ASPECTOS DA CARGA TRIBUTÁRIA BRASILEIRA
Gilmar Mendes Lourenço
Ao ostentar uma carga tributária equivalente a 35,9% do Produto Interno Bruto (PIB), no exercício de 2012, o
Brasil figura entre os países com os maiores fardos de impostos, taxas e contribuições do planeta, aproximando-se de
algumas nações do continente europeu, e superando, inclusive, outras economias consideradas desenvolvidas como a
dos Estados Unidos (EUA).
No entanto, enquanto os contribuintes das nações avançadas auferem renda média de cerca de US$ 40 mil por
ano, sobrando mais de US$ 25 mil líquidos dos impostos para a realização de dispêndios incrementais de consumo e
investimento, no Brasil os rendimentos médios situam-se em U$ 10 mil/ano, restando parcos US$ 6.400 para os
esforços adicionais de consumo, poupança e inversão.
Várias simulações vêm demonstrando, a partir de cálculos com referências comparativas de carga e renda de
mercados ricos e emergentes, que a capacidade de suporte de transferência de renda do setor privado (empresas e
consumidores) para o governo estaria em 25% do PIB no País, o que comprovaria a escorchante sangria de mais de
10% do PIB, ou de quase um terço da arrecadação.
O preocupante, é que o Brasil desfrutava de carga de tal magnitude na fase pré-real. Desde então, o apetite
gastador da União engordou o sistema com um conjunto de contribuições e outros artifícios, vinculados ao
alargamento das bases de arrecadação – tendo como exemplos o PIS, a COFINS, a CSSL, a CPMF, dentre outros – itens
não partilháveis com estados e municípios, deixando, por extensão, os demais entes da federação ainda mais
subordinados às transferências e favores políticos da órbita federal.
Não bastasse isso, trata-se de um sistema amparado em impostos indiretos, onerando, em cadeia, os preços dos
bens e serviços, e subtraindo competitividade da base de produção brasileira tanto no mercado interno quanto no
front internacional, por intermédio da impulsão do já elevado - por outras ineficiências principalmente logísticas custo Brasil. Ademais, o ônus é regressivo, penalizando, de maneira mais aguda, a população menos aquinhoada que,
proporcionalmente, compromete maior parcela da renda com a aquisição de bens e serviços de consumo vis a vis as
classes mais abastadas.
Estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) indica que, pelo quinto ano seguido, o Brasil
figurou em último lugar na lista dos 30 países com maior carga de impostos do mundo, quando aferida a contrapartida
à população em oferta e qualidade de serviços públicos, a partir da mensuração do índice de retorno de bem estar à
sociedade, baseado na combinação entre duas variáveis: participação relativa da arrecadação no PIB e índice de
desenvolvimento humano (IDH).
Há um verdadeiro consenso nacional
acerca da necessidade de uma ampla
reforma tributária.
Nesse contexto, há um verdadeiro consenso nacional acerca da necessidade premente de compressão e
simplificação da carga, afora o governo federal, justamente o ente dotado de poder para realizar (ou negociar e
organizar) a diminuição do peso dos impostos no bolso dos consumidores e no fluxo de caixa das empresas, a despeito
de eventuais prejuízos de natureza política.
Desde os tempos do governo Fernando Henrique Cardos (FHC), o argumento corrente para a elevação de carga tem
sido a urgência da recuperação da trajetória ascendente dos superávits primários – receitas menos despesas correntes,
sem incorporar os juros -, fixados em 1,9% do PIB para 2014. Esse parâmetro representaria a poupança oficial destinada
à cobertura de parcela dos encargos financeiros incidentes sobre a dívida líquida do setor público, para escapar da
condição de insolvência e transmitir, aos mercados, a enganosa mensagem de solidez das contas públicas.
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De fato, no conceito nominal, que inclui juros, as finanças governamentais brasileiras fecham no vermelho em
mais de 3% do PIB a cada ano, situação que piora com a recente onda de elevação da taxa Selic, pelo Comitê de
Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) – nove subidas seguidas, chegando a 11% ao ano em abril de 2014 –
sob a liturgia do combate à inflação, represada, aliás, pela macroeconomia oficial populista de retardamento dos
preços dos combustíveis e serviços públicos e depressão das tarifas de energia elétrica, mesmo em época de apagão,
por insuficiência de investimentos.
Considerando que o executivo federal preserva a postura de gastança e arrecadatória, não fazendo a sua parte,
que seria o simples corte e racionalização de despesas, a não ser em jogos de cena midiáticos, centrados na retração
de verbas fictícias, a definição de poupança ou economia para os saldos primários soa, no mínimo, inapropriada.
O Brasil precisa de uma verdadeira cirurgia em seu aparato fiscal e tributário que venha a incidir mais direta e
progressivamente sobre renda e ganhos especulativos, e abrandar a voraz invasão sobre consumo, investimentos e
exportações. Em paralelo, urge uma radical simplificação, dando lugar a um reduzido número de impostos,
capitaneados pelo IR e o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Nacional. Este último deveria ser recolhido no destino,
para todos os itens – não apenas para petróleo e energia elétrica, como funciona no arcabouço atual – e ter
distribuição regulamentada e mais equânime entre as unidades federadas, a exemplo do que acontece na Europa.
Só assim será factível extirpar a guerra fiscal, uma peleja de resultado negativo para toda a nação, na qual, os maiores
beneficiados são, curiosamente, as grandes corporações que não precisam dos incentivos concedidos, muitas vezes, por
tesouros estaduais falidos que, costumeiramente, enviam a conta para União. Também seria de bom grado a instituição de
dispositivos constitucionais que impedissem a concessão de aval da União e permitissem cortes proporcionais do Fundo de
Participação dos Estados (FPE), a espaços federados que insistissem em participar da farra de benesses.
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