Avaliação de Sustentabilidade em Unidades de Conservação: Um Estudo de Caso no Parque
Estadual da Serra do Tabuleiro - SC
Autoria: Cristina Gerber João, Hans Michael van Bellen
Resumo
Este artigo aborda o processo de avaliação do desenvolvimento, na perspectiva da
sustentabilidade. O objetivo geral do trabalho é avaliar as perspectivas de aplicação de
sistemas de indicadores como ferramentas de gestão para um campo específico: as unidades
de conservação. Para isso são exploradas as bases teóricas que tratam das idéias relacionadas
ao Desenvolvimento Sustentável para em seguida abordar seus principais indicadores. Dentre
os sistemas de indicadores conhecidos optou-se por analisar e aplicar especificamente um
modelo conhecido como Barômetro da Sustentabilidade Para alcançar o objetivo estabelecido
foi adotado um delineamento exploratório e descritivo do tipo estudo de caso. A unidade de
conservação escolhida para análise e avaliação do sistema proposto foi o Parque Estadual da
Serra do Tabuleiro localizado em Santa Catarina. Os resultados da análise e aplicação do
modelo na unidade de conservação originaram uma matriz bidimensional de avaliação que
considera tanto a dimensão humana como a dimensão ecológica. Esta matriz pode ser
utilizada como base para a construção de um sistema integrado de gestão para o parque que
considere as dimensões principais do Desenvolvimento Sustentável.
1. Introdução
O termo Desenvolvimento Sustentável ganhou destaque em vários campos a partir de
Conferência Internacional das Nações Unidas em Meio Ambiente e Desenvolvimento
realizada no Rio de Janeiro em 1992. O documento conhecido como Agenda 21, também
resultado dessa conferência, reforçou as discussões sobre o processo de desenvolvimento em
geral especificamente no que diz respeito a sua avaliação. Apesar das críticas ao caráter
polissêmico do termo, a sua incorporação por diferentes esferas como Estado, Mercado e
Sociedade Civil provocou inúmeros debates sobre o próprio processo de desenvolvimento e
da maneira de avaliá-lo.
A idéia de sustentabilidade traz para o conceito de desenvolvimento uma perspectiva
multidimensional e implica em mudanças gerais na sua maneira de avaliação. Nessa linha
surgem diferentes sistemas de indicadores que procuram incorporar essa nova maneira de
olhar o desenvolvimento. Este trabalho aborda a utilização desses novos indicadores de
sustentabilidade como ferramentas de gestão aplicadas especificamente as unidades de
conservação. As unidades de conservação são espaços especialmente protegidos que são vitais
para a sustentabilidade. A política nacional e a legislação que regulamentam o funcionamento
das unidades de conservação são resultado de um contexto histórico de combate aos
problemas ambientais causados pelo padrão de desenvolvimento que parece negar a existência
de atores sociais que sobrevivem em seu entorno ou dentro dos seus limites. Por isso as
unidades de conservação enfrentam um dilema: conciliar as dimensões econômica e social da
sustentabilidade com a dimensão ecológica.
Para que as unidades de conservação se tornem efetivamente sustentáveis é necessária
a integração das diferentes dimensões do desenvolvimento sustentável. Além disto, as
diferentes dimensões devem ser monitoradas visando compreender melhor suas inter-relações.
Os indicadores de sustentabilidade oferecem algumas possibilidades nessa direção e este
trabalho aprofunda essa discussão procurando analisar e aplicar uma ferramenta de avaliação
reconhecida internacionalmente em uma unidade de conservação no estado de Santa Catarina.
1
Para atingir este objetivo o trabalho foi dividido em quatro partes principais. A
primeira seção trata da base teórica do trabalho a partir de dois pontos: primeiramente uma
abordagem sucinta sobre indicadores para posteriormente discutir um modelo de avaliação
para unidades de conservação. Na segunda seção são apresentados os procedimentos
metodológicos utilizados para condução do trabalho. No terceiro item são apontados os
resultados da análise e implementação do modelo para uma unidade de conservação
localizada em Santa Catarina. Por último, na quarta seção são apresentadas duas matrizes,
referentes a dimensão social e ecológica, que devem funcionar como alvo para a construção
do sistema de avaliação da referida unidade.
2. Fundamentação Teórica
2.1 Indicadores e Sustentabilidade
Para abordar apropriadamente o processo de avaliação de sustentabilidade em
unidades de conservação, que é um dos objetivos centrais deste trabalho, é necessário
compreender o significado do termo indicador de uma maneira mais geral para em seguida
discutir sua aplicação na avaliação da sustentabilidade de sistemas.
O termo indicador é oriundo do Latim “indicare”, que significa descobrir, apontar,
anunciar, estimar (HAMMOND et al., 1995). McQueen e Noak (1988) tratam um indicador
como uma medida que resume informações relevantes de um fenômeno particular ou um
substituto desta medida, semelhante ao conceito de Holling (HOLLING et al., 1978) de que
um indicador é uma medida do comportamento do sistema em termos de atributos expressivos
e perceptíveis.
Um dos objetivos principais dos indicadores é o de agregar e quantificar informações
de uma maneira que sua significância fique mais aparente. Os indicadores simplificam as
informações sobre fenômenos complexos tentando melhorar com isso o processo de
comunicação. Os indicadores podem adotar diferentes significados. Alguns termos
normalmente utilizados são norma, padrão, meta e objetivo dentre outros. Estes termos se
referem fundamentalmente a valores estabelecidos ou desejados pelas autoridades
governamentais ou obtidos por um consenso social. Esses indicadores são utilizados dentro de
um senso normativo, um valor técnico de referência. As metas, por outro lado, representam
uma intenção, valores específicos a serem alcançados.
Meadows (1998) afirma que a utilização de indicadores é uma maneira intuitiva de
monitorar complexos sistemas que a sociedade considera importantes de se controlar. Eles
constituem um modelo da realidade, embora não possam ser considerados como a própria
realidade. A maioria deles foi desenvolvida para observar retratos específicos da realidade:
são indicadores econômicos, sociais, geográficos entre outros.
Existem atualmente poucos sistemas de indicadores que lidam especificamente com o
conceito de desenvolvimento sustentável, sendo que a maioria desses sistemas tem caráter
experimental. A concepção mais usual de sustentabilidade considera ao menos três dimensões
de avaliação: econômica, social e ecológica. Indicadores de sustentabilidade devem
contemplar estas dimensões que, segundo Gallopin (1996), constituem os principais
componentes da avaliação do progresso em relação a um desenvolvimento dito sustentável.
As principais funções dos indicadores em geral, e dos indicadores de sustentabilidade
em particular, são fornecer informações a respeito das condições e tendências de um
determinado sistema. Com isto pode-se avaliar a evolução do sistema no tempo, no espaço ou
frente a metas e objetivos fixados. Hardi e Barg (1997) afirmam que os indicadores de
sustentabilidade podem ser divididos em dois grupos principais: indicadores sistêmicos e
indicadores de desempenho ou performance. Os indicadores sistêmicos, ou descritivos,
2
apresentam um grupo de medidas individuais para diferentes questões características do
ecossistema e do sistema social e comunicam as informações mais relevantes para os
tomadores de decisão. Esses tipos de indicadores estão fundamentados em referenciais
técnicos. Os indicadores de performance, por sua vez, refletem a situação de determinado
sistema frente aos componentes individuais do próprio sistema avaliado.
Apesar das limitações inerentes ao emprego de indicadores para a tomada de decisão,
relacionadas principalmente com a necessidade de simplificar a realidade, existem inúmeras
vantagens para a sua utilização quando se trata da avaliação do grau de sustentabilidade do
desenvolvimento. Alguns autores enfatizam a necessidade de mensuração para
aperfeiçoamento do processo de gestão. Hardi e Barg (1997) destacam algumas razões para
medir o progresso em direção à sustentabilidade, desde a criação de um comprometimento
acerca da utilização de recursos naturais de uma maneira mais justa até o compromisso de um
governo mais eficiente no que se refere à relação sociedade e meio ambiente. Neste sentido
ferramentas de avaliação, ou sistemas de indicadores, podem ser úteis para os tomadores de
decisão determinando o desenvolvimento de políticas específicas na gestão do
desenvolvimento. A mensuração do grau de sustentabilidade do desenvolvimento auxilia na
escolha entre alternativas e na correção da direção política.
Jesinghaus (1999) afirma que programas de avaliação ajudam na especificação de
metas e estratégias conduzindo a decisões que utilizem como base critérios de
sustentabilidade. Um dos objetivos do processo de avaliação é auxiliar os tomadores de
decisão na avaliação de seu desempenho em relação aos objetivos estabelecidos fornecendo,
desta maneira, as bases para o planejamento de futuras ações. É dentro desse objetivo
principal que se desenvolve o presente artigo que procura analisar e validar uma ferramenta
de avaliação de unidades de conservação em termos de sustentabilidade. Neste sentido o
próximo tópico discorre sobre um modelo de avaliação construído especificamente para
mensurar o grau de sustentabilidade deste tipo de unidade.
2.2 Modelo de Avaliação de Sustentabilidade para Unidades de Conservação
O modelo descrito e utilizado para avaliação de sustentabilidade de unidades de
conservação - ASUC – foi construído a partir do sistema de avaliação de bem estar das nações
desenvolvido por Prescott-Allen (2001). Esse modelo avalia as condições e as interações entre
as pessoas e o meio ambiente a partir de um processo analítico hierárquico estruturado, que
integra o bem-estar das pessoas e dos ecossistemas de forma a gerar um único conjunto de
informações.
A hipótese subjacente à filosofia do modelo é a de que o desenvolvimento sustentável
é a combinação do bem-estar humano e do bem-estar dos ecossistemas. Relativamente a uma
unidade de conservação, o bem-estar humano está ligado aos aspectos da interação entre a
própria unidade e a comunidade por ela afetada. Da mesma maneira o bem-estar do
ecossistema é também uma condição necessária do desenvolvimento sustentável, pois ele
constitui a base da vida no planeta, tornando possível a sobrevivência da espécie humana.
No modelo de avaliação do bem estar cada subsistema é dividido em dimensões,
elaboradas com a finalidade de prover um amplo leque de combinações de igual importância.
As dimensões devem ser simples e compreensíveis. Qualquer tema a respeito da
sustentabilidade de uma unidade de conservação deve ter a possibilidade de ser acomodado
em uma destas dimensões. A figura 1 ilustra o esquema utilizado no presente trabalho, que
relaciona os tópicos cobertos pelas dimensões estabelecidas.
Reconhecendo a impossibilidade de mensurar diretamente o bem-estar humano e dos
ecossistemas, para avaliar a sustentabilidade de uma unidade de conservação devem-se
utilizar indicadores mensuráveis das principais características de cada categoria. A literatura
sobre o tema (PRESCOTT-ALLEN, 2001; GUIJT &. MOSEEV, 2001; JOÃO, 2004; VAN
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BELLEN, 2005) enfatiza a necessidade de aprofundamento das etapas que antecedem a
escolha dos indicadores, avaliando como eles se relacionam entre si e analisando
pormenorizadamente as fontes de dados.
Categoria
HUMANO
Dimensões
Administração
Fiscalização e
Educação
Comunidade
Institucional
Disponibilidade de
material, pessoal e
planejamento.
Difusão do
conhecimento;
Cuidados com a
Natureza.
Comunidades do
interior e entorno;
padrão de vida.
Estágio de
implantação, de
governabilidade.
Categoria
ECOSSISTEMA
Dimensões
Cobertura Vegetal
Diversidade e
qualidade Caracterização de
acordo função
protetora.
Água
Uso da Terra
Fauna
Qualidade e
diversidade dos
corpos d’água.
Diversidade
Proteção da
diversidade.
Figura 1: Lista de Tópicos Abrangidos pelas Dimensões de cada Categoria.
Fonte: Adaptado de Prescott-Allen, 2001
Para comparar a condição humana e a conservação dos recursos naturais em uma
unidade de conservação o subsistema humano e o subsistema ecológico são considerados
conjuntamente, mas mensurados separadamente. Prescott-Allen (2001) e Guijt e Moseev
(2001) sugerem um processo hierarquizado que complete um ciclo de seis estágios.
No primeiro estágio são definidos o sistema, seus alvos e suas dimensões. Este
estágio corresponde ao mapeamento dos limites da área avaliada, na unidade políticoadministrativa, tendo em vista que a avaliação de sustentabilidade não tem um fim em si
mesma, mas é um instrumento de apoio à decisão. O processo de estabelecimento de um alvo
é reflexivo e diz respeito àquilo que se acredita seja ideal para a área avaliada. Através da
reflexão pode se considerar os temas mais difíceis, a forma de abordá-los e fazer julgamentos.
Estes julgamentos devem vir acompanhados de mensurações, num processo de identificação
dos melhores indicadores de desempenho para a área em estudo. A combinação dos resultados
permite obter uma figura ampla da área, delimitando os temas específicos mais significantes.
4
Na perspectiva desses autores quanto maior o detalhamento deste estágio, mais informações
locais podem ser capturadas pela avaliação.
O segundo estágio refere-se à identificação das dimensões, elementos e objetivos da
avaliação. Nesse momento são definidos quais aspectos das categorias - ecossistema e
humana - devem ser mensurados, pela identificação dos elementos e de seus objetivos.
Elementos são temas-chave, aquilo que se destaca em cada dimensão. Devem ser
considerados para que seja possível captar o senso adequado em cada um das dimensões.
Quanto menor o número de elementos, mais claro o seu papel e mais forte a sua influência no
índice da dimensão. As dimensões são categorias amplas e conceituais que acomodam aquilo
que é importante para toda a sociedade, sem requerer que se lhes apliquem detalhes que não
sejam comuns a todos, excluindo-se, assim, o que não é de interesse mútuo. É a sua
subdivisão em elementos que permite que tópicos mais detalhados sejam capturados.
A escolha de indicadores e critérios de desempenho define o terceiro estágio. A
avaliação de sustentabilidade pode utilizar duas classes de indicadores: primários e
secundários. Indicadores primários são os considerados os norteadores em relação ao
elemento que representam. São eles que, combinados, dão origem ao índice, ou sub-índice, do
elemento. Os indicadores secundários constituem fonte suplementar de informação e não
fazem parte do índice do elemento. Cada elemento é constituído por, pelo menos, um
indicador, de acordo com a representatividade do indicador frente ao elemento.
Segundo alguns autores (MEADOWS, 1998; VAN BELLEN, 2005; BOSSEL, 1999)
indicadores utilizados na avaliação da sustentabilidade do desenvolvimento devem obedecer
alguns critérios. Para avaliação da sustentabilidade de unidades de conservação optou-se pelas
categorias sugeridas pro Prescott-Allen (2001) que aponta que qualquer indicador deve ser
representativo, fidedigno e exeqüível. Um indicador representativo é aquele que cobre os
aspectos mais importantes do elemento que representa; apontando suas tendências temporais e
as diferenças entre lugares e grupos de pessoas. A fidedignidade reflete quanto o indicador
representa o objetivo do elemento a partir de sua base em procedimentos de amostragem, bem
como sua padronização e acurácia. Por último a exeqüibilidade refere-se disponibilidade
imediata de dados ou da sua obtenção a um custo razoável.
A mensuração dos indicadores geralmente gera uma grande quantidade de números,
que nem sempre podem ser combinados entre si. Para possibilitar as comparações e
combinações, faz-se necessário ter uma unidade comum a todas elas. Para isso normalmente
são utilizados indicadores de performance (VAN BELLEN, 2005) e suas unidades são, no
escopo deste trabalho, pontuações de desempenho. A escala de desempenho é a distância
entre o desempenho-padrão daquele indicador, aquilo que é o alvo a ser alcançado e o
desempenho real que aquele indicador apresenta. Numa escala de 0 a 100, o melhor
desempenho é cem e o pior é 0. Como os pontos são calculados de forma igual para todos os
indicadores, eles podem ser comparados.
O sistema de avaliação de bem-estar das nações proposto por Prescott-Allen utiliza a
escala de desempenho da ferramenta denominada Barômetro da Sustentabilidade
(PRESCOTT-ALLEN, 1995) para comparar resultados. Esta ferramenta de avaliação foi
desenvolvida por diversos especialistas, ligados principalmente a dois institutos, o The World
Conservation Union, IUCN e o International Development Research Centre, IDRC.
O método foi desenvolvido como um modelo sistêmico dirigido prioritariamente aos
seus usuários, com o objetivo de mensurar a sustentabilidade. O Barômetro é destinado,
segundos seus autores, às agências governamentais e não governamentais, tomadores de
decisão e pessoas envolvidas com questões relativas ao desenvolvimento sustentável, em
qualquer nível do sistema, do local ao global (PRESCOTT-ALLEN, 1997). Este autor
considera que a avaliação do estado das pessoas e do meio ambiente em busca do
desenvolvimento sustentável requer indicadores de uma grande variedade de questões ou
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dimensões. Existe a necessidade de integrar dados relativos a vários aspectos de um sistema,
como, por exemplo: qualidade da água, emprego, economia, educação, crime, violência etc.
Embora cada indicador possa representar o que ocorre dentro de uma área específica, a falta
de ordenação e combinação coerente dos sinais que estes emitem conduz a dados relativos e
altamente confusos (PRESCOTT-ALLEN, 1999, 2001).
A medida comum geralmente utilizada em sistemas de avaliação, principalmente nos
sistemas sociais e econômicos, é a monetarização. Para Prescott-Allen (1999, 2001) a
monetarização realmente é eficiente como denominador comum de medidas referentes ao
comércio e ao mercado, entretanto, a moeda muitas vezes não é uma medida comum efetiva
para aspectos não negociáveis dentro do mercado. Para esse autor muitos dos aspectos
relativos à sustentabilidade não têm preço no mercado e, embora existam muitos métodos
largamente utilizados para monetarização destes bens, eles ainda estão longe de fornecer uma
resposta efetiva para esta questão.
Prescott-Allen oferece como solução para este problema a utilização de escalas de
performance para combinar diferentes indicadores. Como descrito anteriormente uma escala
de performance fornece uma medida de quão boa é uma variável em relação a variáveis do
mesmo tipo. Bom ou ótimo são definidos como um extremo da escala e ruim ou péssimo
como o outro, assim as posições dos indicadores podem ser esboçadas dentro desta escala.
O conceito de escala de performance é uma das características fundamentais desta
ferramenta. Considerando a impossibilidade de mensurar o sistema como um todo, no que se
refere à sociedade e à ecosfera, e a inexistência de uma ferramenta para tal, Prescott-Allen
(1999) afirma que o Barômetro da Sustentabilidade procura medir os aspectos mais
representativos do sistema através de indicadores. É através da combinação dos indicadores
que o Barômetro mostra seus resultados por meio de índices. Estes índices são exibidos na
ferramenta através de uma interface gráfica, procurando facilitar a compreensão e dar um
quadro geral do estado do meio ambiente e da sociedade. Esta representação pode apresentar a
dimensão principal de cada índice para realçar aspectos de performance que mereçam mais
atenção, sendo adequada também para comparações entre diferentes avaliações. Na figura 2 é
apresentada, de maneira genérica, a interface desta ferramenta.
6
100
Bom
80
Justo
60
HUMANO
Médio
40
Pobre
20
Ruim
0
Ruim
Pobre
20
Médio
40
Justo
60
Bom
80
100
ECOSSISTEMA
Figura 2: Escala do Barômetro de Sustentabilidade
Fonte: Prescott-Allen, 1995
O Índice de Bem-Estar Humano é representado no eixo vertical (Y) e o Índice de
Bem-Estar dos Ecossistemas no eixo horizontal (X). O resultado da avaliação se dá na
intersecção destes dois eixos e representa o Índice de Bem-Estar.
O Barômetro da Sustentabilidade e sua interface gráfica foram concebidos para
mensurar e apresentar conjuntamente o bem-estar humano e dos ecossistemas, sem sobrepor
um ao outro. As principais características desse sistema de avaliação são destacadas a seguir:
a) A interface gráfica da ferramenta é construída a partir de dois eixos (abscissas e ordenadas):
um deles para o bem-estar humano e o outro para o bem-estar dos ecossistemas. Isto permite
que cada grupo de indicadores (elemento) seja combinado independentemente dos outros.
Esta independência permite a análise das interações entre os dois subsistemas;
b) O eixo com menor pontuação se sobrepõe ao outro. O objetivo é prevenir que altas
pontuações em determinado eixo ofusquem o mau desempenho em outra categoria, o que
reflete a visão eqüitativa do método;
c) Cada eixo é subdividido em cinco bandas, o que permite aos usuários definir, não só o
ponto final da escala, mas também seus pontos intermediários (entre o melhor e o pior
desempenho existem três classes intermediárias).
Os critérios de desempenho permitem que as mensurações dos indicadores dêem
origem a uma determinada pontuação pela conversão através da escala do Barômetro de
Sustentabilidade. As bandas do barômetro são apresentadas no quadro 1.
BANDA
INTERVALO
TETO
DEFINIÇÃO
Bom
81-100
100
Desempenho desejável; objetivo plenamente alcançado
Justo
61-80
80
Desempenho aceitável; objetivo quase alcançado
7
Médio
41-60
60
Desempenho neutro ou fase de transição
Pobre
21-40
40
Desempenho indesejável
Ruim
1-20
20
Desempenho inaceitável
Base
0
0
Base da escala
Quadro 1: Bandas do Barômetro da Sustentabilidade
Fonte: Adaptado de Prescott-Allen, 2001
Os critérios definem a taxa de troca entre o indicador e a escala, o nível de
desempenho que equivale a um certo número de pontos. A escolha dos critérios de
desempenho envolve a determinação do teto de cada banda, o que é feito com base em alguns
fatores: Um intervalo de desempenho é utilizado para demarcar o valor mínimo e máximo da
escala. A regra geral estabelecida é que o intervalo total da escala (base ruim ao topo bom, ou
0 a 100) alcance todos os intervalos possíveis de desempenho. Isto se refere ao desempenho
atual, ou a uma combinação de passado, presente e futuro esperado, dependendo de cada caso
sob análise.
O objetivo do elemento é a referência utilizada para estabelecer o teto da banda
“bom”. Para a determinação dos valores limites das bandas podem ser utilizados alguns
parâmetros:
Taxa Estimada de Sustentabilidade, é a taxa de extração na qual um ecossistema ou hábitat
se mantém. Esta taxa deve determinar, sempre que possível, o teto da banda “médio” da
Escala de Valores do Indicador. Isto se dá em função do princípio da precaução. Uma
avaliação de sustentabilidade em Unidades de Conservação não pode considerar “justa” (um
desempenho aceitável) uma utilização insustentável de seus recursos naturais;
Taxa Estimada de Suporte. Esta taxa está ligada ao alvo almejado; é aquilo que se pretende
para o indicador. A taxa estimada de suporte deve estipular o teto da banda “bom” (o melhor
desempenho). A questão de maior dificuldade é determinar quão distante desta taxa o
desempenho do indicador ainda pode ser considerado “bom”;
Padrões Internacionais ou Nacionais. Pode-se fazer uso dos padrões das Nações Unidas, ou
de algum órgão nacional ou internacional;
Alvos Internacionais ou Nacionais. Aquilo que se almeja para o índice que se pretende
medir;
Opinião de Especialistas. Pode ser utilizada na falta das outras fontes de informação citadas;
Derivação a partir de um indicador correlato. Esta estimativa é utilizada quando, na
ausência de um alvo oficial ou de um índice oficial, existem alvos oficiais para os indicadores
correlatos;
Outros limites. Estes limites podem estar baseados no conhecimento comum de determinadas
sociedades, ou em observações que, mesmo não sendo consideradas cientificamente, são
reconhecidas pelo senso comum local;
Julgamento dos Participantes. Este critério só deve ser utilizado na indisponibilidade de
qualquer um dos outros critérios citados.
A escolha dos critérios de desempenho é a etapa mais difícil de um processo de
avaliação de bem-estar. Requer e demanda que julgamentos sejam feitos em toda a sua
trajetória. Estes julgamentos estão intimamente ligados ao juízo de valor de cada um dos
atores que participam do processo de avaliação. Assim, a discussão exaustiva deste
componente é vital para o sucesso do processo.
O quarto estágio se refere à mensuração e mapeamento dos indicadores. Após a
escolha dos indicadores é necessária a obtenção dos seus valores. O processo de avaliação
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estabelece a sua própria base de dados, faz arranjos com as fontes de dados existentes,
organiza levantamentos a fim de monitorar o sistema para aqueles indicadores que ainda não
podem ser mensurados. Os dados coletados são armazenados e as mensurações têm seus
resultados comparados e catalogados. É importante o mapeamento do local e dos resultados
alcançados, pois proporciona maior transparência sobre as informações coletadas.
A combinação de indicadores e mapeamento dos índices é realizada no quinto
estágio. Uma vez pontuados os indicadores, eles devem ser combinados de acordo com a
hierarquia apresentada na Figura 1. A informação flui a partir dos indicadores na direção do
sistema da seguinte forma: pontuações dos indicadores devem ser combinadas para formar a
pontuação dos sub-elementos (quando existiram); estes são combinados para formar o índice
dos elementos, que, por sua vez, dão origem ao índice das dimensões. Estas devem originar o
índice dos subsistemas, que formam a base do índice do sistema. A combinação dos
componentes pode se operar de duas maneiras:
•
média aritmética;
•
média ponderada.
O uso de uma ou outra possibilidade se dá de acordo com o objetivo e com as
necessidades do componente. Em geral, utiliza-se a média simples, entendendo-se que os
componentes estariam sendo julgados de maneira generalizada, sem detalhamento.
Por último no sexto estágio é realizada uma revisão dos resultados. Neste estágio
busca-se um exame detalhado das ligações entre os indicadores, os padrões de desempenho,
os pontos fracos e fortes, os fatores causais, as oportunidades e os obstáculos envolvidos na
avaliação.
3. Procedimentos Metodológicos
O ciclo de seis estágios, descrito anteriormente, delimitam a base do modelo de
avaliação de sustentabilidade proposto por Prescott-Allen (2001) e que pode ser utilizado para
unidades de conservação. Pretende-se, a partir da base teórica disposta anteriormente, analisar
e aplicar o modelo proposto por este autor em uma Unidade de Conservação. Inicialmente
trata-se de construir os alvos de avaliação das duas dimensões propostas no modelo: Humana
e Ecológica. Nesse sentido o artigo limita-se as etapas iniciais do ciclo de avaliação.
Para alcançar o objetivo do trabalho adotou-se um delineamento exploratório e
descritivo de cunho predominantemente qualitativo. A pesquisa qualitativa foi conduzida a
partir de um estudo de caso sendo que a unidade de análise escolhida para o trabalho foi
Parque Estadual da Serra do Tabuleiro localizado no estado de Santa Catarina. O Parque
Estadual da Serra do Tabuleiro foi escolhido como referência da área de estudo pela
importância e magnitude dos benefícios gerados e a pela relativa quantidade de informações
disponíveis acerca do sistema, em função do Plano Básico de Zoneamento da área, que
caracteriza os seus aspectos físicos, bióticos e socioeconômicos.
Para construir os alvos das dimensões Humana e Ecológica, e assim analisar e aplicar
o modelo de avaliação proposto na Unidade de Conservação, foram utilizados dados
secundários. Todas as fontes de dados e os critérios adotados para a análise da unidade de
conservação, bem como para construção da matriz dos alvos para a avaliação do Parque
Estadual da Serra do Tabuleiro, são descritos no próximo item.
4. Apresentação dos Resultados
9
Como descrito anteriormente o Barômetro de Sustentabilidade provê o ponto de
partida para a implantação de políticas públicas, de acordo com a visualização gráfica dos
índices de bem-estar humano e dos ecossistemas. Essa ferramenta permite avaliar os pontos
fortes e fracos de um sistema. A seguir será detalhado o modelo utilizado nesse estudo de
caso, especificamente no que diz respeito aos estágios concernentes à avaliação do Parque
Estadual da Serra do Tabuleiro em Santa Catarina.
Definição da Área de Avaliação
A área total do projeto compreendeu as unidades de conservação existentes nos
municípios que integram o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro em Santa Catarina:
Palhoça, Santo Amaro da Imperatriz, Águas Mornas, São Bonifácio, São Martinho, Imaruí,
Paulo Lopes e Garopaba.
A escolha de unidades político-administrativas para compor os limites da avaliação de
sustentabilidade se deu pela função de instrumento de apoio à decisão, na determinação da
cota-parte de ICMS dos municípios. O município de Florianópolis não está inserido na
presente avaliação por dois motivos básicos: 1) contribui com menos de 1% da área total do
Parque da Serra do Tabuleiro (EPAGRI, apud SOCIOAMBIENTAL, 2001); 2) existem
poucas informações a respeito dos ecossistemas costeiros (PRESCOTT-ALLEN, 2001). Em
termos político-geográficos a área em avaliação é de 285.926,00 hectares, dividida conforme
o quadro.
A unidade de conservação integrante da presente proposta de avaliação foi escolhida
tomando-se como base o cadastro de unidades de conservação da Fundação de Meio
Ambiente (FATMA, 2003). Neste sentido, foram inseridas somente as unidades de
conservação sistematizadas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e
Sistema Estadual de Unidades de Conservação (SEUC), devendo, para tal, possuir diploma
legal de criação vigente. Assim, a unidade integrante deste estudo de caso é o Parque Estadual
da Serra do Tabuleiro (PEST). A Área de Preservação Ambiental da Baleia Franca, no
município de Garopaba, não foi contemplada na pesquisa em tela em função da
indisponibilidade momentânea de informações acerca das suas condições biofísicas. Além
disto, esta é uma unidade marcadamente marinho-costeira, estendendo-se pelo litoral
catarinense desde o município de Palhoça até o sul do estado, somente apresentando área
terrestre no município de Garopaba.
MUNICÍPIO.
ÁREA (HA)
Águas Mornas
36.075,700
Garopaba
11.467,000
Palhoça
39.466,200
Imaruí
54.223,600
Santo Amaro da Imperatriz
31.073,500
São Bonifácio
46.130,100
Paulo Lopes
45.037,200
São Martinho
22.453,100
TOTAL
285.926,400
Quadro 2: Área dos Municípios que Compõem a Avaliação de Sustentabilidade
Fonte: IBGE, 2000
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Existem inúmeras controvérsias acerca da área total do Parque da Serra do Tabuleiro
em função das diferentes formas de apuração da área das glebas (SOCIOAMBIENTAL,
2001). As medições cartográficas apresentam um resultado, enquanto que a demarcação do
parque apresenta resultado distinto. Foi utilizada nesse trabalho a área total de 87.405
hectares, por ser a área legal da unidade, constante do Decreto 17.720/82, que, mesmo não
sendo o decreto de criação da unidade de conservação, é o diploma legal que apresenta a área
resultante, em função de anexações e desanexações na área original, constante do Decreto
1.260/75, de criação do parque.
Na área de abrangência da avaliação de sustentabilidade existem cinco regiões
fitogeográficas bem-definidas: Manguezal, Restinga, Floresta Ombrófila Densa, Floresta
Ombrófila Mista e Campos de Altitude. Considerando que a divisão político-administrativa
das municipalidades não foi construída em função das possíveis unidades ecológicas
existentes, estabeleceu-se uma subdivisão de área em função da localização geográfica dos
municípios.
Definida a área de avaliação devem ser delimitados, segundo o modelo, os alvos do
sistema e dos subsistemas. O alvo do sistema, meta a ser atingida em termos de
sustentabilidade, para o parque da serra do tabuleiro foi definido como:
Manutenção de unidades de conservação sustentáveis, sob o ponto de vista da proteção da
biodiversidade, da geração de informações ambientais e lazer; coexistindo em harmonia com
o ambiente humano com o qual interagem.
Da mesma maneira, para o subsistema humano, foi definido como alvo a existência de:
Comunidades fortes, com alto nível de bem-estar, que interagem com as unidades de
conservação como parte integrante da sua estratégia geral de conservação, coexistindo
harmonicamente.
Para o subsistema ecológico, o alvo do processo de avaliação refere-se ao:
Alto nível de bem-estar dos ecossistemas que preservados integram a estratégia de
conservação da unidade de conservação e coexistem em harmonia com a comunidade.
O segundo estágio do processo de avaliação refere-se à identificação e definição das
dimensões. Estas foram construídas para os dois subsistemas que constituem o sistema:
Humano e Ecológico. É necessário ressaltar que todos os componentes desta avaliação foram
estabelecidos especificamente para as condições existentes na área delimitada para o sistema,
ou seja, o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro.
Para a categoria Ecossistema foram selecionadas quatro dimensões, iguais em
importância, para caracterizar este subsistema. Estas dimensões constituem o ponto de partida
comum para todas as avaliações; escolhidas de forma a capturar todo o espectro de recursos
ambientais relevantes para a avaliação. Os fundamentos para esta subdivisão podem ser
encontrados na legislação de impacto ambiental (Resolução 001/86 CONAMA), que em seu
Artigo 6° classifica os recursos ambientais em duas categorias:
•
meio físico: o subsolo, o ar, o clima, os recursos minerais, a topografia, os tipos e
aptidão dos solos, os corpos d’água, o regime hidrológico;
•
meio biológico e os ecossistemas naturais: a fauna e a flora, destacando as espécies
indicadoras de qualidade ambiental.
Também foi utilizado como parâmetro a definição de recurso ambiental, constante da
Lei do Sistema Estadual de Unidades de Conservação – SEUC -, Art. 1°, inciso XX:
11
RECURSO AMBIENTAL: atmosfera, águas interiores, superficiais e subterrâneas, estuários,
mar territorial, solo, subsolo, elementos da biosfera, fauna e flora.
Além das legislações citadas anteriormente, foram utilizados os objetivos constantes
da Estratégia Mundial para a Conservação (IUCN, UNEP, WWF, 1980), relacionados
abaixo:
•
manutenção dos processos ecológicos essenciais;
•
preservação da diversidade genética;
•
utilização sustentável de espécies e ecossistemas.
Partindo-se do princípio de que o objetivo da avaliação é buscar compreender quão
distante, ou quão próximo, o subsistema se encontra da sua sustentabilidade, buscou-se captar
todos os aspectos da natureza, trazendo os objetivos da conservação para cada um deles.
O meio físico foi caracterizado pelas dimensões águas interiores e uso da terra. A
escolha das dimensões excluiu o ecossistema estuarino e o mar territorial pela imensa
dificuldade de se obter dados, o que poderia vir a descaracterizar a avaliação. A escolha do
termo “uso da terra” se deve ao objetivo da avaliação, que, como descrito, representa uma
“medida de distância”, entre o que se tem e o que se almeja. O meio biótico foi contemplado
pelas dimensões cobertura vegetal e fauna. Neste caso, também se buscou a inserção dos
objetivos da conservação no escopo desta etapa da avaliação.
A avaliação dos aspectos de uma unidade de conservação relacionados com a
comunidade, com a geração de conhecimento, com a legalidade da área e com a sua
administração, são os objetivos da categoria do subsistema Humano. Estes objetivos são tão
vitais para a sobrevivência da unidade de conservação quanto o são os objetivos diretos da
preservação.
A interligação entre as duas categorias é vital, pois não existem unidades de
conservação tão remotas que não influenciem e sejam influenciados pela humanidade. Mesmo
as reservas biológicas e as estações ecológicas, as categorias de manejo mais restritivas que
existem, possuem ligações com a sociedade. As dimensões do subsistema Humano foram
escolhidas de forma a caracterizar a unidade de conservação de acordo com o seu papel na
estratégia de conservação, da qual é parte integrante. Para Fonseca et. al. apud DINÂMICA
(2000), as unidades de conservação devem ser o foco principal da implantação de projetos de
geração de informação ambiental e de educação ambiental, servindo também como
laboratórios naturais destinados à pesquisa científica e à bioprosperação.
De acordo com Savi (1997 apud DINÂMICA, 2000), as unidades de conservação,
sejam elas científicas, preservacionistas ou de recreação, obtêm melhores resultados quando o
seu planejamento envolve a relação entre os recursos naturais e o usuário. O autor aponta a
relação entre comunidade e unidade de conservação como um dos principais parâmetros a
serem levados em consideração durante o planejamento de um parque. Além desses autores, a
legislação acerca de unidades de conservação, tanto Federal (SNUC, art. 5°) quanto Estadual
(SEUC, art. 3° e 4°), prevê o relacionamento harmônico entre a natureza preservada e a
comunidade diretamente afetada pela preservação.
Para a subsistema Humano foram elaboradas quatro dimensões principais:
Administração, Fiscalização e Educação, Comunidade e Institucional. As dimensões
“Administração” e “Fiscalização e Educação” buscam captar a função de difusão de
conhecimento, a relação entre a biodiversidade preservada e a comunidade afetada e a
estrutura existente como suporte à manutenção da área e ao recebimento de visitantes.
Acredita-se que o significado de sustentabilidade se perde ao marginalizar as comunidades
inter-relacionadas com a unidade de conservação. O Sistema Nacional de Unidades de
Conservação traz no seu escopo o processo participativo na gestão das unidades de
conservação. Para capturar o inter-relacionamento entre a unidade e a comunidade afetada, foi
12
utilizada a dimensão “Comunidade”. Tendo em vista que grande parte das unidades de
conservação em Santa Catarina (e no Brasil), apesar de formal e legalmente criadas, ainda não
tiveram seu processo de implantação concretizado, foi inserida a dimensão “Institucional”,
com a finalidade de capturar os aspectos legais, fundiários e de governabilidade da área,
somados ao estágio de implantação da unidade.
A terceira etapa do modelo prevê a escolha dos indicadores e seus critérios de
desempenho. Da mesma maneira que na etapa anterior este processo foi dividido em dois:
planejamento do índice de sustentabilidade do Ecossistema e planejamento do índice de
sustentabilidade do subsistema Humano.
O Índice de Sustentabilidade dos ecossistemas deve ser construído a partir da média
aritmética simples do índice apurado para as suas quatro dimensões: cobertura vegetal, águas
interiores, uso da terra e fauna. O bem-estar de um ecossistema é “uma condição na qual ele
mantém a sua qualidade e biodiversidade e, conseqüentemente, a sua capacidade de
manutenção da vida”. (PRESCOTT-ALLEN, 2001 p. 59). O ecossistema global consiste de
várias camadas de pequenos ecossistemas: comunidades de plantas, animais e outras criaturas,
juntamente com os seus ambientes físicos.
A diversidade inclui o modelo dessas comunidades na paisagem, a composição das
espécies, o tamanho e a estrutura dos componentes populacionais e as interações e conexões
entre as comunidades. Todas estas informações são importantes e devem ser usadas para
mensurar os aspectos ligados à natureza. Existem muitas informações que não podem ser
mensuradas; outras não podem ser capturadas e, ainda, outras cuja base de dados é
inexistente. Por isto, estas informações deram lugar a outras, que permitiram viabilizar a
avaliação.
A qualidade de um ecossistema inclui a sua capacidade de auto-manutenção, através
dos ciclos de crescimento, maturidade, morte e regeneração, a integridade química e física do
solo e da água. Nesta avaliação procura-se cobrir todos os aspectos de biodiversidade e
qualidade dos ecossistemas, bem como as pressões sobre eles exercidas. As dimensões do
subsistema ecossistema foram subdivididas em seis elementos - dois para a dimensão
cobertura vegetal, dois para a dimensão água, um para a dimensão uso da terra e outro para
fauna.
Na dimensão cobertura vegetal, o elemento diversidade foi subdividido em dois sub
elementos, em função da disponibilidade de informações, conseqüência de pesquisas
efetuadas no local e pelas informações disponíveis no Plano Básico de Zoneamento do Parque
(SOCIOAMBIENTAL, 2000). A dimensão uso da terra apresenta somente um elemento, em
função da inexistência de informações objetivas e sistematizadas acerca do tema.
A dimensão fauna também apresenta um único elemento, pela falta de disponibilidade e pela
dificuldade de mensuração da sua biodiversidade.
O índice de sustentabilidade humana deve ser construído a partir da média aritmética
do índice apurado para as suas quatro dimensões: Administração, Fiscalização e Educação,
Comunidade e Institucional. As dimensões foram subdivididas em sete elementos, sendo
dois elementos para cada dimensão, à exceção da dimensão comunidade, que apresenta
somente um elemento. Procurou-se, deste modo, cobrir todos os aspectos que compõem o
mosaico de atividades que envolvem o aspecto “humano” de uma unidade de conservação.
Busca-se desta maneira demonstrar, através dos critérios de desempenho, os pontos fortes e
fracos de cada área de atuação da unidade de conservação, o que resulta num processo de
melhoria contínua na gestão da unidade.
A dimensão Administração será composta por dois elementos: pessoal e
administração, por constituírem os componentes de qualquer empreendimento, público ou
privado. Na dimensão Fiscalização e Educação serão utilizados os dois componentes que
formam a própria dimensão– fiscalização e educação, sendo a última especificamente a
13
educação ambiental. Com a dimensão Comunidade objetivou-se criar condições de avaliar
os grupos que vivem dentro e no entorno das unidades de conservação. Será utilizado somente
um elemento, residentes. A dimensão Institucional será representada por dois elementos:
governança e estágio de implantação, sendo que esta última foi adotada em função do
número reduzido de unidades de conservação totalmente implantadas no país.
5. Considerações Finais
As dimensões relacionadas às categorias do subsistema Humano e Ecológico
construídas anteriormente devem orientar o processo de avaliação da unidade de conservação
escolhida. Todas as dimensões, e suas categorias, foram criadas com base no Plano Básico de
Zoneamento do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (SOCIOAMBIENTAL, 2000), no
Diagnóstico de Efetividade das Unidades de Conservação Marinho Costeiras de Santa
Catarina – GIUC – (SYNTHESIS, 2003) e em Loureiro (2003). Ao final desse processo, que
compreendeu os três primeiros estágios do modelo de avaliação de bem estar proposto por
Prescott-Allen (2001), é possível visualizar as matrizes de avaliação das dimensões dos
subsistemas considerados para a unidade de conservação selecionada. As duas matrizes estão
representadas nos quadros 3 e 4.
COBERTURA
VEGETAL
ÁGUAS
INTERIORES
QUALIDADE
Os danos causados por agentes externos
são mantidos dentro de padrões aceitáveis
para uma UC
Residentes vivendo em plena harmonia
com os princípios da conservação,
mantendo o hábitat aquático livre da
deposição de resíduos sólidos ou
líquidos.
DIVERSIDADE
Os ecossistemas terrestres são, em larga
escala mantido e/ou recuperados
Ambiente aquático mantido ou
recuperado, com perda mínima para as
comunidades e hábitat.
A degradação do solo é mantida
consideravelmente abaixo da taxa mínima
de degradação para áreas naturais.
Residentes em número sustentável,
vivendo em harmonia com o ambiente
natural e os objetivos da conservação,
fazendo uso de práticas conservacionistas
para a sua sobrevivência.
Todas as espécies nativas são mantidas, e
as taxas de extinção são reduzidas a um
limite mínimo considerado suportável
para o ecossistema.
USO DA
TERRA
FAUNA
Quadro 3: Matriz dos Alvos das Dimensões do Subsistema Ecossistema
Fonte: os autores
ADMINISTRAÇÃO
FISCALIZAÇÃO
E EDUCAÇÃO
PESSOAL
Equipe em número compatível com a
área, periódica e devidamente capacitada.
FISCALIZAÇÃO
A comunidade e a fiscalização convivem
em parceria para a melhoria contínua do
local.
INFRA-ESTRUTURA
Infra-estrutura compatível com os
objetivos da conservação.
EDUCAÇÃO
As informações geradas pela pesquisa
local e por outras fontes de conhecimento
são plenamente difundidas pela UC
14
COMUNIDADE
INSTITUCIONAL
RESIDENTES
A UC e a população mantêm um
relacionamento positivo e harmônico,
promovendo o bem-estar recíproco.
GOVERNANÇA
A unidade é autônoma e participa
plenamente do desenvolvimento local e
regional.
ESTÁGIO DE IMPLEMENTAÇÃO
A UC está totalmente implantada e possui
todas as condições de autogestão.
Quadro 4: Matriz dos Alvos das Dimensões do Subsistema Humano
Fonte: os autores
Os resultados encontrados na construção do sistema de avaliação demonstram as
possibilidades de utilização da ferramenta proposta para mensurar o grau de sustentabilidade
de uma unidade de conservação. O modelo proposto apresenta inúmeras vantagens na medida
em que pode ser utilizado como ferramenta de comunicação, uma vez que conduz à reflexão
sobre o significado dos termos bem-estar humano e bem-estar do meio ambiente dentro de
uma unidade de conservação. Sua abordagem abrangente, obtida através da integração do
bem-estar humano com o meio ambiente, está de acordo com os principais elementos do
desenvolvimento sustentável, na medida em que estas duas categorias são combinadas de uma
maneira adequada, procurando preservar as informações do processo. O declínio de um
determinado índice não mascara o crescimento de outro; isto é particularmente importante no
índice geral.
As decisões cruciais num processo de avaliação são a identificação das questões e
objetivos do sistema, a escolha dos indicadores e a decisão relativa aos critérios de
performance. Estas etapas do processo são atendidas pelo modelo de avaliação, mas para
efetivamente validar a ferramenta proposta por Prescott-Allen (2001), deve-se percorrer todo
o ciclo de avaliação incluindo, no caso específico das unidades de conservação, as três etapas
posteriores do processo: mapeamento e mensuração dos indicadores, sua combinação em
índices e por último a revisão dos resultados encontrados.
Os resultados encontrados na primeira etapa do processo de avaliação, que são as
matrizes ou alvos dos subsistemas Humano e Ecológico, demonstram a possibilidade de
aplicação do modelo numa unidade de conservação real. Espera-se concluir este trabalho
utilizando estas matrizes para avaliação efetiva da unidade de conservação do Parque Estadual
da Serra do Tabuleiro. Os resultados encontrados nesse processo devem orientar, de maneira
genérica, na elaboração de políticas públicas que visem melhorar efetivamente sua gestão,
mas de maneira específica pretende-se utilizar os resultados como parâmetro para um
instrumento econômico de apoio a sustentabilidade.
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1 Avaliação de Sustentabilidade em Unidades de Conservação: Um