura 7 – Planos de Ordenamento da Orla Costeira ....................................................63 Figura 8 – Limites da EGIZC..........................................................................................65 Figura 9 - Registo das ONGA por ano e acumuladas ....................................................71 Figura 10 – Estatuto das ONGA em 2006 (valores absolutos) ......................................71 Figura 11 – Âmbito da actuação da ONGA, 2006 (%) ...................................................72 Figura 12 – Tipologia das ONG inquiridas .....................................................................73 Figura 13 – Distribuição dos participantes .....................................................................77 Figura 14 – Alterações realizadas..................................................................................78 Figura 15 – Participação por Município..........................................................................78 Figura 16 – Tipologia das ONG inquiridas .....................................................................80 Figura 17 – Ano de Formação da ONG .........................................................................80 Figura 18 – Âmbito da ONG...........................................................................................81 Figura 19 – Número de associados das ONG inquiridas ...............................................81 Figura 20 – Localização das ONG por NUT II................................................................82 Figura 21 – Tipologia dos projectos ...............................................................................82 Figura 22 – Acções desenvolvidas no âmbito dos projectos..........................................83 Figura 23 – Tipologia das entidades parceiras na dinamização das acções .................83 Figura 24 – Faixa etária dos participantes .....................................................................84 Figura 25 - Organização das Sessões de esclarecimento .............................................85 Figura 26 – Faixa etária dos participantes nas sessões de esclarecimento ..................85 Figura 27 – Classificação da participação pública. ........................................................86 Figura 28 - A observação antes do debate ....................................................................90 Figura 29 - A Sessão de abertura e a Sessão técnica...................................................90 Figura 30 - O Público e a participação ...........................................................................90 Figura 31 - Mapa de campo (exemplo) ..........................................................................99 Figura 32 – Kit de Nitratos ...........................................................................................100 Figura 33 – Previsão de marés (Fonte: Instituto hidrográfico) .....................................101 Figura 34 – Evolução de número de escolas participantes no projecto (1999-2007)...103 Figura 35 – Número total de alunos em relação ao total de participantes no projecto (2003-2007) .................................................................................................................104 Figura 36 – Número de entidades envolvidas no projecto 2003-2007 .........................105 Figura 37 – Número de autarquias coordenadoras......................................................107 Figura 38 – Número de docentes participantes em função da disciplina leccionada. ..112 Figura 39 – Grau de envolvimento no projecto (%)......................................................114 Figura 40 – Meio de conhecimento do Projecto Coastwatch (%).................................115 Figura 41 – Número de anos de permanência no projecto ..........................................115 Figura 42 – Workshop Apr(e)ender o Litoral –Prática CW e Prática de Perfil de Praia .....................................................................................................................................116 Figura 43 - Tipologia das actividades desenvolvidas no âmbito da divulgação do Coastwatch ..................................................................................................................117 Figura 44 - Número de pessoas envolvidas por acção ................................................118 Figura 45 – Tipologia das parcerias na dinamização de actividades ...........................119 Figura 46 – Tipo de Projectos/Actividades associados à dinamização do Coastwatch (%) ...............................................................................................................................119 Figura 47 – Tipo de actividades de divulgação dos resultados (%) .............................120 Figura 48 – Entidades Convidadas/Envolvidas na divulgação dos resultados.............120 Figura 49 – Exposição de trabalhos desenvolvidos no âmbito do Coastwatch (CM Funchal) .......................................................................................................................121 Figura 50 - Precipitação mensal em Portugal Continental em 2006.Comparação com os valores médios.............................................................................................................122 Figura 51 – Corte e planta da área de análise do projecto Coastwatch.......................127 Figura 52 – Tipos de costa no litoral português ...........................................................128 Figura 53 - Estrutura conceptual do modelo PER da OCDE........................................130 Figura 54 - Modelo DPSIR : Forças Actuantes (Driving forces) - Pressão – Estado – Impactes – Resposta ...................................................................................................133 Figura 55 - Aplicação do modelo DPSIR na análise de indicadores de desenvolvimento sustentável na gestão do litoral ...................................................................................134 LISTA DE SIGLAS ADA - Associações de Defesa do Ambiente AIA - Avaliação de Impacte Ambiental APA – Agência Portuguesa do Ambiente CCDR – Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional CE – Comissão Europeia CIDN - Conselho Ibérico para a Conservação da Natureza CIGA – Centro de Investigação e Geologia Aplicada CNA - Comissão Nacional de Ambiente CNUAD - Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento CPADA - Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente CREA - Conselho Regional de Engenharia, Arquitectura e Agronomia CTA - Comissão Técnica de Acompanhamento DGOTDU - Direcção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano EEB - European Environmental Bureau EIA – Estudos de Impacte Ambiental ENDS – estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável EPE - European Partners for the Environmen EU – União Europeia EUCC - European Union for Coastal Conservation FOIA - Freedom of Information Act GAP - Gabinetes de Atendimento Personalizado GEOTA – Grupo de Estudo Ordenamento do Território e Ambiente GIZC - Gestão Integrada das Zonas Costeiras IA – Instituto do Ambiente ICNB - Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade IGT - Instrumentos de Gestão Territorial INAG - Instituto Nacional da Água INAMB - Instituto Nacional de Ambiente IPAMB - Instituto de Promoção Ambiental JNICT - Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica LBOTU - Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo LPN - Liga para a Protecção da Natureza MAOTDR - Ministério do Ambiente do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e o Ministério educação OCDE- Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico ONG – Organização Não Governamental ONGA - Organização Não Governamental de Ambiente ONU – organizações das Nações Unidas PDM – Planos Directores Municipais PEOT – Planos Especiais de Ordenamento do Território PIENDS - Plano de Implementação PNOPT - Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território PNUA - Programa das Nações Unidas para o Ambiente PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento POOC – Plano Ordenamento da Orla Costeira PROT – Planos Regionais de Ordenamento do Território RJIGT - Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial SAR - Seas at Risk SEMARH - Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – SGT - sistema de gestão territorial TAI – The Acess Initiative UICN - União Internacional para a conservação da Natureza UNECE - Comissão Económica para a Europa das Nações Unidas UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura WCED - World Commission on Environment and Development/ Comissão Mundial sobre Ambiente e Desenvolvimento WWF - World Wildlife Fund INTRODUÇÃO O tema da dissertação enquadra-se no domínio da Ecologia Humana e tem como objectivo investigar os contributos da participação pública na preservação do litoral. A fragilidade do litoral é amplamente conhecida pelas características demográficas, socioeconómicas, políticas, biológicas, históricas, entre outras, que lhe são subjacentes. Este é, não apenas um problema social contemporâneo, como também um problema de Ecologia e de Ecologia Humana em particular. Sobre a faixa litoral reside cerca de 75% da população portuguesa – com todo o impacte que isto acarreta, nomeadamente em termos de pressão imobiliária e turística – daí que o (des) ordenamento do litoral seja uma evidência em termos práticos e de discussão. Aliás, é tema infindável de muitos estudos, notícias, projectos, etc. Gera ainda inúmeros projectos-lei, planos e um interminável rol de outras matérias. Questiona-se, assim, porque os cidadãos não desenvolveram hábitos de participação pública, quando são discutidos estes temas; porque não se interessam activamente pela discussão pública de projectos que vão alterar o território, condicionando, quase sempre, a sua sustentabilidade, com impacte não só na geração actual como nas vindouras. Por experiência profissional, enquanto docente e mais recentemente ligada ao associativismo e a projectos de educação e cidadania ambiental, vocacionados essencialmente para o litoral, verifico que, muito embora haja um maior envolvimento por parte dos cidadãos nas questões ambientais e nos processos de decisão, esta participação pública funciona em muitos casos de acordo com os interesses de cada um, individualmente ou em grupo. Os relatórios de ponderação da discussão pública provam esta realidade. E, porque a educação ambiental foi institucionalizada em 1986, com a publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo, esperava-se que tal desse os seus frutos e as gerações seguintes, algumas já com responsabilidades sociais e políticas, fossem mais pró-activas. A realidade veio provar que a inércia e os grandes erros de ordenamento e gestão são, com efeito, não só insustentáveis como dificilmente reparáveis. 1 A investigação realizada no desenvolvimento do trabalho incidiu principalmente na problemática da participação pública como contributo para a preservação do litoral. Em termos gerais, os cidadãos têm acesso a instrumentos de participação política indirecta, com a eleição de órgãos representativos, a petição para a adopção de leis e o referendo. Não se trata, pois de uma questão de suporte legislativo. A Constituição prevê o envolvimento dos cidadãos em decisões administrativas, para tal as autoridades públicas são obrigadas a fornecer as informações necessárias à participação pública, apoiar e promover iniciativas do público e receber as suas opiniões e informação. Segundo Sendim (2002), a participação no Estado de Direito do Ambiente justifica-se ao possibilitar a incorporação de mais informação nos processos decisórios e a potencial minimização de impacte negativos no ambiente, ao permitir uma melhor afectação dos bens e interesses em causa e como condição de legitimidade. A participação é assim promotora da transparência, da racionalidade e da qualidade das decisões administrativas. Neste âmbito, um dos pontos do presente trabalho prende-se com a participação pública na elaboração dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC). E, porque a participação social também desempenha um papel imprescindível, importa compreender de que forma as ONG vivenciam a questão da participação pública. Que actividades dinamizam e como as desenvolvem; como lidam com a educação ambiental e com as fragilidades do litoral. Posteriormente foi analisado o Projecto Coastwatch, como estudo-caso ao nível da participação pública. Sendo um projecto implementado há 18 anos, cujo objecto de estudo é o litoral e o impacte que a actividade humana exerce sobre ele, em que a educação ambiental sempre teve uma tónica vincada, propôs-se conhecer o projecto e compreender como evoluiu ao longo deste período. A experiência de dinamização do Coastwatch mostrou a necessidade de introduzir novas variáveis no questionário que é usado pelos participantes. Nesse sentido são propostos novos itens de monitorização que permitem introduzir novas tónicas ao projecto; adequá-lo aos currículos escolares e ao próprio ecossistema em estudo que, devido a factores naturais e/ou antrópicos, também sofreu alterações. 2 Assim pretende-se com este trabalho, por um lado dar um contributo para repensar a participação pública em Portugal e por outro perceber de que forma os projectos de educação ambiental poderão ser integrados nos currículos escolares criando sinergias entre escolaridade institucional e cidadania. 3 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA DA DISSERTAÇÃO NO ÂMBITO DO MESTRADO Em 1866, o biólogo alemão Ernst Haeckel criava, com duas palavras gregas (οi\κος e λóγος), a palavra ecologia. Definia ele a ecologia como “o conhecimento da economia da natureza, a investigação de todas as relações de um animal ao mesmo tempo com o seu meio inorgânico e orgânico, incluindo, além disso, todas as suas relações amigáveis e antagónicas com os animais e as plantas com os quais entra directamente em contacto”1. Para Odum (1971:4) “ A Ecologia define-se usualmente como o estudo das relações dos organismos ou grupos de organismos com o seu ambiente, ou a ciência das interrelações que ligam os organismos vivos ao seu ambiente”. Porém, muitos outros autores se dedicaram a definir e estudar este tema, muito antes de ecologia ser reconhecida como ciência. A ecologia, per si, é tão antiga quanto o Homem, na medida em que este, desde sempre, sentiu necessidade em conhecer o ambiente e os seres que com ele partilham o Planeta. Primitivamente, por uma questão básica de sobrevivência – abrigo, alimentação – adaptando-se numa simbiose com a natureza, nem sempre pacífica, e posteriormente, à medida que o progresso tecnológico tomava forma e procurava suprir outras necessidades, inclusive culturais. “Ao imaginarmos uma paisagem pré-histórica onde habitam alguns homens, á priori, dificilmente perceberemos a existência de quaisquer litígios entre a sua presença e a paisagem que os envolve” (Carapeto, 1998). Porém essa convivência com a natureza terá sido, frequentemente, marcada por rupturas. Segundo Costa (1992) “O Homem foi, desde sempre, um poderoso factor de alteração do meio. A primeira manifestação desse poder terá consistido na destruição de largas parcelas de floresta tropical (por exemplo, na China), através do domínio da prática do fogo, com vista a garantir áreas de pastagem”. O mesmo autor refere que “ao consolidar a sua característica gregária a ocupação humana acentuou a sua influência sobre a evolução das componentes geoambientais que, por sua vez, condiciona a qualidade de vida do Homem. E conclui que “em alguns casos o declínio das 1 Citado por Prieto, 2000 4 civilizações pode estar associado à degradação dessas mesmas condições ambientais” dando como exemplo, o actual Iraque, berço dos impérios sumérios e babilónios, “em cuja zona de influência se estende agora o deserto: no avanço do delta do Tigre e do Eufrates sobre o Golfo Pérsico está grande parte do solo fértil da Mesopotâmia” (Costa, 1992: 257). A capacidade de produzir impactes no ambiente é uma característica intrínseca da Humanidade desde os primórdios, e como tal reconhecida desde há séculos. Cotta (1866)2 afirmava: “acredito que a superfície actual da Terra, com todas as suas formas individuais, tem vindo a ser gradualmente desenvolvida numa relação recíproca entre o Homem e a Natureza”. De acordo com Costa o que é novo nessa relação é o carácter global das transformações e da velocidade que se lhes pode imprimir. De facto, a magnitude dos efeitos das actividades humanas no ambiente tem-se manifestado numa relação directamente proporcional ao crescimento económico. Tal como refere Campbell (1983) “Enquanto o número de seres humanos foi reduzido e baixa a densidade das populações, a humanidade adaptou-se aos ecossistemas existentes, quer do ponto de vista biológico quer de comportamento, sem gerar grandes alterações na estrutura do sistema”. E, continuando na linha de raciocínio daquele autor “actualmente, no entanto, devido ao presente nível de progresso tecnológico e ao enorme aumento demográfico a ele associado, as fronteiras entre os diversos sistemas perderam significado e, hoje em dia, a humanidade compartilha daquilo que é, na sua essência, um único ecossistema à escala mundial: a biosfera. A nossa sobrevivência como espécie depende da circunstância de reconhecermos tal facto” (Campbell, 1983:240). Não obstante a interdependência entre o Homem e a “ecologia inata”, os primeiros registos escritos sobre o estudo das relações entre os diferentes grupos de organismos e o meio reportam à Antiguidade; indicando Teofrasto como o primeiro ecólogo da História. Numa época em que o estudo da natureza e a subjacente preocupação com o ambiente eram palco para a generalidade das ciências, não admira que a ecologia estivesse associada a todas elas. 2 Citado por Costa (1992:257). 5 Como refere Prieto (2000), “Teofrasto, (372 a.C – 287 a.C) discípulo de Aristóteles, foi muitas vezes chamado “pai da botânica”, mas um estudo atento dos seus escritos revela que ele merece um outro título: “pai da ecologia”. Mais de metade dos escritos botânicos de Teofrasto ocupa-se de observações ecológicas (ver de Teofrasto a sua Metafísica e as Investigações sobre as Plantas). Não se trata de observações isoladas, mas de um ponto de vista sistemático. Teofrasto não estuda uma planta isoladamente, mas investiga qual a sua relação como organismo vivo com o brilho do sol e a exposição aos agentes naturais, o solo, o clima, a água, a cultura e as outras plantas e animais. Baseava as suas afirmações na observação. Reconhecia a diferença entre grandes zonas climáticas mas também estudava microclimas. Igualmente estava ciente da extrema importância da água para o crescimento das plantas em regiões áridas. Observava com particular interesse a resposta das plantas à domesticação. Algumas plantas, diz ele, não podem ser cultivadas, mas das que podem algumas adquirem uma muito diferente aparência devido ao solo e ao cultivo que recebem. Discute, portanto, alterações produzidas pela cultura. Finalmente dá notícia de certas alterações locais ao clima provocadas por actividades humanas. Reuniu, por exemplo, informações sobre as alterações de temperatura causadas na sua época pela drenagem dos pântanos, desvio do curso dos rios e desflorestação” (Prieto, 2000:39)3. Muitos outros se dedicaram ao estudo da ecologia, sobretudo na ciência grega. “Descobertas importantes foram feitas em Alexandria. Lá e noutras zonas do mundo helenístico, manuais botânicos foram escritos e ilustrados com desenhos. Infelizmente muitos dos escritos dos cientistas do Museu pereceram, mas o Museu de Alexandria representou um ponto culminante no estudo grego do mundo natural e estabeleceu uma ponte no tempo entre os filósofos gregos do século IV a.c. e o crescimento de Roma no domínio da bacia mediterrânica (Prieto, 2000). Do despertar da ecologia ao seu reconhecimento enquanto ciência, por volta de 1900, permanece o registo de muitas obras como reflexo do trabalho de inúmeros cientistas das mais diversas áreas e países. De entre todas as obras escritas, a “origem das espécies” de Charles Darwin, publicada em 1859, terá sido, como refere Campbell (1983) uma das obras mais importantes jamais escritas. 3 http://www2.dlc.ua.pt/classicos/novela.pdf (visitado em 11 de Junho 2007) 6 Já anteriormente a Darwin, T. R. Malthus, no seu livro “Ensaio sobre os Princípios da População”, publicado em 1798, demonstrava que o potencial de reprodução da humanidade excedia em muito os recursos naturais disponíveis para alimentar uma população em crescimento. De constatar, que este estudo patenteou um valor inquestionável, no âmbito da Ecologia Humana. Contudo, será com o raiar do século XX que a Ecologia inicia o seu percurso como ciência distinta da Biologia; ainda que relacionadas. Se dissecarmos os conteúdos das mais diversas ciências, ainda hoje se constata que a Ecologia, face ao seu objecto de estudo com intensa ligação às Ciências da Terra e da Vida, permanece com elas articulada como refere Melo (1993) “A Ecologia recorre à informação e apresenta interfaces com outros ramos das ciências da vida (biologia, bioquímica, genética), bem como com as diferentes especialidades taxonómicas (zoologia, botânica, microbiologia e suas subdivisões).” Todavia, a partir de que momento se começa a falar em Ecologia Humana? Tal como aconteceu com a Ecologia geral, a Ecologia Humana foi objecto de estudo, muito antes de se considerar como tal – não fosse o homem mais um organismo e um elemento da biosfera que vive num ecossistema próprio com interacções, entre os membros da mesma e outras espécies (de predação, parasitismo, comensalismo, simbiose, indiferença). Contudo, terá sido a Revolução Industrial e todas as alterações tecnológicas, sociais e demográficas que despoletou o motor de arranque para o reconhecimento da Ecologia Humana enquanto área de especialização. Muito embora tenha sido nos meados do século XX que este ramo da ecologia criou alicerces – ao que o pós 2ª Grande Guerra não foi alheio - não terá sido por acaso que, numa fase inicial, a Ecologia Humana surgiu associada à Escola de Chicago, ela própria fundamentada no cenário da sociedade americana: crescimento desordenado dos grandes centros urbanos, pobreza, condições de vida precárias, instabilidade, etc. É interessante verificar que à medida que as sociedades vivenciavam o êxodo rural, transferindo contingentes populacionais para as cidades em detrimento do campo – e como tal aprofundando a ruptura com a natureza – a Ecologia, enquanto ciência, 7 sempre atenta aos fenómenos decorrentes, sofre igualmente um transfere no seu objecto de estudo. A relação do homem com a natureza continua a ser um importante objecto de análise, mas o meio urbano fervilha de problemas que urge entender. Problemas estes que, com maiores ou menores mutações, não deixaram de aumentar, ao ritmo do crescimento urbano, da industrialização, do desenvolvimento tecnológico e posterior terciarização das sociedades. Com efeito, a complexidade das sociedades e dos enigmas dela emergentes, permitem-nos entender a Ecologia Humana como uma ferramenta essencial para melhor compreender/solucionar os impactes exercidos sobre a biosfera. Para trás ficam as ideias deterministas e positivistas: o Homem é parte integrante da Natureza e dependendo da situação (alternadamente, em simultâneo ou por reflexo), ambos – Homem/Natureza – influenciam-se, modificam-se e interagem. Porém, nesta dicotomia, reconhece-se que os comportamentos humanos foram maioritariamente de domínio e predação, induzindo alguns desequilíbrios neste grande ecossistema que é o planeta – a uma escala global. Para enfatizar o papel central do Homem na geologia e na ecologia, Crutzen e Stoermer (2000) propuseram o termo “antropocénico” para a corrente época geológica. Em apoio da sua tese referiram: “Para assinalar uma data mais específica para o início do Antropocénico, ainda que arbitrário, propomos a parte final do século XVIII, embora estejamos conscientes que propostas alternativas podem ser feitas (alguns podem incluir o Holocénico inteiro). Contudo, escolhemos esta data porque, durante os dois últimos séculos, os efeitos globais das actividades humanas se tornaram evidentes. Este é o período em que os dados colhidos dos testemunhos de gelo glaciar mostram o crescimento das concentrações atmosféricas de vários “gases com efeito de estufa”, em particular CO2 e CH4. Esta data de início também coincide com a invenção da máquina a vapor de James Watt, em 1784.” O termo Holocénico (literalmente “todo o recente”) para a época geológica pós-glaciar dos últimos 12 mil anos parece ter sido proposto inicialmente por Sir Charles Lyell em 1833, e adoptado pelo Congresso Geológico Internacional em Bolonha em 1885 8 (Encyclopaedia Britannica, 1976). Durante o Holocénico as actividades humanas cresceram gradualmente enquanto força transformadora da morfologia da Terra, como foi reconhecido desde muito cedo por vários cientistas. G. P. Marsh, em 1864, publicou o livro com o título “O Homem e a Natureza”, um século mais tarde reimpresso como “A Terra modificada pela acção do Homem” (Marsh, 1965). Stoppani, em 1873, classificou as actividades humanas como “uma nova força telúrica com o poder e a universalidade comparável às forças maiores da Terra”4. Vemadsky5 reconheceu o poder crescente do Homem como parte da biosfera interrogando-se sobre a direcção na qual os processos de evolução deverão seguir, nomeadamente rumo a uma consciência e um pensamento mais claros acerca da crescente influência sobre o meio que nos rodeia. Ele, juntamente com o jesuíta francês, Teilhard de Chardin e E. Le Roy (1924), criaram o termo “noosfera”, o mundo do pensamento, para marcar o papel crescente do poder do cérebro humano e os seus talentos tecnológicos na modelação do seu próprio futuro e do ambiente. Efectivamente, ao longo da história da humanidade e, por inerência da ecologia, muitas das adaptações operacionalizadas pelo Homem, sentidas como um acto de vitória – o poder do homem sobre a natureza – a diferentes escalas temporais, acabaram por mostrar que o ecossistema tem uma “palavra a dizer”, que convém ouvir. Como refere Campbell (1983) “Continuamos a confrontar-nos com os mesmos problemas que tiveram os nossos antepassados – problemas de sobrevivência. Em última análise, dependemos em absoluto da natureza, das plantas e dos animais junto dos quais vivemos. (…) a fome que ameaça um terço da população mundial mostra com nitidez como é extensa a nossa dívida para com a natureza e como são finitos os seus recursos. Pelo facto de o homem ser produto da hereditariedade e do meio ambiente, a ciência da ecologia (…) é a chave quer para o entendimento da evolução da humanidade quer para a compreensão da própria natureza humana”. Desde já, e não no futuro, indiscutivelmente, a conduta do Homem para com a Natureza terá que ser de mutualismo, simbiose e cooperação. 4 5 Citado por Clark (1986) 1926, reimpresso em 1998 9 Com efeito, a expansão da humanidade, em número e exploração per capita dos recursos naturais tem sido espantosa (Turner et al, 1990). Para dar alguns exemplos: nos últimos 3 séculos a população humana cresceu 10 vezes, ultrapassando os 6 biliões de seres no ano 2000, o que é acompanhado pelo crescimento da população de gado (cerca de 1 vaca por cada família, Crutzen e Greadel, 1986). A urbanização cresceu 10 vezes no passado século. Em poucas gerações a humanidade queimou literalmente os combustíveis fósseis gerados no decurso de centenas de milhões de anos. A libertação de CO2, globalmente cerca de 160 Tg/ano para a atmosfera devido à queima de carvão e petróleo é pelo menos tão grande como a soma das emissões naturais (Watson, et al., 1990). Segundo Vitousek et al. (1997) de 30 a 50% da superfície da Terra foi transformada por acção do Homem; mais azoto é fixado sinteticamente a partir da utilização de fertilizantes na agricultura que naturalmente nos ecossistemas terrestres; a libertação para a atmosfera de NOx a partir da queima de biomassa e de combustíveis fósseis é hoje superior às contribuições naturais dando origem à formação de ozono fotoquímico (conhecido por “smog”) em largas partes do globo. Mais de metade da água potável está a ser usada pelo Homem, e o que é pior, genericamente de uma forma lesiva. A actividade humana acelerou a taxa de extinção das espécies em milhares a dezenas de milhares de vezes nas florestas tropicais (Wilson, 1992). Neste contexto, as zonas húmidas costeiras são das mais seriamente afectadas pelo Homem, no que resultou já a perda de cerca de 50% dos mangais das áreas tropicais. A predação mecanizada da actividade pesqueira remove actualmente mais de 25% da produção primária dos oceanos nas regiões de “upwelling” e cerca de 35% das regiões da plataforma continental das zonas temperadas (Paul e Cristensen, 1995). Não se trata aqui de pôr em causa o desenvolvimento económico. Segundo Costa (2007) “É possível e desejável o desenvolvimento económico. Mas, de acordo com a Declaração de Tóquio (WCED, 1987), ele deverá ser um desenvolvimento sustentável, definido em termos simples como “uma forma de abordagem do progresso que vá ao encontro das necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações poderem dar resposta às suas”. Segundo esta perspectiva as actuais gerações poderão estar já a pagar os erros cometidos pelas anteriores. De facto, o 10 consumo desenfreado de recursos que resulta da não consideração integrada do binómio “desenvolvimento económico”/“conservação dos recursos” parece estar na base do desencadeamento dos grandes desequilíbrios ambientais da nossa era, com destaque para as alterações climáticas globais.” A nossa civilização, a primeira de contornos efectivamente planetários, atravessa uma crise global. Valores como o papel da ciência e da tecnologia, e instituições como o Estado-nação, são constantemente questionados (adaptado de Soromenho-Marques, 1998). O crescimento demográfico sem paralelo na história, a produção e consumo desenfreados, as alterações no modus vivendus da população dos países mais desenvolvidos e a reduzida ou inexistente proximidade/intimidade com a natureza, entre outros factores, conduziram a um desequilíbrio tal que a sustentabilidade está ameaçada. Mas, à medida que a fragilidade do planeta e os desequilíbrios ambientais atingem proporções demasiado evidentes, a preocupação com a tónica da conservação e da educação ambiental (como meio indissociável desta conservação), torna-se uma constante de uma franja social cada vez maior no mundo desenvolvido e os alertas chegam de diferentes formas e de diversas vias. Sistema social humano e ecossistema estão intimamente ligados –“Marten (2001) defende que, no âmbito da Ecologia Humana, um ecossistema abrange o próprio ambiente construído pelo homem, podendo também ser considerados ecossistemas uma aldeia, uma grande cidade ou o próprio planeta Terra”6 . Tendo em conta este contexto e a enorme pressão sobre a faixa costeira, o objectivo deste trabalho é contribuir para o estudo da Participação Pública, ao nível das decisões sobre o litoral e à luz do Desenvolvimento Sustentável. E porque a educação ambiental, foi o fio condutor da participação pública, a experiência do projecto Coastwatch ao longo de 18 anos, em prol da cidadania ambiental será o estudo de caso abordado nesta dissertação. 6 Citado por Briz, 2005 11 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública DA EMERGÊNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Neste primeiro capítulo serão abordadas as temáticas relacionadas com a educação ambiental, o desenvolvimento sustentável e a participação pública. O debruçar sobre cada um destes temas permitir-nos-á compreender o papel dos cidadãos face aos actuais problemas ambientais. Assim, o primeiro capítulo começa com um percurso pela educação ambiental em Portugal, na medida em que esta foi vital para que o cidadão visse o ambiente com um outro olhar. Embora a um ritmo lento, foi-se tomando consciência que era preciso alterar comportamentos para alcançar atitudes mais ambientais. “As investigações têm referido que a formação de atitudes é só um passo para a obtenção de comportamentos ambientalmente positivos” (Bickman et al, 1972)7. Seguidamente será desenvolvida uma abordagem histórica do Desenvolvimento Sustentável, com ênfase sobre os quatro pilares do Desenvolvimento Sustentável, complementares entre si – ambiental, económico, social e institucional. Por fim, cumprindo o tema da tese, será abordado a temática da participação pública e os contributos que esta pode ter em prol do Desenvolvimento Sustentável. 1.1 O PERCURSO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL Sobre os objectivos da Educação Ambiental pode ler-se no PNUA – Relatório do Director executivo, nº 1, 1978. “Uma educação cuja finalidade seja o desenvolvimento de uma população mundial consciente e se sinta afectada pelo ambiente e pelos problemas que lhe estão associados e que possua os conhecimentos, capacidades práticas, atitudes, motivações e compromissos necessários para trabalhar individual e colectivamente para a solução dos problemas existentes e prevenir outros novos”. Interessa, pois “espreitarmos” para o percurso da educação ambiental em Portugal. A participação de Portugal em eventos internacionais vocacionados para a temática do 7 Citado por Martins, 1996:3 12 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública ambiente, conservação da natureza e educação ambiental foi uma importante ajuda para um processo que dava os primeiros passos “Depois dos problemas ambientais se terem tornado uma preocupação internacional, no final dos anos sessenta, o debate em torno do tema intensificou-se” (Martins, 1996:1). A título de exemplo cite-se, em 1977, a Conferência de Tbilisi, onde o então Secretário de Estado do Ambiente apresentou um relatório sobre as iniciativas levadas a cabo por Portugal em termos de educação ambiental. “Esta conferência é tida como o evento mais importante até hoje realizado em todo o mundo em relação à educação ambiental” (Aleixo, 2002:41)8. No entanto, ao pesquisar nos anais da história percebe-se que a educação ambiental em Portugal há muito dava sinais de arranque. “João Evangelista (1992) no seu livro Razão e Porvir da Educação Ambiental refere, em memórias sobre o assunto, que existiram quatro etapas de educação ambiental, compreendendo toda uma dinâmica legislativa que, a partir de recomendações das Nações Unidas e das suas agências especializadas, deram corpo a um conjunto de acções promocionais por todo o país, nomeadamente nas escolas: Primeiros passos, o arranque, a expansão e o final de um ciclo” (Aleixo, 2002.49). Assim, na história da educação ambiental, o primeiro grande passo é indicado pelo autor como a inscrição das problemáticas ambientais no III Plano de Fomento Quinquenal (1968/73). Já em 1965 a ONU fazia referência oficial aos problemas ambientais; em 1967 reuniu-se a Conferência de Williamsburg da ONU sobre a crise mundial da educação, antecedendo o Maio de 68 em França9. Em 1968 a UNESCO faz um levantamento em 79 países sobre a inclusão do estudo do ambiente nos programas escolares. Pela sua pertinência este trabalho é considerado uma referência na educação ambiental. Portugal, pelo regime político vigente, nomeadamente ao nível da política ultramarina era muitas vezes contestado nos fóruns internacionais. “Como bom aluno estava atento ao que se passava lá fora neste campo, estudava as matérias, partilhava preocupações, fazia comunicações sobre a situação ambiental portuguesa” (Aleixo, 8 Conferência Intergovernamental sobre educação ambiental, organizada pela UNESCO, à qual assistiram mais de 300 especialistas vindos de 69 estados-membros. 9 Adaptado de Aleixo (2002:50) 13 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública 2002: 50). Vários acontecimentos comprovam o papel da educação ambiental em Portugal. A título de exemplo ficam os mais marcantes no período antes do 25 de Abril (Quadro I). Quadro I – Marcos no percurso da Educação Ambiental em Portugal (adaptado de Aleixo, 2002:51-61) 1969 - Portugal foi solicitado pela ONU para apresentar um relatório ambiental sobre o país. Tinha a finalidade de preparar a Conferência Mundial de Estocolmo agendada para 1972 sobre problemas do ambiente. No prazo de 48 horas foi elaborado um documento pela Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT) 1970 – Publicou-se a Lei Básica de Parques (Lei10/70), surgiram as portarias 29/70de 14 de Janeiro e 307/71 de 17 de Junho para defesa e protecção de ecossistemas ricos e únicos na flora e fauna. Inaugura-se o Parque nacional da Peneda-Gerês. 10 1971 – Foi criada a Comissão Nacional de Ambiente (CNA) na JNICT , cujo objectivo era intensificar e coordenar as actividades do país, directa ou indirectamente relacionadas com a preservação e melhoria do ambiente, a conservação da natureza e a protecção da valorização dos recursos naturais. “Com a institucionalização do CNA entra-se numa fase a que chamaremos de Arranque da Educação 11 Ambiental” . 1972 – Realiza-se a Conferência de Estocolmo. Portugal constava na lista dos 113 países participantes. Esta é considerada a primeira grande referência para a educação ambiental. “A partir destes contactos internacionais e pela comunhão de novos princípios ecológicos a CNA passa a preocupar-se mais com a questão da Educação Ambiental em Portugal” 1973 – Em Portugal a CNA celebra o Dia Mundial do Ambiente. O momento ficará para a história. Registam-se alguns acontecimentos que servirão de marco para a Educação Ambiental: Lançamento na RTP da série “Há só uma Terra”; edição do livro “O Mundo é a Nossa Casa”; edição traduzida “dos Limites do Crescimento”. Paralelamente realiza-se a sessão solene sobre o tema, na Gulbenkian; desenvolve-se debates e criam-se exposições principalmente nas escolas, que aderiram com entusiasmo à iniciativa. Ainda neste ano dá-se a reforma do ensino “Veiga Simão” 1974 – A 15 de Maio é criado o Ministério de Equipamento Social e do Ambiente. Agrega a CNA que deixa de fazer parte da JNICT. A este momento João Evangelista chamou Expansão da Educação Ambiental. Por reflexo da euforia política pós revolução 25 de Abril, ou por outras questões sociais, aliando, ainda, as notícias sobre o impacte do Homem na natureza e consequente extinção de muitas espécies, a década de 80 foi uma época relevante para a emergência do trabalho voluntário em prol do ambiente. Sem dúvida que a mediatização do ambiente funcionou, tal como hoje, como um considerável influenciador de massas. “O tema do ambiente, depois de marginal e minoritário, foi ganhando, no decurso dos últimos 30 anos, um amplo e múltiplo direito de cidade. Das preocupações quotidianas e de longo prazo do cidadão comum, à linguagem do discurso institucional (…) a multifacetada realidade da tomada de consciência colectiva acerca da crise ambiental, já não se confunde com o tom de profetismo visionário e apocalíptico com que eram malevolamente contemplados, pelos seus detractores dos 10 11 Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica Evangelista, 1992:32, citado por Aleixo, 2002:51 14 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública anos 60 e 70, os pioneiros da reflexão e intervenção ecologista e ambientalista” (Soromenho-Marques, 1998). A publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo, em 1986, veio institucionalizar a educação ambiental muito embora, já anteriormente, no ensino primário, “o Meio Físico e Social” tivesse introduzido os temas ambientais no currículo, conferindo ao educador ou professor uma grande responsabilidade. “O professor deve actuar de modo que os problemas do ambiente sejam abordados e tratados de tal maneira que os alunos, ou os receptores de informação, sejam capazes, por eles próprios, de elaborar novos conceitos e novos valores, segundo o método heurístico” (Fernandes, 1983). Todavia, a introdução do ambiente nos «currícula» – por falta de formação, motivação ou recursos – nem sempre foi sinónimo de uma verdadeira educação, muitas vezes cingiu-se a uma mera visita de estudo ou actividade com uma total ausência de reflexão sobre a realidade observada e os comportamentos a seguir. Segundo Wals12,”Não se trata de remediar tal ou tal atitude dizendo aos alunos, ou a quem ela se dirige, o que eles devem pensar ou fornecendo-lhes os juízos de valor já prontos; bem pelo contrário, trata-se de ensiná-los a reflectir por si próprios”. Com o intuito de fazer justiça a todos os que, ao longo da história recente, tanto se esforçaram para trabalhar em prol da educação ambiental, louva-se os inúmeros projectos que foram sendo desenvolvidas por Escolas – muitas vezes apenas por um professor que remou contra a maré – associações diversas, entidades com sensibilidade para a temática, entre outros. E, apesar de algumas falhas, a realidade comprova que a institucionalização da educação ambiental, foi um valioso passo em prol do ambiente. A história da educação ambiental adquire uma “lufada de ar fresco” com a implementação do Ano Europeu do Ambiente, que, de entre outras coisas, permitiu a organização do I Seminário de Formação de Professores em Educação Ambiental, iniciativa conjunta entre o Ministério do Ambiente e da Educação. Com oscilações diversas, existe até hoje um protocolo entre estas duas entidades que permite a 12 Citado por Fernandes (1983) 15 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública requisição de professores para coordenarem projectos de educação ambiental, entre eles o Projecto Coastwatch Europe. A educação ambiental entra na década de 90 já ligada à investigação e às Universidades, facto sem dúvida relevante, consolidado pela “popularização” dos cursos de Engenharia do Ambiente em diferentes Universidades do país. A escola teve, efectivamente, um papel preponderante em todo o percurso da educação ambiental. As acções que decorreram num contexto escolar foram e continuam a ser muitas e diversas. Poder-se-á questionar se algumas destas acções foram ou não eficazes, se se integraram plenamente na educação formal, se foram ou não uma mais valia para o sistema educativo, se existe consonância entre o que se aprende/ensina e o que se pratica. Aleixo (2002) questiona: “O sistema educativo ao produzir tantos e tão importantes diplomas para se adequar à complexidade dos tempos presentes, estará de facto a desenvolver competências e a tornar as pessoas mais autónomas e preparadas para lidar com o tempo futuro que se advinha complexo?”13. Com efeito muitas questões poderão ser colocadas, nem todas obterão resposta satisfatória, porque se tal acontecesse a realidade educativa, ambiental, cultural e social do país seria diferente. A trajectória da educação ambiental tem ainda um longo caminho a percorrer, só que mudar mentalidades, por vezes, não é compatível com uma ou duas décadas de investimento, sobretudo quando o processo nem sempre foi bem alicerçado. Contudo, “chegamos a uma etapa da educação ambiental, que se caracteriza já não tanto pela informação com sentido de protecção ambiental, mas sim pela auto formação através de práticas cooperativas com intervenção directa nos problemas, favorecendo a autonomia e ao mesmo tempo a abertura aos outros solidariamente” (Aleixo, 2002:62). Actualmente a escola encontra-se em processo de reestruturação, mas as questões relacionadas com a educação ambiental e com a participação pública fazem já parte da realidade escolar quer seja nas áreas curriculares ou não curriculares. Isso mesmo é 13 (Aleixo, 2002:62) 16 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública comprovado pela adesão aos diferentes projectos que são dinamizados pelos docentes. Estamos pois a caminho de algo mais abrangente, algo em que a Educação ambiental é apenas uma vertente: O Desenvolvimento Sustentável. 1.2 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – UMA ABORDAGEM HISTÓRICA “Em meados do século XX vimos o nosso planeta, pela primeira vez, a partir do espaço. Os historiadores talvez considerem que esta visão teve um maior impacte no pensamento, que a revolução de Copérnico, no século XVI, que alterou a imagem que o Homem tinha de si próprio, ao revelar que a Terra não é o centro do Universo. A partir do espaço, vê-se uma bola pequena e frágil envolvida não pela actividade e construções humanas, mas sim por um tecido de nuvens, oceanos, zonas verdes e solos. A falta de capacidade do Homem para adaptar as suas acções àquele tecido está a causar alterações fundamentais nos sistemas planetários. Muitas destas alterações são acompanhadas por riscos que ameaçam a vida. Esta nova realidade, à qual não se pode fugir, tem de ser reconhecida – e gerida” (in “O Nosso Futuro Comum”14. Enquanto a população aumenta de ano para ano, a quantidade de recursos com que a sustentar mantém-se finita. É esta dualidade que torna a sociedade cada vez mais frágil. O progresso tecnológico possibilita uma produção megalómana, cuja aliança com a poderosa arma de marketing permite um consumo desrespeitador, por parte de uma população ávida do consumo. Aliás, psicológica e socialmente, à medida que a ciência e tecnologia avançam – o que facilita melhores níveis de vida e bem-estar dos cidadãos – a necessidade de consumir é manifestamente crescente. “A qualidade e o tempo perderam importância. Consomem-se bens e serviços não porque eles sejam necessários às pessoas ou por contribuírem para a sua felicidade, mas porque existe uma gigantesca máquina de propaganda que pressiona o consumo como forma de alimentar artificialmente o crescimento económico” (Melo et al, 1993). 14 Gabinete de Estudos e Planeamento da Administração do Território – Ministério do Planeamento e da Administração Interna (1987:15) 17 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública De facto, a satisfação dos mais altos padrões de vida gera tensões ambientais que se têm agravado, em parte pela ausência de politicas visionárias e de determinação para implementar medidas. Há muito que se provou que a economia e a ecologia estão cada vez mais envolvidas na mesma teia, todavia, ainda se teima em separá-las, nalguns casos até colocá-las em posições diametralmente opostas: viver numa óptica ecológica parece ser antagónico de viver numa óptica económica. Por ironia ou não, a parte do mundo mais pobre que nem sequer sonha com as possibilidades (in)finitas que a produção permite consumir, também recebe o seu valor acrescentado para pagar. E salda uma dívida, que não tem, de duas formas. Por um lado a pobreza, ela própria, também degrada o ambiente, criando tensões ecológicas de outra índole, porque para sobreviverem, “os mal nutridos” – ou os simplesmente pobres – destroem o ambiente que os rodeia: florestas e pastagens dizimadas, uso incorrecto de terrenos acabando por os conduzir ao seu empobrecimento total, entre outros factores – para não falar daqueles que fugindo da penúria contribuem para uma miséria maior nos grandes centros urbanos, ao encetarem colossais êxodos rurais. Mas para além desta vertente, os mais pobres pagam, ainda, porque os mais ricos, usam e abusam dos seus recursos naturais, esgotam-lhe os solos em plantações para exportação – amputando-lhe as fracas hipóteses de uma agricultura de subsistência –; extraem-lhe os minérios e combustíveis fósseis de forma não sustentada. Por outro lado, à medida que os problemas ambientais se agravam, os ecossistemas adoecem; a perda de biodiversidade é real e não deixa margem para dúvidas. Em 1998 a União Europeia adoptou a estratégia para a Biodiversidade. “Desde então a taxa de perda de biodiversidade, longe de diminuir, ou mesmo estabilizar, não parou de crescer, na razão directa da intensificação das pressões que sobre ela se exercem de forma cada vez mais intolerável” (Costa 2006:1). Todos queremos o desenvolvimento económico mas ele conduz à expansão urbana e industrial, infra-estruturas de transporte, energia e outras. E, nada disto se faz sem o reverso da medalha: desflorestação, incêndios, erosão e consequente desertificação. 18 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Desta forma temos todos a nossa quota de responsabilidade no declínio da biodiversidade. Já em 1995, o Relatório Dobris alertava para o facto de muitas regiões da Europa estarem a perder biodiversidade como consequência do uso intensivo do solo, através de práticas agrícolas e silvícolas incorrectas, de uma fragmentação crescente dos habitats naturais em resultado de infra-estruturas e urbanizações e da exposição ao turismo de massas e à poluição da água e do ar. Porém, a perda de biodiversidade é apenas umas das pontas do iceberg que demonstra a fragilidade ambiental do planeta. A uma escala mais próxima, cada sociedade tem a responsabilidade de zelar por si, tendo sempre bem patente a sustentabilidade das gerações futuras. E esta premissa atinge uma complexidade tal que se torna difícil, nalguns casos, impossível de cumprir. Assim, não é de estranhar que o tema do desenvolvimento sustentável esteja na ordem do dia. Este foi colocado na agenda política mundial pela Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento (CNUAD), realizada no Rio de Janeiro em 1992 e reafirmado-se o conceito - definido como o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a capacidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades - lançado em 1987 pelo Relatório Brundtland "O Nosso Futuro Comum". Não obstante toda a importância da Conferência do Rio para a temática ambiental e de Desenvolvimento Sustentável, há que considerar outros momentos em que o conceito já se esboçava. • Período «Pré-Estocolmo» “Relativamente aos aspectos percursores do conceito de desenvolvimento sustentável, Mebraut (1998) refere um primeiro período histórico “Pré-Estocolmo”, que abrange o período antecedente da conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972. (…)Mebraut considera também como percursor do conceito, o contributo de Malthus que nos finais do século XVIII, indica a escassez de recursos como factor limitante do crescimento, perante a evidência de problemas como o desemprego, a pobreza e doenças associadas à revolução industrial” (Briz, 2003:7). 19 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública De entre alguns marcos deste período destacam-se, a Conservação das espécies com a criação do 1º parque natural criado em Yellowstone, EUA, no final do séc. XIX; a comemoração, pela primeira vez, do dia da Terra em 1970; o lançamento o programa MaB – (Man and the Biosphere)15 pela UNESCO, em 1971, tendo como principal objectivo promover o conhecimento, a prática e os valores humanos para implementar boas relações entre as populações e o meio ambiente em todo o planeta. Já em 1972 “O relatório Meadows - Limites do crescimento - apresentado ao Clube de Roma16, revelava um conjunto de preocupações, sobretudo relacionadas com o esgotamento dos recursos, face aos elevados níveis de consumo que então se verificavam”(Carvalho, 2003:16). “Assim, quanto mais rapidamente se investisse na alteração destas tendências, maiores seriam as probabilidades de criar condições de estabilidade ecológica e económica, numa perspectiva de muito longo prazo” (Meadows et al., 1972:32)17. • Conferência de Estocolmo Em 1972 realiza-se aquela que é considerada a primeira grande referência para o Desenvolvimento Sustentável: a Conferência de Estocolmo18. Segundo Carvalho (2003) “O facto mais relevante da década é a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, onde se discute pela primeira vez, o futuro do mundo, e se traz para a discussão pública o problema da degradação do ambiente, a qual coloca em risco esse mesmo futuro” (2003:16). 15 Criado como resultado da "Conferência sobre a Biosfera" realizada pela UNESCO em Paris em Setembro de 1968 16 “O Clube de Roma é uma ONG constituída por cientistas, economistas, empresários, altos funcionários públicos internacionais, chefes de Estado e ex-chefes de Estado, que partilham as suas diversas experiências no sentido de obterem um entendimento aprofundado das questões mundiais. Estabelecendo a sua missão como catalizador global da mudança, o Clube de Roma pretende contribuir para a resolução de problemas de natureza política, social, económica, tecnológica, ambiental, psicológica e cultural. O primeiro relatório publicado “The Limits to Growth”, obteve 12 milhões de exemplares vendidos em 27 línguas, tendo-lhe sucedido outras publicações sobre diferentes temáticas, como a educação, a energia e o impacte da micro-electrónica na sociedade” (Briz, 2005:7). Mais informações sobre o clube de Roma em www.clubofrome.org (visitado em 19 de Outubro de 2007) 17 Citado por Briz (2005:8) 18 Participaram 113 países entre os quais Portugal. A partir de contactos internacionais encetados e pela comunhão de novos princípios ecológicos a Comissão Nacional de Ambiente (CNA) passa a preocuparse mais com a questão da Educação Ambiental em Portugal 20 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública A Conferência de Estocolmo inicia-se com a ideia que parar o crescimento seria um erro mas também com o “peso” do relatório “Limites do crescimento” e com tudo o que estava inerente à dicotomia Norte-Sul e às assimetrias Leste-Oeste. Destas ideias compartilham alguns autores. Segundo Biswas &Biswas, 198219 “ Na Conferência havia um sentimento generalizado por parte de muitos países de que a protecção do ambiente podia dificultar o seu processo de desenvolvimento”. Para Cans, (1992:13)20 “Quando os políticos se reuniram para alertar contra o crescimento desenfreado encolheram-se os ombros: pôr fim ao crescimento? Era o mesmo que pedir a paragem do progresso! Quebrar o ímpeto do desenvolvimento económico? Era pior que um erro – um crime!”. E de acordo com Soromenho-Marques (1998) “As questões ambientais estão sobre-determinadas pela clivagem Norte-Sul. Esta característica, que continua a impedir a existência de uma concepção consensual de ambiente, capaz de prefaciar uma real actuação comum entre uma maioria significativa de Estados de diversos continentes já patente na Conferência de Estocolmo, sendo alias mais forte que a fissura ideológica da Guerra Fria” (1998:181). Com efeito, os países do Norte mostraram-se preocupados com a deterioração do ambiente e o rápido esgotamento dos recursos do planeta, reconhecendo que a divisão do mundo em ricos e pobres, tem uma elevada cota de responsabilidade; por seu lado os países do sul consideraram que o principal problema era o desenvolvimento da sua economia e que os problemas ambientais eram apenas preocupações e responsabilidade dos países ricos. Desta declaração consta ainda a proclamação do dia 5 de Junho de cada ano como o Dia Mundial do Ambiente, e é criado o PNUA21, que dotará a comunidade internacional de conhecimentos ambientais, através do desenvolvimento e disseminação de ferramentas apropriadas e instrumentos políticos. De entre a lista de princípios que saiu desta declaração citam-se dois em que o Desenvolvimento Sustentável está mais patente: “ (...) Cabe o homem o dever solene de proteger e melhorar o ambiente para 19 Citado por Martins (1996:43) Citado por Martins (1996:43) 21 PNUA - Programa das Nações Unidas para o Ambiente 20 21 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública as gerações actuais e vindouras. (...)” e “Os recursos naturais do Globo (...) devem ser salvaguardados no interesse das gerações presentes e futuras (...)”. No ano de 1980, destaca-se a Estratégia Mundial da Conservação, UICN. “O desenvolvimento e a conservação são igualmente necessários para a nossa sobrevivência e para assegurarmos as nossas responsabilidades como garantes dos recursos naturais das gerações futuras. A Estratégia Mundial da Conservação identificou três grandes objectivos para desenvolvimento sustentável: Manutenção dos processos ecológicos essenciais e dos sistemas de suporte de vida, a Prevenção da diversidade genética e a Utilização sustentável das espécies e dos ecossistemas” (Partidário, 2003).22 • Comissão Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento (WCED) A constituição da Comissão Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento (WCED) pela ONU, da qual viria a ser publicado, em 1987, o Relatório “O Nosso Futuro Comum” também conhecido por relatório Brunddtland, assume grande relevância para o desenvolvimento sustentável. “Este relatório viria a ter uma grande importância ao identificar os principais problemas ambientais que ameaçam e entravam o desenvolvimento de muitos países do Sul, e propondo um compromisso entre ecologia e economia, assente no conceito de desenvolvimento sustentável, ou seja conciliar a intervenção tecnológica com a capacidade ecossistémica do planeta de suportar essa intervenção. Em suma conciliar ambiente e desenvolvimento” (Carvalho, 2003:17). Apesar de ser criticado pelos seus pressupostos irrealistas, o principal impacte do relatório Brandtland tem sido a capacidade de estimular novos planos de protecção do ambiente tanto a nível nacional como internacional (Martins, 1996:45). 22 In: Aulas de Políticas de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – evolução histórica e situação internacional. 22 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública • A Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento (CNUAD) A Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento (CNUAD) – também conhecida por Conferência do Rio, realizou-se no Rio de Janeiro em 1992. “A Cimeira da Terra, foi a Cimeira dos bons propósitos: as convenções sobre as mudanças climáticas, a diversidade biológica, o combate à desertificação; os 27 princípios sobre o Desenvolvimento Sustentável, conhecidos como a declaração do Rio; a Agenda 21” (Santos, 2002)23. Desta Conferência ressalta-se a elaboração de dois documentos com a maior importância para o Desenvolvimento Sustentável: a Agenda 21 e a Declaração do Rio; ambos constituem um importante compromisso político. Ainda hoje estes documentos servem de linha orientadora dos trabalhos que têm vindo a ser realizados, quer a nível internacional quer no âmbito das políticas domésticas dos países considerados individualmente. Em relação à Agenda 21 pode afirmar-se que foi um importante instrumento na área do ambiente, servindo como referência em termos de gestão ambiental na maioria das regiões do mundo. Ao focalizar a implementação do desenvolvimento sustentável, tem sido uma referência muito importante de apoio à decisão, relacionando aspectos ambientais, sociais e económicos. A declaração do Rio é composta por 27 Princípios com vista a garantir a manutenção do equilíbrio ecológico do planeta e do desenvolvimento sustentável. De realçar os princípios de Declaração do Rio que coincidem com os princípios fundamentais do Direito do Ambiente, internacional e nacional, de acordo com Canotilho (1998) – princípios 4,10,15 e 16 - e com Magno (2001) – princípios 10, 15, 16, 17, 18 e 19 24 (Quadro II). 23 24 http://www.ces.fe.uc.pt/opiniao/bss/057en.php (visitado em 19 de Outubro 2007) Citado por Briz (2005:14) 23 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Quadro II – Alguns Princípios do Direito do Ambiente25 Princípio 4 – Para alcançar o desenvolvimento sustentável, a protecção ambiental deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada separadamente Princípio 10 - A melhor forma de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, de todos os cidadãos interessados ao nível conveniente. Ao nível nacional, cada pessoa terá acesso adequado às informações relativas ao ambiente detidas pelas autoridades, inclusive informações sobre produtos e actividades perigosas nas suas comunidades e a oportunidade de participar em processos de tomada de decisão. Os Estados deverão facilitar e incentivar a sensibilização e participação do público, disponibilizando amplamente as informações. O acesso efectivo aos processos judiciais e administrativos, incluindo os de recuperação e de reparação, deve ser garantido. Princípio 15 – Para que o ambiente seja protegido serão aplicado pelos Estados, de acordo com as suas capacidades, medidas preventivas. Onde existam ameaças e riscos sérios ou irreversíveis não será utilizada a falta de certeza científica total como razão para o adiamento de medidas custo-eficazes para evitar a degradação ambiental. Princípio 16 - As autoridades nacionais deverão esforçar-se por promover a internacionalização dos custos ambientais e a utilização de instrumentos económicos, tendo em conta o principio de que o poluidor deverá, em princípio, suportar o custo da poluição, com o devido respeito pelo interesse público e sem distorcer o comércio e investimento. Princípio 17 - Deverá ser empreendida a avaliação do impacte ambiental, enquanto instrumento nacional, de certas actividades susceptíveis de terem impacte significativo adverso no ambiente e que estejam sujeitas a uma decisão por parte de uma autoridade nacional competente. Princípio 18 - Os Estados deverão notificar imediatamente os outros Estados de quaisquer desastres naturais ou outras emergências que possam produzir efeitos súbitos nocivos no ambiente desses Estados. Deverão ser envidados todos os esforços pela comunidade internacional para ajudar os Estados afectados por tais efeitos. Princípio 19 - Os Estados deverão notificar, prévia e atempadamente, os Estados potencialmente afectados, e fornecer-lhes todas as informações pertinentes sobre as actividades que possam ter um efeito transfronteiriço adverso significativo sobre o ambiente, e deverão estabelecer consultas atempadamente e de boa fé com esses Estados. Fonte: Adaptado de Briz, (2005:12) • Declaração do Milénio Em Setembro de 2000, a Declaração do Milénio, organizada pelas Nações Unidas, não só reforça a importância de resolver as questões ambientais como acentua a tónica na erradicação da pobreza, uma outra vertente do Desenvolvimento Sustentável. A assinatura desta declaração foi uma esperança para muitos dos que tentam combater a pobreza extrema, auxiliando as suas vítimas. “A declaração apresenta uma visão arrojada firmada num compromisso partilhado com relação aos direitos humanos universais e à justiça social, e apoiada por metas com prazos bem definidos. Essas metas incluem a redução da pobreza extrema para metade, diminuição da mortalidade de crianças, provisão de educação para todas as crianças do mundo, redução das doenças Infecciosas e a promoção de uma nova parceria mundial para produzir resultados”26 (Quadro III). 25 26 Declaração do Rio Sobre Ambiente e Desenvolvimento Relatório Desenvolvimento Humano (PNUAD), 2005:1 24 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Quadro III – Objectivos de Desenvolvimento do Milénio da ONU 1. Erradicação da pobreza e fome extremas • • 2. Alcançar a educação primária universal 3. Promover a igualdade entre os sexos e delegar poderes nas mulheres 4. Reduzir a mortalidade infantil 5. Melhorar a saúde maternal 6. Combater o VIH/SIDA, a malária e outras doenças • • Reduzir para metade a proporção da população que vive com um rendimento inferior a um dólar diário; Reduzir para metade a proporção da população que sofre de fome Garantir que todas as crianças, raparigas e rapazes, completem a escolaridade primária Eliminar as disparidades entre sexos na educação primária e secundária de preferência até 2005 e a todos os níveis até 2015 Reduzir em dois terços a taxa de mortalidade entre as crianças com menos de cinco anos • Reduzir em três quartos o rácio de mortalidade maternal • Parar e iniciar a inversão do alastramento do VIH/SIDA • Parar e iniciar a inversão da incidência da malária e de outras grandes doenças 7. Garantir a • Integrar os princípios de desenvolvimento sustentável nas políticas e sustentabilidade ambiental programas nacionais; inverter a perda de recursos ambientais • Reduzir para metade a proporção da população sem acesso sustentável à água potável • Alcançar, até 2020, uma melhoria significativa nas vidas de pelo menos 100 milhões de moradores de bairros degradados 8. Desenvolver uma parceria • Aprofundar o desenvolvimento de um sistema comercial e financeiro baseado global para o em regras, previsível e não-discriminatório. Inclusão de um compromisso com desenvolvimento a boa governação, desenvolvimento e redução da pobreza – a nível nacional e internacional • Abordar as necessidades especiais dos países menos desenvolvidos. Isto inclui uma política de acesso isenta de taxas e quotas para as suas exportações; o aumento do alívio da dívida para os países pobres altamente endividados; o cancelamento das dívidas bilaterais oficiais; maior ajuda pública ao desenvolvimento para os países que estão empenhados na redução da pobreza • Abordar as necessidades especiais dos pequenos Estados insulares em desenvolvimento e dos Estados sem acesso ao mar • Lidar de forma abrangente com os problemas da dívida dos países em desenvolvimento através de medidas nacionais e internacionais concebidas para tornar as suas dívidas sustentáveis a longo prazo • Em cooperação com os países em desenvolvimento, criar emprego decente e produtivo para os jovens • Em cooperação com a indústria farmacêutica, disponibilizar medicamentos financeiramente acessíveis nos países em desenvolvimentos • Em cooperação com o sector privado, tornar disponíveis os benefícios das novas tecnologias - especialmente tecnologias da informação Fonte: Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável 2005-2015 (2005:17) • A Declaração do Milénio, para além de levantar a questão da pobreza, procurou assentar metas concretas que implicassem a inversão da tendência da degradação do ambiente e para a insustentabilidade das condições de vida de uma grande parte do planeta. • A Cimeira Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável A Cimeira Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável, realizada em Joanesburgo de 26 de Agosto a 4 de Setembro de 2002 foi outro marco para o Desenvolvimento Sustentável. As esperanças eram muitas por parte dos ambientalistas relativamente aos resultados que iriam sair da Convenção de Joanesburgo. Contudo a opinião geral foi de que os resultados foram pouco ambiciosos. “ A Cimeira de Joanesburgo deixou 25 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública em aberto não apenas a realização do Plano de Implementação, como também o desafio de implementar a nível mundial estratégias nacionais para o desenvolvimento sustentável na década – 2005/2015 - que as Nações Unidas vão dedicar a esse tema decisivo” (Mota et al, 2005:16). No entanto, os documentos redigidos no âmbito desta Convenção ficaram muito aquém do esperado. Segundo Vieira (2002a:1) “Ao falhanço completo na resolução da maioria dos problemas humanos e ecológicos que se verificou nas últimas décadas acresce agora a falta de vontade política para inverter a degradação do Planeta”27. Para Santos (2002)28 “O fracasso da Cimeira de Joanesburgo foi um fracasso anunciado. Depois do colapso das reuniões preparatórias não havia muito a esperar. (…) Esperava-se que a Cimeira de Joanesburgo fosse a Cimeira dos compromissos vinculativos, dos objectivos concretos e dos prazos definidos. Em vez disso, a Cimeira foi dominada pela aversão a prazos e objectivos e pela preferência por compromissos voluntariamente assumidos. A Conferência do Rio tinha defendido um conceito amplo de Desenvolvimento Sustentável que não só punha em causa o modelo de desenvolvimento económico em curso – na medida em que este não garante a renovação dos recursos –, como também punha limites ao mercado enquanto critério de acção social e decisão política. A prova disto mesmo foi o facto de a Cimeira ter sido dominada pelos Estados e pela sociedade civil sob a forma de organizações não governamentais. Neste domínio, a Cimeira de Joanesburgo não só não avançou como significou um retrocesso”. Apesar de alguns aspectos positivos, tais como o Anúncio do Canadá e da China da ratificação do protocolo de Quioto; da redução para metade, até 2015, da percentagem de pessoas em condições de pobreza extrema; do número de pessoas sem acesso a água potável – reafirmação dos objectivos e metas do Desenvolvimento do Milénio –, “Os discursos inflamados dos líderes mundiais na Cimeira de Joanesburgo acabaram por ficar reduzidos a compromissos vagos e frágeis. No final, uma declaração política, 27 28 Citado por Briz (2005:17) http://www.ces.fe.uc.pt/opiniao/bss/057en.php (visitado 19 de Outubro 2007) 26 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública um plano de acção, várias parcerias e a frustração pela ausência de metas” (Público, 5 de Setembro 2002)29. 1.3 AS DIMENSÕES DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Quando, em 1987, o relatório Brundtland, definiu o conceito de desenvolvimento sustentável, pretendia alertar para a urgência em interligar a política económica com os programas de ambiente, de forma a não comprometer o futuro das novas gerações. “Para que isso seja atingindo, são requeridas grandes mudanças no comportamento dos indivíduos, da indústria e dos governos. (Martins, 1996:45). Desde que o conceito de Desenvolvimento Sustentável foi publicado, tem havido uma difusão, não apenas do conceito em si como das diferentes dimensões que o compõem. O desenvolvimento sustentável assentava inicialmente em duas dimensões fundamentais: o desenvolvimento económico e a protecção do ambiente. Porém, “após a Cimeira Social de Copenhaga, realizada em 1995, foi integrada a vertente social como terceiro pilar do conceito de desenvolvimento sustentável. Assim, embora actualmente o desenvolvimento sustentável mantenha o mesmo desígnio global, a sua implementação é realizada com base em três dimensões essenciais: o desenvolvimento económico, a coesão social e a protecção do ambiente” (ENDS, 2005:10) (Fig. 1). Dimensão Económica (eficiência, crescimento, estabilidade) Desenvolvimento Sustentável Dimensão Social (equidade) Dimensão Ambiental (reproduzibilidade dos recursos) Figura 1 – Dimensões do Desenvolvimento Sustentável 30 Fonte: Melo, et al, 2001:218) 29 30 http://dossiers.publico.pt/dossier.aspx?idCanal=979 (visitado em 19 de Outubro de 2007) Citado por Aleixo, 2002:33 27 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública • Dimensão ambiental Em termos ambientais, a sustentabilidade requer, não apenas alterações nos padrões de produção e consumo, como também limites ao crescimento populacional pois só assim se conseguirá garantir o pressuposto no conceito de desenvolvimento sustentável. Com efeito como gerir recursos ambientais sabendo que os aspectos socio-económicos da sociedade estão muito aquém de estarem resolvidos? Em sociedades mais desenvolvidas, em que a satisfação do bem-estar e qualidade de vida está assegurada, as questões ambientais assumem um papel imprescindível e, regra geral, já não aparecem dissociadas dos restantes domínios. Todavia, falar e resolver questões ambientais em sociedades onde impera a fome, a pobreza e a guerra é algo praticamente inconcebível. • Dimensão económica Na dimensão económica é evidenciado o saber usar os recursos ambientais de modo eficiente e fazê-lo de modo estável considerando o desenvolvimento como um processo de longo prazo, contudo, tal não é tarefa fácil. Segundo Martins (1996) “A vitalidade económica de uma sociedade depende da sua capacidade para dispor de excedentes que possa trocar pelos bens que necessita. Esses excedentes podem derivar da produtividade, tecnologia ou saber, mas caso derivem dos seus recursos naturais a capacidade de renovação dos mesmos deve ser a primeira consideração a ter em conta para se manter o desenvolvimento sustentável” Sem dúvida que os países mais ricos estão mais sensibilizados para o problema da sustentabilidade, porém, são também os que têm uma economia mais forte. E, esta forte economia dá-lhes uma segurança que lhes permite enveredar por “uma qualificação dos consumos e desmaterialização das produções de maior eficiência produtiva, resultando algumas poupanças de energia e de matérias-primas e maior requalificação ambiental” (Aleixo, 2002:34). Contrariamente, os países do Sul – os mais pobres – ainda em fase de satisfação das suas necessidades básicas, preocupam-se exclusivamente com a sua sobrevivência e aqui as questões ambientais perdem peso. Perante objectivos antagónicos há que haver esforços e cedências de ambas as partes. 28 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública De acordo com Soromenho-Marques a questão dos custos económicos é um factor decisivo para facilitar ou dificultar acordos. “O modo como o Estado e outros actores ambientais antecipam o impacte de medidas de protecção ambiental sobre as suas economias e sobre as suas perspectivas de desenvolvimento pode conduzir a alianças muito mais complexas do que a simples oposição Norte-Sul poderia fazer prever” (1998:192). A título de exemplo cite-se o lento e problemático processo que mediou entre a assinatura da Convenção-quadro sobre as Alterações climáticas (1992) e o protocolo de Quioto (1997), cujo objectivo era a redução efectiva de emissões de gases causadores do efeito de estufa. Confirma-se assim que a dimensão económica do Desenvolvimento Sustentável é bastante complexa não apenas entre países ricos e pobres como no seio do grupo de países mais ricos. Efectivamente, eficiência, crescimento e estabilidade são essenciais, porém, a equidade intrageracional e intergeracional, objectivos da economia ecológica, são difíceis de alcançar e, manter o equilíbrio e a sustentabilidade vai gerar ainda muitas discussões cimeiras e acordos. • Dimensão Social A Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Social, conhecida pela Cimeira de Copenhaga, realizou-se em 1995. Vem introduzir a tónica da dimensão social ao Desenvolvimento Sustentável. De entre os objectivos destacam-se: Erradicação da pobreza absoluta, apoio ao pleno emprego como um objectivo político básico; promoção da integração social baseada no reforço e na protecção de todos os direitos humanos; aumento dos recursos atribuídos ao desenvolvimento social; reforço da cooperação para o desenvolvimento social, etc. A observação, atenta, destes objectivos permite concluir que são os mesmos que cinco anos mais tarde foram estabelecidos nas metas e objectivos da Cimeira do Milénio. Aliás, a dimensão social está patente em todos os relatórios do Programa das Nações Unidas (PNUD), o que demonstra a sua importância a nível internacional. Contudo, tendo em conta os problemas bélicos que dominam o cenário internacional, os conflitos internos da maior parte dos países em desenvolvimento, os regimes totalitaristas que vigoram nos países menos desenvolvidos, a fome que continua a 29 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública afectar uma parte importante da população mundial, entre outros indicadores, torna-se difícil concretizar a dimensão social do desenvolvimento sustentável. • Dimensão institucional Para além das dimensões anteriormente focadas, económica, ambiental e social, foi acrescentada ao desenvolvimento sustentável a dimensão institucional31. Esta dimensão tem intrínseca a ideia de abranger as questões relativas à forma de governação quer das instituições quer dos sistemas legislativos. A vertente institucional chama a atenção para as questões relativas às formas de governação, das instituições e dos sistemas legislativos tais como a flexibilidade, transparência, democracia, para o quadro da participação dos grupos de interesse (sindicatos e associações empresariais) e para a sociedade civil, onde as Organizações Não Governamentais (ONG) são parceiros essenciais na promoção dos objectivos do desenvolvimento sustentável. Actualmente não se pode dissociar governação de participação pública. O papel desempenhado e a desempenhar pelos cidadãos nos processos de decisão é inquestionavelmente reconhecido. Na 5ª Conferência Ministerial “Ambiente para a Europa”, realizada em Kiev, na Ucrânia, em 2003, a Declaração Ministerial, no §37º,“...encoraja todos os Estados a encetar os passos para a promoção de uma “governação responsável e transparente” e em reforçar o papel do público no processo de tomada de decisão, designadamente através de medidas de formação de capacidade dirigidas para a implementação do Princípio 10 da Declaração do Rio, tal como foi sublinhado na Declaração de Lucca da 1ª Reunião das Partes da Convenção de Aarhus” (CNADS, 2003:13). O princípio da participação32encontra-se consagrado nas principais Declarações e Convenções Ambientais33 e o Livro Branco sobre Governação dá-lhe uma nova 31 Governance, no original. “A participação directa e activa de homens e mulheres na vida política constitui condição e instrumento fundamental de consolidação do sistema democrático (...)” 33 Declaração do Rio Janeiro sobre Ambiente e Desenvolvimento – Princípio 10 “Participação, Acesso à Informação e Direito à Justiça em Matéria de Ambiente” (IPAMB, 1997); Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas – Artigo 6º “Educação, Formação e Informação do Público” (IM, 1994); Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação – Artigo 3º “Princípios” (SPCCD, 1996); §37º da Declaração de Kiev, 23 de Maio de 2003. 32 30 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública expressão ao enunciar o Princípio da Participação para uma Governação Responsável como “a qualidade, relevância e eficácia das políticas da União Europeia dependem do assegurar da ampla participação ao longo de todo o processo político – desde a concepção à implementação. O aprofundar da participação gera uma maior confiança, por parte do público, quanto ao resultado final da aplicação das políticas, assim como nas instituições que as elaboram e propõem. Para a participação ser uma realidade, os governos centrais deverão seguir uma “aproximação inclusiva” aquando da elaboração e implementação das políticas da União Europeia” (CE, 2001b). Tendo em conta que a dimensão institucional “governance” assenta na participação pública e sendo esta uma dimensão do desenvolvimento sustentável, deparamo-nos com mais uma questão de desigualdade entre países ricos e pobres. Ao acrescentar um novo pilar ao desenvolvimento sustentável – institucional – aumentou-se o fosso entre países do Norte e do Sul. Mas o acesso à informação também é desigual nos países do Norte em função dos níveis de rendimento e escolaridade. 1.4 – ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Um dos compromissos internacionais assumidos no âmbito da Agenda 21, acordada na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, foi a elaboração de uma Estratégia de Desenvolvimento Sustentável por parte dos Estados-Membros. Este mesmo compromisso viria a ser reafirmado na 19ª Sessão Especial da Assembleia-Geral das Nações Unidas de 1997, onde os Estados-Membros da União Europeia, acordaram apresentar as suas estratégias nacionais a tempo do Conselho Europeu de Sevilha (2002), no quadro de preparação da Cimeira sobre Desenvolvimento Sustentável a ocorrer em Joanesburgo. 1.4.1 ESTRATÉGIA DA UNIÃO EUROPEIA PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A elaboração da estratégia para o Desenvolvimento Sustentável torna-se imperativa à luz dos princípios e das políticas defendidas pela União Europeia. Assim, as Nações Unidas e a União Europeia, entre outras entidades e instituições, apelaram para que cada país formulasse e implementasse a sua própria estratégia para o desenvolvimento sustentável. A própria União Europeia deu o exemplo ao aprovar a sua própria 31 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Estratégia Comunitária para o Desenvolvimento Sustentável (2001). As Nações Unidas, como forma de sensibilização designaram a década de 2005-2015 à consagração universal do carácter estratégico do desenvolvimento sustentável. O Desenvolvimento Sustentável é, assim, primeiro que tudo, um objectivo fundamental consagrado nos Tratados da União Europeia, em que se exige uma abordagem integrada das políticas económicas, sociais e ambientais. O Processo de Cardiff34 em 1998 consagrou a integração das questões ambientais nas políticas sectoriais. Desde esta data e dentro deste contexto têm vindo a ser assumidos compromissos políticos e mecanismos de aplicação que permitem salvaguardar as preocupações ambientais no desenvolvimento das diversas políticas. Posteriormente, na Estratégia de Lisboa (2000), definiu-se um novo objectivo estratégico para a primeira década do século XXI no espaço da União Europeia: “Tornar-se na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social”35. A dimensão ambiental é assim acrescentada à Estratégia de Lisboa (Quadro IV). 34 O processo de Cardiff foi o enquadramento acordado para a aplicação do artigo 6º do Tratado da União Europeia de integração das questões de ambiente nas demais políticas sectoriais. (http://www.gri.maotdr.gov.pt/) (visitado em 20 de Outubro 2007) 35 http://www.ces.pt/file/doc/68 (visitado em 20 de Outubro 2007) 32 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Quadro IV – Principais problemas visados na EDS – UE (2001) O mandato de Gotemburgo reconhece a necessidade de acção urgente nas quatro áreas de intervenção prioritárias: • Alterações climáticas; • Transportes sustentáveis; • Riscos para a saúde pública; • Recursos naturais. No combate às alterações climáticas são reiterados os compromissos relativos ao Protocolo de Quioto, nomeadamente o da redução, até 2010, de 8% das emissões de gases com efeito de estufa, tendo por referência os níveis de 1990. Antecipa-se que, para além de 2010, e até 2020, a UE deverá procurar alcançar uma redução das emissões de gases com efeito de estufa numa taxa média de 1% ao ano relativamente aos níveis de 1990. Estabelece-se ainda a meta indicativa de 22% (em 2010) para a produção de electricidade proveniente de energias renováveis. Relativamente aos transportes sustentáveis, a UE identifica como objectivos a redução dos níveis de tráfego, congestionamento, ruído e poluição, bem como incentivar o uso de transportes que respeitem o ambiente e assegurar a plena internalização dos custos sociais e ambientais. Salienta a necessidade de serem adoptadas medidas para dissociar o crescimento dos transportes do crescimento do PNB através, nomeadamente da substituição do transporte rodoviário pela ferrovia, pelo transporte marítimo e pela maior utilização de meios de transportes públicos de passageiros. Na diminuição de riscos para a saúde pública, a Estratégia Comunitária convida as instituições europeias competentes a adoptarem, até 2004, a estratégia para os produtos químicos e aprovação do regulamento relativo à Autoridade Alimentar Europeia. Relativamente à gestão mais responsável dos recursos naturais, a UE assume como fundamental o objectivo da dissociação do crescimento económico, do consumo de recursos naturais e da produção de resíduos, de modo a assegurar a manutenção da biodiversidade e a preservação dos ecossistemas. Salienta que a Política Agrícola Comum deverá ter em conta a promoção de modos de produção sustentáveis, incluindo a produção biológica e a protecção da biodiversidade e que, no âmbito da Política Comum de Pescas deverá ser assegurada que a pressão exercida sobre os recursos haliêuticos terá em conta o impacte social resultante da necessidade de evitar a sobrepesca. Reitera a importância da implementação da política integrada de produto em cooperação com as empresas, com o objectivo de reduzir a utilização de recursos e o impacte ambiental de resíduos. Define ainda como desígnio prioritário que o declínio da biodiversidade deverá ser sustido até 2010 Aos Conselhos Europeus da Primavera, de acordo com o mandato de Gotemburgo, cabe a revisão do desenvolvimento e da implementação da EDS e adopção de orientações para o futuro, tendo por base os relatórios síntese produzidos pela Comissão. Fonte: ENDS 2005-2015 (Mota et al, 2005:20) Em 2001 no Conselho de Gotemburgo os países membros elaboraram uma estratégia para o desenvolvimento sustentável acrescentando uma dimensão ambiental à estratégia de Lisboa relativo ao emprego, à reforma económica e à coesão social. Em 2004 a Comissão Europeia apresentou Construir o Nosso futuro Comum, Desafios políticos e Recursos Orçamentais da União Alargada, 2007-2013. O Desenvolvimento Sustentável surge como o primeiro grande objectivo das políticas da UE. (Quadro V) 33 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Quadro V - A União Europeia e o Desenvolvimento Sustentável (2007/13) Na sua comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu - Building Our Common Future a Comissão Europeia define três grandes objectivos para a União Europeia no período 2007/13 • Desenvolvimento Sustentável, através da mobilização das políticas económicas, sociais e ambientais • Cidadania Europeia, completando as realizações na área de liberdade, justiça, segurança e acesso aos bens públicos básicos • Projecção da Europa como Parceiro Global O Desenvolvimento Sustentável surge como o primeiro dos Objectivos e como um vector estratégico do terceiro Objectivo. Para a Comissão Europeia o Objectivo de aumentar a prosperidade dos cidadãos europeus de um modo sustentável desdobra-se em três vectores. • Transformar a UE numa economia baseada no conhecimento dinâmica e orientada para o crescimento • Atingir uma maior coesão no contexto de uma União alargada • Reforçar a competitividade da agricultura europeia, fortalecer o desenvolvimento rural, assegurar uma exploração sustentável dos recursos piscatórios e a qualidade do ambiente Por sua vez o Objectivo “Projecção da Europa como Parceiro Global” desdobra-se em três vectores principais • A União Europeia e o seu espaço próximo • A União Europeia como parceiro para o Desenvolvimento Sustentável (quer através da sua acção ao nível global, quer no quadro das suas relações bilaterais) • A União Europeia como Actor Global No primeiro vector do Objectivo “Desenvolvimento Sustentável” - “Transformar a UE numa economia baseada no conhecimento dinâmica e orientada para o crescimento” destacam-se como objectivos operacionais: • Promover a competitividade das empresas num mercado único totalmente integrado • Reforçar o esforço europeu na área da investigação & desenvolvimento • Aumentar a conectividade na Europa através de redes transeuropeias • Melhorar a qualidade da educação e da formação • Prosseguir a agenda social europeia, no sentido de ajudara a sociedade europeia a antecipar e gerir a mudança No segundo vector do Desenvolvimento Sustentável – “Coesão no contexto de uma União alargada” a União Europeia deverá prosseguir com a política de coesão assente num conjunto de princípios orientadores Concentração de recursos e investimentos • Respeito pelas regras do Mercado Único • Maior ênfase na criação de empregos em novas actividades • Contribuição para o desenvolvimento de parcerias e de boa governação No terceiro vector do Objectivo “Desenvolvimento sustentável” – “Reforçar a competitividade da agricultura europeia, fortalecer o desenvolvimento rural, assegurar uma exploração sustentável dos recursos piscatórios e a qualidade do ambiente” integram-se como vectores chave: • O prosseguimento da reforma da Política Agrícola Comum • A implementação da nova Política Comum de Pescas mais orientada para a exploração sustentável dos recursos vivos aquáticos • A implementação do programa da UE para a Mudança climática • A implementação das estratégias temáticas dirigidas a prioridades ambientais específicas - solo; qualidade do ar; pesticidas; ambiente marinho; etc. • A implementação do Plano de acção em Tecnologias ambientais • O desenvolvimento da rede Natura 2000 Fonte: ENDS 2005-2015 (Mota et al, 2005:22-23) Em qualquer um destes conselhos europeus está patente a temática da coesão social na estratégia do desenvolvimento económico. Com efeito, a União Europeia assumiu o desafio da Sustentabilidade como aspecto central da sua agenda política. 1.4.2 ESTRATÉGIA NACIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Tendo como enquadramento a estratégia da UE para o Desenvolvimento Sustentável, cada estado membro deveria formular a sua própria estratégia. No caso de Portugal a 34 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável foi definida para o período 2005/15. De acordo com os autores, entende-se por ENDS “um conjunto coordenado de actuações que, partindo da situação actual do País, com as suas fragilidades e potencialidades, permitam num horizonte de 12 anos assegurar um crescimento económico célere e vigoroso, uma maior coesão social, e um elevado e crescente nível de protecção do ambiente” (ENDS, 2005,13). Após alguns contratempos eis que em 2005 a Estratégia Nacional para o Desenvolvimento Sustentável ficou concluída, mas não para entrar em vigor como estava previsto. Foi em Agosto de 2007 que a resolução do Conselho de Ministros 109/2007, publicou em Diário da República36 a aprovação ENDS 2005-2015 e o respectivo Plano de Implementação (PIENDS). Para trás fica um complexo processo. No Quadro VI estão expostos os principais momentos que assinalam a integração de Portugal no processo europeu e global de Desenvolvimento Sustentável. Quadro VI – Integração de Portugal no processo europeu e global de DS • • • • • Consagração no texto originário da Constituição da República Portuguesa de 1976 do “direito a um ambiente de vida humano sadio e ecologicamente equilibrado (n.º 1 do artigo 66º, na versão originária): de salientar que, relativamente aos Estados-membros da União a quinze, apenas a Grécia nos precedeu, consagrando a protecção ambiental na sua Lei Fundamental desde 1975. Aprovação da Lei de Bases do Ambiente (Abril de 1987) que aponta para um: “desenvolvimento integrado, harmonioso e sustentável” (art.º3). Resolução do Conselho de Ministros sobre o Plano Nacional de Política de Ambiente (Abril de 1995): o PNPA, onde a menção ao desenvolvimento sustentável como objectivo surge de modo claro, seria discutido no Outono de 1995, mas jamais entraria em fase de implementação. O PNPA definiu várias Orientações Estratégicas nas quais integrou a Educação Ambiental como Tarefa Primordial, evidenciando a importância da questão ambiental na formação dos cidadãos; assim, o Ambiente deixa de ser encarado apenas como recurso e passa a ser também peça fulcral da Sociedade Portuguesa: “...A educação ambiental visa, em última instância, a defesa de valores comuns, o exercício de direitos democráticos, em suma, uma afirmação de cidadania...”. Consagração na revisão constitucional de 1997 do Desenvolvimento Sustentável (Artigos 66.º e 81º da Constituição da República Portuguesa. Criação do Conselho Nacional para o Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável (Agosto de 1997). Resolução do Conselho de Ministros sobre a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável (Março de 2002). Fonte: Adaptado de ENDS 2005-2015 (Mota et al, 2005:23-24) • Após a aprovação37 das grandes linhas gerais de orientação da ENDS 2002 esta foi submetida à discussão pública em Junho de 2002. “Foi alvo de críticas, que sublinharam as suas inspirações e fragilidades, aliás inevitáveis, no curto período da sua elaboração” (Schmidt &Valente, 2004:30)38. 36 (1.ª série — N.º 159 — 20 de Agosto de 2007) Resolução do Conselho de 28 de Maio de 2002 38 Citado por Briz (2005:35) 37 35 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública O resultado das fortes críticas não deixou de se fazer sentir e a coordenação política do Plano de Implementação da Estratégia Nacional para o Desenvolvimento Sustentável (PIENDS) passou a ser da responsabilidade do Gabinete do Primeiro-Ministro “de modo a reflectir a transversalidade que lhe é inerente e a necessidade de coordenação ao mais alto nível” (Mota et al, 2005:25). Assim, em Janeiro de 2004 é nomeada uma comissão de especialistas, encarregue de terminar ENDS para que esta estivesse pronta até Janeiro de 2005. No documento final da ENDS pode ler-se. “O Grande Desígnio que enforma a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável é o de fazer de Portugal, no horizonte de 2015, um dos países mais competitivos da UE, num quadro de qualidade ambiental e de coesão e responsabilidade social” (Mota et al, 2005:9). Segundo o portal do Governo, a ENDS tem sete objectivos de acção39: Preparar Portugal para a «Sociedade do Conhecimento»; Crescimento Sustentado, Competitividade à Escala Global e Eficiência Energética; Melhor Ambiente e Valorização do Património Natural; Mais Equidade, Igualdade de Oportunidades e Coesão Social; Melhor Conectividade Internacional do País e Valorização Equilibrada do Território e Uma Administração Pública mais Eficiente e Modernizada. A destacar da ENDS o capítulo V – A ENDS como Desafio à Cidadania – como os próprios autores afirmam “A ENDS só terá possibilidades de ter êxito se for entendida, no que diz respeito à sua gestão, implementação, acompanhamento, avaliação e reformulação, como um desafio mobilizador da sociedade portuguesa, dos diferentes parceiros sociais e, individualmente, de cada cidadão em particular” (Mota et al, 2005:103). A Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável foi aprovada pelo Conselho de Ministros para discussão pública no dia 8 de Junho de 2006. Como exercício de cidadania e participação, esteve em discussão pública até 15 de Setembro de 2006, tendo estado a cargo da equipa de projecto prevista na Resolução de Conselho de Ministros n.º 112/2005, de 30 de Junho, a promoção da consulta. O Relatório da 39 http://www.desenvolvimentosustentavel.pt (visitado 20 de Outubro 2007) 36 Capítulo 1 – Da Emergência da Educação Ambiental à Participação Pública Discussão Pública esteve disponível no site do Instituto do Ambiente, actualmente Agência Portuguesa do Ambiente40: A elaboração do Plano de Implementação da Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável PIENDS foi dividida em 3 Fases, a cada uma das quais associada um período de discussão. Como resultado da 1ª Fase foi preparado um conjunto de documentos de trabalho, que reúnem as propostas de objectivos, acções e indicadores da responsabilidade dos sectores e expressas nos Painéis Sectoriais realizados41. Como metas transversais para 2015 a ENDS pretende colocar Portugal num patamar de desenvolvimento económico mais próximo da média europeia, melhorar a posição do País no índice de Desenvolvimento Humano do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e reduzir o défice ecológico em Portugal. Sem dúvida grandes metas que exigem um grande esforço por parte de todos os sectores do país. 40 41 www.iambiente.pt/pls/ia/homepage Adaptado de http://portal.icnb.pt/ICNPortal/vPT/Noticias/ (visitado a 20 de Outubro 2007). 37 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal INSTRUMENTOS POLÍTICOS E CIDADANIA AMBIENTAL EM PORTUGAL Conquanto só nas últimas décadas o tema da participação pública tenha começado a fazer parte da linguagem de muitos cidadãos, a concepção subjacente a esta temática é histórica. Segundo Beck (1992)42 “na sociedade contemporânea, por vezes qualificada como “sociedade de risco”, os cidadãos preocupam-se cada vez mais com os riscos resultantes do desenvolvimento industrial e tecnológico e tornaram-se, do mesmo passo, mais reflexivos, reclamando uma intervenção mais activa na gestão desses riscos. Talvez tenha sido o risco, associado à capacidade de obter informação sobre o mesmo que tenha induzido a uma maior difusão da participação pública dos cidadãos e à criação, por parte das entidades responsáveis, de um mecanismo legal em que estes se pudessem apoiarem. Muito embora só recentemente se comece a falar em participação pública na sociedade portuguesa, de acordo com o CNADS pode-se encontrar raízes muito claras nos debates constitucionais das revoluções americana e francesa, do final do século XVIII. Actualmente a participação é uma exigência fundamental da cidadania activa plena e como já foi referido os seus princípios fundamentais encontram-se evidenciados no longo percurso da construção europeia, das políticas comunitárias e da política internacional de ambiente. Porém, para que haja participação há que ver consagrado o direito mais básico: o de acesso à informação. “O direito de acesso à informação assume, assim, uma dimensão estruturante no direito do ambiente, aspecto que é reconhecido quer pelo direito internacional quer pelo direito comunitário43. No âmbito do direito internacional, merece especial relevo a Convenção sobre o acesso à informação, a participação pública no processo decisional e o acesso à justiça em matéria de ambiente, assinada em Aarhus em 25 de Junho de 1998” (Sendim, 2002: 30). 42 Citado em CNADS, 2003: 10 No direito comunitário deve-se ter em conta a Directiva nº 90/313/CEE transposta pela Lei nº 65/93, de os 26 de Agosto com as alterações introduzidas pelas leis N. 8/95, de 29 de Março e 94/99, de 16 de Julho 43 38 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal No que respeita à legislação nacional, em matéria de ambiente e qualidade de vida a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 66º, consagra o “direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado” e proclama que “o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos”. Esta norma constitucional é, de alguma forma, reiterada na Lei de Bases do Ambiente44, onde se acentua o “apelo a iniciativas populares e comunitárias”, e reforçada, no campo dos princípios, pela referência aos conceitos de participação e de responsabilização. E, apesar de alguns entraves por parte de determinados sectores da administração pública, a lei é bem clara em matéria de acesso a documentos por parte dos cidadãos “estes são públicos, podendo ser consultados e copiados por qualquer cidadão” (Sendim, 2002:29). A convenção de Aarhus encontra-se em vigor desde 30 de Outubro de 2001 contudo, é importante questionar que percentagem de cidadãos portugueses a conhece ou dela se vale como instrumento político. Com efeito, o acesso à informação e participação pública em Portugal é munido de diferentes instrumentos políticos, mais ou menos acessíveis, como forma de incentivar o indivíduo a pôr em prática a cidadania ambiental. Para além das políticas ambientais de estímulo à participação pública na UE, a legislação portuguesa criou uma série de mecanismos com o intuito de dotar os cidadãos de instrumentos que lhe permitam exercer uma cidadania ambiental activa e participada, “os textos legais em vigor garantem estes direitos a todos os cidadãos num enquadramento mais abrangente do que existe em vários países europeus” (TAIDIS, 2006:13). De entre o vasto leque de instrumentos em que o cidadão pode exercer o seu direito de participação (na sua maioria verifica-se na fase de Consulta Pública dos procedimentos de Avaliação de Impacte Ambiental), a presente dissertação debruçar-se-á sobre a 44 Lei n.º 11/87, de 7 de Abril, artigos 2º, nº1, e 3º, alíneas c) e h). 39 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal participação pública nos POOC45 e sobre o seu contributo como forma de preservar o litoral. Por fim, com base nos inquéritos realizados às ONG com o intuito de analisar o incentivo social à participação pública, procurar-se-á avaliar de que forma este incentivo contribui ou não para formar cidadãos mais activos e participativos. 1.5 Políticas ambientais e estímulo à participação pública na UE Apesar de alguns registos históricos sobre políticas ambientais a nível internacional, estas cingiam-se, na maior parte dos casos, à protecção de algumas espécies. Na realidade só a partir dos anos 60 do século passado, fruto do desenvolvimento industrial e tecnológico e do seu impacte a nível planetário, emerge a necessidade urgente de uma política de ambiente internacional. Não obstante este facto, podem referir-se alguns exemplos comprovativos de preocupações com o ambiente em períodos transactos, muito embora na sua maioria reflectissem uma preocupação com a protecção de espécies.” (…) Já em 1872 o governo da confederação Helvética propusera o estabelecimento de uma comissão internacional para a protecção de aves migratória. De igual modo, em 1900 e 1903 as potências coloniais europeias assinam convenções destinadas à protecção da vida selvagem nas suas colónias africanas. Da mesma forma, a criação em 1946 da International Whaling Commission, resultou da assinatura em 1931 da Whaling Concention, que seria a pedra basilar dos esforços conducentes à abolição, ou, pelo menos, radical redução da caça à baleia” (Soromenho-Marques, 1998:186). É consensual, que as Conferências de Estocolmo (1972) e do Rio (1992) foram dois marcos na história da política de ambiente internacional, pese embora todas as falhas inerentes. Hoje, é sobejamente reconhecido que a participação pública é um instrumento fundamental para a sustentabilidade. Contudo, as políticas ambientais como estímulo à 45 POOC - Os Planos de Ordenamento da Orla Costeira são nove. Seis realizados pelo INAG (CaminhaEspinho, Ovar-Marinha Grande, Alcobaça-Mafra, Cidadela-São Julião da Barra, Sado-Sines e BurgauVilamoura) e três, por corresponderem a áreas que integram a rede nacional de áreas protegidas, foram realizados pelo ICN (Sintra-Sado, Sines-Burgau e Vila Moura-Vila Real de Stº António). 40 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal participação pública, exceptuando casos concretos, começaram a delinear-se na década de 80. O Relatório Brundtland, a isso faz referência indicando que a justiça social necessária ao desenvolvimento sustentável devia ser “coadjuvada por sistemas políticos que garantam a efectiva participação dos cidadãos no processo de tomada de decisões e por uma maior democraticidade nos processos de decisão a nível internacional (WCED, 1987:17)”. De entre todas as áreas, será nas políticas públicas de ambiente, que a necessidade e a complexidade dos processos participativos encontra a sua verdadeira expressão. A experiência nacional e internacional comprova que a participação é um processo vital para o êxito das iniciativas políticas. Ao longo das últimas três décadas de políticas de ambiente, a necessidade de encarar a participação dos cidadãos nos processos de tomada de decisão transmutou-se numa tendência política, teórica e prática, cada vez mais clara e incontornável. A Declaração do Rio em 1992 vem realçar o papel das sociedades civis em matéria de ambiente. “O Princípio 10 da Declaração do Rio46 estabeleceu o acesso à informação, a participação pública nos processos de tomada de decisão e o acesso à justiça como princípio-chave da «governação ambiental», que ficaram conhecidos como os princípios de acesso (The access principles) (TAI, 2003; WRI, 2003; Petkova et al, 2002)”47, O Principio 10 no espaço europeu acabou por ser reforçado com a convenção de Aarhus. Segundo Kofi Annan, ainda que de âmbito regional, o significado da Convenção de Aarhus é global. Representa, de longe, a melhor concretização do Principio 10 da Declaração do Rio, que sublinha a necessidade de os cidadãos participarem em assuntos e acederem à informação sobre ambiente detida pelas autoridades públicas (TAIDIS, 2006:39). 46 Princípio 10: “ A melhor forma de tratar as questões ambientais é assegurar a participação de todos os cidadãos interessados ao nível conveniente. Ao nível nacional, cada pessoa terá acesso adequado ás informações relativas ao ambiente detidas pelas autoridades, incluindo informações sobre produtos e actividades perigosas nas suas comunidades e a oportunidade de participar em processos de tomada de decisão. Os estados deverão facilitar e incentivar a sensibilização e participação do público, disponibilizando amplamente as informações. O acesso efectivo aos processos judiciais e administrativos, incluindo os de recuperação e de reparação, deve ser garantido” (Earth Summit’92, 1992:11). 47 Citado em Briz, (2005:38). 41 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal A Agenda 21 realça, igualmente, a tónica da promoção da participação pública e do envolvimento das ONG e outros grupos nos processos de decisão. No capítulo 8 deste documento pode ler-se uma recomendação aos cidadãos, no sentido que estes venham a ter acesso a informação relevante, devendo poder participar efectivamente no processo de decisão ambiental. Para Bass et al. (1995)48 apenas não é suficientemente claro o meio como a Agenda 21 poderá chegar aos seu grande desafio – atingir o desenvolvimento sustentável de uma forma participada. Todavia, segundo o autor, a participação passa a assumir um papel de revitalização das abordagens de planeamento mal sucedidas, ao mesmo tempo que se associa aos conceitos empowerment49 e capacity-building50das comunidades”. Com a Cimeira de Joanesburgo surge uma nova área: A Governância, apontada por muitos como um alicerce do conceito de Desenvolvimento Sustentável. “Ao introduzir esta componente na aplicação do Princípio 10 em diferentes realidades nacionais, pretendeu-se explorar factores instrumentais que coloquem em relevo as iniciativas desenvolvidas, ao nível de cada país, para efectivar a aplicação deste princípio fundamental” (TAIDIS, 2006:41). A governação responsável deve assentar nos princípios da Declaração de Laeken51. Actualmente o grande desafio da União Europeia passa por uma aproximação das instituições europeias ao cidadão. Cada vez mais um maior número de cidadãos sentese á margem das decisões, exigindo um papel mais activo e desejando um maior controlo democrático. “A «governação responsável» é a criação de novas oportunidades e não de novos factores de rigidez. Só uma democracia efectivamente participada conduzirá à prática de uma “governação responsável”. Os cidadãos só serão os actores e operadores das políticas e contribuirão para um desenvolvimento 48 Citado em Briz (2005:40) No sentido de conferir poder aos cidadãos, promovendo o acesso a recursos e o desenvolvimento das suas capacidades para uma participação activa na tomada de decisões, que afectam as suas vidas e a sua comunidade 50 No contexto da Agenda 21, capacity-building consiste nos mecanismos, esforços ou condições que promovam significativa e eficazmente a participação pública nas decisões que afectam o ambiente; inclui, por exemplo, a criação de um enquadramento legal e de suporte administrativo para ONG, a formação de funcionários públicos para a implementação dos princípios do acesso e a garantia de acesso á internet ao público em geral (TAI, 2003). 51 A 14 e 15 de Dezembro de 2001, reuniu-se o Conselho Europeu, em Laeken, na Bélgica. Desta reunião saiu a”Declaração do Concelho Europeu de Laeken”. 49 42 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal sustentável se participarem conscientemente e forem envolvidos no processo decisório” (CNADS, 2003:12). O Livro Branco sobre Governação52 reforça igualmente o papel da participação e do melhor acesso e divulgação da informação como vias essenciais para alcançar uma governação responsável. Também a 5ª Conferência Ministerial «Ambiente para a Europa»53, “encoraja todos os Estados a encetar os passos para a promoção de uma “governação responsável e transparente” e em reforçar o papel do público no processo de tomada de decisão, particularmente através de medidas de formação de capacidade dirigidas para a implementação do Princípio 10 da Declaração do Rio, tal como foi sublinhado na Declaração de Lucca da 1ª Reunião das Partes da Convenção de Aarhus. Todavia, já em 2000, a Declaração do Milénio, defendia, no princípio V – Direitos Humanos, Democracia e Boa Governação, o papel da participação dos cidadãos como forma de se obter uma boa governação54. Não obstante estes contributos, outros houveram que permitiram reconhecer a importância da participação pública nos processos de decisão, no âmbito do desenvolvimento sustentável. Todavia, poder-se-á considerar a Convenção de Aarhus como um marco nesta matéria. “Assinada por 36 países em 1998, incluindo Portugal, entrou em vigor em 30 de Outubro de 2001, depois de ratificada por 16 países55. Tratase de um documento pan-europeu, elaborado no âmbito da Comissão Económica para a Europa das Nações Unidas (UNECE/CEE/ONU), e que recolhe uma experiência internacional onde se destacam a legislação norte-americana de 1969 – US Freedom of Information Act (FOIA) – e a directiva europeia sobre liberdade de informação em matéria de ambiente (90/313 CE, de 7 de Junho de 1990)” (CNADS, 2003:10). 52 53 (CE, 2001b), proposto pela Comissão Europeia em 25 de Julho de 2001. Realizada em Kiev, na Ucrânia, de 21 a 23 de Maio de 2003 54 Declaração do Milénio, princípio V “Trabalhar colectivamente para conseguir que os processos políticos sejam mais abrangentes, de modo a permitirem a participação efectiva de todos os cidadãos, em todos os países; Assegurar a liberdade dos meios comunicação para cumprirem a sua indispensável função e o direito do público de ter acesso à informação” (http://www.netprof.pt ) 55 cfr. Artº20º, nº1 da Convenção 43 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal A Convenção de Aarhus, assente em três pilares - acesso à informação, o direito à participação dos cidadãos nos processos de tomada de decisão e o acesso à justiça no domínio do ambiente – na prática vem munir as sociedades de um instrumento legal para se manifestarem sobre questões relacionadas com a cidadania ambiental. Em Janeiro de 2005 o então Instituto do Ambiente, de acordo com as directrizes europeias, elabora o 1º Relatório Nacional à Convenção de Aarhus, no qual pode lerse: “A Convenção sobre Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em matéria de Ambiente, trata de matéria transversal à política do ambiente, devendo as suas partes assegurar que: As autoridades públicas respondam aos pedidos de informação relativos ao ambiente e, de acordo com a legislação nacional aplicável, disponibilizem a informação bem como as cópias dos documentos actualizados que a contenham; As autoridades públicas possuam e actualizem informação em matéria de ambiente; Sejam desenvolvidos mecanismos obrigatórios de informação às autoridades públicas sobre as actividades com incidências importantes no ambiente; - Em caso de ameaça iminente para a saúde ou para o ambiente sejam disponibilizadas, de imediato, todas as informações na posse das autoridades públicas, susceptíveis de permitir ao público tomar medidas para prevenir ou limitar eventuais danos; O público participe em decisões sobre actividades específicas que possam ter impactes significativos no Ambiente; participe na preparação de planos, programas e políticas relativas a ambiente, bem como na elaboração de regulamentos e diplomas legais com impacte significativo no ambiente; Seja garantida a possibilidade de recurso para o tribunal ou para uma entidade independente quando os pedidos de informação forem ignorados, recusados ou inadequados” (IA, 2005). Tal como exposto, a União Europeia tem consagrado diversas políticas ambientais como reforço da participação pública nos processos de decisão. No cômputo geral, as políticas ambientais são decididas a nível mundial, transpostas para a UE e posteriormente adaptadas pelos diferentes estados-membros. 44 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal 1.6 POLÍTICAS AMBIENTAIS EM PORTUGAL Como já foi referido ao longo desta dissertação o Direito do Ambiente é consagrado na Constituição da República Portuguesa, aprovada e decretada em 1976, através do artigo 66º. Assim, pode ler-se “1. Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender. 2. Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos: a) Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão; b) Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento socio-económico e a valorização da paisagem; c) Criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou artístico; d) Promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações; e) Promover, em colaboração com as autarquias locais, a qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, designadamente no plano arquitectónico e da protecção das zonas históricas; f) Promover a integração de objectivos ambientais nas várias políticas de âmbito sectorial; g) Promover a educação ambiental e o respeito pelos valores do ambiente; h) Assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida” (Constituição da República Portuguesa)56. E, muito embora a Convenção de Aarhus venha reforçar o poder do cidadão nos processos de decisão, em Portugal, há muito que ao nível da legislação existe a consagração de participação pública por parte dos cidadãos. Com efeito, “Em termos de legislação Portugal foi considerado internacionalmente como pioneiro, ao conceder às preocupações ambientais dignidade constitucional. Mas a sua consagração ocorreu com a publicação da Lei de Bases do Ambiente57, ponto de partida e referência para todos os diplomas relativos ao ambiente” (Martins, 1995:29-30). Relativamente à Lei nº 11/87, são definidas as bases da política de ambiente, em cumprimento do disposto nos artigos 9.º e 66.º da Constituição da República. De entre 56 57 http://www.parlamento.pt (visitado em 19 de Setembro 2007) Lei n.º 11/87, de 7 de Abril 45 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal os diversos artigos que compõem esta nova Lei destaca-se, a criação do Instituto Nacional de Ambiente (INAMB), dotado de personalidade e autonomia administrativa e financeira. No artigo 39º pode ler-se: “2 - O Instituto Nacional do Ambiente é um organismo não executivo destinado à promoção de acções no domínio da qualidade do ambiente, com especial ênfase na formação e informação dos cidadãos e apoio às associações de defesa do ambiente, integrando a representação da opinião pública nos seus órgãos de decisão.58. A lei Orgânica do INAMB é aprovada pelo Decreto-lei 34/89 de 30 de Janeiro, e as competências dos Serviços Centrais do INAMB são definidas pela Portaria n.º 203/89 de 10 de Março. Posteriormente, o Decreto-Lei nº 194/93, de 24 de Maio, cria o Instituto de Promoção Ambiental (IPAMB), que substitui o então Instituto Nacional de Ambiente.59“ Para além do suporte legal subjacente à Lei de Bases do Ambiente, a criação do IPAMB foi um passo considerável ao nível da educação ambiental. Assim, foram desenvolvidas acções nas áreas da Educação, Formação e Informação Ambiental como forma de abranger variados tipos de público (Quadro VII). Domínio de intervenção Educação Formação Sensibilização e Informação Quadro VII – Medidas por domínios de intervenção Público-alvo Tipos de medidas População escolar Técnicos na área do ambiente População em geral • Apoio a projectos escolares de Educação Ambiental • Projectos demonstrativos e campanhas específicas • Acompanhamento das reformas curriculares • Programa anual de formação na área do ambiente • Publicações e edições • Exposições e certames / feiras • Ecotecas / espaços informativos Fonte: IPAMB: Relatório do Estado do Ambiente 1999. Não obstante o trabalho desenvolvido ao nível da educação ambiental, os contributos desencadeados para sensibilizar, informar e formar indivíduos como cidadãos activos e detentores do direito à participação pública, foi um trabalho notável. Neste sentido 58 http://www.diramb.gov.pt (visitado em 17 de Agosto 2007) 59 No Ministério do Ambiente cabe ao Instituto de Promoção Ambiental (IPAMB) a responsabilidade de promover acções no domínio da formação, educação e informação dos cidadãos, bem como promover formas de participação alargada dos cidadãos nos processos de decisão no domínio do ambiente” (Relatório do Estado do Ambiente, 1999: 307) 46 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal foram publicados diversos documentos de ordem prática (fichas, folhetos, …) que em muito contribuíram para desenvolver hábitos de cidadania (Anexo 1).). Efectivamente, a par das acções de educação ambiental, o IPAMB, procurava promover a participação activa dos cidadãos nos processos de decisão. “A promoção da participação activa dos cidadãos nos processos de decisão compreende os seguintes objectivos: melhorar o atendimento do cidadão; facultar o acesso à informação; promover o envolvimento dos cidadãos nas questões ambientais; implementar a Consulta Pública no âmbito dos processos de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), melhorar os meios de divulgação da mesma e promover acções de sensibilização, dirigidas ao público-alvo, sobre procedimentos, avaliação e participação nos processos de AIA; prestar apoio técnico e financeiro às ONGA. A acção neste domínio efectuada pelo IPAMB traduz-se na promoção de formas de apoio técnico e financeiro às ONGA (organizações a privilegiar no contexto da avaliação e decisão sobre questões ambientais), na criação de infra-estruturas de apoio à informação e participação do cidadão, e na recolha de contributos no quadro de procedimentos legais de Consulta Pública, como é o caso dos processos de Avaliação de Impacte Ambiental” (IPAMB, 1999: 315). É desta altura a criação da “Casa do Ambiente e Cidadão”, cujos princípios eram inovadores e bastante positivos. Aí estavam centralizados os serviços de consultas públicas dos processos de AIA; atendimento ao cidadão; atendimento às ONGA; salas para formação profissional em ambiente, actualmente a “Casa do Ambiente e Cidadão” ainda existe, porém, não serve os princípios que levaram à sua criação. Nove anos após a criação do IPAMB, o Decreto-Lei n.º 8/2002, de 9 de Janeiro, cria o Instituto do Ambiente como organismo resultante da fusão entre a Direcção-Geral do Ambiente e o Instituto de Promoção Ambiental. Mas será o Decreto-Lei n.º 113/2003 de 4 de Junho que aprova a orgânica do Instituto do Ambiente. No artigo 3º pode-se ler: “São atribuições do IA: g) Efectuar a avaliação ambiental estratégica de planos e programas e coordenar os processos de avaliação de impacte ambiental de projectos de nível nacional e inter regional, neles se incluindo os procedimentos de consulta pública, em articulação, no que se refere aos projectos de 47 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal nível regional, com as comissões de coordenação e desenvolvimento regional; p) Realizar acções de sensibilização, educação e formação dos cidadãos no domínio do ambiente e promover a estratégia nacional de educação ambiental através da qual se garanta a integração das matérias relevantes no sistema e programas de ensino, em articulação, no que se refere aos níveis regional e local, com as comissões de coordenação e desenvolvimento regional; q) Promover formas de apoio às organizações não governamentais de ambiente e avaliar a sua eficácia, em articulação, no que se refere aos níveis regional e local, com as comissões de coordenação e desenvolvimento regional; r) Assegurar a divulgação da informação sobre o ambiente, compreendendo a actualização constante do site do IA, bem como promover e garantir a participação do público e o acesso à informação que lhe permita intervir nos processos de decisão em matéria de ambiente”60. A 27 de Abril de 2007, foi publicada em Diário da República (DR, 82 SÉRIE I), a lei orgânica da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). A APA resulta da fusão do Instituto do Ambiente e do Instituto dos Resíduos e das diversas atribuições a este novo organismo salienta-se a alínea f) do artigo 2º (Missões e atribuições), respeitante à Educação Ambiental e à participação pública “ Desenvolver e acompanhar a execução das políticas de educação e formação dos cidadãos no domínio do ambiente, promover e acompanhar formas de apoio às organizações não governamentais de ambiente, bem como promover e garantir a participação do público e o acesso à informação nos processos de decisão em matéria de ambiente”61. Na prática, muda-se o organismo mas a legislação mantém-se. Importa pois acompanhar o trabalho a desenvolver pela APA, para que se compreenda e analise o papel a desempenhar em prol da efectivação da participação pública e envolvimento dos cidadãos nos processos de decisão. Em termos de educação e cidadania ambiental, o trabalho desenvolvido pela rede de professores requisitados encontra-se fragilizado, tal como o próprio protocolo entre o Ministério do Ambiente do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (MAOTDR) e o Ministério da Educação (ME). As contenções económicas e as recentes 60 61 http://www.diramb.gov.pt (visitado a 23 de Setembro 2007) http://www.dre.pt (visitado em 23 de Setembro de 2007) 48 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal alterações ao nível da carreira docente periclitam a continuidade dos professores à frente dos diferentes projectos de educação ambiental; tal significará um retrocesso em termos do trabalho desenvolvido ao longo de mais de uma década. Sobre o direito de participação Sendim escreve “O Estado de direito ambiental é, como se sabe, um estado democrático, que se constrói com o envolvimento e a participação dos cidadãos. Isto significa, essencialmente, que a tarefa de defesa do ambiente não é só do Estado e dos poderes públicos, competindo antes a todos nós. (…) A participação promove a transparência, a racionalidade e a qualidade das decisões administrativas. O exercício útil e efectivo do direito de participação não pode ser dissociado de outras dimensões fundamentais do estado de direito ambiental. (…) O Princípio da participação impõe à administração um dever de (co)laboração com os cidadãos e concede-lhes, simultaneamente, um direito de participação na actividade administrativa” (Sendim, 2002: 55-56). Ainda de acordo com este autor os regimes especiais de participação são, o procedimento de audiência prévia62; a participação na elaboração de instrumentos de Gestão Territorial63; a participação nos procedimentos de licenciamento de operações urbanísticas64 e a participação nos procedimentos de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA)65. No 1º relatório nacional à Convenção de Aarhus, o Instituto do Ambiente esclarece: “Com o objectivo de promover e diversificar as formas de esclarecimento e auscultação dos interessados, bem como melhorar os resultados da participação pública nos processos de AIA, foi posto em prática, desde o início de 2000, um modelo de Consulta Pública que privilegia o envolvimento das autarquias locais da área geográfica de 62 O regime jurídico da participação procedimental e acção popular previsto na lei nº 83/95, de 31 de Agosto, impõe a audiência prévia dos procedimentos públicos com impacte relevante no ambiente ou nas condições económicas e sociais e da vida em geral das populações (Sendim, 2002: 63) 63 A lei nº 48/98, de 11 de Agosto (LBOTU) consagrou a participação enquanto princípio geral da política de ordenamento do território e urbanismo e como garantia dos cidadãos (Sendim, 2002: 69) 64 O DL 555/99, de 16 de Dezembro, prevê a discussão pública dos projectos de loteamento, podendo ser dispensada tal discussão por regulamento municipal dada a dimensão reduzida, dos quais resultem apenas lotes confiantes com arruamentos existentes (Sendim, 2002: 74) 65 Estão sujeitos a uma AIA prévia os projectos públicos ou privados susceptíveis de produzir efeitos significativos no ambiente, natural ou social, nomeadamente os descritos nos anexos I e II do DL nº 69/2000, de 3 de Maio (RJAIA). Além destes, podem ainda ser sujeitos à avaliação do impacte ambiental projectos cujas características, dimensão e natureza o justifiquem, (Sendim, 2002: 75). 49 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal localização do projecto, através de reuniões técnicas de esclarecimento”66. Com base no mesmo relatório pode-se observar a evolução das consultas públicas e respectivas participações nos processos de AIA (Quadro VIII). Quadro VIII – Participações nos processos de AIA Fonte: 1º relatório Nacional à Convenção de Aarhus (IA, 2005: 14). Os fracos níveis de participação prendem-se, em parte, com o desinteresse e ausência de tradição dos cidadãos em participar em processos de decisão. Assim, os processos mais participados são os que afectam directamente os interesses das populações ou os mais mediáticos, não estando normalmente o nível de participação directamente associado à importância do projecto. Foram encontrados no arquivo histórico, desde 1995, disponível no site do IA, 961 registos de AIA. Sujeitos a pós-avaliação encontram-se 157 processos; destes um está em Fase de Acompanhamento Público67. No entanto, apesar de toda a conjuntura em torno da participação pública, a análise da Reflexão sobre o Acesso à informação, a Participação Pública nos Processos de Tomada de Decisão e o Acesso à Justiça, desenvolvida pela CNADS, permite compreender as fraquezas em torno desta temática, não obstante a convenção de Aarhus e toda a legislação que lhe está inerente. Com efeito, o Decreto-Lei nº69/2000 de 3 de Maio68 ao acabar por tornar facultativa a apresentação da Proposta de Definição do Âmbito do EIA e a sua discussão pública contraria a norma constante do artigo 6º, nº5 da Convenção de Aarhus, que prescreve a promoção da discussão antes de apresentar o seu pedido de autorização. 66 1º Relatório Nacional sobre a Convenção de Aarhus, Portugal, (IA, 2005: 13) http://www.iambiente.pt (visitado a 23 de Setembro de 2007) 68 Revogou o Decreto-Lei nº186/90, de 6 de Junho, que tinha transposto para a ordem interna portuguesa a Directiva nº85/337/CEE. 67 50 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal “Estabelece este Decreto-Lei que, em qualquer caso, e independentemente da dimensão e magnitude dos impactes previstos para o projecto, a consulta pública da proposta de definição do âmbito do EIA, está dependente da iniciativa do proponente69. Verificam-se, assim, casos em que pequenas obras têm propostas de definição do âmbito do EIA, que são submetidas a consulta pública e outras, de maiores dimensões, ou não têm definição do âmbito, ou como foi recentemente o caso do Novo Aeroporto Internacional de Lisboa, não foram objecto de consulta pública” (CNADS, 2003:38)70. Perante a exposição da CNADS, apercebemo-nos que o procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental patenteia algumas limitações ao nível da qualidade de informação disponibilizada, das formas de divulgação e esclarecimento público; do sentido restrito do conceito de “público interessado” e das formas de participação e da efectiva ponderação das opiniões públicas. Efectivamente, muitos dos Resumos Não Técnicos são pouco inteligíveis para o cidadão comum; o horário normal de expediente da Administração pública para disponibilização dos Relatórios Base é também um obstáculo à consulta dos mesmos, para não falar de todos os entraves, muitas vezes ao nível de uma simples fotocópia, que vão surgindo sempre que se visita o IA para este fim. Os “Gabinetes de Atendimento Personalizado” (GAP), promotores da participação pública - na prática, muitas vezes mais não fazem que reuniões de esclarecimento com as autarquias; sendo que o público, as ONGA ou outras organizações da sociedade civil só terão acesso se convidadas - vieram substituir as audiências públicas. O fulcro da questão é que enquanto as audiências públicas tinham carácter obrigatório, os GAP têm um regime de excepção. Ao nível do sentido restrito do conceito de “público interessado” e das formas de participação e da efectiva ponderação das opiniões públicas, o CNADS, como órgão independente criado pelo decreto-lei nº 221/97 de 20 de Agosto, tece diversas considerações que provam a fragilidade da efectiva participação pública ao nível dos AIA contribuindo grandemente para “o clima de desencanto”, característico de uma 69 Número 5 do artº 11º do DL 69/2000, de 3 de Maio. A consulta púbica foi conduzida no âmbito de actuação de uma CAIA (Comissão de Acompanhamento de Impacte Ambiental) com base em EPIA (estudos preliminares de impacte ambiental), isto é, existiu mas não se enquadrou de forma regular numa AIA (Nota da autora) 70 51 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal vasta franja da sociedade civil. Acresce ainda, que apesar de todos os pressupostos, em prol da participação pública e do envolvimento dos cidadãos, existe, de uma forma generalizada, a ideia de que em determinados casos se cultiva um ocultar de informação. Esta política de “obstáculo à informação” por parte das instituições oficiais, vem reforçar a já grande desconfiança, por parte dos cidadãos, face às entidades administrativas, em nada contribuindo para a formação da opinião pública, podendo mesmo desencadear situações radicais como atitudes reactivas, tipo síndrome NIMBY71, muitas das vezes conduzindo a boicotes de medidas e soluções ambientais importantes. No que respeita ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial72 (RJIGT), que estabelece as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo, tem como suporte legislativo o Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, em desenvolvimento da Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto. Para além de modificações pontuais, o RJIGT foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 310/2003, de 10 de Dezembro, essencialmente no domínio do procedimento de formação dos planos municipais de ordenamento do território. No Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNOPT) pode ler-se “Um país bem ordenado pressupõe a interiorização de uma cultura de ordenamento por parte do conjunto da população. O ordenamento do território português depende, assim, da vontade de técnicos e de políticos, mas também do contributo de todos os cidadãos” (Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território 2007:7). Crêse, então que a aprovação do PNPOT73 servirá como um instrumento legal integrador dos diferentes planos existentes. “O Programa Nacional da Política de Ordenamento do 71 O termo “nimby” foi criado a partir das letras iniciais da expressão “not in my back yard”, que na tradução portuguesa significa “no meu quintal, não”, para designar as atitudes que exprimem a defesa de interesses concretos e imediatos das pessoas e não necessariamente as suas convicções e pontos de vista mais sustentados sobre as questões ambientais. 72 Esses instrumentos são: o programa nacional da política de ordenamento do território, os planos sectoriais (entre outros, transportes, comunicações, energia, turismo, agricultura, comércio, indústria, florestas e ambiente), os planos especiais de ordenamento do território (áreas protegidas, orla costeira e albufeiras de águas públicas) e os planos intermunicipais e municipais de ordenamento do território (planos directores municipais, planos de urbanização e planos de pormenor). Embora o Decreto-Lei nº380/99 não o declare expressamente, é legítimo inferir-se que, à semelhança do que prevê a Directiva 2001/42/CE, de 27 de Junho, ficam de fora os planos e programas no âmbito da defesa nacional ou da protecção civil e os financeiros e orçamentais (CNADS, 2003: 40) 73 Lei n.º58/2007, de 4 de Setembro 52 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Território” (PNPOT) constitui um instrumento de desenvolvimento territorial, de natureza estratégica e de âmbito nacional, com precedência em relação aos restantes IGT. De acordo com o disposto no Decreto-Lei nº 380/99, o PNPOT: “estabelece as grandes opções com relevância para a organização do território nacional, consubstancia o quadro de referência a considerar na elaboração dos demais instrumentos de gestão territorial [nomeadamente, os PROT e os PDM] e constitui um instrumento de cooperação com os demais Estados-membros para a organização do território da União Europeia” (art. 26º); e “estabelece as opções e as directrizes relativas à conformação do sistema urbano, das redes, das infra-estruturas e equipamentos de interesse nacional, bem como à salvaguarda e valorização das áreas de interesse nacional em termos ambientais, patrimoniais e de desenvolvimento rural” (n.º 1a), art. 28º). A Resolução do Conselho de Ministros nº 76/2002, de 11 de Abril, determina a elaboração do PNPOT, tarefa de que é incumbida a Direcção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano (DGOTDU), com o apoio de uma equipa de projecto” (2007:9)74. Um olhar sobre a política de ordenamento do território, permite-nos observar que até finais dos anos 1990 esta não dispôs de um instrumento legal integrador. Em 1982 são instituídos os Planos Directores Municipais (PDM)75; no ano seguinte criam-se os Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT)76; em 1993 são criados os Planos Especiais de Ordenamento do Território (PEOT); em 1998, o País passa a dispor de uma Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo (LBOTU)77. Lei esta que define globalmente os objectivos e princípios desta política e estabelece o conjunto coerente e articulado dos Instrumentos de Gestão Territorial (IGT), de âmbito nacional, regional e local, em que ela assenta e que constitui o sistema de gestão territorial (SGT)” (Quadro IX). 74 http://www.territorioportugal.pt (visitado em 1 de Novembro 2007) Decreto-Lei nº 151/95, de 24 de Junho. 76 (Decreto-Lei nº 338/83, de 20 de Julho) 77 Lei nº 48/98, de 11 de Agosto 75 53 Âmbito Municipal Âmbito Regional Âmbito Nacional Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal • • • Quadro IX – Instrumentos de Gestão Territorial (IGT) Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT) Planos Sectoriais com Incidência Territorial (PSIT) Planos Especiais de Ordenamento do Território (PEOT): Planos de Ordenamento de Áreas Protegidas (POAP) Planos de Ordenamento de Albufeiras de Águas Públicas (POAAP) Planos de Ordenamento dos Parques Arqueológicos (POPA) Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Planos de Ordenamento de Estuários (POE) • Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT) • • Planos Intermunicipais de Ordenamento do Território (PIOT) Planos Municipais de Ordenamento do Território (PMOT): Planos Directores Municipais (PDM) Planos de Urbanização (PU) Planos de Pormenor Fonte: Relatório Nacional Preliminar da Execução da Recomendação 2002/413/CE, de 30 de Maio, sobre Gestão Integrada da Zona Costeira (2007:18) Sendo os processos de planeamento e gestão do território divididos em duas fases distintas: elaboração dos planos (explícito eventuais alterações e revisões) e execução encontram-se nas duas fases do processo algumas lacunas e limitações no que respeita ao efectivo exercício dos direitos de informação e de participação pública. Ao não prever que todos os processos devam ser publicados através da comunicação social, bastando nalguns a publicação em Diário da República (e.g. Planos Directores Municipais e com as Estratégias e Programas de âmbito nacional), gera-se à partida uma deficiência e desigualdade ao nível da informação e da participação pública. “Não se verifica, pois, neste caso, a regra da proactividade na disponibilização da informação, pelo que, normalmente, só existe a percepção colectiva de estar em curso um determinado processo de planeamento, quando ele já se encontra numa fase avançada da sua elaboração, o que não raro conduz à ideia de que já não há nada de útil e de eficaz a fazer, em termos de participação directa dos cidadãos na tomada das decisões” (CNADS, 2003, 41). Espera-se pois que as recentes alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial permitam colmatar as falhas apontadas pelo CNADS em 2003 e que as questões de informação com vista à participação activa dos cidadãos não se embrenhem na (em nada inócua) teia legislativa. 54 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal 1.6.1 PLANOS DE ORDENAMENTO DA ORLA COSTEIRA Portugal, como aconteceu um pouco por toda a Europa, sofreu o impacte de uma intensa procura e ocupação do litoral. “É sabido que actualmente a maior parte da população humana a nível mundial se estabeleceu em zonas litorais (numa faixa que se estende até cerca de 100 km para o interior). É também sabido que o turismo é actualmente, nos países desenvolvidos (ou em vias de desenvolvimento) um dos principais responsáveis pela ocupação do litoral” (Fonseca, 2007: 7). Importa, primeiro que tudo, definir Zona Costeira na medida em que, dada a complexidade dos sistemas costeiros não existe uma definição única. Contudo, “As designações de litoral, costa, faixa costeira, faixa litoral, orla costeira, zona costeira, zona litoral, área/região costeira são utilizadas de modo indiferenciado ou por especialistas de diferentes áreas para referir porções do território de dimensões variáveis, na interface entre a Terra e o Oceano. Se há algum consenso no que respeita à complexidade da zona costeira (dos processos actuantes e das respostas dos sistemas), à sua sensibilidade, ao seu dinamismo, à sua importância económica e ecológica, à ocorrência de conflitos entre utilização e equilíbrio natural, à pressão aí exercida, à necessidade de promover o seu uso sustentável, já o mesmo não se passa em relação ao estabelecimento dos seus limites físicos, sendo estes muito variáveis nos diversos conceitos e documentos legais existentes”78. A mesma opinião é manifestada por outros autores “A complexidade dos sistemas costeiras é bem ilustrada pelo facto de não se poder afirmar que exista uma definição universal em relação ao que é zona costeira e ao que são os seus limites precisos. Existem mesmo diferentes perspectivas dos limites que esta deve ter, o que tem resultado na utilização de diferentes definições em diferentes países. Aliás, existe mesmo um uso indiscriminado, muitas vezes pouco cuidado, dos termos Costa, Zona Costeira, Litoral e Orla Costeira, que vai variando em função dos objectivos com que se pretende utilizar o conceito. Esta dificuldade resulta em grande parte do entendimento 78 Projecto Relatório Grupo Trabalho “Bases para a Gestão Integrada da Zona Costeira” (2006:10) 55 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal da Zona Costeira poder variar em função dos elementos que a constituem, quer físicos quer humanos”79. Não obstante esta complexidade que dificulta a definição de um conceito único, para o grupo de trabalho das Bases para a Gestão Integrada da Zona Costeira (2006), Zona Costeira é a porção de território influenciada directa e indirectamente em termos biofísicos pelo mar (ondas, marés, ventos, biota ou salinidade) e que pode ter para o lado de terra largura tipicamente de ordem quilométrica e se estende, do lado do mar, até ao limite da plataforma continental (2006:10) [Fig. 2]. Figura 2 - Esquema sobre a Zona Costeira Adoptado na União Europeia Fonte: GIZC, 2007:18 Perante uma tão complexa área e com tantos interesses subjacentes, legislar e fazer cumprir a lei era, de todo, imprescindível. A figura 3 permite-nos compreender o número de entidades que têm jurisdição sobre a faixa litoral, o que à priori, pode, nalguns casos dificultar uma correcta gestão e ordenamento. 79 Relatório Nacional Preliminar da Execução da Recomendação 2002/413/CE, de 30 de Maio, sobre Gestão Integrada da Zona Costeira (2007:5) 56 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Figura 3 - Mapa de jurisdição do litoral Fonte: Programa Finisterra 57 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Assim, tomando consciência do enorme problema que se estava a tornar o (des)ordenamento do litoral, em 1981, realiza-se em Creta, a reunião plenária da Conferência das Regiões Periféricas Marítimas da CEE. Nesta reunião é aprovada a Carta Europeia do Litoral, e, entre os objectivos então enunciados, figuram os de organização e gestão do litoral, ou seja, o ordenamento do território desta zona através da fixação de uma disciplina que impeça a sua degradação. Todavia, em Portugal, as preocupações com esta matéria datam de uma década anterior à Carta Europeia do Litoral. “Desde de 1971, com a publicação do Decreto-Lei 468/71, de 5 de Novembro, que veio clarificar a natureza, quanto à titularidade, dos terrenos que integram a margem das águas do mar, o conceito do Domínio Público Marítimo encontra-se enraizado, tendo permitido que nos instrumentos de planeamento, ordenamento e gestão para o território em geral, e para a zona costeira em particular, tenham ficado estabelecidas regras que apontam para uma utilização predominantemente pública desta estreita faixa que se desenvolve ao longo de toda a costa”80. À data da entrada em vigor deste Decreto-Lei, a legislação sobre o litoral era bastante desactualizada. “Impunha-se, com efeito, proceder a tal revisão, pois o direito aplicável a uma matéria tão vasta e complexa como esta encontrava-se muito antiquado e muito disperso, não satisfazendo por isso as necessidades actuais. Muito antiquado: na verdade, grande parte das disposições até agora vigentes datavam de 1892, ano em que foi publicado o Regulamento dos Serviços Hidráulicos, que regulou o assunto segundo as concepções da época, e vários outros preceitos agora substituídos, embora mais recentes, vinham já dos regulamentos marítimos de 1919 ou das reformas de 1926. E muito disperso: realmente, o regime aplicável aos terrenos do domínio público hídrico constituía, nos últimos tempos, uma autêntica manta de retalhos, daí advindo todas as indesejáveis consequências que se verificam em circunstâncias semelhantes e, nomeadamente, a perturbação da certeza do direito e a incoerência das soluções adoptadas nos diferentes diplomas e nas várias épocas”81. 80 Relatório Nacional Preliminar da Execução da Recomendação 2002/413/CE, de 30 de Maio, sobre Gestão Integrada da Zona Costeira (2007:1) 81 Decreto-Lei n.º 468/71 de 05-11-1971 58 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Não obstante esta preocupação em clarificar e legislar os usos e ordenamento da faixa costeira, a crescente ocupação, de um modo geral desordenada rapidamente deixou consequências de degradação irreversíveis, criando, inclusivamente situações de ruptura. Assim, em 26 de Setembro de 1990 entra em vigor o Decreto-Lei n.º 302/9082. Neste documento pode ler-se: “A solução adequada para obstar aos desequilíbrios que se vem registando e as suas graves consequências passa necessariamente pela definição de um enquadramento legal que estabeleça, com clareza e rigor, as regras a que deve obedecer a ocupação dos solos da faixa costeira, designadamente através da elaboração de Planos Municipais de Ordenamento do Território que tenham em conta os princípios estabelecidos pelo presente diploma. Na ausência de planos que contemplem estes aspectos e enquanto eles não existirem, tem o Governo o dever de estabelecer tais regras, sempre que o considere justificado, sem prejuízo do respeito que as autarquias locais devem sempre assegurar, no exercício das suas atribuições, em relação aos princípios atrás referidos. Porém, é através do Decreto-Lei 309/93, de 2 de Setembro, que são instituídos os Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC). Mais tarde o Decreto-Lei nº 151/95, de 24 de Junho vem considerar os POOC83 como Planos Especiais de Ordenamento do Território que incidem directamente sobre o PDM e área adjacente ao mesmo e que estabelecem os condicionamentos, vocações e usos dominantes, para a orla costeira, numa perspectiva de salvaguarda de ecossistemas fundamentais. As regras aplicam-se a toda a faixa delimitada pela batimétrica dos 30m e uma zona terrestre de protecção cuja largura é de 500m a partir da linha limite das margens do mar (Fig.4). 82 O Decreto-Lei n.º 302/90, de 26 de Setembro, é também conhecido como “Diploma da Gestão Urbanística do Litoral”. 83 Este diploma não abrange as áreas sob jurisdição portuária, nem os estuários. 59 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal D O M ÍN IO P R IV A D O D O M ÍN IO P Ú B L IC O M A R ÍT IM O - D L 4 6 8 /7 1 , 5 N o v P L A N O D IR E T O R M U N IC IP A L F A IX A T E R R E S T R E D E P R O T E C Ç Ã O F A IX A M A R ÍT IM A D E P R O T E C Ç Ã O P L A N O S D E O R D E N A M E N T O D A O R L A C O S T E IR A (P O O C ) - D L 3 0 9 /9 3 , 2 S e t * F A IX A C O S T E IR A - D L 3 0 2 /9 0 , 2 6 S e t R E S E R V A E C O L Ó G IC A N A C IO N A L - D L 9 3 /9 0 , 1 9 M a r ; D L 2 1 3 /9 2 , 1 2 O u t * * Fonte: INAG, 2007 84 Figura 4 – Limites da faixa terrestre e marítima de protecção Não obstante alguns problemas inerentes a estes planos, a aprovação, execução e implementação dos POOC, não deixa de ser um contributo positivo para a gestão do litoral em Portugal. “Pela primeira vez um instrumento de gestão territorial é concebido e aplicado à totalidade da zona costeira continental, com objectivos de contenção construtiva e interditando novas ocupações nas zonas de risco, originando uma discussão e um consenso nacional sobre os problemas e as potencialidades do litoral português. Por outro, a administração pública, ganha uma base de dados actualizada que cobre todo o litoral permitindo não só gerar outros estudos como monitorizar a implementação dos POOC”85. No entanto, apesar das vantagens que estão associadas a estes planos, existem alguns aspectos que aparentemente não foram tidos em conta. Segundo Araújo “Ora numa área extremamente frágil e dinâmica como é a faixa costeira, parece-nos óbvio que os condicionalismos de ordem natural deveriam ter uma relevância que não parece ter-lhes sido atribuída. Basta pensar no carácter arbitrário do limite dos 500m a partir da linha de média preia-mar de águas vivas equinociais (LMPMAVE). Assim, a zona terrestre de protecção dos 500m tem um significado completamente diferente se estamos numa zona de arribas graníticas, ou num área de areias dunares assentes em 84 http://www.inag.pt (visitado em 10 de Outubro de 2007) 85 Relatório Nacional Preliminar da Execução da Recomendação 2002/413/CE, de 30 de Maio, sobre Gestão Integrada da Zona Costeira, 2007:7 60 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal sedimentos consolidados. Pensamos, por isso, que a referida zona terrestre de protecção deveria ser revista e adequada aos condicionalismos geomorfológicos da área em questão”86 (Fig. 5). Fonte: Araújo, 1999 Figura 5 – Regiões geológico-estruturais de Portugal Continental e POOC A classificação dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira como um instrumento de natureza especial, permite à administração pública assumir o ordenamento e gestão do litoral como uma interesse nacional. Actualmente estes prevalecem sobre os 86 http://web.letras.up.pt (Visitado em 28 de Agosto 2007) 61 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal instrumentos de gestão territorial (Planos Municipais de Ordenamento do Território) e sobre os Planos Intermunicipais de Ordenamento do Território. Dada a sua natureza especial o POOC, o PNPOT e o PROT deverão articular-se entre si para que se possa garantir um compromisso mútuo de integração e compatibilização. A promoção dos POOC é da responsabilidade do Instituto da Água e do Instituto da Conservação da Natureza (ICN)87. A sua elaboração é acompanhada por uma Comissão Técnica de Acompanhamento constituída para o efeito, envolvendo diversas entidades, para que seja garantida a defesa dos vários interesses e pontos de vista bem como a articulação com outros planos, programas e projectos (Fig. 6). Fonte: INAG, 2007 Figura 6 - Entidades envolvidas nos processos de elaboração dos POOC O litoral português no continente foi dividido em nove troços, correspondentes a nove POOC, embora a ritmos e datas diferentes, actualmente todos os Planos de Ordenamento da Orla Costeira encontram-se aprovados e publicados. 87 Actualmente o ICN é designado por ICNB. Em 2007, tendo em conta a lei orgânica do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (MAOTDR) - Decreto-Lei n.º 207/2006, de 27 de Outubro - foi decidida a manutenção e reestruturação do Instituto da Conservação da Natureza (ICN), refundado com a componente da Biodiversidade e redenominado Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB) - Decreto-Lei n.º 136/2007, D.R. n.º 82, Série I de 2007-04-27 (http://portal.icnb.pt) 62 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal O ICN foi o Instituto responsável pela elaboração de 3 POOC, designadamente o POOC Sintra-Sado, o POOC Sines-Burgau e o POOC Vilamoura-Vila Real de Sto. António (este o último a ser aprovado) os quais correspondem troços costeiros abrangidos predominantemente por Áreas Protegidas. Os restantes Planos (CaminhaEspinho, Ovar-Marinha Grande, Alcobaça-Mafra, Cidadela-São Julião da Barra, SadoSines e Burgau-Vilamoura) são da responsabilidade do INAG88 (Fig. 7). Fonte: ICNB Figura 7 – Planos de Ordenamento da Orla Costeira 88 http://www.icnb.pt (visitado em 10 de Outubro de 2007) 63 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Tendo em conta a importância e necessidade de preservar os cerca de 950Km de litoral de Portugal Continental, onde se concentra mais de 70% da população nacional e onde é gerado mais de 80% do PIB nacional, os POOC e as intervenções por ele propostas são sem dúvida um importante contributo para a Gestão Integrada das Zonas costeiras (GIZC). 1.6.2 GESTÃO INTEGRADA DAS ZONAS COSTEIRAS Pela sua importância e pelo enorme interesse que se gera em torno das zonas costeiras não é de estranhar que a gestão costeira seja, em todo o mundo, um dos grandes desafios do século XXI. “Efectivamente, a intensificação do crescimento populacional junto ao litoral, a ampliação e diversificação das áreas industriais, os impactes induzidos no litoral por múltiplas actividades antrópicas decorrentes nas bacias hidrográficas, as intervenções de defesa costeira, o grande crescimento do turismo balnear, a modificação climática em curso e a elevação do nível médio do mar (entre vários outros factores que pressionam as zonas costeiras), converteram a faixa litoral numa zona de grande complexidade cuja gestão harmónica é muito difícil” (Dias, 2007:4). “Por outro lado, as apetências e interesses que normalmente estas zonas geram e irão gerar, de forma ainda mais acentuada no futuro, obrigam a que haja um sistema de gestão integrada, que englobe o controlo, a monitorização e uma dinâmica de intervenção, capaz de responder com soluções tecnologicamente avançadas e mais amigas do ambiente, aos múltiplos processos erosivos e às acções antrópicas, sem que com isso se coloque em causa o desenvolvimento sustentável” (Reis, 2005). O Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, determinou, através do Despacho nº4 /2005, “A criação de um Grupo de Trabalho com o objectivo de desenvolver as Bases de uma Estratégia que sustente uma política de ordenamento, planeamento e gestão da zona costeira portuguesa, continental e insular, nas suas vertentes terrestre e marinha”89. 89 Com base no estabelecido na Recomendação Europeia sobre GIZC (2002/413/EC JO L 148, 06.06.2002) foi criado um grupo de trabalho que teve como missão desenvolver as “Bases para Gestão Integrada da Zona Costeira” que, em documento apresentado publicamente em Fevereiro de 2006, 64 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Os limites, propostos no documento desenvolvido por este grupo de trabalho podem ser observados na figura 8. Fonte: RGIZC (2007: 21) Figura 8 – Limites da EGIZC A promoção da Gestão Integrada das Zonas Costeiras (GIZC) é uma prova de que actualmente existe, a nível mundial, uma tomada de consciência quanto à indispensabilidade de prestar uma muito maior atenção ao litoral. Os princípios fundamentais para a estratégia da GIZC deverão ser os enumerados no Quadro X discutiu igualmente o conceito de zona costeira tentando diferenciar os termos e a sua delimitação territorial. 65 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Quadro X – Princípios e Objectivos Fundamentais da GIZC 1. Sustentabilidade e solidariedade intergeracional 2. Coesão e equidade social 3. Prevenção e precaução 4. Abordagem sistémica 5. Suporte científico e técnico 6. Subsidiariedade 7. Participação Promovendo a compatibilização em todo o território nacional entre o desenvolvimento socio-económico, a conservação da natureza e da biodiversidade, num quadro de qualidade de vida das populações actuais e vindouras; Assegurando o equilíbrio social e territorial e uma distribuição equilibrada dos recursos e das oportunidades, pelos diversos grupos sociais, classes geracionais, territórios e lugares; Prevendo e antecipando os problemas e adoptando uma atitude cautelar face ao défice de conhecimento ou à capacidade de intervenção, minimizando riscos ou impactes negativos; Criando uma nova cultura de abordagem transversal, intersectorial, interdisciplinar, que permita uma visão integradora e prospectiva da zona costeira; Apoiando as decisões de medidas de ordenamento e gestão na compreensão dos fenómenos e na sua evolução dinâmica; Coordenando os procedimentos dos diversos níveis da Administração Pública, de forma a privilegiar o nível decisório mais próximo do cidadão; Potenciando o activo envolvimento do público, das instituições e agentes locais e reforçando a consciência cívica dos cidadãos, através do acesso à informação e à intervenção nos procedimentos de elaboração, execução, avaliação e revisão dos instrumentos de gestão territorial; 8. Co-responsabilização Assumindo a partilha da responsabilidade nas opções de gestão da zona costeira com a comunidade, os agentes económicos, os cidadãos e associações representativas, não só pelo princípio do poluidor - pagador e do utilizador - pagador, mas também pela procura de formas institucionais que permitam uma gestão mais próxima dos cidadãos e dos utentes da zona costeira; 9. Operacionalidade Criando mecanismos legais, institucionais, financeiros e programáticos céleres, eficazes e com fontes de financia Fonte: Projecto Relatório Grupo Trabalho “Bases para a Gestão Integrada da Zona Costeira” (2006:11) Contudo, apesar de todas as potencialidades que a GIZC oferece aos decisores, sem dúvida um instrumento legal bastante importante, muito há a fazer sobretudo enquanto os usos e a ocupação das zonas costeiras pelo Homem continuem a ser equacionados numa perspectiva de curto prazo, quando as escalas temporais de evolução dos fenómenos naturais se desenrolam a uma escala geológica. 1.7 PARTICIPAÇÃO PÚBLICA NA PRESERVAÇÃO DO LITORAL Ambiente e crescimento económico nem sempre conseguem caminhar lado a lado, na prática porque, em muitos casos, salvaguardar um implica prejudicar o outro. Tal é mais problemático e intenso em muitos processos relacionados com o ordenamento do território, seja ele no litoral ou no interior. Porém, forçosamente, por questões estruturais sobejamente conhecidas (densidade populacional, concentração das actividades económicas, existência de infra-estruturas, desenvolvimento do turismo, etc.), o litoral sofre uma maior pressão. Em Portugal, os processos de planeamento e ordenamento do território mantiveram-se durante muito tempo fora da alçada dos cidadãos; por inércia ou falta de interesse, a 66 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal realidade mostra a fraca tradição dos portugueses em matéria de participação pública. Porém, o cenário aparenta alterações e embora não possamos falar da sociedade portuguesa como uma sociedade deliberativa, há indícios que mostram o percurso dos cidadãos neste sentido. “A democracia não é um conceito estático, mas sim um projecto dinâmico e aberto. Mais importante que os modelos democráticos são os processos de democratização, e estes devem estender-se a três dimensões: (1) expandir o número de pessoas capazes de participar efectivamente na decisão colectiva; (2) trazer para os contextos debaixo de controlo democrático mais temáticas; (3) assegurar a autenticidade do controlo através do envolvimento efectivo da participação de actores autónomos e competentes (Dryzek, 2000)90. Com efeito cada vez um maior número de cidadãos envolve-se nos processos de decisão, fazendo pressão sobre as diversas entidades e/ou respectivos técnicos. “Hoje em dia as autoridades locais encontram-se debaixo de um escrutínio crescente por parte da sociedade civil. Cidadãos, cada vez mais educados e informados, exigem ser ouvidos e que os seus interesses sejam considerados. No seu dia-a-dia os gestores responsáveis pelas áreas protegidas sejam dirigentes ou técnicos, enfrentam esta nova realidade, e não é raro serem confrontados com situações de conflito quando solicitados a tomar decisões. Isto reflecte a tendência verificada actualmente de mudança de um sistema de democracia representativa para a deliberativa com uma intervenção mais activa do cidadão na tomada de decisão (Dryzek, 2000)91. É verdade que o envolvimento do cidadão numa tipologia de participação tradicional continua a ter uma grande expressão, mas a forma como decorre começa a ser pouco apelativa para os novos cidadãos mais activos e conscienciosos do seu papel nos processos de decisão. Para Vasconcelos (2001) “O envolvimento do cidadão nas formas de participação tradicional é marcado por decorrer em fases tardias do processo de decisão e é frequentemente considerada insuficiente pelos envolvidos. É geralmente concretizado através de uma exposição, folheto de divulgação ou mesmo de audiências públicas, e 90 Citado por Vasconcelos, 2001:3 Citado por Vasconcelos, 2001:1 91 67 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal tem uma função essencialmente informativa, não deixando praticamente espaço para um debate efectivo. As audiências públicas, o formato mais usado nos nossos processos de participação pública, são ambíguas quanto ao contributo e essencialmente expositivas. A informação complexa, é dificilmente apreendida pelos participantes no pouco tempo disponível e o debate é frequentemente considerado insuficiente. Se bem que não representem um problema quando há consenso relativamente generalizado, podem gerar situações de conflito, distanciamento do cidadão e dificuldades de implementação quando o problema em questão for complexo (Vasconcelos, 2001:2). Apesar das vivências da sociedade portuguesa em matéria de participação pública demonstrarem uma evolução favorável, ainda muito há a fazer neste campo. E se é verdade que a participação está mais deliberativa, também o é que, em questões de processos de decisão, como é o caso do POOC, esta é muitas vezes meramente centrada nos interesses de cada um dos intervenientes, sem se ter em conta os benefícios comuns. A explicação deste atraso ao nível da participação pública, comparativamente com outros países da União Europeia, prende-se com diversos factores, nomeadamente a inércia do cidadão, a fraca tradição em termos de participação, talvez fruto do regime político do passado recente, dum desinvestimento ao nível governativo; enfim, diversos factores o justificam, mas nenhum deles se prende com questões legislativas. Com efeito, a questão da não participação pública não se centra ao nível da legislação existente ou ausência de legislação, “ (…) mas antes na adequabilidade dos processos institucionalmente definidos de participação e co-responsabilização dos agentes envolvidos directa e indirectamente nesses processos. Aliás, a actual situação sustenta um elevado grau de desresponsabilização da sociedade civil na definição e implementação das estratégias de planeamento e ordenamento preconizadas, quando a legitimação dos Planos só poderá ser obtida através de um envolvimento informado, activo e alargado de todos os interesses, quer se trate de um simples Plano de Urbanização ou de um Plano Estratégico para a indústria de uma certa região” (Batista 2000). 68 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal 1.7.1 O ASSOCIATIVISMO EM PORTUGAL As alterações verificadas na sociedade, consequência de uma maior industrialização e urbanização aliadas à adesão de Portugal à Comunidade Europeia, que veio exigir a criação de legislação em matéria de ambiente e associativismo ambiental, contribuíram para que a partir desta etapa se registasse uma mudança sem paralelo no movimento ambientalista em Portugal. “É no ano de 1985 que se inicia a viragem decisiva no movimento ambientalista em Portugal em resultado de um vasto conjunto de factores. Desde logo, pelo efeito cumulativo das transformações verificadas na sociedade portuguesa, que vinham simultaneamente criando uma nova sociedade urbanizada e de consumo geradora de impactes sobre o ambiente, e condições para a emergência de novos grupos portadores deste tipo de valores, não só enquanto actores mas também enquanto públicos da acção associativa e política. (…) A interacção destas evoluções com o acréscimo da informação pública sobre problemas ambientais conduziu à actualização das orientações para a formulação política do problema ambiental, conduzindo à criação de estruturas governamentais ligadas ao ambiente. (…) Também o Ano Europeu do Ambiente celebrado, em 1987, cuja campanha se prolongou durante 1988, teve uma função importante; por um lado, pela sensibilização da opinião pública por outro porque permitiu o acesso de algumas associações a meios financeiros que lhe proporcionaram uma consolidação até aí muito difícil” (Carvalho, 2003: 274)92. Assim, para além da criação dos instrumentos políticos citados anteriormente, a legislação portuguesa, com o intuito de tornar os cidadãos mais participativos, criou através da Lei 10/87 de 4 de Abril, as Associações de Defesa do Ambiente. Segundo o artigo 2º, são associações de defesa do ambiente com representatividade genérica: a) As de âmbito nacional; b) As de âmbito regional que para tal sejam equiparadas pelo Instituto Nacional do ambiente. 92 A lei de Bases do Ambiente e a lei das ADA, bem como a criação do então INAMB, em 1987, ao prestarem apoio às associações, são consideradas como marcos importantes no movimento associativo. 69 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal A 18 de Julho de 1998 a Lei nº 35/98 revoga a Lei 10/87 de 4 de Abril e define o estatuto das organizações não governamentais de ambiente93. Entre os diversos direitos que são consignados às ONGA, destacam-se o direito de acesso à informação sobre todos os documentos ambientalmente relevantes: “As ONGA gozam, nos termos da lei, do direito de consulta e informação junto dos órgãos da Administração Pública sobre documentos ou decisões administrativas com incidência no ambiente”; e o direito de participação (Artigo 6) “As ONGA têm o direito de participar na definição da política e das grandes linhas de orientação legislativa em matéria de ambiente”. A actual lei define como ONGA as associações que “visem, exclusivamente, a defesa e valorização do ambiente ou do património natural e construído, bem como a conservação da Natureza, podendo ser consideradas equiparadas a ONGA outras associações, nomeadamente socioprofissionais, culturais e científicas que não prossigam fins partidários, sindicais ou lucrativos para si e para os seus associados, e tenham como área de intervenção principal o ambiente, o património natural e construído ou a conservação da natureza”94. Note-se que o movimento ambientalista em Portugal só atinge contornos definidos a partir de 197495. Até então, exceptuando a Liga para a Protecção da Natureza (LPN), fundada em 1948, no mesmo ano em que foi criada a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), o movimento associativo em Portugal era inexistente, influenciado sobremaneira pelo regime político vigente, repressor de qualquer associativismo ainda que relativamente tolerante para com o cooperativo. Com efeito, é a partir da década de 80 que se assiste à difusão das associações de ambiente em Portugal. No período de 1985-1988 foram criadas 23 associações, duas delas, desempenham, actualmente, um papel preponderante a nível nacional; o 93 As Associações de Defesa do Ambiente (ADA) passam a ser designadas por Organizações Não Governamentais de Ambiente (ONGA) 94 Lei 35/98 de 18 de Julho: Artigos 5º: Acesso á informação; 6º: Direito de Participação; 13º: Mecenato Ambiental; 14º: Apoios: Direito de Antena. Às organizações equiparadas a ONGA não é concedido o direito de representação (citado por Carvalho, 2003: 259) 95 Em 1948 foi fundada a Sociedade Portuguesa de Espeleologia; em 1953 o Centro de Actividades Subaquáticas; em 1957 o Instituto Zoófilo Quinta Carbone; 1963 Os Montanheiros – Sociedade de Exploração Espeleológica. Embora hoje desenvolvam também actividades na área do ambiente, à época surgiram com interesse específico (Adaptado de Carvalho, 2003: 265). 70 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal GEOTA fundado em 1985 (embora com actividade informal desde 1981) e a Quercus em 1986 (iniciando o seu processo de formação em 1984) [Adaptado de Carvalho, 2003:275] (Fig. 9). Fonte: Carvalho, 2003:275 Figura 9 - Registo das ONGA por ano e acumuladas A criação da Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente (CPADA) em 1991 foi um marco importante na consolidação do movimento associativo em Portugal. De lamentar que, por circunstâncias várias, a Quercus e a LPN não integrem esta confederação. “Em 1993 a CPADA congregava já cerca de meia centena de associações, e em 1999 eram cerca de uma centena de ONGA confederadas, de âmbitos nacional, regional e local” (Carvalho, 2003:280). O GEOTA é, do conjunto das três ONGA com maior expressão a nível Nacional, a associação que integrou a CPADA desde a sua fundação. 70 61 60 50 40 35 30 23 20 10 0 ONGA Equiparada Semâmbito Fonte: IA (2007) Figura 10 – Estatuto das ONGA em 2006 (valores absolutos) 71 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Presentemente, em termos do Estatuto existem 119 associações de ambiente registadas. Assim, são classificadas como ONGA 61 (51%), Equiparadas a ONGA 35 (29%) e Sem Âmbito 23 (19%) (Fig. 10). Comparando estes valores com os existentes em 1999 (Fig. 2), cujo total de ONGA eram 147, constata-se que em menos de uma década - embora possa ter surgido novas associações - houve uma diminuição de 28 ONGA. Numa época em que a informação está mais acessível, que a pressão sobre o ambiente, a todos os níveis, é mais intensa, que a educação ambiental já amadureceu e que o apelo à participação pública é intensificado, o decréscimo do número de ONGA, reflectindo a forma como os portugueses se revêem nas questões ambientais, é um fenómeno inquietante. Assim, se em 1999 Portugal contava com 16% de ONGA de Âmbito Nacional, 18% Regional, 31% Local e 35% Não Atribuído, em 2006 registaram-se algumas alterações. Apenas 9% têm atribuição de Âmbito Nacional, 15% Regional, 27% Local e Sem Âmbito 19% (Fig. 11). Sem âmbito 19% Nacional 9% Regional 15% Equiparada 30% Local 27% Fonte: IA, 2006 Figura 11 – Âmbito da actuação da ONGA, 2006 (%) Não deixa de ser interessante constatar que 49% das associações é considerada Equiparada e Sem Âmbito, o que permite deduzir que o movimento associativo deixou de se especializar no tema ambiente, mostrando maior abrangência de temas. Tal pode ser reflexo de questões organizacionais, por aproveitamento de sinergias ou porque, efectivamente o ambiente não se pode dissociar dos restantes problemas vigentes na sociedade contemporânea. 72 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal 70% Ambiental Defesa Património ONGD Tipologia Mistas 22% 4% 4% Fonte: inquérito realizado às ONG (2007) Figura 12 – Tipologia das ONG inquiridas Embora nos inquéritos realizados às ONG96, 70% dos inquiridos afirmar que a sua associação tem uma tipologia ambiental, é de registar que 22% afirma pertencer a uma tipologia mista. Da mesma forma, os projectos desenvolvidos são de natureza diversa; sendo que a opção Educação Ambiental é assinalada por 81% das ONG, independentemente do seu âmbito de actuação (Fig.12). 1.7.2 O EXEMPLO DOS PLANOS DE ORDENAMENTO DA ORLA COSTEIRA Tendo em conta que este trabalho tem como objectivo analisar a participação pública nos POOC, como instrumentos de gestão do litoral, ficarão de fora todos os outros exemplos de envolvimento dos cidadãos nos processos de decisão. Já foram analisados, no item anterior desta dissertação, os Planos de Ordenamento da Orla Costeira ao nível da legislação. Neste ponto será dado enfoque à forma como os cidadãos se manifestaram e se envolveram activamente no decurso da respectiva consulta pública de cada Plano. O facto da aprovação dos planos distar, nalguns casos, 6 anos entre si, é por si só um indicador da forma como entidades responsáveis, sociedade civil e cidadãos em particular, olham para as questões do ordenamento do litoral e para os processos de decisão; diversos entraves, independentemente do âmbito (políticos, económicos ou outro qualquer), condicionaram a elaboração de todos os POOC em tempo previamente estipulado. De referir que o POOC Vilamoura -Vila Real de Stº António, talvez o mais polémico de todos – e não estivesse ele localizado no Algarve, onde o impacte 96 Os inquéritos foram dirigidos a diferentes Organizações Não Governamentais (Ambiente, Defesa Património e Desenvolvimento). 73 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal económico do turismo na região tem um enorme peso e numa área protegida com todos os condicionantes que lhe estão associados - foi apenas aprovado em 2005. Actualmente todos os POOC estão aprovados, independentemente de maior ou menor polémica em torno da sua elaboração (Quadro XI). Quadro XI – Planos Ordenamento da Orla Costeira POOC Caminha/Espinho Áreas Protegidas abrangidas Parque Natural do Litoral Norte (1) Situação Actual do Plano Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 25/1999 de 7 de Abril Ovar/Marinha grande Alcobaça/Mafra Reserva Natural das Dunas de S. Jacinto (2) INAG Sintra /Sado Parque Natural de Sintra/Cascais (3) Paisagem Protegida da Arriba Fóssil da Costa da Caparica (4) Parque Natural da Arrábida (5) Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 142/2000 de 20 de Outubro Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 11/2002 de 17 de Janeiro Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 86/2003 de 25 de Junho Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 123/1998 INAG Aprovado e Publicado R.C.M. nº 136/99 de 2 de Outubro Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 152/1998 de 30 de Dezembro Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 33/1999 de27 de Março Aprovado e Publicado R.C.M. n.º 103/ 2005 de 27 de Junho INAG Cidadela/S. Julião da Telha Sado/Sines Sines/Burgau Reserva Natural das Lagoas de Santo André e da Sancha (6) Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina (7) Burgau/Vilamoura Vilamoura/V. Real de St.º. António Fonte: ICNB Parque Natural da Ria Formosa (8) Entidade INAG INAG ICNB ICNB INAG ICNB O elevado número de instituições com responsabilidades directas em termos de jurisdição na gestão costeira é, à priori, um obstáculo, não apenas para o acto de legislar como de intervir e, indirectamente, até o de exercer uma cidadania activa (Quadro XII). Quadro XII- Resumo das principais instituições com responsabilidade na gestão da zona costeira. Actuação de Âmbito Nacional Actuação de Âmbito Regional e Municipal Actuação de Âmbito Regional (c/ Autonomia) INAG – Instituto da Água ICN – Instituto da Conservação da Natureza IPTM – Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos IGP – Inspecção-Geral de Pescas IPIMAR – Instituto de Investigação das Pescas e do Mar DGRF – Direcção-Geral dos Recursos Florestais DGT – Direcção-Geral de Turismo DGPA – Direcção-Geral de Pescas e Aquicultura INETI – Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação DGAM – Direcção-Geral da Autoridade Marítima IH – Instituto Hidrográfico AP – Administrações Portuárias CCDR – Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional ARS – Administração Regional de Saúde Capitanias Autarquias Governo Regional dos Açores – Secretaria Regional do Ambiente e do Mar Governo Regional da Madeira – Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais Fonte: Relatório Nacional Preliminar da Execução sobre Gestão Integrada da Zona Costeira (2002:16) 74 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Apesar da grande maioria destas instituições pertencer, ao Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, existe um conjunto de outros organismos com tutelas diversas que face às suas competências em políticas sectoriais tem interferência directa sobre a zona costeira97. Como se observou na figura 598, a preparação dos POOC é acompanhada por uma Comissão Técnica de Acompanhamento que envolve diversas entidades ficando a sua elaboração a cargo, muitas vezes de entidades independentes aos organismos que têm responsabilidade sobre o respectivo Plano. A título de exemplo, cite-se que o Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sintra -Sado foi elaborado pelo Consórcio PLURAL99. Para cada Plano a respectiva entidade (INAG ou ICNB) disponibiliza os elementos para consulta na Internet, no respectivo Sítio, estando ainda disponíveis nas autarquias dos respectivos concelhos e CCDR, entre outras entidades, de acordo com o disposto na lei. Toda a informação relativa ao POOC é ainda entregue à Comissão Técnica de Acompanhamento (CTA) e respectivas entidades convidadas desta Comissão. Relativamente às modalidades de publicitação esta é feita, de uma forma geral, por Anúncio da discussão pública em Diário da República, é afixada em Edital e publicada em aviso em jornais de âmbito nacional, regional e local. No que concerne à forma de elucidação dos interessados, é geralmente utilizado o modelo tradicional de participação, isto é, são organizadas sessões públicas de esclarecimento pelas entidades responsáveis. No âmbito desta dissertação e, como forma de colmatar algumas falhas na informação contidas nos Relatório de Apreciação do Inquérito Público, foram efectuadas duas entrevistas às técnicas do INAG e do ICNB responsáveis pelos POOC100.(Anexo 2). Da análise das entrevistas realça-se a caracterização do tipo de participação pública que é mais uma consulta pública que um exemplo de participação propriamente dita mas que as discussões públicas têm vindo a ser cada vez mais participadas. Os 97 (Adaptado de Relatório Nacional Preliminar da Execução da Recomendação 2002/413/CE, de 30 de Maio, sobre Gestão Integrada da Zona Costeira, 2002:16) 98 Página 61 deste documento 99 http://www.biodesign.pt (visitado a 20 de Outubro 2007) 100 As entrevistas foram realizadas a 21 de Março e 24 de Abril de 2007, respectivamente ICNB e INAG. 75 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal cidadãos continuam, de uma forma geral, mais interessados em defender o «seu quintal» que acertadamente, pensar no ordenamento como um todo Tal é mais visível em POOC em que a ocupação do litoral é mais intensa, como ocorreu com o mais recente plano Vilamoura/Vila Real Santo António e com o iniciante Caminha - Espinho. Em ambas as entrevistas há um realçar da evolução da participação pública nos processos de decisão” Ainda assim tem havido uma evolução positiva na medida em que as pessoas, que participam durante a fase de discussão pública, tem apresentado um maior conhecimento das propostas e tem apresentado sugestões concretas para permitir a sua adequada ponderação no âmbito das opções do plano, e em determinadas situações tem fundamentado alterações às opções iniciais colocadas a discussão. Prevalece uma visão individual e é evidente a falta de consciência colectiva para consolidar o que se pretende que possa ser um processo de participação pública com o envolvimento de diferentes sectores de actividade durante as várias fases de elaboração do plano” (Henriques, INAG). Para além das entrevistas efectuadas forma consultados relatórios de apreciação do inquérito público a cada um dos POOC. Desta consulta tentou-se, primeiramente, encontrar pontos comuns a todos os Planos (Quadro XIII). Quadro XIII – Possíveis Pontos comuns aos POOC Categoria dos Participantes Natureza das participações Tipo de alterações efectuadas após as participações Distribuição espacial das participações Abaixo assinados Associações Autarquias locais Concessionários Particulares (Individuais, Colectivos) Comentários propondo alterações que reforçam os aspectos de protecção Comentários propondo reforço das áreas edificadas Comentários específicos aos Planos de Praia Comentários de natureza jurídica Comentários de concordância com os POOC Comentários à organização do Inquérito Público Comentários diversos Comentários específicos às UOPG (unidades operativas de planos de gestão) S/ comentários Comentários de natureza jurídica Comentários específicos aos Planos de Praia Comentários propondo alterações que reforçam os aspectos de protecção Comentários propondo reforço das áreas edificadas S/ alterações Respectivos concelhos Todavia, verificou-se que nem sempre havia equiparação nos parâmetros estudados o que dificultou uma exacta comparação. Na justificação desta não coesão pode estar o 76 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal facto dos planos serem feitos por entidades diferentes e/ou por distarem muito temporalmente. Os respectivos relatórios, disponíveis para qualquer pessoa que os solicite, permitem comprovar não só a existência da forma tradicional de participação pública como o tipo de intervenção solicitada. A título de exemplo analisa-se o relatório de apreciação do Inquérito Público do POOC Caminha-Espinho, realizado em 1999. No que respeita à participação, o inquérito teve a seguinte distribuição: (Fig. 13) Pa rticu la res e e m pre s a s 8 1,9 % C ap itan ia s 0 ,3 % "C o nce s s io n á rio s " d e Pra ia 1 1 ,6 % Ju n ta s d e Fre g u e s ia 4 ,1% As s o cia çõ e s e ON G 2 ,1 % Fonte: INAG (1999) Figura 13 – Distribuição dos participantes Segundo o Relatório de Apreciação do Inquérito Público101, a metodologia utilizada foi a seguinte: Construção de uma “ficha-resumo” de cada participação, onde a informação era agrupada de acordo com os comentários recebidos (Propondo alterações reforçando os aspectos de protecção; propondo alterações reforçando a expressão das áreas edificadas; específicos aos Planos de Praia; de natureza jurídica; em concordância com as propostas dos POOC; à organização do inquérito público; sem comentários). A figura 14 mostra as alterações efectuadas após a análise das fichas de alteração; estas modificações prendem-se com os apoios de praia (11%). Tal vem confirmar a opinião geral que são os indivíduos com interesses directos nos POOC quem mais se manifesta. 101 FBO Consultores, cedido em formato impresso pelo INAG 77 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal S/ alterações 87,5% Regulam ento 0,3% m ais edificação 0,9% m ais protecção 0,3% Planos de Praia 11,0% Fonte: INAG (1999) Figura 14 – Alterações realizadas A figura 15 apresenta a participação por Município compreendido no POOC CaminhaEspinho. A esmagadora maioria das participações (63%) foram do concelho de Póvoa do Varzim. O tipo de proposta apresentada prendeu-se com a criação de mais áreas de utilização livre e recreativa. Póvoa do varzim 63,0% Vila do Conde 19,2% Geral 0,3% Esposende 5,5% Viana do Castelo 2,5% Caminha 3,3% Matosinhos 2,0% Vila Nova de Gaia 3,8% Espinho 0,3% Fonte: INAG (1999) Figura 15 – Participação por Município Este é apenas um exemplo dos dados obtidos através dos relatórios de apreciação do inquérito público. Embora cada processo seja único, o resultado não difere de forma substancial. O que corrobora a ideia de que a participação pública nos processos de decisão, nomeadamente do POOC está muito vocacionada para os interesses que se prendem com os apoios de praia. 78 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal 1.8 PARTICIPAÇÃO SOCIAL 1.8.1 O INCENTIVO DAS ONG À PARTICIPAÇÃO PÚBLICA Após nos termos debruçado sobre o movimento associativista e sobre o envolvimento dos cidadãos nos processos de decisão, nomeadamente os POOC, importa compreender de que forma as Organizações Não Governamentais incentivam a participação pública. Neste contexto foram elaborados, no âmbito deste trabalho, 89 inquéritos a diferentes ONG (Ambiente, Desenvolvimento e Defesa de Património). Como premissa, o questionário só se dirigia a ONG que desenvolvessem trabalhos no âmbito do litoral e estava dividido em três partes, uma identificativa da ONG e das suas características, outra direccionada para os projectos/acções desenvolvidas no âmbito do litoral e uma terceira dedicada à participação pública (Anexo 3). Nas duas primeiras partes, o inquérito tinha os seguintes objectivos: • Identificar as características da ONG (é uma organização não governamental de Ambiente, de património, de desenvolvimento, outro…); • Indicar o interesse manifestado na área do ambiente, caso a ONG tenha outra tipologia; • Identificar a área de intervenção geográfica do trabalho desenvolvido pela OMG; • Especificar a tipologia dos trabalhos desenvolvidos no litoral; • Assinalar as acções que desenvolve no âmbito dos projectos (organiza acções, palestras, reuniões, ou outras…?); • Apresentar uma estimativa das pessoas envolvidas e a sua faixa etária; • Conhecer se existem ou não parceiros na dinamização das actividades e que tipo de parceiros (Autarquias, empresas, outras associações, escolas, universidades…?). Dos 89 de inquéritos enviados recebemos apenas 39 respostas; 12 das quais informando que não desenvolviam trabalhos neste âmbito. A pesquisa dos contactos foi desenvolvida via internet mas muitos dos endereços não se encontravam actualizados; sobretudo o e-mail, por isso a devolução de inquéritos foi considerável. Apesar do universo estatístico ser muito reduzido, o que implica um fraco grau de representatividade, segue-se a análise das 27 respostas válidas. 79 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal A figura 16 mostra o universo das ONG respondentes. Assim, 18 são ONGA, 1 é ONGD, 1 de Defesa do Património. Das seis associações que responderam ter uma tipologia mista, 5 são ONGA e Defesa do Património e 1 ONGA e ONGD. Figura 16 – Tipologia das ONG inquiridas Relativamente ao ano de formação da ONG, verifica-se que 27% foram formadas em 1987 ou em data anterior (como já foi referido anteriormente, 1987 corresponde ao período em que foi publicada a legislação sobre Associações de Defesa de Ambiente). 66% formaram-se entre 1988 e 2002. No período mais recente, entre 2003 e 2007 apenas se formaram duas ONG (7%). Mesmo com a percentagem de erro intrínseca a um reduzido universo estatístico, pode-se afirmar que existe uma clara diminuição na formação de novas ONG (Fig. 17). Ano de formação da ONG 7% 27% 22% 2003-2007 1998-2002 1993-1997 1988-1992 ≤1987 22% 22% Figura 17 – Ano de Formação da ONG As respostas recebidas apontam para uma clara predominância de ONG de carácter Nacional (47%), seguidas das de carácter Local e Regional. Duas delas (10%) têm uma abrangência internacional (Fig. 18). 80 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal 5% Âmbito da ONG 10% Internacional 28% nacional regional local outra 47% 10% Figura 18 – Âmbito da ONG No que respeita ao âmbito de actuação, independentemente do estatuto, a lei define que “As associações de âmbito nacional deverão ter pelo menos 2000 associados, as de âmbito regional pelo menos 400 associados e as de âmbito local pelo menos 100 associados” (Carvalho, 2003:260). Contudo, 30% dos inquiridos afirma que a sua associação tem um número inferior a 200 associados, muito próximo do indicado para as ONG de carácter local. Tendo em conta que 47% afirmou ter um âmbito nacional é de estranhar que apenas 19% apresente mais de 2000 associados, condição indispensável, segundo a lei, para que tal âmbito lhe seja atribuído (Fig. 19). 19% 30% No de sócios < 200 200-400 401-1999 ≥2000 36% 15% Figura 19 – Número de associados das ONG inquiridas Dos inquiridos que responderam ter entre 401-1999 associados (36%) também existem associações carácter local, para além do regional, o que quer dizer que não é apenas o número de associados que as leva a candidatar-se a um âmbito mais abrangente. A título de exemplo realça-se a Associação A Rocha, de âmbito local, com 490 associados. A figura 20 reflecte a localização das ONG por NUT II. Apesar de alguma heterogeneidade na dispersão, é a NUT Lisboa que apresenta uma maior concentração de ONG (45%), seguida da região Centro (26%). Não existe qualquer resposta de ONG 81 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal localizadas no arquipélago da Madeira. As ONG localizadas no Alentejo, Algarve e Açores são de âmbito local. Existindo apenas três ONG localizadas na NUT Norte, o seu âmbito é nacional, regional e local, duas são de ambiente e uma apresenta uma tipologia mista – ambiente e defesa do património. 7% 7% 0% Localização 11% Norte 26% 4% Centro Lisboa Alentejo Algarve Açores Madeira 45% Figura 20 – Localização das ONG por NUT II No que concerne à tipologia dos projectos desenvolvidos na área do litoral, 76% das ONG desenvolve projectos relacionados com o ambiente e com a educação ambiental, independentemente do âmbito. A referência a Outros é diversa e varia entre o desenvolvimento de projectos na área do desporto, educação para a paz, investigação científica e educação cívica (Fig. 21). 7% 10% 7% Tipologia dos Projectos cultural património Ambiente/EA outros 76% Figura 21 – Tipologia dos projectos A percentagem de projectos desenvolvidos dentro da temática da Educação Ambiental mostra a importância que este tipo de formação ainda desempenha na actualidade; o que acaba por se reflectir nos princípios das associações, em especial as ONGA, implicando um investimento a este nível, nomeadamente com o desenvolvimento de actividades que promovem práticas de Educação e cidadania Ambiental. 82 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal São disto exemplo projectos como o Coastwatch Europe; Eco-escolas; repórteres do ambiente; e muitos outros, que embora desenvolvidos a nível regional, têm uma incidência sobre ecossistemas ou temáticas específicas, desempenhando um papel preponderante ao nível do desenvolvimento sustentável (e.g. plantação de vegetação autóctones em dunas; limpeza das praias; sensibilização para a preservação de diversas espécies ameaçadas, etc.). Em termos de acções desenvolvidas as ONG variam entre Formação (38%); Seminários/Encontros/Colóquios (35%) e Outros (27%), nesta categoria estão abrangidas actividades variadas: exposições, percursos pedestres, notas de imprensa, etc. (Fig.22). 27% Tipologia das actividades 38% Formação Semin/Enc./colóquios outras 35% Figura 22 – Acções desenvolvidas no âmbito dos projectos Do total das associações inquiridas, 67% afirma recorrer a parceiros para a dinamização das actividades. O leque de entidades a que as associações recorrem para dinamizar as acções é diverso, contudo, regista-se uma certa preponderância para os estabelecimentos de ensino (31%). Embora o ensino básico e secundário desempenhe um papel predominante, o uso de parcerias com estabelecimentos de ensino ao nível superior é igualmente significativo no universo estatístico considerado. 19% 1% Parcerias autarquias locais 19% outras ONG 15% 31% 15% Empresas/outros agentes economicos Estab. Ens ino (basico/sec/superior) outras n responde Figura 23 – Tipologia das entidades parceiras na dinamização das acções 83 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Por questões óbvias que se prendem com factores económicos é cada vez maior o número de parcerias desenvolvidas com as autarquias e empresários/outros agentes económicos (respectivamente 19% e 15%). Contrariamente ao que seria de supor apenas 10 associações recorre a outras ONG como parceiras na dinamização das actividades. No item outras estão incluídas parcerias muito díspares (comércio Justo, projectos diversos – Crew Hassam; Cores do Globo, etc. – esc(u)oteiros, entre outros) [Fig.23]. A faixa etária dos participantes, embora com alguma variedade, reflecte uma tendência para o envolvimento de um público jovem e adulto – 60% estima que o público-alvo tem entre 16-45 anos. Apenas 18% desenvolve actividades direccionadas para um público com menos de 15 anos. As acções que envolvem a faixa etária >45 anos estão, especialmente, relacionada com turismo sustentável, percursos pedestres e defesa património (Fig.24). 30% Faixa etária < 15 16-30 31-45 30% 21% >45 n responde 1% 18% Figura 24 – Faixa etária dos participantes Na parte dedicada à participação pública o questionário teve como objectivos: Compreender se existe preocupação em desenvolver acções com vista a formar/informar a população, em caso de situações pontuais que interfiram com o ordenamento (por exemplo: construção de marinas, esporões, campos de golfe ou outros projectos); saber a estimativa de participantes nas acções e a sua faixa etária; Analisar a participação pública (como se comportam os cidadãos face a problemas que lhe dizem respeito e que ocorrem na faixa do litoral onde residem, passam férias (?) ou desenvolvem a sua actividade económica? Se são reactivos, pró-activos, passivos conflituosos?); e Compreender o comportamento da participação pública nos últimos anos. Os cidadãos são, ou não, mais activos, participativos, empenhados? 84 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal 15% Sessões de esclarecimento 41% corrente ano 1-3 anos mais de 3 anos atrás 44% Figura 25 - Organização das Sessões de esclarecimento À pergunta “Em caso de projectos/acções que vão interferir com o litoral na área de influência da ONG, organiza sessões de esclarecimento para a população? responderam 52%. Destes 41% organizou as sessões de esclarecimento há mais de 3 anos, 44% 1-3 anos e 15% no corrente ano (Fig.25). As associações estimam que o público-alvo nas sessões de esclarecimento seja predominantemente adulto, 60% entre 16-45 e 23% com mais de 45 anos. Apenas 17% tem menos de 15 anos (Fig. 26). 23% 17% Faixa etária <15 16-30 31-45 31% >45 29% Figura 26 – Faixa etária dos participantes nas sessões de esclarecimento 74% das ONG inquiridas considera haver, nos últimos anos, um maior envolvimento dos cidadãos nas questões ambientais relacionadas com o litoral. Destas, 61% classificam os cidadãos como mais participativos (os cidadãos expressam a sua opinião, dão sugestões, levantam questões); 15% consideram a participação pública passiva (os cidadãos ouvem os oradores mas não interferem nem manifestam opinião). 85 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Em igual percentagem (8%) os inquiridos consideram a participação controversa (os cidadãos levantam polémica sobre o tema que é bastante discutido e debatido) e conflituosa (Os cidadãos levantam problemas de uma forma irritável, gera-se alguma desordem). Na hipótese outra – com 8% – foi assinalada a seguinte classificação “Um misto do que é referido, dependendo da temática, com predominância da opção passiva” (Fig. 27). 8% 8% Classificação da participação participativa 8% passiva controversa 15% 61% conflituosa outra Figura 27 – Classificação da participação pública. Não obstante o reduzido número de respostas à questão em que se solicitava “Especifique de que forma considera haver um maior envolvimento dos cidadãos nas questões ambientais”, algumas ONG opinam que as camadas mais jovens estão mais atentas. Outras afirmam que em termos de ordenamento do litoral existe uma maior participação dos cidadãos por se sentirem directamente afectados. No entanto, há também a opinião, por parte de algumas ONG, que existe uma maior passividade dos cidadãos. O universo estatístico, já por si reduzido, aliado ao fraco número de respostas à questão, não permite tirar conclusões válidas. 1.8.2 DOIS EXEMPLOS PRÁTICOS DE DINAMIZAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO PÚBLICA O GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente), constituiu-se legalmente em 1986 mas desenvolve actividades desde 1981. É uma associação aberta à participação de todos os interessados e conta actualmente com associados residentes em todo o País e no estrangeiro. Cerca de 75% dos associados têm menos de 30 anos, o que evidencia uma clara uma predominância de jovens, muitos com formação universitária. Actualmente o GEOTA mantém protocolos de cooperação com diversas associações; tem ajudado a criar e desenvolver várias associações locais; participou na comissão instaladora da Confederação Portuguesa das Associações de 86 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Defesa do Ambiente, estando ainda inserido num conjunto de redes internacionais, onde intervém regularmente no sentido de contribuir para a resolução de problemas globais. “Destaque-se a participação no European Environmental Bureau (EEB), na European Union for Coastal Conservation (EUCC), no Med FÓRUM – Rede Mediterrânea para a Ecologia e o Desenvolvimento Sustentável, no Conselho Ibérico para a Conservação da Natureza (CIDN), nos European Partners for the Environment (EPE) e no Seas at Risk (SAR), assim como as relações de trabalho pontuais com o World Wildlife Fund (WWF) e com o Stichting Natuur en Milieu”102. Os seus princípios de actuação são simples e claros, desenvolvendo acções em diversas áreas: conservação, educação ambiental, sensibilização, ordenamento do território, energia, solos, transportes e mobilidade, alterações climáticas, património, resíduos, meio marinho, entre outras; tendo sempre patente o Desenvolvimento Sustentável. Com efeito, estando sempre atento aos problemas procura informar, formar e desenvolver acções que conduzam à participação pública. Neste âmbito serão aqui focados dois exemplos que o GEOTA desenvolveu recentemente com vista à informação e envolvimento dos cidadãos num claro exercício de cidadania e participação pública: erosão costeira em S. João da Caparica e construção da IP2 – Variante de Estremoz (Anexo 4). Enquanto no caso de S. João da Caparica estava em causa o investimento por parte do INAG nesta praia como forma de travar o avanço do mar; no exemplo da Variante de Estremoz a inexistência de estudos alternativos e comparativos de impactes da proposta de construção da referida variante, tanto em termos financeiros como ambientais, o comprometimento da enorme reserva de água pelo actual traçado, a destruição de vários hectares de montado, de vinhas emblemáticas e de uma mancha de oliveiras centenárias em São Brissos, estiveram na base da organização da sessão pública de esclarecimento à população. Assim, no que respeita a S. João da Caparica, quando o GEOTA decidiu organizar a sessão pública de esclarecimento sobre Erosão Costeira e Ordenamento do Território 102 www.geota.pt 87 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal na Costa da Caparica há muito que o tema se debatia pela opinião pública, sobretudo dinamizado pela comunicação social, numa calorosa preocupação e discussão entre erros de ordenamento, a montante (geograficamente e temporalmente), as alterações climáticas e a inoperância das entidades responsáveis. Os comentários veiculados pelos meios de comunicação eram diversos, divergentes e na maior parte dos casos com um carácter reduzido de informação útil para a população em geral. O GEOTA para além de ambicionar informar a população e proporcionar um momento de debate e de participação pública, o que faz parte das suas funções, pretendia que fossem conhecidas as razões que motivaram um mega investimento no reforço das praias de S. João da Caparica. A sessão pública juntou mais de 180 pessoas que, após receberem informação/formação dos diferentes intervenientes, colocaram questões que permitiram um caloroso debate sobre o tema. À data da sessão de esclarecimento (26 de Janeiro de 2007) o GEOTA questionava se a reconversão urbanística de 123 hectares, incluindo a construção de unidades hoteleiras e campo de golfe poderia estar na base da justificação de uma obra de “engenharia pesada” com custos estimados pelo INAG na ordem dos 15 milhões de euros. Esta obra, a iniciar-se ainda em 2007, destinava-se, alegadamente, a promover a estabilização da linha de costa actual em S. João da Caparica através do reforço dos esporões e do enchimento artificial das praias com areias dragadas em off-shore. Apesar de representantes das autarquias estarem presentes na sessão de esclarecimento esta opção não foi discutida publicamente. Ao invés foram os eventuais danos produzidos em apoios de praia e parques de campismo que forneceram as justificações de investimentos tão avultados. Mas, como afirmou Francisco Andrade, professor de Gestão e Ordenamento Costeiros na FCUL e especialista em modelos de valorização do litoral, “a realização das ditas obras de «engenharia pesada» não pode ter justificação cabal apenas com base na defesa de apoios de praia e parques de campismo, como se pretende fazer crer. Um simples estudo de custo-benefício mostraria facilmente que sai muito mais barato ao erário público indemnizar os eventuais afectados do que realizar as projectadas obras 88 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal de protecção costeira, mesmo sem contar com os custos de manutenção que teriam de se realizar indefinidamente” (Andrade, 2007). O GEOTA não estava e continua a não estar contra qualquer tipo de projectos de reconversão urbanística que se proponha para aquela parcela do território, mas exige que sejam colocados publicamente com a máxima transparência e sujeitos aos mecanismos de avaliação de impacte ambiental previstos na lei. Exigia-se, igualmente, que as obras que se preconizam com o objectivo de promover a estabilização da linha de costa actual em S. João da Caparica através do reforço dos esporões e do enchimento artificial das praias com areias dragadas em off-shore fossem também sujeitas a procedimento de avaliação de impacte ambiental. Não obstante considerar que devem ser salvaguardados os direitos dos residentes e utentes das praias de S. João da Caparica, o GEOTA chamou à atenção para o facto de outros trechos da costa portuguesa se encontrarem sob tanta ou mais pressão que a Caparica, sem contudo mobilizarem investimentos de monta. Na sua postura enquanto ONGA, o GEOTA reafirmou, e continuará a fazê-lo, que a generalidade do que é feito em Portugal apenas pretende debelar os sintomas sem nunca ir à raiz dos problemas e que sem se conhecer as causas, não podem ser combatidas as consequências. A erosão costeira é o produto de fenómenos naturais potenciados pela acção humana: aumento da frequência das tempestades em resultado das alterações climáticas globais, alterações na dinâmica litoral e fluvial (incluindo extracção de areias), retenção dos sedimentos nas barragens, construção em áreas sensíveis e acesso desordenado às praias são algumas das causas que concorrem para o aumento do número e da intensidade dos eventos erosivos no litoral e que precisam de ser atacadas de forma consequente aos mais diversos níveis, tendo por base uma política coerente de ordenamento do território. Muito embora se registasse uma falta de consenso sobre as soluções para a resolução do problema, a sessão pública funcionou como um bom exemplo de participação em questões que dizem directamente respeito aos cidadãos (Figuras 27-29). 89 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal Figura 28 - A observação antes do debate Figura 29 - A Sessão de abertura e a Sessão técnica Figura 30 - O Público e a participação Outro exemplo, de sensibilização e dinamização de participação do público, que o GEOTA tem vindo a desenvolver de uma forma muito positiva prende-se com o caso de estudo da Variante a Estremoz. 90 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal O projecto “IP2-Variante a Estremoz e reformulação do Nó com a EN4” foi recentemente objecto de Declaração de Impacte Ambiental103 desfavorável por parte do Ministério do Ambiente, o que obrigará o proponente Estradas de Portugal, E.P. a reformular todo o projecto, nomeadamente com a apresentação de corredores alternativos, para que possa ser seleccionado aquele que apresente menores impactes ambientais. Este facto, em si, não constituiria ocorrência excepcional pois, embora não seja a regra, existe uma percentagem, ainda que bastante pequena, de projectos que não obtém declaração de impacte ambiental favorável104). O que é relevante é a Declaração de Impacte Ambiental, ter sido fundamentada no teor do Parecer Final da Comissão de Avaliação (CA), destacando como um dos aspectos cruciais da decisão “a Consulta Pública que foi muito participada, apresentando uma fundamentação objectiva para os impactes negativos no uso do solo e da sócio economia”. De referir que o procedimento de avaliação de impacte ambiental relativo a este projecto tem antecedentes com mais de uma década: começou por ser instruído em Novembro de 1995 tendo-se concluído, já na altura, pela reformulação do Estudo de Impacte Ambiental (EIA). Em Janeiro de 1997, e após apresentação de relatório complementar ao EIA, a CA insiste na necessidade de estudar alternativas ao traçado, o que, no entanto, não demoveu o proponente de persistir numa solução única” (adaptado de Costa, 2007)105. A contestação a este era reduzida, até porque havia uma clara ausência de esclarecimento público sobre o tema. Foi o envolvimento do GEOTA neste processo que veio servir como motor de arranque no processo de participação pública. “O primeiro momento crucial de viragem do processo ocorre quando os contestatários decidem unir esforços e apresentar petições em conjunto, pondo em causa o traçado no seu todo. É a altura dos abaixo-assinados, que culmina com a contratação do advogado José Sá Fernandes, que consubstancia em documento único de participação 103 A Declaração de Impacte Ambiental é a peça que culmina todo o procedimento de avaliação de impacte ambiental de projectos susceptíveis de produzir impactes ambientais, regulado pelo Decreto-Lei n.º 69/2000 de 3 de Maio, com a redacção que lhe é dada pelo Decreto-Lei n.º 197/2005, de 8 de Novembro. 104 A Declaração de Impacte Ambiental pode ser favorável, desfavorável, ou favorável condicionada (à aplicação de um conjunto de medidas mitigadoras dos impactes). 105 Boletim Geotàlupa, Novembro 2007 91 Capítulo 2 – Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal na Consulta Pública, as contribuições de todos os queixosos. O segundo momento decisivo do processo sucede com o empenhamento activo das ONGA, designadamente do GEOTA. É o momento da passagem de uma fase recuada em torno da discussão do processo em si, para a fase de organização, generalização e debate público das questões mais abrangentes. Por aconselhamento do GEOTA os contestatários decidem formar uma associação local, a S. Brissos – Cidadãos pelo Ambiente e Desenvolvimento de Estremoz que organiza o primeiro debate público não tutelado pelo poder (local ou outro) em décadas nessa cidade. Nesse debate público a discussão muito participada do projecto da Variante, mas também da sua implicação nas opções de desenvolvimento do concelho e da região surpreende os próprios organizadores e terá tido influência no desfecho do processo de avaliação do impacte ambiental, ao ocorrer num momento em que as Estradas de Portugal, E.P. poderiam ainda inverter a situação a seu favor, ao beneficiarem em exclusivo de um período de Audiência Prévia para contestação do parecer não vinculativo da CA” (Costa, 2007, documento interno do GEOTA). O desfecho foi favorável para os cidadãos envolvidos, quer pela não construção do traçado, quer pela experiência e exemplo de sucesso de participação pública e cidadania. Apesar de se relatarem apenas dois exemplos de sucesso do estímulo à participação pública por parte da ONGA, o GEOTA tem vindo a desenvolver acções semelhantes para apoiar os cidadãos, com o intuito de resolverem problemas de interesse social ao nível de processos de decisão. 92 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch CASO DE ESTUDO: O PROJECTO COASTWATCH 1.9 O COASTWATCH NA EUROPA O Projecto Coastwatch é um projecto europeu lançado em 1988106 na Irlanda, por Karin Dubsky107; em 1989 foi implementado em Portugal através do GEOTA Tinha como principais objectivos sensibilizar para a educação ambiental e alertar os participantes (especialmente o público escolar) para a importância de monitorizar os ecossistemas do litoral como forma de os defender e preservar. Dadas as suas características e a época em que surgiu – com a educação e a cidadania ambiental em expansão – a adesão ao projecto em diferentes países europeus com linha de costa foi elevada nos primeiros anos do seu aparecimento, chegando a formar uma rede de 23 países. No entanto, uma das grandes falhas do Coastwatch, enquanto projecto internacional, foi a inexistência de uma verdadeira rede internacional, com uma Base de Dados comum. A ausência de feed back entre os países participantes e a fraca coordenação internacional, não só inibiu a formação de um fio condutor comum à implementação do projecto como dificultou uma análise correcta da situação do projecto, em cada país participante. Infelizmente e não obstante alguns contactos por e-mail e uma reunião presencial com a coordenadora internacional, não foi obtida qualquer resposta às perguntas solicitadas e que seriam de todo imprescindíveis para uma boa análise da conjuntura actual do projecto (e.g. quantos países actualmente compõem a rede Coastwatch, em que datas os países foram aderindo e abandonando o projecto, como é feita a dinamização, quais os resultados obtidos, como se divulgam, intervenção das autoridades competentes a partir da divulgação dos resultados, etc.). Por aquilo que foi possível saber através de contactos informais, alguns países foram abandonando o projecto, outros participaram apenas no início; a existência de 106 www.coastwatch.org Karin Dubsky é Eng.ª Civil e docente no Trinity College em Dublin 107 93 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch contactos e/ou webpáginas inactivas ou ainda a ausência de resposta a e-mail enviados a solicitar informações, mostra que em muitos dos países inicialmente envolvidos o projecto já não está a ser desenvolvido; pelo que não é possível transmitir com rigor, a situação actual estado do Coastwatch ao nível europeu. Dos contactos encetados apenas foi possível obter resposta oficial da coordenação espanhola, a qual afirma que o projecto ficou inactivo após o incidente com o Prestige, sem contudo, apontar data para reactivação do mesmo. O forte impacte que o incidente do Prestige, em 2002, teve na costa da Galiza, com elevados níveis de poluição, foi um factor determinante para pôr termo ao Coastwatch Espanha, que já se apresentava em decadência. No caso de Itália108, foi efectuado um contacto não oficial que informa que o projecto também se encontra inactivo temporariamente. Alguns países como é o caso da Noruega109, Alemanha110, Holanda111 e Portugal, criaram uma dinâmica própria para o projecto e é este dinamismo que tem permitido a sua manutenção contínua. Apesar de ligeiras alterações, o que estes países têm em comum, é o facto utilizarem o projecto Coastwatch como ferramenta de apoio às escolas. Por diversos motivos, conjunturais ou não, foram surgindo, sobretudo na União Europeia, um número crescente de programas vocacionados para a sensibilização do público com vista à protecção do litoral e/ou do oceanos. Tal, induziu à adesão de muitos países a estes novos projectos. Alguns integraram o Coastwatch, outros dedicaram-se em exclusivo ao projecto que foram surgindo. A título de exemplo: o “De Noordzee112, dinamizado pela Holanda, inclui as actividades de monitorização do Coastwatch; e o “Global Garbage” desenvolvido a nível mundial, embora com sede na Alemanha. Perante este cenário a abordagem ao Coastwatch na Europa fica aquém do que seria esperado e, por se tratar de um projecto internacional, do que seria essencial conhecer. 108 http://ww2.unime.it/scienze-terra/cwn.htm http://miljolare.no/kyst 110 http://213.239.198.103/coastwatch 111 http://www.coastwatch.nl 112 http://www.noordzee.nl/ 109 94 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch 1.10 COASTWATCH EM PORTUGAL Quando o Projecto Coastwatch foi apresentado ao GEOTA, numa reunião internacional, trabalhar a (e para a) educação ambiental, era o desafio e as associações de ambiente, um pouco por todo o país, independentemente do seu carácter (local, regional ou nacional) desenvolviam projectos vocacionados para esta temática. Neste sentido, o GEOTA aceitou coordenar o projecto a nível nacional e dinamizou-o ao ritmo que o voluntariado e o associativismo permitiam. Apesar de, durante quase uma década, os coordenadores nacionais que passaram pelo projecto funcionarem em regime de voluntariado ou a desenvolver estágios de formação profissional, o Coastwatch foi ganhando terreno e enraizando-se nos hábitos dos participantes. Porém, é com a assinatura do protocolo entre os Ministérios com tutelas na Educação e no Ambiente, em 1996, – protocolo que se mantém até à actualidade – que o projecto ganha novo fôlego. O GEOTA passa a dispor de um professor requisitado a tempo inteiro, cuja relação de proximidade com as escolas, permite uma maior dinamização e envolvimento dos docentes e alunos, num claro benefício para o Coastwatch. 1.10.1 OBJECTIVOS O projecto Coastwatch, como outros de Educação Ambiental, tem um vasto leque de objectivos que poderão ser atingidos a diferentes níveis, de acordo com a exploração e dinamização das diferentes entidades/participantes. Sabendo que a maioria das entidades envolvidas no projecto são escolas dos diferentes níveis de ensino, os seus objectivos vão de encontro aos programas das diversas áreas curriculares e aos princípios orientadores das áreas não curriculares. Por outro lado, os agrupamentos de escuteiros, associações, ONGA ou outras entidades, encontram no Coastwatch uma forma de pôr em prática muitos dos ensinamentos que fazem parte da sua filosofia. O projecto serve, ainda, de base a jornalistas, investigadores, entidades públicas e outros interessados que necessitem de dados actualizados sobre o litoral português, quer seja para informação, pesquisa, ou outra componente. 95 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch E porque se monitorizam diversos parâmetros, a informação ao público em geral, através da divulgação dos resultados de cada campanha Coastwatch é, para além de um objectivo, uma tentativa de envolver os cidadãos nos problemas da sociedade. Constata-se assim que o Coastwatch – por ter um grande investimento ao nível da formação de hábitos de cidadania e sustentabilidade – envolve um elevado número de participantes e entidades, motivando-os para a participação pública, essencialmente nas questões relacionadas com a biodiversidade, no seu conjunto, e em particular com os ecossistemas do litoral, já de si frágeis e com forte impacte da actividade antrópica. “Todos os que se preocupam com a perda da biodiversidade sabem que este problema só pode ser resolvido se houver mudanças no comportamento dos cidadãos. Para alterar comportamentos pode-se recorrer a instrumentos compulsórios e/ou voluntários. Enquanto que os primeiros requerem um investimento, por vezes proibitivo, em fiscalização para assegurar a sua implementação, os últimos apresentam vantagens substanciais pois têm um maior potencial para contribuírem para um grau mais elevado de co-responsabilização dos participantes, elemento essencial para atingir a tão preconizada sustentabilidade” (Vasconcelos, 2001:1). Por outro lado, um projecto que envolve cerca de 5000 participantes todos os anos, dá um enorme contributo para a actividade de monitorização, que frequentemente sente a falta de capital humano. Como refere Vasconcelos (2000) “Numa altura em que existem recursos limitados, não sendo possível colocar fiscais por todo lado, e em que frequentemente os problemas necessitam do envolvimento de mais do que uma organização para serem resolvidos, este novo formato de estruturação do processo de gestão oferece uma alternativa para educar, motivar e envolver entidades e utilizadores da área protegida, consciencializando-os e co-responsabilizando-os” (Vasconcelos, 2000:2). A nível da Educação Ambiental em Portugal, esta terá que ser uma aposta. Já em 1992, quando esta temática dava os primeiros passos, se afirmava que optar pela educação era o único caminho a seguir. “A única coisa capaz de garantir o futuro a médio e longo prazo são os hábitos e não as leis, continuar a descurar a formação é o mesmo que castrar o futuro. (…) Formar é o único processo de garantir que os 96 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch cidadãos participem em decisões cruciais e não fiquem indiferentes quando se lhes fala no efeito de estufa ou na importância da biodiversidade…” (Schmidt, 1992). Evidenciam-se em seguida os objectivos do Coastwatch e com estes, as potencialidades e possibilidades que o projecto oferece: • Melhorar o conhecimento da situação ambiental do litoral português e, sobretudo, sensibilizar as escolas, outras instituições e população em geral para os problemas resultantes dos impactes da actividade humana na faixa litoral (dentro deste quadro a sensibilização dos mais jovens relativamente a esta problemática é fundamental, sendo este facto o pilar principal do projecto); • Recolher dados, a partir do preenchimento de um questionário relativos a vários aspectos ambientais do litoral português; armazenar e analisar os dados obtidos de uma forma facilmente utilizável na gestão costeira e na protecção do litoral; • Sensibilizar e informar o público, de forma a tornarem-se activamente envolvidos na protecção do litoral; sensibilizar para o Desenvolvimento Sustentável, educando para a participação pública; • Contribuir para o inter-associativismo e para a criação de sinergias entre instituições ligadas ao ambiente e à gestão costeira; • Envolver os jovens, em idade escolar, em actividades de ar livre e sensibilização ambiental, de complemento curricular e de alternativa ocupacional; • Desenvolver o espírito crítico e científico através de técnicas de observação e trabalho de campo. A lista de objectivos fica em aberto, tendo em conta as hipóteses que podem ser exploradas a partir deste projecto. De salientar que, em cada campanha, a partir de 2003/04 passou a ser introduzido um subtítulo; desta forma abrem-se as possibilidades de trabalhar outros aspectos, quer ao nível do ordenamento e Gestão Costeira quer do Desenvolvimento Sustentável (Quadro XIV). Quadro XIV – Títulos das campanhas Coastwatch Ano lectivo Anterior a 2003/04 2003/04 2004/05 2005/06 2006/07 2007/08 Título das Campanhas “O Papel das Populações na Protecção do Litoral” “De Olho no Litoral” “As Potencialidades do Litoral” “O Papel das Populações na Protecção do Litoral” “O Papel das Populações na Protecção do Litoral” “Coastwatch e as Comunidades Ribeirinhas” O facto do projecto se preocupar em desenvolver actividades com vista ao desenvolvimento de atitudes pró-activas vai de encontro aos princípios da convenção de Aarhus, tal como se pode ler no1º Relatório Nacional sobre a Convenção de Aarhus 97 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch coordenado pelo então Instituto do Ambiente, “Medidas tomadas para promover a educação e a sensibilização do público em matéria de ambiente: No contexto da educação formal, desde o final da década de 70, têm vindo a ser integrados nos programas escolares conteúdos e temáticas ambientais. A partir dos anos 80, estabelece-se a possibilidade de envolvimento formal das escolas em metodologias de projecto nas quais predominam as temáticas ambientais, numa perspectiva de estudo e intervenção ao nível local. Complementando o processo de educação formal, é promovida a edição de materiais pedagógicos, de apoio e informação para alunos e professores, da responsabilidade de editoras, produzidos por ONG e também por entidades governamentais. Com efeito há que assinalar o esforço desenvolvido por parte dos organismos do então MAOT na produção de recursos informativos e educativos, que permitiram a divulgação de informação ambiental através de edições e publicações, dirigidas a públicos alvo específicos e em suportes diversificados. Em 1996, os Ministérios com as tutelas da Educação e do Ambiente celebraram um protocolo que permitiu o desenvolvimento de projectos de educação ambiental sob a coordenação de professores a tempo inteiro, consubstanciados em parcerias envolvendo o poder local, ONG e outras instituições de âmbito local e regional. “É de salientar o contributo desta iniciativa para o reforço da cidadania ambiental dos profissionais envolvidos, quer dos professores coordenadores, quer dos professores das escolas beneficiárias dos projectos. No âmbito deste protocolo e de outros, celebrados entre diversas entidades, foi ainda possível implementar projectos, concursos, campanhas e outras iniciativas que contribuíram significativamente para a sensibilização ambiental dos jovens” (IA, 2005). Pelo atrás exposto é fácil concluir que o projecto Coastwatch oferece um vasto leque de excelentes potencialidades, como projecto de educação e cidadania ambiental. 1.10.2 Metodologia A metodologia do projecto é simples. O levantamento da informação obtém-se a partir do preenchimento de um questionário in loco, por todo o litoral, até à entrada dos estuários. Como base de trabalho é utilizado um mapa à escala 1/25.000, 98 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch correspondente a um bloco de 5km; este é dividido em 10 unidades de 500m. A área total para análise está delimitada no mapa (fig. 31). Figura 31 - Mapa de campo (exemplo) A observação incide sobre a Zona Intertidal (Zona entre as linhas normais de maré cheia e de maré vazia); a Zona Supratidal (Zona entre a linha normal de maré cheia e a linha máxima atingida nas marés vivas e Zona Interior Contígua (faixa de 500m de 99 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch largura paralela à linha de costa contada para o interior a partir da linha máxima atingida pela água do mar no período das marés vivas ou desde o bordo da falésia). A divisão dos blocos está organizada segundo as NUT III (Nomenclatura de Unidades Territorial para fins estatísticos), estipuladas pelo INE, sendo que esta segmentação em blocos foi definida de Este para Oeste, na costa meridional e de Sul para Norte na costa Atlântica (Quadro XV). Quadro XV - Excerto da Divisão dos Blocos por NUT (exemplo) NUT 16B 16B 16B 16B 16B 16B 16B 16B 16B 16B 16B 16B 16B Bloco 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 Nome do Mapa Águas de Medeiros/Vale de Paredes Vale Furado Praia Norte Nazaré Praia do Salgado S. Martinho do Porto Salir do Porto Quebrada da Arrinhada a Pedra da Escada Pedra da Escada a Ponta das Boiças Barraca do Varino (Lagoa de Óbidos) Ponta das Canas Praia Bom Sucesso a Vale Bem Feito Penedo da Gaivota a Pedras Muitas O preenchimento do questionário prevê, de entre diversos parâmetros, a caracterização das descargas líquidas no mar ao longo da unidade. Para este fim são distribuídos Kits para teste de nitratos que incluem as fitas de análise e uma tabela de leitura (Fig. 32). Figura 32 – Kit de Nitratos A monitorização é feita em período de baixa-mar para uma correcta recolha de informação na Zona Intertidal. A visualização da tabela de marés pode ser feita em 100 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch http://www.hidrografico.pt, bastando seleccionar o dia e o local onde se pretende fazer a saída de campo (Fig. 33). Figura 33 – Previsão de marés (Fonte: Instituto hidrográfico) Esta metodologia desenvolve-se por todo o litoral com a colaboração dos Coordenadores Regionais (representantes de ONGA, autarquias - que a partir de 2003 passaram a demonstrar um interesse em incluir o projecto na sua agenda de actividades de Educação Ambiental - associações diversas, escolas, universidades, entre outras entidades e participantes em geral). A Coordenação Nacional reúne em Setembro de cada ano, com os Coordenadores Regionais para preparar cada campanha. Distribui-se o material, calendariza-se actividades e discutem-se aspectos de logística e pedagógicos do projecto, com o intuito de envolver o maior número de participantes possível, aumentar a taxa de cobertura, mas acima de tudo garantir que o Coastwatch funciona como uma prática de educação e Desenvolvimento Sustentável. O GEOTA desenvolve ainda actividades de formação em escolas e outras entidades como meio de preparar os participantes para a monitorização da área pretendida. Aos participantes é entregue um guia de campo, como instrumento de auxílio. Por assentar no trabalho desenvolvido pelas escolas, o projecto é dinamizado por ano lectivo, de acordo com o calendário escolar. Assim, o lançamento de cada campanha é 101 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch feito em Setembro, a monitorização é efectuada de 1 de Outubro a 31 de Dezembro, o tratamento estatístico e a elaboração do relatório desenvolvido durante o 2º período lectivo e a apresentação dos dados, no Seminário Anual, ocorre no início do 3º período, para que docentes e alunos possam desenvolver e apresentar trabalhos resultantes da sua monitorização ou outros sobre o litoral. Para concorrer ao projecto, basta contactar o GEOTA ou qualquer um dos coordenadores regionais, inscrever-se, utilizando as fichas próprias (escola participante, grupos de participantes ou participantes individuais) e solicitar o material necessário para a campanha: mapa da respectiva área, questionários, guia de campo e fitas de nitrato. O portal www.geota.pt/coastwatch disponibiliza os questionários, as fichas de inscrição, os relatórios e outras informações relacionadas com o projecto (Anexo 5). Após a implementação da campanha no terreno, os elementos retirados dos questionários são introduzidos numa base de dados alfanumérica e submetidos a tratamento estatístico (Quadro XVI). Quadro XVI - Excerto da Base de dados Coastwatch A7: até 3 designações A8.1: Acesso A8.2: Proibido? 4 Primeira opção Segunda opção Terceira opção 1 & 2 -> 1 A7.1 A7.2 A7.3 A8 B1: Até 5 utilizações Primeira opção Segunda opção Terceira opção Quarta opção Quinta opção B1.1 B1.2 B1.3 B1.4 B1.5 2 2 3 12 6 2 3 7 9 12 6 2 3 7 9 12 6 2 3 7 9 12 3 2 4 5 9 12 4 7 2 2 3 4 7 4 2 2 4 7 13 4 2 2 3 4 7 2 3 11 Conscientes da importância que assume a identificação dos diferentes parâmetros na qualidade ambiental da costa portuguesa, os dados são posteriormente divulgados, em Seminário, a todos os participantes e interessados nas temáticas focadas pelo projecto ao longo de cada campanha (Anexo 6). 102 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Pretende-se também, através desta acção, divulgar os trabalhos realizados pelas escolas e coordenadores regionais, principais intervenientes no processo. O relatório anual é posteriormente enviado aos coordenadores regionais, escolas participantes, divulgado pela comunicação social, ficando ainda disponível on-line113. Sendo o projecto vocacionado essencialmente para professores os Seminários, a partir da campanha 2004/05, passaram a ser acreditados com 0,6 créditos. Mediante a participação em todas as actividades programadas para os 3 dias do evento e posterior entrega de relatório, os docentes podem candidatar-se à respectiva acreditação reconhecida pelo Centro de Formação Professor Orlando Ribeiro. A figura 34 mostra a evolução do número de escolas envolvidas no Coastwatch, a partir da campanha 1999/2000 (a ausência de dados fiáveis nos anos transactos impede uma clara leitura desde o seu inicio). 2006-07 2005-06 2004-05 2003-04 2001/02 2000/01 1999/00 0 20 40 60 80 100 120 Figura 34 – Evolução de número de escolas participantes no projecto (1999-2007) É notório o aumento do número de escolas envolvidas no projecto; consequentemente as escolas, enquanto entidades, e os alunos, enquanto público-alvo do projecto, passam a deter o maior peso no total dos participantes tendo estabilizado nos últimos anos em torno dos 70% do total (fig. 35). 113 www.geota.pt 103 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch 2 0 0 6 -0 7 2 0 0 5 -0 6 2 0 0 4 -0 5 2 0 0 3 /0 4 0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 T o ta l d e p a r ti c i p a n te s T o ta l d e a l u n o s Total de Alunos Total de participantes Percentagem de alunos em relação ao total de participantes 2003/04 3391 4534 74,8 2004-05 2898 4222 68,6 2005-06 3050 4324 70,5 2006-07 3467 4774 72,6 Figura 35 – Número total de alunos em relação ao total de participantes no projecto (2003-2007) Na generalidade, um aumento do total de participantes corresponde a um aumento do número de alunos envolvidos no projecto. Tal prova a importância da escola enquanto fio condutor dos projectos de educação ambiental e também a necessidade de manter um professor requisitado com exclusividade para gerir o Coastwatch. Após a campanha de 2003/04, com a requisição da actual coordenadora, passou a ser pedido aos coordenadores regionais e participantes em geral que especificassem na ficha de inscrição a entidade a que pertencem (ONG, grupos, outros associações, etc.). No caso dos professores, foi igualmente solicitado que indicassem a disciplina leccionada, independentemente de se tratar de Áreas Curriculares ou Não Curriculares (Formação Cívica, Área de Projecto e Estudo Acompanhado). Embora muitas fichas dêem entrada no GEOTA incompletas – o que dificulta o rigor na análise estatística – este procedimento permite compreender melhor a evolução e comportamento dos participantes no projecto que, por ter quase 20 anos de existência, necessita de reformulação. Assim, pode observar-se, através da figura 36, o número de entidades envolvidas no Coastwatch a partir da campanha 2003/04, independentemente serem ou não coordenadores regionais. Apesar de algumas oscilações, a campanha transacta reflecte um aumento em todos os parâmetros. De realçar o papel crescente dos 104 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch agrupamentos dos escu(o)teiros. No total dos participantes, estes encontram-se em segundo lugar, seguidos dos alunos. O u tr a s A s s o c ia ç õ e s /e n ti d a d e s A u ta rq u i a s 2 0 0 6 -0 7 2 0 0 5 -0 6 2 0 0 4 -0 5 A g r u p a m e n to s d e E s c u (o ) te i ro s 2 0 0 3 -0 4 ONG 0 5 10 15 20 25 Figura 36 – Número de entidades envolvidas no projecto 2003-2007 Em suma, poder-se-á dizer que o Projecto Coastwatch defendido, primeiramente, como um projecto de monitorização, evidenciou, desde a sua implementação, uma grande vertente educativa direccionada para as questões da educação ambiental no âmbito do litoral. Isto é, se para alguns o projecto serve unicamente como ferramenta de caracterização, para muitos potencia a cidadania como meio de formar indivíduos activos e participativos. 1.11 IMPLEMENTAÇÃO DO PROJECTO A implementação do projecto Coastwatch é facilitada pelo facto de existir uma professora requisitada para o coordenar nacionalmente. A sua relação com as escolas e dedicação exclusiva ao projecto impelem uma maior dinamização de actividades com vista à cidadania ambiental e desenvolvimento de atitudes pró-activas. 1.11.1 O QUESTIONÁRIO O questionário Coastwatch referido na metodologia foi elaborado pela coordenadora internacional em 1988 e traduzido e adaptado pelos coordenadores nacionais de cada país aderente. Reflectindo as preocupações à época, o questionário assentou essencialmente na temática dos resíduos. 105 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Portugal aderiu à então CEE em 1986, quando as questões relacionadas com a temática dos resíduos já eram reguladas a um nível superior nos outros países. Por motivos diversos a problemática dos resíduos não era, ainda, a principal preocupação de Portugal; a verdade é que o acelerar do processo de industrialização e a expansão económica, com consequente aumento de produtividade e do poder de consumo, ocorrem após a entrada de Portugal na CEE. Por questões conjunturais e estruturais os resíduos começam a estar na ordem do dia, seja ela política, social ou económica. As siglas RSU (Resíduos Sólidos Urbanos) e RRR (Reduzir, Reutilizar, Reciclar) entram assim no vocabulário dos portugueses. «”RSU? RRR!” Parece linguagem de extraterrestres, mas não há mais terra-a-terra. Quer apenas dizer que a resposta à pergunta “que fazer dos resíduos sólidos urbanos?” é a seguinte: “Reduzir, Reutilizar, Reciclar! (…) O lixo tem valor económico, é já sabido que é um recurso a aproveitar. Pode criar novas indústrias e serviços e novos mercados; e cria mais empregos estruturais em toda a pirâmide – desde o emprego não qualificado à mais sofisticada investigação científica” (Schmidt, 1999). Nesta altura, como agora, os debates sobre a incineração estão na ordem do dia. As campanhas publicitárias e de sensibilização para a reciclagem entram no dia-a-dia dos cidadãos. As escolas aderem ao lema dos 3R’s, com grande sucesso. Os alunos, eles próprios, tornam-se exemplo de sensibilização para a temática da recolha selectiva e consequente contributo para a reciclagem. Sendo o questionário do Coastwatch muito vocacionado para a monitorização e contagem de resíduos, este facto foi mais um ponto a favor da adesão dos participantes ao projecto. Quer seja porque o tema dos resíduos ainda é muito trabalhado nas escolas, ou porque o seu impacte visual em áreas de costeiras é chocante, os resíduos têm, até então, condicionado a estrutura dos questionários Coastwatch. Só na última campanha, devido ao efeito dos temporais sobre a costa e consequente erosão, é que se assistiu a uma mudança de paradigma. A temática das mudanças climáticas globais associada aos riscos de ocupação do litoral, ganhou assim o lugar antes reservado aos resíduos na lista de prioridades das populações e dos próprios participantes nas campanhas. Mas terá que se reconhecer que o interesse da 106 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch comunicação social sobre o tema também contribui, em muito, para este novo olhar sobre o Coastwatch e o litoral. O questionário prevê a monitorização e abordagem de outras temáticas: ocupação do solo, descargas líquidas no mar, composição da superfície intertidal e supratidal, fauna e flora marinha, petroleamento de aves e outras questões relacionadas com petróleo ou derivados, riscos e ameaças - erosão marinha, pressão turística, extracção de inertes, etc. (Anexo 7). A dinamização do Coastwatch, como acontece noutros projectos, pressupõe a preparação dos participantes antes da saída de campo tendo sempre presente que se vai fazer um trabalho de monitorização que implica uma caminhada. Assim, é importante utilizar calçado e roupa confortável, levar água e todo o material necessário para pôr em prática o projecto, sem esquecer de frisar os perigos eminentes nalguns troços de costa (falésias, áreas que podem ser de fácil acesso com a maré vazia mas se tornam inacessíveis à medida que maré enche, zonas mais lodosas como o sapal, etc.). As potencialidades do projecto são aproveitadas pelas escolas, que encontram aqui uma forma de pôr em prática muitos dos conteúdos das diferentes áreas (curriculares e não curriculares). Da mesma forma os coordenadores regionais aproveitam o projecto como forma de sensibilizarem os participantes para os problemas existentes no litoral da sua área de intervenção. Nos últimos anos tem sido crescente o envolvimento das autarquias no projecto, sobretudo como coordenadores regionais (Fig. 37). 2 0 0 6 /07 2 0 0 5 /06 2 0 0 4 /05 2 0 0 3 /04 a n te rio r a 2 0 03 0 2 4 6 8 10 12 14 16 Figura 37 – Número de autarquias coordenadoras 107 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Com efeito, o Coastwatch enquadra-se plenamente nos princípios da Agenda Local 21, das actividades Bandeira Azul, entre outras, daí que faça parte do plano de actividades das autarquias. Mesmo sem desempenharem cargos de coordenação regional, existe um conjunto de outras autarquias cuja ligação ao projecto passa, por exemplo, pelo apoio ao nível de transporte de participantes – nomeadamente alunos – até ao local da monitorização. A difusão do projecto tem trazido um outro tipo de público, que embora encontre objectivos diferentes no projecto, representa, igualmente, uma mais valia; neste grupo enquadra-se os idosos, sobretudo os da Universidade da Terceira Idade (UTI) e grupos com necessidades educativas especiais. Neste momento aposta-se na criação de alguns percursos onde seja possível a monitorização por indivíduos com problemas motores. Esta capacidade de ir dando respostas aos novos desafios é uma mais valia do projecto Coastwatch, que lhe tem permitido manter-se activo e com um interesse crescente desde 1989. 1.11.2 PRODUÇÃO DE MATERIAIS DE APOIO Atendendo a que o projecto Coastwatch abrange uma vasta área temática, dentro do objecto de estudo que é a faixa costeira, ao longo das campanhas a coordenação nacional recebe vários pedidos de apoio ao projecto. Assim, para além de actividades de formação, sensibilização, apresentações em Power Point, entre outras, desenvolvidas nas escolas - em grupos de trabalho dinamizados pelo GEOTA - ou em seminários, congressos e similares, foi elaborado um sítio de internet dedicado ao projecto114. Regularmente, na página, são publicados artigos, sensibilizando para a temática de cada campanha – ou outros temas – Notas de Imprensa, entre outros. No sítio do Coastwatch estão, também, disponíveis as fichas de inscrição, notas de preenchimento, questionário, relatórios de apresentação de dados desde 1995 e outras informações relacionadas com o projecto e com o litoral. 114 www.geota.pt/coastwatch 108 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Em 2003 foi lançado o Guia “Coastwatch – de olho no litoral”, um guia de campo essencial para os participantes. Esta publicação é composta por 3 partes: a primeira aborda algumas características do litoral português; a segunda explica o que é o projecto focando a Educação e a Cidadania Ambiental; a terceira parte é dedicada a notas explicativas sobre o preenchimento do questionário. O guia contém ainda fotos exemplificativas de fauna e flora do litoral, assim como de alguma tipologia de resíduos. Nos anexos poderão ser consultados os mapas das Áreas Protegidas, Rede Natura e Sítios Ramsar. No boletim interno do GEOTA “Geotàlupa” são publicados, bimestralmente, artigos relativos ao projecto e a cada campanha. A par da publicação do GEOTA, a coordenadora escreve ainda artigos, relacionados com o projecto, para diversas revistas e sítios de diferentes entidades, como por exemplo: (Mar da Palha, Junho 2004, APOGEO, Março 2006; Mútua dos Pescadores, Maio 2006; APOGEO, Abril 2007; entre outros). O facto do projecto ser coordenado regionalmente por diversos organismos, contribui para que seja referenciado em diferentes meios de comunicação social, seja nacional, regional ou local. Uma pesquisa no motor de busca Google, apenas em português, podemos ler a seguinte informação, quando introduzida a palavra coastwatch “Aproximadamente 20.600 páginas em português sobre coastwatch”115. O número de páginas aumenta consideravelmente se fizermos uma pesquisa tendo em conta os principais jornais online. Contudo, esta referência é focalizada nos períodos altos da campanha: Sessão de Abertura e Seminário de Apresentação de Dados. 1.11.3 O PROJECTO COASTWATCH NO ENSINO FORMAL A escola, enquanto sistema organizacional, inserida na sociedade procurou adapta-se e desenvolver a dimensão ambiental para além das actividades curriculares; o projecto Coastwatch tem sido impulsionado por docentes, que nele descobrem um meio de trabalhar o tema do Desenvolvimento Sustentável. 115 [http://www.google.pt – visitado em 31 de Julho de 2007]. 109 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Na escola, o Coastwatch surge como objecto de estudo de diferentes áreas, curriculares ou não curriculares. Nele cada disciplina descobre potencialidades cuja verdadeira exploração permite apreender conhecimentos, exigidos a nível curricular, e desenvolver um projecto de Educação para a cidadania ambiental. Na organização da saída de campo, os professores trabalham os conceitos subjacentes ao projecto, integrados nos conteúdos das suas disciplinas; exploram o questionário, discutem os objectivos do projecto e envolvem os alunos, de forma a originar um debate participativo sobre os problemas e potencialidades do ordenamento do território e do desenvolvimento sustentável – objectivos essenciais do Coastwatch. Se a saída de campo ocorrer pela primeira vez, os alunos deverão ter um conhecimento do local a monitorizar através de mapas, fotografia, filmes, etc. assim como dos objectivos da monitorização e do trabalho final a realizar. Após a recolha da informação, para que se possa falar numa verdadeira aprendizagem é essencial que haja um tratamento dos dados recolhidos, questionar o que foi observado e a divulgação deste trabalho para a comunidade escola e/ou outra. Desta forma poder-se-á contribuir efectivamente para o Desenvolvimento Sustentável e para a formação ao nível da participação pública. Como já foi referido, tal permite a diferentes áreas (curriculares ou não) e diferentes tipos de público-alvo abordarem o Coastwatch sobre o ângulo mais conveniente (resíduos, ordenamento, planeamento, erosão costeira, biologia, educação ambiental, desenvolvimento sustentável, actividade lúdica, ou outra). A transversalidade com as diferentes disciplinas só depende da capacidade de organização dos actores envolvidos e/ou das possibilidades que o meio oferece. Sobre o Papel da Geografia no Projecto Coastwatch, Soares (2006) refere “Uma análise pormenorizada do questionário, não nos deixa dúvidas sobre a presença marcante da Geografia em qualquer item. Comecemos pelo A: Informação sobre o local; código do país, da NUT; nome do mapa; etc. Se quisermos aprofundar outra temática, falaremos no B: Principal utilização da Zona interior contígua; características das entradas no mar e por aí adiante. Só mais um exemplo F: Conhece algum risco efectivo ou ameaça iminente na unidade de monitorização? Há erosão marítima; 110 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch extracção de inertes; descargas de lixo ou entulho; pressão turística ou outra? Em simultâneo, com todos os conteúdos que a Geografia, ou outra disciplina, possa vir a encontrar subjacente ao projecto Coastwatch, está sempre bem patente a questão da cidadania ambiental, da participação pública, da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, entre outras vertentes – e aqui a Geografia também tem algo a dizer. Independentemente dos conteúdos científicos, o facto de ser gerida na escola é, por excelência, um meio transmissor para este fim (Soares, 2006:68). Apesar das potencialidades que o projecto tem para a disciplina de Geografia, esta não é a que apresenta um maior envolvimento. Tal como foi referido na metodologia do projecto, a partir da campanha 2003/04 foram introduzidas alguns parâmetros para fins estatísticos na ficha de escola participante. Assim, foi solicitado aos docentes que especificassem o número de alunos por turma/escola, número de professores e respectiva disciplina. No caso das Áreas Não Curriculares (Área de Projecto, Estudo Acompanhado, Formação Cívica) e de outros projectos dinamizados na escola (Clube Ambiente, Clube Ciência, etc.) deveria ser clarificada a disciplina de base do professor responsável. Podemos constatar que na campanha 2004/05 o número de professores que não especificou a disciplina leccionada foi bastante elevado, mas tem vindo a reduzir-se desde esta altura. Ao longo de todas as campanhas, as disciplinas de Ciências Naturais, Biologia, Ciências da Terra e da Vida e Biologia/Geologia, devido aos conteúdos programáticos, sobretudo ao nível do 3º ciclo, são as que mais aderem ao projecto. De realçar que docentes da área de Física e Química têm aderido de forma crescente ao Projecto, alguns deles ao nível do secundário, aproveitando a monitorização para desenvolver análises diversas – para além das previstas no questionário – às descargas líquidas, trabalhando esta informação posteriormente em laboratório (Fig. 38). 111 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Outras disciplinas Não es pecificados 1º Ciclo Não curriculares Clube Ambiente/Clube Ciências CFQ/Quim ica/TLQ EVT/EV/ET Línguas Geografia CN/CTV/Biol/Biol-Geologia 0 20 40 2006/07 60 2005/06 80 100 120 2004/05 Figura 38 – Número de docentes participantes em função da disciplina leccionada. Os Clubes Ambiente/Ciências registaram na última campanha um maior envolvimento no projecto. No grupo de Outras disciplinas estão incluídas a Matemática, a História, a Educação Física, as Tecnologias de Informação, a Geometria Descritiva e disciplinas próprias das Escolas Profissionais e dos diferentes Politécnicos, embora algumas delas com valores residuais. Não obstante o leque de disciplinas seja vasto, muitos dos professores apenas vão como acompanhantes aquando da saída de campo. Os resultados da monitorização e a sua divulgação ficam a cargo de um número mais reduzido de docentes. 1.12 AVALIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO NO PROJECTO COASTWATCH 1.12.1 METODOLOGIA Para caracterizar a participação no Projecto Coastwatch foi elaborado um inquérito a actuais coordenadores regionais, professores responsáveis pela sua dinamização e outros responsáveis, quer seja de grupos de escuteiros, ONG ou outras entidades e a outros que no passado a ele estiveram ligados ao projecto (Anexo 8). 112 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Tendo o projecto 18 anos tornou-se impossível contactar todos os participantes envolvidos desde então – esta tarefa foi ainda mais difícil ao nível dos professores dada a sua mobilidade geográfica. Além do mais o facto do Coastwatch funcionar como um projecto em regime de voluntariado dificultou a resposta ao inquérito, sobretudo no caso de antigos colaboradores. Diversas respostas, chegadas por e-mail, afirmam que não poderiam responder ao inquérito na medida em que as pessoas que dinamizaram o projecto já não se encontravam ligadas à ONG. Por outro lado, alguns professores e dirigentes de agrupamentos de escu(o)teiros também variam de ano para ano, sendo, nalguns casos impossível contactá-los. Importa salientar, que o inquérito não foi aberto a todos os participantes, na medida em que estes são maioritariamente alunos, não sendo identificados individualmente, aquando do preenchimento da ficha de participante, mas como pertencentes à escola, ficando somente registado o nome e contacto do professor responsável e número de alunos envolvidos, nalguns casos a turma e ano a que pertencem. Por outro lado pretendia-se perceber se os responsáveis pelo projecto, independentemente de serem coordenadores regionais ou não, desenvolviam actividades de educação ambiental para divulgar o projecto; que tipo de acções dinamizavam; se recorriam a parceiros nesta dinamização e que tipo de parceiros; se associavam outros projectos/actividades à dinamização/divulgação do Coastwatch; se incrementavam actividades para a divulgação dos resultados; qual o número de pessoas envolvidas, em média, nas acções e quais as entidades envolvidas na divulgação dos resultados da monitorização. 1.12.2 ANÁLISE DOS INQUÉRITOS AOS PARTICIPANTES NO PROJECTO COASTWATCH Como a resposta aos inquéritos também é uma forma de avaliar a participação pública, salienta-se que apenas se obteve 42% da taxa de resposta, isto é, dos 107 inquéritos enviados foram obtidas apenas 45 respostas. A análise do resultado permite-nos constatar que 47% são de coordenadores regionais, 33% de professores responsáveis e 20% afirmaram ser participantes, não havendo qualquer resposta ao inquérito por parte dos responsáveis de outras entidades (Fig. 39). 113 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch P a rtic ip a n te 20% C o o rd e n a d o r R e g io n a l 47% P ro fe s s o r re s p o n s á ve l 33% Figura 39 – Grau de envolvimento no projecto (%) Com efeito, estes são os colaboradores mais ligados ao projecto e, na sua maioria, detêm com a coordenadora nacional uma estreita relação, o que facilita a comunicação. Na prática, quase todos os actuais coordenadores responderam ao inquérito, permanecendo, no entanto, uma maior dificuldade em contactar antigos coordenadores ou professores ligados ao projecto. O facto de se trabalhar em regime de voluntariado conduz, por vezes, à perda do contacto – o e-mail, meio por excelência de comunicação em projectos desta índole – altera frequentemente; daí que muitos dos inquéritos que seguiram via internet tenham vindo devolvidos sem terem chegado ao destino. À pergunta Como teve conhecimento do projecto? 33%, respondeu ter sido através de colegas e amigos, o que prova que relatos de experiências são um óptimo meio de difusão. A aposta em divulgar o projecto em Seminários/outros eventos, contribui com 24% dos participantes para o Coastwatch. De salientar que o inquérito não solicitava que fosse especificado se o Seminário tinha sido de Apresentação de Dados do Coastwatch ou outro. Contudo, a experiência demonstra que os Seminários relativos ao projecto angariam um número considerável de participantes e coordenadores regionais para a campanha seguinte. Incluído na categoria Outros, à qual responderam doze inquiridos (27%), predomina a indicação de que tomaram conhecimento através do GEOTA, sem ser especificado, se foi por e-mail, actividades desenvolvidas pela ONGA no âmbito do projecto, ou qualquer outra forma de divulgação (Fig.40). 114 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Outros 27% Colegas/amigos 33% Comunicação Social/Internet 16% Seminários/outros eventos 24% Figura 40 – Meio de conhecimento do Projecto Coastwatch (%) Contudo, tendo em conta a experiência, enquanto coordenadora nacional, qualquer actividade desenvolvida pelo GEOTA, seja ao nível de formação, divulgação em seminários, congressos, feiras, dinamização de workshops, apresentação do projecto nas escolas, ou exposição do poster da campanha, traz, regra geral, novos participantes para o projecto. > 5anos 4-5 anos 2-3 anos 1 ano 0 5 10 15 20 25 Figura 41 – Número de anos de permanência no projecto Relativamente ao número de anos de permanência no projecto, 46,6% dos inquiridos participam há 2-3 anos. Os restantes parâmetros detêm igual número de respostas (8). Dos 17,8% dos participantes que responderam permanecer no projecto apenas um ano, a larga maioria ingressou no projecto apenas na presente campanha, nada indicando que não pretendem continuar (Fig. 41). Muito embora não haja nenhum inquirido que indique permanecer no projecto desde a sua implementação em Portugal, alguns estão a ele ligados há mais de uma década. E, apesar do inquérito não o mostrar, é sabido que existem actualmente docentes participantes no projecto que já o foram enquanto alunos. Assim, exceptuando os 115 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch inquiridos que participaram apenas um ano – quer se trate da 1ª vez ou apenas um acto isolado – 89% dos restantes afirmaram ter continuidade no Projecto. Um dos objectivos da coordenação regional é utilizar o projecto Coastwatch para pôr em prática a Educação Ambiental e o Desenvolvimento Sustentável, o mesmo ocorrendo com a maioria dos professores responsáveis pela dinamização do projecto na escola daí que não seja de estranhar que 60% dos inquiridos responda afirmativamente à pergunta “ Organiza actividades de educação ambiental para divulgar o projecto Coastwatch?”. Ao longo de cada campanha chegam ao GEOTA diversos relatos de trabalhos desenvolvidos por coordenadores regionais e professores no âmbito da preparação da campanha. Outros há, que contactam a Coordenação Nacional para apresentar o projecto e sensibilizar para a temática em questão. Nos últimos anos têm sido dinamizados grupos de trabalho exclusivamente sobre o Coastwatch ou sobre o Coastwatch e o Perfil de Praia, em parceria com o Laboratório Marítimo da Guia destinados a coordenadores regionais, docentes, técnicos de ambiente, etc. (Figura. 42). Figura 42 – Workshop Apr(e)ender o Litoral –Prática CW e Prática de Perfil de Praia A associação da prática do Perfil de Praia com o Coastwatch tem funcionado com uma experiência positiva e enriquecedora e cada vez um maior número de escolas e coordenadores regionais solicitam a dinamização do Workshop para, mais tarde, porem em prática com os alunos (Anexo 9). 116 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Como seria de esperar, os que responderam ser apenas participantes não desenvolvem qualquer outra actividade, ligada ao projecto, que não seja a monitorização em si. Em relação à tipologia das actividades desenvolvidas no âmbito da divulgação do Coastwatch, apesar de 21 inquiridos afirmar organizar Seminários/Encontros/Colóquios e dinamizar actividades de Formação/Workshops, o maior número de respostas (14) foi para o parâmetro Outras (Fig. 43). out ras S em inários /enc ont ros /c olóquios form aç ão/wh op 0 2 4 6 8 10 12 14 16 Figura 43 - Tipologia das actividades desenvolvidas no âmbito da divulgação do Coastwatch Incluídas em Outras estão diversas actividades tais como: passeios pedestres, acções de limpeza, notas de imprensa e artigos para a comunicação social; sendo que o maior peso das respostas relativas a este parâmetro está relacionado com a divulgação através dos órgãos de comunicação social. No início da campanha, cada coordenador regional recorre à imprensa local e regional e à internet para divulgar o projecto, os blocos disponíveis sob a sua responsabilidade e as actividades de educação ambiental que desenvolve para dinamizar do projecto. O resultado obtido através da pergunta ao número de pessoas envolvidas, em média, por acção foi diverso, sendo que maioritariamente as respostas apontaram para o intervalo de classe 0-49 participantes (Fig. 44). 117 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch 2 0 0 -3 5 0 1 0 0 -1 9 9 5 0 -9 9 0 -4 9 0 2 4 6 8 10 12 14 16 Figura 44 - Número de pessoas envolvidas por acção De ressaltar que neste intervalo de classe estão incluídas as respostas dos professores responsáveis pelo projecto, que, por norma desenvolvem actividades com uma ou duas turmas. Alguns destes professores contactam a Coordenação Nacional para que esta apresente o Projecto nas escolas, simultaneamente sensibilizando para a educação e cidadania ambiental e preparam-se os alunos e docentes para a prática do Coastwatch. Na sequência deste trabalho, acontece, por vezes que a Coordenadora Nacional acompanha as escolas aquando da monitorização. À pergunta “Recorre a parceiros na dinamização das actividades?”, 52% dos inquiridos que desenvolve actividades de divulgação do projecto afirma recorrer a parceiros. A tipologia destes parceiros assenta essencialmente nas Escolas (41%); seguida de Outras – essencialmente órgãos de comunicação social e exposições (32%). Trabalhar com o ambiente e em educação ambiental só é possível graças a parcerias. Tendo em conta, como já foi referido diversas vezes, que o Coastwatch é um projecto que assenta no voluntariado e com parcos recursos económicos – fruto das sucessivas alterações de financiamento a projectos desta natureza pelos diferentes órgãos governamentais – a opção por incrementar parcerias com diversas e distintas entidades, sejam elas ONG, autarquias ou outros agentes económicos é, muitas vezes crucial para implementar o projecto ou desenvolver actividades. Assim, poder-se-á deduzir, á priori, que o facto de apenas 16% dos inquiridos ter respondido recorrer a autarquias/empresas/outros agentes económicos, só é justificado, porque uma boa parte dos coordenadores regionais são as próprias 118 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch autarquias do litoral, que num número cada vez maior tem aderido ao projecto. No que concerne à participação de outras ONG, como parceiros na dinamização das actividades de divulgação do projecto Coastwatch fica-se pelos 11% (Fig. 45). o u tra s 32% ONG 11% E s c o la s 41% Au ta rq u ia s /E m p re s a s /o u t ro s a g e n te s e c o n ó m ico s 16% Figura 45 – Tipologia das parcerias na dinamização de actividades Porque se trabalha em parcerias e em interdisciplinaridade rumo ao desenvolvimento sustentável, não é de estranhar que 55% dos inquiridos tenha afirmado associar outros projectos/actividades à dinamização do Coastwatch; mais ainda quando a maior parte dos parceiros são escolas, onde se incrementa um sem número de projectos, sendo imprescindível a sua integração. De entre os projectos a que se associa a divulgação do Coastwatch, destaca-se Outros projectos/exposições (50%) e as actividades da ABAE (36%), nomeadamente o projecto Eco-escolas e Jovens Repórteres do Ambiente (Fig. 46). Outros projectos/exposições 50% Bandeira Azul da Europa (ABAE) 36% Passeios pedestres 7% Acções de limpeza 7% Figura 46 – Tipo de Projectos/Actividades associados à dinamização do Coastwatch (%) Para além das actividades de divulgação do projecto Coastwatch com vista á sua implementação e à sensibilização para a cidadania ambiental e o desenvolvimento sustentável, torna-se essencial organizar actividades de divulgação dos resultados. Tal espelha o empenhamento dos participantes e fomenta a participação pública. Assim, no 119 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch que concerne à pergunta “Organiza actividades de divulgação dos resultados?”, 53% responderam afirmativamente. Quanto à tipologia das actividades, das hipóteses propostas no inquérito apenas 19% assinalou recorrer a Seminários/Encontros/Colóquios e 4% Formação/Workshops; 77% dos inquiridos, não encontrando referência à sua opção indicou Outras, descriminando a comunicação social e as exposições como principal forma de divulgar os resultados do Coastwatch (Fig. 47). o u tr a s 77% F o r m a ç ã o /W s h p 4% S e m in á r io s / e n c o n to s / c o ló q u io s 19% Figura 47 – Tipo de actividades de divulgação dos resultados (%) Hoje em dia, a ligação aos órgãos de comunicação social é essencial e um meio fortemente difusor das actividades desenvolvidas, daí que muitos coordenadores recorram a estes como forma de, com maior destaque, difundir e divulgar o trabalho desenvolvido. N S a b e /N r e s p o n d e O u tr a s Po p u la ç ã o e m g e r a l En c a r r e g a d o s Ed u c a ç ã o Es c o la s En tid a d e s G o v e r n a m e n ta is c o m r e s p o n s a b ilid a d e n a s á r e a s d e a m b ie n te /o r d e n a m e n to /A u ta r q u ia s O NG 0 2 4 6 8 10 12 Figura 48 – Entidades Convidadas/Envolvidas na divulgação dos resultados 120 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Relativamente às entidades convidadas/envolvidas na divulgação dos resultados, predominam as Escolas (11 respostas); Encarregados de Educação e População em geral (com 7 respostas cada). No parâmetro Outras, destaca-se a Comunicação Social (Fig. 48) Muitos dos professores e coordenadores regionais que dinamizaram o projecto durante o ano, organizam exposições e feiras de actividades através das quais expõem os trabalhos desenvolvidos no âmbito deste e doutros projectos. Desta forma envolvem a comunidade escolar, local e encarregados de educação nas actividades desenvolvidas em prol da cidadania e educação ambiental (Fig. 49). Figura 49 – Exposição de trabalhos desenvolvidos no âmbito do Coastwatch (CM Funchal) Contrariamente ao que seria de supor, o papel desempenhado pelas ONG, sejam de ambiente ou outras é neste inquérito pouco invocado, apenas dois inquiridos referiram convidar/envolver as ONG na divulgação dos resultados. 1.13 FRAGILIDADES DO PROJECTO COASTWATCH O Coastwatch tem, inerente, algumas fragilidades próprias de um Projecto que tem 18 anos. Não sofreu, até então, alterações ao nível do questionário base, de forma a actualizá-lo; é um projecto internacional cujo questionário é praticamente igual para todos os países, independentemente das suas características geomorfológicas e climatéricas e é desenvolvido em regime de voluntariado por um vasto leque de participantes das mais diversas formações e idades. A diversidade de participantes é uma das mais valias do projecto, porém, não é possível manter um controlo sobre a fiabilidade dos dados, o que lhe confere alguma margem de erro. É certo que este é um 121 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch projecto de Educação Ambiental e não um projecto científico, mas a margem de erro persiste e só com muita formação se consegue colmatar. Aliado a todos estes factores, há a acrescentar o facto do projecto estar essencialmente vocacionado para as escolas e muito dependente da monitorização efectuada pelos alunos (mais de metade dos participantes são alunos que por sua vez monitorizam um elevado número de blocos). As recentes alterações no estatuto da carreira docente, por ocuparem os docentes com mais horas lectivas, dificultam a sua dedicação a projectos e a própria saída de campo para monitorização. Por outro lado o facto da monitorização ter que ser efectuada durante a maré baixa, no período de Outubro a Dezembro, coincidindo, em Portugal, com a época de maiores quantitativos de precipitação, dificulta a concretização de alguns dos objectivos, o que representa uma condicionante na obtenção de melhores resultados. (Fig. 50). Figura 50 - Precipitação mensal em Portugal Continental em 2006.Comparação com os valores médios 116 Acresce aos elevados quantitativos de precipitação os períodos de alerta pela Protecção Civil, dificultando, igualmente as saídas de campo para monitorização. 2006, foi um ano em que associados aos períodos de monitorização se registaram vários dias de alerta laranja e amarelo em praticamente toda a costa portuguesa (Quadro XVII). 116 (http://www.meteo.pt -visitado a 13 de Agosto 2007) 122 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch 20 a 26 de Outubro Alerta Amarelo Quadro XVII – Distribuição de Alertas emitidos pela Protecção Civil 05 a 07 de 15 a 16 de 22 a 23 de 24 a 25 de 25 a 26 de Novembro Novembro Novembro Novembro Novembro Alerta Alerta Alerta Alerta Alerta Amarelo Amarelo Amarelo Laranja Amarelo Fonte: Protecção Civil 26 a 28 de Novembro Alerta Laranja 117 Um outro aspecto que lhe confere fragilidade prende-se com o tipo de cartografia utilizado e a divisão dos blocos e das unidades. A linha de costa é cedida, gratuitamente, ao GEOTA, pelo IgeoE através de um protocolo de parceria. A partir daí são delimitados, em SIG, os blocos a uma escala de 1/25000. A divisão em unidades é manual e, como se tem em conta as reentrâncias da linha de costa, nem sempre os 500m são exactos; e, de ano para ano, ou de participante para participante, podem sofrer pequenas alterações. Associado à cartografia refere-se, ainda, que a linha de costa nem sempre se encontra actualizada o que dificulta bastante o trabalho no terreno, sobretudo nos blocos em que as reentrâncias são mais acentuadas. Esta mesma situação acaba por retirar ao projecto algum rigor científico. Aquando da implementação do projecto em Portugal, em 1989 foi tomada a decisão de considerar todo o tipo de reentrâncias ou saliências da costa na medição dos blocos, tendo em vista a sua delimitação em trechos com 5 km de extensão. Como se sabe, nessa época ainda se estava longe da aplicação sistematizada dos Sistemas de Informação Geográfica tal como hoje a conhecemos. A divisão era efectuada manualmente sobre os mapas cartográficos de 1/25000, com todas as incorrecções que isso acarretava. Essa opção não se veio a revelar a mais correcta, na medida em que tanto o dinamismo da costa, como as intervenções antrópicas geram grandes alterações na configuração da linha de costa. Um bloco de 5km, delimitado, em linha média, sem reentrâncias - mesmo sofrendo efeitos da erosão ou construções, como por exemplo, um pontão ou esporão - não implicará um aumento ou diminuição do número de unidades. O mesmo não acontece quando se considera o contorno de pontões na definição das unidades; ou quando, numa determinada unidade a construção de um novo esporão implica uma nova delimitação. Por estas razões julga-se que a divisão 117 (dados enviados por e-mail a 10 de Abril de 2007). 123 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch dos blocos deve ser feita com base numa linha média, tão rectilínea quanto possível, mesmo que isso implique perda de detalhe na comparação de dados. Assim, quando os mapas passaram a ser em formato digital, optou-se, para efeitos de comparação, manter os mesmos limites, daí que se encontrem algumas divergências na dimensão dos blocos, não podendo garantir-se que estes tenham 5km exactos. Acontece que, aquando a divisão, uns participantes dividem o bloco em 10 unidades (que poderão ter mais ou menos que 500m) e outros optam por dividir em 500m exactos, o que se poderá traduzir em mais ou menos unidades que as 10 estandardizadas. Ao nível do questionário em si e dos respectivos parâmetros de monitorização, existem também algumas fragilidades, que se pensam ter colmatado com as alterações introduzidas no novo modelo de questionário. Continua, porém, a permanecer a questão relacionada com as análises às descargas líquidas no mar. São apenas previstas análises aos nitratos, embora importante - na medida em que os produtos químicos usados na agricultura acabam por ir parar directa ou indirectamente ao mar - é deveras insuficiente, porque a descarga pode não ter nitratos e continuar estar poluída com outros elementos. Contudo, introduzir outras hipóteses de análise como cloretos, fosfatos, oxigénio dissolvido, ph; condutividade eléctrica – com a qual podemos obter uma correlação com concentração de sais presentes nas águas – ou outras Microbiológicas simples como coliformes fecais, é neste momento, insustentável economicamente para um projecto que tem vindo a perder apoios financeiros por parte das entidades governamentais. Entidades que desenvolvem estudos específicos, complementam as análises mas suportam o seu financiamento e não chegam a enviar os dados para o GEOTA. Alguns alunos do secundário recolhem amostras de água e posteriormente fazem o seu tratamento em sala de aula, em técnicas laboratoriais. Todas estas características, conferem ao Coastwatch fragilidades, algumas delas poderão ser superadas, outras serão sempre intrínsecas ao projecto. 124 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch 1.14 POTENCIALIDADES DO PROJECTO COASTWATCH O Projecto Coastwatch apresenta diversas potencialidades a diferentes níveis. Ao nível dos dados, apesar de alguma margem de erro, são fidedignos, objectivos, práticos, comparáveis, actualizáveis e aplicáveis. Actualmente existe um manancial considerável de armazenamento de dados, na medida em que anualmente, entre Outubro e Dezembro, é monitorizada uma parte substancial do litoral português. É verdade que existem troços cuja monitorização não ocorre todos os anos, mas no geral a informação disponível é actualizada, o que lhe confere grande utilidade. Com efeito os dados podem ser utilizados por diferentes entidades, com distintos propósitos, sendo que, em comum, todas poderão utilizá-los ao nível da sensibilização. Para além das escolas – que já a eles recorrem ao nível curricular – podem, ser aproveitados pelas autarquias para informação, divulgação e resolução de problemas; pelas ONGA que através destes podem ter um papel mais interventivo junto da população e fazerem pressão sobre os órgãos competentes; por diversas instituições que os podem aplicar para outras áreas ou apenas para divulgação. As universidades, jornalistas, investigadores, entre outros, com frequência, solicitam a cedência de dados para trabalhos específicos, sobretudo ao nível da erosão costeira. A título de exemplo, refira-se, que o INE utilizou a recolha de dados, referente a um dos parâmetros do questionário, para criar um indicador de risco. Aproveitando a continuidade temporal e área de análise da monitorização, o Coastwatch oferece a possibilidade de entidades diversas, como por exemplo as CCDR’s, especificarem determinadas questões, não contempladas no questionário base, e que poderão a ele ser anexadas. Desta forma poder-se-á fazer o levantamento de informação aproveitando sinergias. Não obstante a utilização dos dados monitorizados o Coastwatch, em si, oferece a possibilidade de se abordar uma vastidão de assuntos relacionados com a temática do litoral, a sensibilização, o desenvolvimento sustentável, a participação pública, a dinâmica costeira, o ordenamento do território, entre outros, quer ao nível nacional quer 125 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch regional ou mesmo local. Aliás, tendo em conta que a observação mínima é de 500m, pode-se até chegar ao ponto de falar da praia, ou outro troço do litoral, utilizado por qualquer indivíduo, seja por interesse ao nível do lazer, académico, económico ou outro. A versatilidade do projecto é comprovada aquando da organização, todos os anos, do Seminário de Apresentação de Dados. Sendo cada campanha dedicada a um tema específico, o molde do seminário compreende, para além da apresentação dos resultados nacionais; apresentações orais de coordenadores regionais; comunicações de investigadores dentro da temática do litoral a nível geral e específico da área onde é organizado o evento; Workshops temáticos em sala ou in loco; visitas de estudo de forma a compreender, questionar e propor soluções, sobre o impacte no ordenamento do território, essencialmente nas áreas do litoral; um “espaço intercultural” composto por exposição de posters realizados – no âmbito do Coastwatch – quer pelas escolas, associações, autarquias, etc., exposições relacionadas com o tema mas desenvolvidas por outras entidades, ateliers temáticos (pretende-se divulgar artesanato local, associações de pescadores, entre outros). A organização do seminário, segundo este formato, tem obtido grande sucesso: os painéis temáticos são diversos, actuais e de interesse global (por vezes controversos), o que gera o debate; na prática assiste-se a um bom exercício de cidadania. Desta forma contribui-se também para se adquirir hábitos de participação pública. Como refere Andrade (2007) “O Projecto Coastwatch deu-me já a possibilidade de participar, como observador, na praia; nos seminários de abertura e encerramento, discutindo possibilidades, estratégias e resultados de trabalho; como orientador de Workshops, demonstrando a montagem e utilização de métodos adicionais ao “Inquérito base” do projecto, passíveis de utilização expedita na praia e que nos podem ensinar um pouco mais sobre o devir das nossas costas. Em todas essas situações, sempre senti que o Coastwatch é um verdadeiro exercício de cidadania em ambiente, que integra um público verdadeiramente abrangente (Andrade, 2007:6). Para além das potencialidades já focadas, o projecto Coastwatch, permite desenvolver hábitos de voluntariado - ele próprio é um exemplo vivo – de associativismo, de 126 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch interligação e parceria com diferentes entidades. A um nível mais lato, contribui, directa e/ou indirectamente, para uma melhor gestão integrada das áreas costeiras. Através do questionário Coastwatch, já alterado, poder-se-á criar um indicador de percepção de risco para as áreas costeiras. Para além deste indicador, outros poderão ser propostos. E porque é um projecto em aberto, certamente que outros lhe encontrarão muitas mais potencialidades. No futuro a coordenadora nacional pensa desenvolver uma série de materiais didácticos, com hipóteses de exploração para diferentes áreas curriculares, a par do que já é feito na Holanda. 1.15 PROPOSTAS DE ALTERAÇÃO DO QUESTIONÁRIO Em face das fragilidades encontradas ao nível do questionário, procurou-se solucionar o problema introduzindo algumas alterações de fundo no questionário base. Após a proposta à coordenação internacional e a respectiva anuência, procedeu-se às modificações com vista a uma maior abrangência na monitorização e menos dependente da quase exclusividade à maré baixa. Simultaneamente, corrigiram-se algumas imprecisões técnicas existentes (Anexo 10). A primeira alteração foi a simplificação da imagem exemplificativa do campo de análise do projecto Coastwatch (Fig.51). A – linha máxima do nível do mar em épocas de marés-vivas B – linha de maré-cheia (marca da última maré) C – limite mínimo da maré vazia D – Zona interior contígua (nunca atingida pela água do mar, excepto eventualmente durante alguma grande tempestade) E – Zona Supratidal (coberta pela água do mar na época de marés vivas) F – Zona Intertidal (entre o limite mínimo e máximo das marés) G – Zona subtidal (abaixo do limite máximo da maré vazia Figura 51 – Corte e planta da área de análise do projecto Coastwatch. Fonte: CIGA -FCT/UNL 127 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Já atrás foi referido, a tipologia das áreas curriculares que aderem ao projecto Coastwatch são diversas, por isso é de todo o interesse diversificar o campo de análise, para que um número cada vez maior de docentes encontrem, para além da interdisciplinaridade, um objecto de estudo da sua área específica. Para os outros participantes, poder olhar para o território de uma forma mais abrangente, é certamente uma mais valia. A figura 52 mostra-nos uma costa geomorfologicamente distinta. Importa pois, que quem procede à monitorização observe atentamente estas diferenças para que se questione nos parâmetros seguintes: fauna, flora, riscos, entre outros. Figura 52 – Tipos de costa no litoral português Fonte. http://oficina.cienciaviva.pt Assim, ao nível da geologia, mais do que alterações ao questionário foram introduzidos novos parâmetros que têm a ver com a caracterização da costa (rochosa, não rochosa, 128 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch arenosa); com a altura e inclinação das arribas; presença de sedimentos grosseiros na base da arriba; grau de alteração da rocha; grau de fracturação da rocha. Tendo em conta que havia uma certa repetição de parâmetros, procurou-se sintetizar e reagrupar, de forma a simplificar o questionário e simultaneamente torná-lo mais rico em termos de recolha de dados. Um dos pontos mais sensíveis do questionário era sem dúvida, a monitorização das descargas líquidas no mar ao longo da unidade, mesmo ficando longe do ideal, procurou-se melhorar este item, especificando correctamente a tipologia das drenagens [Drenagem natural – Linha de água (rio, ribeira, etc.) ou surgência (nascente, fonte, etc.); Drenagem artificial: entubado; a céu aberto (vala); escorrência (fossas, indústria, etc.)]; a secção das Linha de água/vala (a céu aberto); o diâmetro do Tubo/conduta e a largura Surgência/escorrência. O anterior questionário previa apenas a observação de fauna e flora na zona Intertidal, o que empobrecia bastante a recolha de dados, como tal foi acrescentado a hipótese de se monitorizar estes itens também na zona Supratidal. Neste parâmetro, como no dos resíduos, foi alterado a questão da contagem, para uma maior facilidade e até fidedignidade, deixa-se de fazer uma contagem absoluta e passando a ser contabilizados em intervalo de classe. Futuramente será editado um novo guia do litoral com um maior suporte de imagens exemplificativas da fauna e flora da costa portuguesa, ao nível dos resíduos foi onde se procedeu a um maior número de alterações, contudo, no cômputo geral, este item ficou mais harmonioso. E, porque criar indicadores de risco, mesmo que sejam indicadores de percepção será sempre uma mais valia, quer para o Coastwatch em si, quer para outros projectos ou entidades, públicas ou privadas, que necessitem desenvolver estudos nesta área; procurou-se introduzir, no novo modelo de questionário, um parâmetro “Percepção de Riscos”. Através de vários indicadores ambientais, cria-se assim a hipótese de criar um indicador de risco a partir da percepção que cada indivíduo tem do que observa. Na generalidade estes são indicadores de Estado, segundo o modelo PER - PressãoEstado-Resposta (Quadro XVIII). 129 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Quadro XVIII – Indicadores percepção de Risco INDICADORES: Erosão costeira [sinais de deslizamentos de terrenos, sinais de galgamento do mar, presença de estruturas de carácter permanente que permitam evidenciar o grau de erosão ou deposição de sedimentos (p. ex. um sinal de aviso enterrado ou a descoberto)] Extracção de inertes (areias, etc.) Pressão turística excessiva Perda de qualidade ambiental (descarga de efluentes sem tratamento, areias poluídas, perda de bandeira azul) Outros. Quais? Risco Desconhecido Fonte: Questionário Coastwatch Este parâmetro tem toda a pertinência numa altura em que a erosão costeira, as alterações climáticas e os impactes da actividade humana, causa e/ou consequência uns dos outros, estão na ordem do dia. Segundo o modelo PER (Pressão-Estado-Resposta - Classificação segundo a OCDE) os Indicadores de Pressão são os que caracterizam as pressões sobre os sistemas ambientais e podem ser traduzidos por indicadores de emissão de contaminantes, eficiência tecnológica, intervenção no território e de impacte ambiental; os Indicadores de Estado reflectem a qualidade do ambiente num dado horizonte espaço/tempo (indicadores de sensibilidade, risco e qualidade ambiental); e os Indicadores de Resposta que avaliam as respostas da sociedade às alterações e preocupações ambientais, bem como a adesão a programas e/ou implementação de medidas em prol do ambiente (indicadores de adesão social, de sensibilização e de actividades de grupos sociais importantes) [adaptado de Sistema de Propostas de Indicadores de Desenvolvimento Sustentável, DGA, 2000] (Fig. 53). Fonte: IA 2000 Figura 53 - Estrutura conceptual do modelo PER da OCDE 130 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Na proposta para um Sistema de Indicadores de Desenvolvimento Sustentável pode ler-se “Os indicadores de desenvolvimento sustentável são, presentemente, não apenas necessários, mas indispensáveis para fundamentar as tomadas de decisão aos mais diversos níveis e nas mais diversas áreas. Surgem por todo o mundo iniciativas e projectos com vista à definição de indicadores de desenvolvimento sustentável para um variado leque de finalidades de gestão, ao nível do desenvolvimento local, regional e nacional” (DGA, 2000). Quadro XIX - Indicadores Ambientais SECTOR AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO AMBIENTE MARINHO E COSTEIRO NOME Crescimento populacional em zonas costeiras Evolução da linha de costa Área construída Contaminação de origem difusa Descargas pontuais de efluentes sem tratamento Descargas acidentais de hidrocarbonetos Qualidade da água em zonas balneares Zonas balneares com bandeira azul Qualidade do sistema aquático em faixas costeiras, estuários, lagunas e rias Investimento e despesa na preservação ambiental e defesa de zonas costeiras TIPO PRESSÃO ESTADO PRESSÃO ESTADO PRESSÃO PRESSÃO ESTADO ESTADO ESTADO RESPOSTA Fonte: Adaptado de Sistemas de Propostas de Indicadores de desenvolvimento Sustentável, DGA, 2000 A partir da Quadro XIX pode-se observar os indicadores ambientais que directa ou indirectamente poderão servir de complemento ao projecto Coastwatch, quer através da monitorização (a criação do item Percepção de risco foi elaborada a partir da análise deste documento), quer, posteriormente, complementando os dados recolhidos com a elaboração do relatório anual. 1.16 INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL - O MODELO DPSIR Os indicadores de desenvolvimento sustentável foram introduzidos com o objectivo de avaliar o desempenho das economias, em geral, e de determinados sistemas, em particular, face ao novo conceito de desenvolvimento – o desenvolvimento sustentável, tal como definido no Capítulo 1. Segundo a Agência Europeia de Ambiente (AEA), estes indicadores podem ser usados para explicar de uma forma compreensível, mas simplificada, as condições de sistemas complexos. Cada um dos indicadores “conta 131 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch uma história” que é parte do todo, e só a combinação dos indicadores pode dar uma visão global da complexidade. Neste contexto “indicadores” são parâmetros, isto é, grandezas descritas de forma qualitativa ou quantitativa, ou conjunto de parâmetros, seleccionados para descrever determinadas condições do sistema ou sistemas em análise. É importante que se entenda que, com a simplificação da informação sobre fenómenos mais ou menos complexos ganha-se em clareza e operacionalidade o que se perde em detalhe dos dados originais. O objectivo da introdução deste tipo de indicadores no projecto Coastwatch consiste em facilitar a avaliação do desempenho da gestão do litoral pelos diferentes agentes, face ao novo conceito de desenvolvimento atrás definido. Neste contexto, o projecto Coastwatch irá adoptar, como modelo enquadrador dos indicadores utilizados, o modelo DPSIR. Como foi referido anteriormente o primeiro modelo conceptual integrador da análise do desempenho de determinados sistemas em termos de desenvolvimento sustentável foi proposto pela OCDE em 1993 e adoptou a designação de modelo PER. Mais tarde, em 1999, a AEA apresentou um modelo conceptual evoluído a partir do modelo PER, designado por DPSIR: D – Driving Forces, aqui traduzido por Forças Actuantes; P – Pressure, ou Pressão; S – State, ou Estado; I – Impacts, ou Impactes; R – Responses, ou Respostas. De novo, relativamente ao modelo PER, apresenta a introdução de um elemento “a montante” (Forças Actuantes) e de um elemento entre o Estado e as Respostas (Impactes). O diagrama da figura 54 ilustra o descrito, exemplificando com vários indicadores, ou grupos de indicadores, possíveis. 132 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch Fonte: Costa 2007 Figura 54 - Modelo DPSIR : Forças Actuantes (Driving forces) - Pressão – Estado – Impactes – Resposta 1.16.1 APLICAÇÃO DO MODELO DPSIR NA ANÁLISE DE INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA GESTÃO DO LITORAL O modelo DPSIR começa por ser desenvolvido a partir da identificação de indicadores que caracterizam os diversos elementos que o constituem. Como se pretende aplicar este modelo na análise dos indicadores de desenvolvimento sustentável na gestão do litoral, foram identificados para os diversos elementos os seguintes indicadores (Quadro XX). Forças actuantes (Driving forces) Pressões Estado Impactes: Respostas Quadro XX – Indicadores de DS na Gestão do Litoral - Indústria (ex: nº de pontos de descarga de efluentes) - Áreas urbanas (ex: nº de pontos de descarga de águas residuais) - Turismo/ lazer (ex: nº de utentes das praias/dia) - Actividades portuárias (ex: nº embarcações) - Construção (ex: área construída no interior da faixa de 500 m) - Nº de descargas de efluentes/ano - Resíduos sólidos (nº unidades; tipologia consoante perigosidade) - Nº fontes emissoras poluição atmosférica - Nº de Apoios de praia - Ar – qualidade do ar (ex. NOx, SOx, etc.) - Solo/sedimentos – (ex: parâmetros de contaminação química e bacteriológica) - Água – (ex: parâmetros de contaminação química e bacteriológica) - Seres vivos – (ex. Sanidade de comunidades) - Nº praias c/ água balnear imprópria - Doenças registadas por efeito de utilização da praia - Nº peixes mortos Nº de dias interdição de uso da praia - Áreas de restrição de uso por efeito de risco de desmoronamento de falésia - Nº de intervenções de despoluição das águas - Euros dispendidos na protecção costeira por km de costa Fonte: Adaptado de Costa, 2007 133 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch O diagrama da figura 55 ilustra o descrito, exemplificando com vários cenários de resposta consoante os níveis hierárquicos dos elementos em que se pretende actuar. Como se pode observar, é desejável que as respostas possam ser dirigidas o mais “a montante” possível, favorecendo a actuação pró-activa, em detrimento da actuação reactiva que, naturalmente se dirige à correcção dos impactes directamente derivados dos danos resultantes da efectivação de um determinado “perigo” que pode ter resultado em “desastre” (Costa, 2007). FORÇAS ACTUANTES PREVENÇÃO PRÓ-ACTIVA Factores de controlo de perigos e danos potenciais (ex: no planeamento: restrição da ocupação de áreas de risco de erosão) PRESSÕES MITIGAÇÃO NÃO-ESTRUTURAL Perigos e danos potenciais (ex: conservação do ecossistema: proteger os sistemas dunares) ESTADO MITIGAÇÃO ESTRUTURAL Risco(?) dependente da vulnerabilidade (ex: obras: reforço de estruturas de protecção costeira) IMPACTES REACÇÃO Prevenção/ Vigilância (ante) Desastre (um perigo potencial resultou em dano) Socorro Recuperação (post) RESPOSTAS Gestão do risco ACÇÕES Figura 55 - Aplicação do modelo DPSIR na análise de indicadores de desenvolvimento sustentável na gestão do litoral 118 134 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch 1.17 PERSPECTIVAS DE DESENVOLVIMENTO DO PROJECTO COASTWATCH INTERCONTINENTAL O sucesso do Coastwatch em Portugal, aliado a uma visão de internacionalização da actividade do GEOTA, acarretou a esperança de levar o projecto para além da Europa. Tendo em conta as potencialidades que os países de expressão lusófona oferecem para se trabalhar a Educação e Cidadania Ambiental num contexto do Desenvolvimento Sustentável e as boas relações mantidas com estes países, à partida a ideia oferecia grandes hipóteses de êxito. Assim, foram encetados alguns contactos com ONGA em Cabo Verde, Angola e Brasil, com o intuito de apresentar o projecto e descobrir parceiros para se implementar o Coastwatch. Se nos dois primeiros países tem existido alguma dificuldade em obter respostas que conduzam a um concretizar da implementação do projecto a curto prazo (embora actualmente se reiniciem os contactos com Angola) no Brasil aspectos conjunturais facilitaram o trabalho e na próxima campanha (2007/08) irá iniciar-se a experiência piloto em alguns trechos do litoral de Fortaleza, no Estado do Ceará, de Salvador, no Estado da Bahia e de Maceió, Estado de Alagoas. De 1 a 15 de Dezembro de 2007 a Coordenadora Nacional deslocar-se-á a estes Estados para dinamizar o projecto, preparando os novos parceiros para as próximas campanhas. 1.17.1 COASTWATCH BRASIL A orla costeira brasileira apresenta, grosso modo, problemas idênticos, em maior ou menor escala, que qualquer outro país onde exista litoral. A temporalidade e o espaço podem ser diferentes mas o impacte da actividade humana sobre a costa, causada pela forte atracção que esta exerce sobre a humanidade seguem percursos similares. “O turismo é a actividade económica que se tem destacado no cenário internacional por apresentar os mais altos índices de crescimento nas últimas décadas e o litoral tem sido um dos principais destinos dos turistas contemporâneos. Os atractivos naturais (praias de águas límpidas, ambientes naturais preservados, recursos da pesca, beleza da paisagem, etc.) que propiciam uma grande diversidade de actividades de lazer e recreação são factores decisivos para esta escolha. Por sua vez, a prática do veraneio 135 Capitulo 3 – Caso de estudo: O Projecto Coastwatch é um fenómeno mundial que ocasiona em todo o globo o surgimento de áreas de segunda residência. O litoral brasileiro vive na actualidade, além de um incremento do turismo e do veraneio doméstico, uma rápida inserção no turismo internacional. Estes fatos têm ocasionado uma veloz ocupação e adensamento de localidades até então isoladas e preservadas. Para garantir a sustentação e a vitalidade destas três funções (económica, ecológica e sócio-cultural) no espaço litorâneo119, de forma simultânea, tornam-se necessárias acções de planeamento e gestão para a integração das mesmas, de modo a reduzir conflitos e eliminar antagonismos (Projecto Orla: Fundamentos para a Gestão Integrada, 2002). O desordenamento do litoral, as descargas líquidas no mar e os resíduos são alguns dos grandes problemas do litoral brasileiro. Como é sabido, tais questões são abordadas no questionário Coastwatch, daí toda a pertinência e o interesse das diferentes entidades que tomaram conhecimento do projecto. Actualmente são três os estados já envolvidos: Ceará, Bahia e Alagoas e com entidades diversas, respectivamente Hidroambiental Águas do Brasil (IHAAB), ONDA VERDE e Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMARH). Neste momento procura-se delinear os mapas de campo, reajustando-os aos objectivos do projecto Coastwatch Brasil. Tendo em conta a extensão do litoral brasileiro os blocos serão divididos em 5 unidades de 1km cada. Os técnicos responsáveis pelo Coastwatch no Brasil procedem à respectiva adaptação do questionário, para que este reflicta a realidade local, oferecendo a oportunidade de uma monitorização com recolha de dados fiáveis e úteis. À semelhança do que acontece em Portugal, o Coastwatch Brasil, terá como públicoalvo estudantes dos diferentes níveis de ensino, jovens, técnicos de ambiente, membros de associações diversas, entre outros. A próxima campanha funcionará, nestes Estados do Brasil, como experiência piloto, contudo, espera-se que outros estados venham a aderir. O interesse manifestado é crescente, por isso acreditamos que a apresentação do projecto nestes três estados trará mais parceiros para o Coastwatch Brasil. 136 Capitulo 4 – Conclusões CONCLUSÕES Ao realizar o balanço desta dissertação, que procurou deliberar acerca da forma como o caminho da participação pública foi desenvolvido em Portugal, apercebemo-nos que este nem sempre foi um percurso fácil e que ainda muito há a fazer. Por questões conjunturais, relacionadas com a situação política do país, Portugal só tardiamente encetou a promoção da participação activa dos cidadãos nos processos de decisão. O atraso nesta caminhada ainda hoje se reflecte, muito embora haja sinais que a sociedade se está a estruturar nesse sentido tornando-se mais preocupada e empenhada nos processos de decisão que lhe dizem directamente respeito. Para este despertar muito contribuiu, numa primeira fase, a entrada de Portugal na União Europeia ao introduzir legislação inovadora sobre esta temática e, inerente a ela, a obrigatoriedade do nosso país implementar a participação pública, nomeadamente através de instrumentos que complementassem os processos educativos formais, dos quais relevam os da educação ambiental. Assim, ao longo deste trabalho procurou-se analisar o percurso da participação pública em paralelo com o caminho trilhado pela educação ambiental em Portugal, tendo sempre como pano de fundo o conceito de Desenvolvimento Sustentável. No capítulo I – Da Emergência da Educação Ambiental ao Desenvolvimento Sustentável – procurou-se mostrar como o papel da institucionalização da educação ambiental foi decisivo para o desenvolvimento da cidadania. Muito embora, este seja um tema que não se esgota, pode-se afirmar que as novas gerações começam a estar imbuídas do espírito de cidadania activa. Para tal foi preciso que a sociedade em geral e cada cidadão em particular se consciencializasse acerca da importância do impacte do progresso tecnológico sobre o planeta. A história da tomada de consciência desta realidade é abordada ao longo da dissertação mas as conclusões ficam em aberto: na verdade, a degradação dos ecossistemas e a perda de biodiversidade já atingiram proporções tais que deixam pouca margem para optimismos exagerados. 137 Capitulo 4 – Conclusões Por outro lado, é possível concluir, pelo trabalho desenvolvido, que o papel do voluntariado ambiental foi essencial para a chamada de atenção para todos os problemas que foram surgindo á escala planetária. Não obstante as dificuldades e falhas subjacentes, é fácil deduzir que os principais acontecimentos, a nível internacional, das últimas décadas não teriam sido tão marcantes e indispensáveis para o alerta sobre esta problemática em torno do consumo, do crescimento e do desenvolvimento sem a contribuição das organizações não governamentais enquanto elementos de pressão sobre os decisores políticos. Exemplos não faltam, Conferência da Terra, Cimeira de Joanesburgo, declaração do Milénio, etc. De entre todos os documentos e relatórios, de todas as cimeiras, conferências e outros eventos realizados com o intuito de não só alertar mas também de obter um compromisso para a mudança de comportamentos em relação ao estado do Planeta, o mais relevante foi o Relatório Brundtland. Vinte anos depois, o recente balanço feito pelo Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA) no relatório Geo-4 reconhece a gravidade da crise global e refere como, em relação a um dos elementos chave desta crise, as alterações climáticas - uma prioridade mundial que exige vontade política e liderança – se está a dar uma resposta lamentavelmente inadequada. No capítulo II – “Instrumentos Políticos e Cidadania Ambiental em Portugal” procurouse fazer uma análise dos instrumentos políticos criados para a concretização do percurso da Participação Pública no contexto do Desenvolvimento Sustentável. Verificou-se pois que a criação de uma legislação de suporte ambiental, como o caso da Lei de Bases do Ambiente foi capital para todo este processo. A entrada de Portugal na U.E impôs a transposição para o direito português da legislação europeia o que veio consubstanciar o percurso que tinha sido iniciado em meados da década de oitenta nomeadamente com a Convenção de Aarhus. A emergência das associações de defesa do ambiente em Portugal foi influenciada pelos acontecimentos internacionais e suportada por uma legislação de protecção do ambiente e estas viriam a ter um papel preponderante na consciencialização ambiental, quer ao nível da educação ambiental, quer do desenvolvimento sustentável ou da participação pública, facto que ainda hoje se mantém. 138 Capitulo 4 – Conclusões As práticas do exercício de cidadania, como nos exemplos apresentados na dissertação, são um caminho para formar, incentivar e desenvolver hábitos de participação pública. Contudo, não podemos deixar de reconhecer que são, na sua maioria, do tipo convencional, de que é exemplo a participação pública nos POOC. Se queremos formar cidadãos mais activos, então há que investir em métodos, eles próprios mais interactivos, como por exemplo reuniões de debate com os “actores chave”. A dissertação apresenta dois casos exemplificativos de participação colaborativa, em que a componente pro-activa se sobrepõe à reactiva, desenvolvidos com o apoio do GEOTA: o debate sobre o processo erosivo da Costa da Caparica e a exigência de um traçado alternativo para o IP2 – Variante de Estremoz, que não seja lesivo do ambiente e do desenvolvimento sustentável desta região. No capítulo III – “Caso de Estudo: O Projecto Coastwatch” – procurei para além de apresentar o projecto e os seus objectivos dar a conhecer a sua implementação em vários países da Europa e em Portugal, e ainda apresentar os primeiros passos da sua expansão para países de expressão lusófona. Assim, no que concerne ao estudo-caso do projecto Coastwatch, conclui-se que os 18 anos de experiência em termos de educação e cidadania ambiental deram alguns frutos em prol da participação pública. Acredita-se que a reestruturação do projecto e o facto deste se expandir para outros continentes terá repercussões positivas também no próprio Coastwatch Nacional, que está a liderar esse processo de expansão. Para caracterizar a participação dos cidadãos no Projecto Coastwatch foi elaborado um inquérito a actuais coordenadores regionais, professores responsáveis pela sua dinamização e outros responsáveis, quer seja de grupos de escuteiros, ONG ou outras entidades e a outros que no passado estiveram a ele ligados. Deste inquérito realça-se, o facto de 46,6% participar à 2-3 anos e 17,8% há mais de 5 anos. Muito embora não haja nenhum inquirido que indique permanecer no projecto desde a sua implementação em Portugal, alguns estão a ele ligados há mais de uma década. E, apesar do inquérito não o mostrar, é sabido que existem actualmente docentes participantes no projecto que já o foram enquanto alunos. Assim, 139 Capitulo 4 – Conclusões exceptuando os inquiridos que participaram apenas um ano – quer se trate da 1ª vez ou apenas um acto isolado – 89% dos restantes afirmaram ter continuidade no Projecto. As entidades responsáveis pela dinamização do projecto, a nível regional, recorrem a actividades de divulgação do projecto e mais tarde de dinamização dos resultados. As maiorias das parcerias são desenvolvidas com escolas e autarquias locais. Quanto á metodologia de dinamização e divulgação, a escolha recai sobre a comunicação social como forma de, com maior destaque, difundir e divulgar o trabalho desenvolvido e sobre actividades que envolvam a comunidade local e encarregados de educação (exposições, e feiras de actividades, sessões de debate, etc.). É consensual, no universo dos inquiridos, a ideia de permanência no projecto como forma de dar continuidade aos trabalhos encetados em cada campanha Coastwatch. Entretanto a coordenação portuguesa continuará a encetar esforços para que o projecto ganhe outro ânimo a nível europeu, criando-se uma verdadeira rede internacional. O facto do projecto ser coordenado por uma ONGA é um sinal promissor de que o Coastwatch continuará a desenvolver esforços para envolver o maior número possível de cidadãos, tornando-os mais activos. A experiência, a continuidade e o olhar dos mais jovens sobre o ambiente em geral e o litoral em particular, são um sinal promissor que as novas gerações estão aí para dar continuidade ao projecto. A minha experiência, enquanto coordenadora, indica-me que vale a pena investir e ter esperança; a comprová-lo estão as evidências: outrora jovens participantes, hoje professores, responsáveis por associações ou outras entidades, entram em contacto com o GEOTA para dinamizarem eles próprios o Coastwatch com as novas gerações. E, este é o sinal que permite acreditar na continuidade do projecto. Vale sempre a pena investir, mais tarde ou mais cedo recolher-se-ão os frutos. “Diz-me, e eu esquecerei; ensina-me e eu lembrar-me-ei; envolve-me, e eu aprenderei”. 140 BIBLIOGRAFIA ALEIXO, António (2002): “Correm Turvas as Águas Deste Rio”, Dissertação de Mestrado. Lisboa: FCSH-UNL. ALMODÔVAR, Margarida (2007): “Relatório Nacional Preliminar da Execução da Recomendação 2002/413/CE, de 30 de Maio, sobre Gestão Integrada da Zona Costeira”. Lisboa. ANDRADE, F. & FREITAS, C. 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INTERNET Agência Europeia do Ambiente http://eea.eu.int Ciência Viva http://oficina.cienciaviva.pt Declaração do Milénio http://www.netprof.pt Mútua dos Pescadores http://www.mutuapescadores.pt Carta dos Direitos Fundamentais http://www.europa.eu Coastwatch: www.geota.pt/coastwatch www.coastwatch.org http://ww2.unime.it/scienze-terra/cwn.htm http://miljolare.no/kyst http://213.239.198.103/coastwatch http://www.coastwatch.nl http://www.noordzee.nl/ 144 Constituição da República Portuguesa http://www.dre.pt Convenção de Aarhus http://europa.eu/scadplus/leg/pt Enciclopédia Britânica http://www.britannica.com/eb Instituto Nacional de Estatística www.ine.pt Instituto da Água www.inag.pt Instituto do Ambiente http://www.iambiente.pt Instituto Conservação da Natureza e Biodiversidade www.icnb.pt Instituto Hidrográfico http://www.hidrografico.pt Instituto meteorologia http://www.meteo.pt Instituto de resíduos http://www.inresiduos.pt Portal da União Europeia http://europa.eu.int Sistemas de Informação Documental sobre Direito do Ambiente http://www.diramb.gov.pt The Club of Rome www.clobofrome.org Outros http://www.ces.fe.uc.pt http://www.esb.ucp.pt http://www.geota.pt 145 ANEXOS Anexo 1 - Fichas de Participação Pública - IPAMB Anexo 2 – Entrevistas Anexo 3 – Inquéritos às ONG Anexo 4 - Programa Costa Caparica Anexo 5 - Fichas de participante na Campanha Anexo 6 -Programas dos Seminários Coastwatch Anexo 7 - Questionário Coastwatch Anexo 8 – Inquérito aos participantes no Coastwatch Anexo 9 – Perfil de Praia Anexo 10 – Novo Questionário Coastwatch 146