Tema Compras Coletivas Diretas: Uma Interpretação Baseada na Sociologia Econômica - Objetivos e/ou Hipóteses As compras coletivas diretas, isto é, realizadas por grupos de consumidores organizados diretamente de pequenos produtores rurais O sistema agroalimentar nos mercados urbanos das grandes cidades está dominado pelo grande capital do varejo e, em particular, pelas cadeias de supermercados. Nelas, impera a lógica da economia de escala e da eficiência, relegando os pequenos produtores a uma posição vulnerável na cadeia de alimentos. Em muitas regiões do País, a fragilidade em que se encontra o pequeno produtor não condiz com a participação proporcionalmente elevada da sua produção no abastecimento dos centros urbanos. É neste contexto de elevada assimetria entre produtores e distribuidores que as compras coletivas diretas operadas através de redes de consumidores organizados representam canais de comercialização alternativos, eliminando o papel do intermediário. Esta modalidade de compra orientada pelos princípios da reciprocidade, da confiança e da solidariedade modela novas transações econômicas e define referências de qualidade, quantidade e preços paralelas as do mercado convencional. Em geral, grupos de compras coletivas também representam espaços de informação e de educação para o consumo crítico e solidário. - Metodologia e informações utilizadas O artigo investiga o potencial dessas redes agirem como modo alternativo de coordenação social – constituindo-se num "contra-movimento protetor" ao sistema de mercado, conforme definido por Karl Polanyi (. Para tanto, caracteriza a natureza e o perfil da instituição central responsável pela redistribuição. Fizemos uma análise comparada das duas experiências citadas de forma a identificar suas fontes de estabilidade e de eficiência na construção social desses canais de comercialização solidária, destacando o peso de seus laços fortes e fracos no enfoque proposto por Mark Granovetter (1985). Entre as experiências brasileiras, duas merecem destaque por seus distintos formatos e por adotarem estratégias diferenciadas. Uma delas é associação legalmente constituída, Associação para o Desenvolvimento da Agropecuária Orgânica em Fortaleza-Ceará (ADAO), enquanto a outra é uma rede informal de consumidores conhecida como Rede Ecológica do Rio de Janeiro. A primeira, com mais de 400 associados, especializou-se em compras de produtos agrícolas orgânicos, provenientes de cerca de dez produtores certificados, apoiados na agricultura biodinâmica, e promove atividades de cursos e treinamentos. Já a Rede Ecológica tem cerca de 100 compradores, entre associados e eventuais, não é legalizada, e propõe-se a adquirir além de hortaliças e frutos orgânicos, produtos de limpeza biodegradáveis, na perspectiva de substituir, senão todos, ao menos os principais itens. Uma característica que a distingue diz respeito ao alcance dos seus benefícios, e o perfil do seu público-alvo, sejam os produtores, sejam os compradores. Enquanto a primeira elegeu um recorte social em grupos de renda mais elevada – tanto entre os produtores, que para serem certificados, e se manterem enquanto tal, devem ter recursos financeiros - quanto entre os consumidores – que pagam mais pelo produto orgânico de produtores certificados, a segunda usa a compra como instrumento de atuação política, buscando comprar, preferencialmente, de produtores de baixa renda marginalizados (a exemplos dos assentamentos rurais), e agregar consumidores com um perfil ideológico específico. - Parte dos Resultados Muito embora as experiências de compras coletivas ainda sejam raras, recentes, e pouco estudadas, observa-se um crescente interesse – com um misto de curiosidade – na sua efetividade. A pesquisa indicou que esta percepção é mais aguçada entre consumidores que percebem os riscos associados ao aquecimento global como graves e iminentes. Essas redes oriundas de consumidores urbanos se inserem no contexto de busca de alternativas que fortaleçam pequenos produtores agroecológicos – se contrapondo assim ao êxodo rural, e apoiando aqueles que estão preservando o planeta. Este tipo de movimento tem sido crescente internacionalmente (a exemplo do Slow Food). Faz parte disto o resgate da dignidade e da valorização do homem do campo. Na medida em que consiga se estruturar de modo mais sólido, as compras coletivas poderão transformar-se na principal alternativa de mercado para a agricultura familiar agroecológica, contribuindo para a segurança alimentar não somente das famílias diretamente beneficiárias das ações propostas, mas de todas aquelas de algum modo abrangidas pelas suas atividades. - Conclusões ou conclusões parciais, reflexões sobre os resultados, propostas ao debate A proposta deste artigo foi analisar como os padrões institucionais alternativos ao mercado convencional, apoiados em princípios de reciprocidade e em laços de confiança se comportam no âmbito das redes de compras coletivas diretas, e nas cadeias curtas de comercialização. O estudo revelou o quanto o atributo da confiança alicerça essas relações, gerando um sentimento de segurança e estabilidade tanto no produtor, quanto no comprador, tem contribuído para agregar mais e mais qualidade específica aos produtos trocados, ao contrário do que a teoria econômica tradicional indica. Entre outros motivos, porque reduz fortemente a assimetria dos mercados. Ao lado das vantagens mais comuns das redes, tais como reduzir assimetria de informação e compartilhar recursos, observamos que no caso de experiências baseadas em princípios de sustentabilidade ambiental, poder compartilhar riscos adquiriu uma centralidade estratégica. Podendo, inclusive, gerar relações improdutivas, que não são percebidas (GULATI et al, 2000). Além disso, a análise comparada das duas experiências demonstrou o potencial explicativo da Sociologia Econômica na compreensão das manifestações contemporâneas de ação coletiva surgidas no bojo da convenção da sustentabilidade. - Principais referências bibliográficas (máximo 5) GRANOVETTER, M. Economic Action and Social Structure: The Problem of Embeddedness The American Journal of Sociology, Vol. 91, No. 3.Nov.1985, pp. 481510. GULATI, R. et al. Strategic Networks Strategic Management Journal, Vol. 21, No. 3, Special Issue: Strategic Networks, Mar. 2000, pp. 203-215. OSTROM, Elinor. Governing the commons: the evolution of institutions for collective action. Cambridge: Cambridge University Press, 1997. 280 p. (1. ed. 1990). POLANYI. K. A grande transformação. Ed.Campus. RJ. Edição n. 6. 2000 SWEDBERG, R. The toolkit of economic Sociology. Ithaca; NY: Cornell University, Aug. 2004. (CSES Working Paper Series, Paper n.22).