Título: A Influência da Apresentação do Preço na Avaliação do Consumidor: o Efeito
Pennies-a-Day no Contexto de Consumo Brasileiro
Autoria: Lucia Salmonson Guimarães Barros, André Hein Kliemann
Resumo:
Estudos prévios relacionados ao processamento de informações demonstraram que,
dependendo da forma como uma determinada informação é apresentada, ela pode ser
compreendida de distintas maneiras pelos indivíduos. Este fenômeno pode ser explicado pelo
efeito conhecido como framing. Por exemplo, a forma como um valor (preço) é mostrado ao
consumidor pode influenciar a sua avaliação. Particularmente, Gourville (1998; 1999; 2003)
encontrou o efeito Pennies-a-Day, no qual as pessoas avaliavam um mesmo valor como sendo
menor quando ele era apresentado em parcelas, pois comparavam o valor da parcela a
despesas corriqueiras.
Porém, o efeito Pennies-a-Day foi encontrado no mercado americano, cuja apresentação de
preços de forma parcelada não é comum. Como o Brasil apresenta o maior índice de compras
parceladas do mundo (58% da população faz uso do parcelamento em suas compras), e como
o varejo brasileiro possui como prática a exibição de preços de forma parcelada, o objetivo
deste artigo é investigar a existência do efeito Pennies-a-Day também para o consumidor
brasileiro.
Para avaliar a presença deste efeito Pennies-a-Day no contexto de consumo brasileiro foi
realizado um estudo do tipo experimento em esquema fatorial 2X2. O primeiro fator referia-se
ao tipo de apresentação do preço de um determinado produto (preço agregado ou preço
parcelado). Já o segundo fator estava relacionado ao valor do produto (baixo valor ou alto
valor), pois desejava-se averiguar também se o efeito Pennies-a-Day desaparece com o
aumento do valor da parcela. Foram analisados 115 questionários, sendo que o número de
respondentes por célula variou entre 27 e 31. O produto escolhido para o estudo foi o telefone
celular.
Conforme esperado, os resultados confirmaram a hipótese de que o efeito Pennies-a-Day está
presente entre os consumidores brasileiros, pois os respondentes avaliaram o produto cujo
preço foi apresentado de forma parcelada como sendo mais barato do que o mesmo produto
com o preço agregado. Porém, isto só foi válido para o produto cuja parcela era de baixo
valor. Para o produto de alto valor, e portanto com um valor de parcela maior, o efeito não foi
percebido. Ou seja, conforme constatado por Gourville no mercado americano, para que este
efeito esteja presente é necessário que o valor da parcela possa ser comparado com despesas
do dia-a-dia do consumidor que sejam consideradas de baixo valor.
Outra descoberta deste estudo foi que, ainda que os consumidores tenham avaliado que o
produto de baixo valor com preço parcelado como sendo mais barato que o mesmo produto
com o preço agregado, isto não foi suficiente para elevar a intenção de compra do produto.
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Introdução
A literatura de processamento de informações mostra que o consumidor entende uma mesma
informação de maneiras diferentes, dependendo de como ela lhe é apresentada (LEVIN;
GAETH, 1988). Um exemplo disso é o Pennies-a-Day Effect (NAGLE; HOLDEN, 1995;
PRICE, 1995; GOURVILLE, 1998; 1999; 2003), que acontece quando um consumidor
processa a informação de preço de maneira diferente se ela for dividida ou agregada.
Diferentemente da teoria da racionalidade na tomada de decisão, que diz que um mesmo valor
independe da forma como é apresentado (TVERSKY et al., 1988) e ao contrário do que
explica a teoria da perspectiva de Kahneman; Tversky (1979) – na qual os indivíduos
preferem integrar uma série de pequenos custos em um grande custo - Gourville (1998; 1999;
2003) explica que quando um consumidor enxerga um preço dividido em uma série de
parcelas pequenas, ele está mais disposto a realizar esta compra. O mecanismo por trás disso é
que uma despesa dividida em várias parcelas é comparada a despesas corriqueiras e sem
importância, enquanto uma despesa agregada, de mesmo valor, é comparada a despesas
menos freqüentes e de maior valor, que parecem inacessíveis num primeiro instante.
Esse tema de pesquisa é particularmente interessante no contexto brasileiro, uma vez que o
Brasil apresenta o maior índice de compras parceladas do mundo, forma de pagamento
escolhida por 58% da população, dos quais 71% pertencentes às classes C e E (FOLHA
ONLINE, 2009). Por um lado, pode-se dizer que as compras parceladas são escolhidas, uma
vez que é a única forma que permite ao consumidor adquirir bens antes de possuírem dinheiro
para tal. Entretanto, nossa hipótese é de que, além disso, a forma de apresentação de produtos
pelo varejo brasileiro faz com que o efeito Pennies-a-Day leve consumidores a considerar
menos caros produtos ao observar apenas o valor da parcela.
Apesar de Gourville (1998) sugerir em suas limitações que o fato de anúncios de preços
parcelados serem incomuns nos EUA faz com que o efeito seja maior e, também, apesar dessa
prática ser comum no Brasil, esperamos encontrar o mesmo efeito entre os consumidores
brasileiros. Assim, sugerimos que ao ver uma propaganda de um produto com preço parcelado
(Ex.: celular por apenas R$7,00 ao mês), o consumidor brasileiro avaliará este produto como
sendo mais barato do que se a mesma propaganda for mostrada com o preço agregado, ainda
que ambos tenham o mesmo preço final. Também investigaremos se esta melhora na
avaliação do preço do produto terá influência na intenção de compra.
Finalmente, Gourville (1998; 2003) encontrou que o Pennies-a-Day só acontece com valores
pequenos, cujas parcelas são comparadas a produtos muito baratos, como uma xícara de café.
Entretanto, a prática encontrada no mercado brasileiro sugere que isso não é verdade, desde
que o valor da parcela seja considerado pequeno para o produto em questão. Ou seja, há a
necessidade de investigar se mesmo para valores altos, a apresentação do preço em parcelas
melhora a avaliação do preço de um produto ou aumenta a intenção de compra. Isso é
facilmente observado na prática do marketing, em que produtos de valor alto (ex.:
eletrodomésticos, automóveis e até apartamentos) são anunciados pelo valor da parcela, ao
invés de seu preço agregado. Entretanto, não está claro teoricamente o motivo por trás disso.
Assim, o objetivo deste artigo é investigar a existência do efeito Pennies-a-Day para o
consumidor brasileiro, que está acostumado a ver preços de forma parcelada ao invés de um
valor integrado. Para isso, primeiramente faremos uma revisão da literatura sobre o tema,
resultando nas hipóteses a serem testadas. Em seguida, explicaremos a metodologia adotada
para testar estas hipóteses. Após isso, mostraremos os resultados encontrados no estudo e
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faremos uma discussão de suas implicações. Finalmente, apontaremos algumas limitações do
estudo, assim como sugestões para linhas de pesquisas futuras.
Referencial Teórico
Framing Effect e Teoria das Perspectivas
A teoria econômica clássica descreve o ser humano como racional, que baseia suas decisões
na maximização de sua satisfação (THOMPSON; FORMBY, 1993; VARIAN, 1990). Sob
este paradigma, a forma de apresentação de um valor não deveria influenciar a tomada de
decisão, uma vez que não há diferença no resultado para a satisfação, o que é conhecido como
invariância descritiva (TVERSKY et al., 1988).
Entretanto, a literatura mostra que a maneira como um valor é apresentado pode influenciar
sua avaliação, efeito conhecido como framing (KAHNEMAN; TVERSKY, 1984) e explicado
pela teoria das perspectivas (KAHNEMAN ; TVERSKY, 1979, TVERSKY; KAHNEMAN,
1981). Esse efeito resulta de um processo de tomada de decisão automático e intuitivo e é
considerado de difícil eliminação (KAHNEMAN; TVERSKY, 1984).
Esse efeito foi demonstrado em diversos contextos em estudos de psicologia (KAHNEMAN;
TVERSKY, 1979; 1984, TVERSKY; KAHNEMAN, 1971; 1981; TVERSKY; SATTATH,
1988; BANKS et al., 1995; ROTHMAN; SALOVEY, 1997) e comportamento do consumidor
(PUTO, 1987; LEVIN; GAETH, 1988; SMITH; NAGLE, 1995; SIMONSON, 1993; SERPA;
AVILA, 2004). Por exemplo, os consumidores preferem comprar carne quando ela é
apresentada como “75% magra” do que quando ela é apresentada como “25% gorda”
(LEVIN; GAETH, 1988); pessoas acreditam que um produto é mais barato quando seu preço
está atrelado a um maior preço de referência (FRANKENBERGER; LIU, 1994), mais
mulheres aderem à mamografia quando os riscos são mais enfatizados do que os ganhos
(BANKS et al., 1995) e mais pessoas passam a utilizar protetor solar quando as mensagens a
respeito do produto focam nos benefícios ao invés dos riscos (ROTHMAN; SALOVEY;
ANTONE et al., 1993).
Especificamente em relação ao preço, inúmeros exemplos já foram demonstrados pela
literatura, como o desconto de um dólar ser considerado maior em uma compra que custava
dez do que em uma compra que custava vinte unidades monetárias (KRISHNA et al., 2002) e
os consumidores enxergarem preços terminados em “9” como substancialmente menores do
que valores um centavo maiores terminados em zero (SCHINDLER; KIRBY, 1997).
Agregando e Segregando Ganhos e Perdas
Avançando o conhecimento de que a maneira como um valor é apresentado afeta a sua
percepção, Thaler (1980; 1985) investigou os mecanismos de contabilidade mental. Descobriu
que os indivíduos preferem agregar custos, o que é consistente com a teoria da perspectiva, a
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qual explica que o sofrimento causado por várias perdas pequenas é maior do que o causado
por uma perda maior agregada (KAHNEMAN; TVERSKY, 1979).
Entretanto, isso só é válido para valores altos. Quando ganhos e perdas não são percebidos
como suficientemente grandes, os consumidores acabam as ignorando e o efeito desaparece
(MORWITZ; GREENLEAF; JOHNSON, 1998). Por exemplo, em promoções em
supermercados, é comum que o varejista mostre ao cliente o desconto total ao invés de um
desconto pequeno em cada item, uma vez que se os descontos não forem apresentados de
forma agregada, eles podem acabar passando despercebidos (KRISHNA; JOHAR, 1996;
MORWITZ; GREENLEAF; JOHNSON, 1998).
Pennies-a-Day Effect
Gourville (1998; 1999; 2003) encontrou o efeito Pennies-a-Day, que contradiz essa
descoberta. Em seus estudos empíricos sobre doações, descobriu que as pessoas enxergam um
mesmo valor como menor quando ele é apresentado em parcelas ao invés de quando ele é
apresentado de maneira agregada. O motivo por trás disso é de que um valor parcelado é
comparado a despesas corriqueiras, como um café, enquanto um valor alto é comparado a
despesas maiores.
Esse efeito também foi demonstrado em outros contextos. Por exemplo, riscos à saúde
apresentados de forma diária parecem mais próximos e concretos do que se os mesmos riscos
forem apresentados de forma anual, resultando em maior disposição para a prática de
atividades físicas e outros comportamentos preventivos (CHANDRAN; MENON, 2004).
Outro exemplo é a forma de apresentação do valor de impostos, que podem fazer o
contribuinte acreditar que está pagando menos (KRISHNA; SLEMROD, 2003).
Entretanto, neste caso, o efeito desaparece para valores maiores. Ou seja, consistente com a
teoria da perspectiva, Gourville (1998, 1999, 2003) encontrou que valores maiores, mesmo
que em parcelas, deixam de ser comparados a despesas corriqueiras. Nesse caso, o
consumidor compara as parcelas a despesas maiores e infreqüentes e prefere agregar a perda.
Crédito
Esse fenômeno ajuda a explicar por que os profissionais de marketing, principalmente no
Brasil, abusam da forma parcelada de apresentar o preço de seus produtos. Entretanto, existe
para isso uma explicação alternativa: o que chama a atenção do consumidor pode não ser
apenas o valor da parcela, mas sim a possibilidade da compra a prazo.
A possibilidade de compra a prazo provoca um mecanismo psicológico que faz com que os
indivíduos subestimem o esforço futuro (SOMAN, 1998). Ou seja, ao se deparar com a
possibilidade de realizar um pagamento no futuro, o indivíduo pensa em sua situação atual e
acredita que no futuro será mais fácil realizá-lo, subestimando possíveis dificuldades.
Além disso, a realidade brasileira mostra que para muitas pessoas, o crédito é a única
possibilidade de aquisição de determinado bem (ROCHA; SILVA, 2008). Por isso, o
consumidor tende a ignorar o valor total do bem e passa a olhar apenas o valor da parcela. Se
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este valor couber no orçamento mensal, o produto será escolhido, mesmo que o preço final
seja maior (PRAHALAD; 2005).
Mais ainda, para parte da população brasileira, o crédito é visto como uma poupança
invertida. Ou seja, quando o indivíduo considera sua renda insuficiente para poupar, ele
prefere comprar um produto a prazo, que permite antecipação do consumo e exige disciplina
para separar, todos os meses, quantias certas para pagar as prestações ou o cartão de crédito
(BRUSKY; FORTUNA, 2002).
Apresentação de Preço
Todos esses efeitos de apresentação de preço (price presentation) são utilizados pelos
profissionais de marketing como ferramentas para diminuir a percepção de sacrifício que há
por trás do preço de um produto (BISWAS et al., 1993; KRISHNA et al., 2002). No caso do
efeito Pennies-a-Day, por exemplo, Gourville (1998, 1999, 2003) realizou experimentos
sobre doações a organizações de caridade para demonstrar que a apresentação parcelada ou
agregada foi capaz de modificar a avaliação dos participantes.
Nesse contexto, é comum encontrar entre as práticas de marketing no mercado brasileiro, a
apresentação do preço em parcelas, ao invés do valor agregado. Entretanto, não está claro se o
motivo por trás disso é a possibilidade de contrair crédito ou se o efeito Pennies-a-Day
acontece com o consumidor brasileiro. Será que, mesmo acostumado a ver diariamente preços
parcelados, o consumidor brasileiro tem a percepção de um sacrifício menor ao ver o valor da
parcela ao invés do valor agregado? Isso acontece apenas para valores baixos? Isso acontece
para uma situação real de compras ou apenas para doações?
Há evidências de que, ao ver um objeto, o indivíduo não processa imediatamente o contexto
em que ele está inserido (DHAR, 1997). Por isso, faz sentido que quando um indivíduo vê
uma parcela baixa, ele não processa imediatamente o seu contexto e, automaticamente, a
compara com outros valores baixos, o que pode acontecer não apenas no contexto de doações,
mas também em um contexto real de compra no Brasil. Assim, tem-se a seguinte hipótese:
H1: O efeito Pennies-a-Day acontece em um contexto de compra para o consumidor
brasileiro.
Apesar de contrariar a prática do marketing e, mais especificamente, do varejo brasileiro, há
evidências de que quando o consumidor deixa de perceber o valor da parcela como
extremamente baixo, ele deixa de compará-lo com gastos corriqueiros (GOURVILLE, 1998,
1999, 2003). Por isso, para uma situação de compra, espera-se que:
H2: Quando o consumidor deixa de comparar o valor da parcela a valores realmente baixos,
o efeito desaparece.
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Metodologia
Para avaliar a presença do efeito Pennies-a-Day no contexto do consumidor brasileiro
(hipótese 1) e para averiguar se o efeito desaparece com o aumento do valor da parcela
(hipótese 2), foi realizado um estudo do tipo experimento em esquema fatorial 2X2. O
primeiro fator referia-se ao tipo de apresentação do preço de um determinado produto
(agregado ou em parcelas) e o segundo fator diz respeito ao valor do produto (baixo valor ou
alto valor). Com isso, foram criadas quatro células distintas (preço agregado com baixo valor,
preço agregado com alto valor, preço em parcelas com baixo valor e preço em parcelas com
alto valor), que possibilitaram o teste das duas hipóteses apresentadas.
Foram enviados 400 questionários através de e-mail (100 questionários por célula), sendo que
o nível de resposta obtido foi de 29%, totalizando 115 respondentes. Do total de respondentes,
59% eram do sexo masculino e 61% possuíam renda familiar superior a R$ 6.500,00. A idade
média da amostra era de 32 anos. O retorno por célula variou entre 27 e 31 questionários
conforme a Tabela 1.
O questionário enviado era composto por um cabeçalho, no qual era feita a apresentação do
produto, suas características e o preço sugerido. Para as quatro células foi utilizado o mesmo
produto (telefone celular), com as mesmas características, sendo que a única variação entre os
grupos era a forma de apresentação do preço e o valor total do produto. A tabela abaixo
resume as condições de preço apresentadas e os retornos para cada uma das células do estudo:
Apresentação
do Preço
Nível de Preço
Preço Agregado
Preço em Parcelas
Baixo Valor
Alto Valor
R$ 49 em 8X
R$ 649 em 8X
N = 27
N = 28
8X R$ 6,20
8X R$ 81,20
N = 29
N = 31
Tabela 1 – Apresentações de preço e respondentes por célula
Após a leitura do cabeçalho, o respondente deveria avaliar o preço do produto (variável 1) e a
intenção de compra (variável 2), sendo que as duas questões possuíam uma escala de resposta
de 1 a 5. No caso da avaliação do preço do produto, a resposta variou entre “muito barato”
(1) e “muito caro” (5), e no caso da intenção de compra as opções concentraram-se entre
“com certeza não compraria” (1) e “com certeza compraria” (5). Após a avaliação de cada
questão o respondente justificava a sua resposta.
Para medir a presença do efeito Pennies-a-Day, utilizamos a variável de avaliação do preço
do produto, pois se os respondentes avaliassem de forma distinta os preços de um produto de
igual valor – sendo a apresentação do preço a única modificação – a presença do efeito já
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estaria confirmada. A variável de intenção de compra foi incluída no intuito de averiguar se a
presença do efeito Pennies-a-Day seria suficiente para provocar uma alteração significativa na
intenção a consumir o produto. Porém, sabe-se que existem diversas variáveis além do preço
que influenciam a avaliação do produto e, conseqüentemente, a intenção de compra (DODDS;
MONROE; GRENWAL, 1991; RAO; MONROE, 1989)
A escolha do telefone celular deveu-se ao fato de que é um produto que apresenta alta
variabilidade de preços no mercado. As operadoras de telefonia celular costumam realizar
promoções e subsídios nos preços dos aparelhos de acordo com o plano selecionado pelo
cliente, sendo comum encontrar o mesmo aparelho ofertado com preços muito distintos. Por
isso foi o produto mais adequado para o estudo em questão – principalmente devido à
segunda hipótese, que visa comparar o efeito Pennies-a-Day para diferentes valores de
parcela. Isto evitou que tivéssemos que recorrer ao uso de produtos distintos ou com
diferentes configurações – um de alto valor e outro de baixo valor - o que poderia criar algum
viés no resultado.
O modelo escolhido foi um modelo existente no mercado, top-de-linha, de acordo com o
perfil da amostra. Não foram informados a marca, o modelo nem o design do produto –
apenas as funcionalidades foram citadas.
Resultados
Para avaliar os resultados, comparou-se a média dos valores das respostas obtidas através dos
questionários para as duas variáveis: a avaliação do preço e a intenção de compra. A
comparação foi feita entre os produtos de mesmo valor (baixo valor ou alto valor),
identificando a diferença entre as médias na avaliação do produto com o preço agregado e do
produto com o preço em parcelas.
Avaliação do Preço
Conforme esperado, o resultado confirmou a hipótese de que o efeito Pennies-a-Day está
presente no contexto do consumidor brasileiro. Ao se comparar a média de avaliação de preço
do produto de baixo valor apresentado de forma agregada com a média de avaliação do preço
do mesmo produto apresentado de forma parcelada (R$ 49,00 em 8X vs. 8X R$ 6,20), a
diferença foi estatisticamente significativa (2,81 vs. 1,93, p<0,001). Ou seja, os respondentes
avaliaram que o produto cujo preço foi apresentado de forma parcelada era mais barato que o
produto com o preço apresentado de forma agregada, ainda que ambos tivessem o mesmo
valor total.
Porém, quando se confronta a média de avaliação de preço do produto de alto valor
apresentado de forma agregada com a média de avaliação do preço do mesmo produto
apresentado de forma parcelada (R$ 649,00 em 8X vs. 8X R$ 81,20), a diferença não foi
estatisticamente significativa (4,00 vs. 3,90, p>0,10). Isto significa que, neste caso, os
consumidores avaliaram que ambos estão em um mesmo nível de preço. Este resultado
confirma a segunda hipótese, ou seja, o efeito Pennies-a-Day de fato é inexistente quando o
consumidor deixa de comparar o valor da parcela com gastos corriqueiros de baixo valor.
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Figura 1 – Comparação das médias na avaliação dos preços dos produtos.
Intenção de Compra
Realizando o mesmo procedimento com a questão relativa à intenção de compra do telefone
celular, os resultados mostram que não houve diferença estatisticamente significativa na
intenção de compra entre produtos de mesmo valor. Ou seja, ainda que os consumidores
tenham avaliado que o produto de baixo valor com preço parcelado era mais barato que o
mesmo produto com o preço agregado, isto não foi suficiente para elevar a intenção de
compra do produto. No caso do telefone celular de alto valor, conforme esperado, não houve
diferença na intenção de compra, pois conforme citado anteriormente os respondentes não
haviam identificado nenhuma modificação no preço entre as duas situações.
8
5
4
3,03
3
2,74
1,96
1,77
2
1
0
Preço Agregado
Alto Valor
Preço em Parcelas
Baixo Valor
Figura 2 - Comparação das médias na intenção de compra dos produtos
Discussão dos Resultados
Os resultados encontrados neste estudo estão coerentes com aqueles encontrados por
Gourville (1998) para o mercado americano. Ou seja, apesar de os anúncios de preços
parcelados serem incomuns nos EUA e bastante comuns no Brasil, isto não trouxe diferença
no resultado final. Isto sugere a inferência de que o efeito Pennies-a-Day está presente nos
mercados consumidores independentemente da disseminação de uma cultura de apresentação
dos preços de produtos de forma parcelada. O que poderá variar, de fato, é o valor da parcela
que será visto como um gasto diário e que permitirá ou não a presença deste efeito para o
consumidor.
De certa forma, o estudo evidencia uma miopia mercadológica no varejo brasileiro, que
normalmente reserva a apresentação do preço em parcelas para itens de alto valor. Se bem que
esta tática é importante para gerar a sensação de possibilidade de compra de itens inacessíveis,
esta pesquisa mostra que o mesmo tratamento deve ser dado também a itens de menor valor.
No caso dos itens mais baratos o benefício para o consumidor provavelmente não será o
acesso – pois, em muitos casos, são itens que ele pode comprar à vista – e sim, uma avaliação
mais favorável do preço anunciado.
Ainda que para o produto de alto valor apresentado neste estudo o efeito Pennies-a-Day não
tenha sido verificado, ao observarmos os comentários dos respondentes nos questionários
vemos que existem diferenças significativas entre aqueles que avaliaram o produto com preço
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agregado e os que avaliaram o produto parcelado. Quando os respondentes afirmaram que o
aparelho cujo preço era R$ 649,00 em 8X era “muito caro” ou “caro”, 50% dos comentários
justificavam a resposta alegando que “a operadora deveria subsidiar o preço do aparelho”,
seja dando o aparelho de graça para aqueles com planos mensais de valor elevado ou dando
um desconto sobre este valor por conta do relacionamento. Já para os que deram a mesma
avaliação (“muito caro” ou “caro”) para o mesmo aparelho com preço de 8X R$ 81,20, este
percentual caiu para 27%, sendo que as principais reclamações (64%) ficaram por conta da
falta de features (“o valor é muito alto para o que o aparelho oferece”) ou o excesso de
features (“o valor é muito alto para a minha necessidade”). Para o produto com preço
agregado a falta ou o excesso de features corresponderam a apenas 28% das reclamações.
Este fato leva a supor que, ainda que a apresentação do preço de forma parcelada seja
insuficiente para alterar a avaliação do preço no caso do produto de alto valor, ela pode alterar
o motivo da avaliação negativa do preço. No caso específico deste estudo, o parcelamento foi
visto como um subsídio que atenuou a necessidade de um maior desconto por parte da
operadora, e fez com que os respondentes justificassem sua resposta negativa de acordo com
uma comparação com as demais ofertas do mercado ou com sua própria necessidade.
Os resultados mostram também que a presença do efeito Pennies-a-Day não alterou a
avaliação relativa à intenção de compra. Neste caso a cultura de subsídios por parte das
operadoras pode ter trazido um viés para a resposta desta questão. Avaliando novamente os
comentários nos questionários, 36% dos respondentes escreveram sobre este tema, citando
que “as operadoras devem dar descontos para a troca de aparelhos”, “sempre troco de
aparelho celular de graça”, e, para o caso do celular com baixo valor, uma desconfiança de
que “por este preço a operadora irá exigir um plano mensal elevado” ou “provavelmente terei
que manter o relacionamento com a operadora por um período muito longo”. Ou seja, a
intenção de compra de telefones celulares no Brasil, em muitos casos, não é baseada somente
no preço anunciado do aparelho, mas também no tipo de plano (gasto mensal) e no tempo de
relacionamento exigido (custo de não poder aproveitar ofertas melhores das demais
operadoras).
Contribuições, Limitações e Estudos futuros
Este estudo trouxe como contribuição a constatação da presença do efeito Pennies-a-Day no
contexto brasileiro, um mercado cuja apresentação de preço no formato parcelado é uma
tática disseminada. A presença do efeito, conforme esperado, foi percebida quando o valor da
parcela era pequeno (gasto cotidiano), sendo que um alto valor de parcela fez com que o
efeito desaparecesse. Porém, uma série de questões foi levantada durante o estudo e exigirão
um maior aprofundamento sobre o tema.
A primeira oportunidade para um estudo subseqüente está em descobrir qual o valor de
parcela até o qual os consumidores serão influenciados pelo efeito Pennies-a-Day. No caso
deste estudo, trabalhou-se com uma faixa de valores bastante ampla (8X R$ 6,20 vs. 8X R$
81,20) e sabe-se, pelo resultado encontrado, que este valor-limite deverá ser intermediário a
estes dois valores. Portanto, averiguar até que valor de parcela o consumidor percebe como
um valor corriqueiro – e que fará com que ele avalie o preço de forma mais satisfatória - trará
implicações gerenciais bastante significativas.
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Nesta mesma linha, pode-se investigar se este valor limite para que ocorra o efeito Pennies-aDay pode variar de acordo com o tipo de produto - produtos de baixo valor podem ter um
valor limite menor do que os produtos de alto valor, por exemplo.
Outro ponto interessante a ser explorado é influência da quantidade de parcelas na
apresentação do preço. Diminuir parcelas através do aumento da quantidade de prestações
parece uma tática interessante para induzir o efeito Pennies-a-Day, mas até que ponto uma
grande quantidade de parcelas poderá influenciar negativamente a avaliação de preço do
produto? Nesta linha, poderão ser testados diversos valores de parcela – com diferentes
quantidades de parcelas - a fim de descobrir se existe um ponto ótimo que maximiza a
avaliação de preço pelo consumidor.
Finalmente, sugerimos a utilização de um produto que não possua um custo de manutenção
mensal, a fim de averiguar se o efeito Pennies-a-Day será suficientemente forte neste caso
para alterar também a intenção de compra – e não somente a avaliação do preço, como foi o
caso deste estudo.
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Título: A Influência da Apresentação do Preço na Avaliação