Uso empírico precoce de antibiótico nos recém-nascidos pré-termos associa-se com menor diversidade bacteriana e maior abundância relativa de Enterobacter Apresentação:Tainá Coelho,Vanessa Pfeilsticker (Internato em Pediatria, 6ª Série) Coordenação: Paulo R Margotto www.paulomargotto.com.br Introdução • Os antibióticos são os medicamentos administrados mais comumente prescritos para crianças em Unidades Neonatais de Terapia Intensiva¹. • Mesmo sendo baixa a incidência de sepse precoce, os recém-nascidos (RN) pré-pré-termos recebem antibioticoterapia empírica nos primeiros dias de vida quando se suspeita de infecção2,3. • Apesar do uso de antibioticoterapia empírica em recém-nascidos pré- termos (RNPT) ser indicado na suspeita de sepse precoce, infecção intrauterina oculta que precipitou trabalho de parto prematuro, rotura prematura de membranas ovulares e corioamnionite, o seu uso parece ser prudente, mas no entanto, a Introdução • Quando se inicia a antibioticoterapia empírica, muitos clínicas usam-na por 2 dias. mas no entanto, tem sido prolongado por 5 dias ou mais frente a fatores, como rotura prolongada de membrana, corioamnionite, necessidade de reanimação, desconforto respiratório e intolerância alimentar • Infelizmente, a antibioticoterapia empírica precoce tem potencial para causar danos assim como benefícios para os RNPT, por impedir a colonização microbiana inicial6,7. • Nestes RN prematuros, a colonização microbiana consiste em menos espécies benéficas, pouca diversidade bacteriana e mais patógenos do que os observados nos RN a termo saudáveis8-11. • Porém não se sabe até que ponto esse fato pode ser atribuído ao alto uso de antibiótico. Introdução • Apesar do maior entendimento dos microrganismos que vivem com e dentro do organismo, os estudos sobre RNPT não tentaram avaliar o impacto do uso de antimicrobiano na microbiota intestinal. • O uso irrestrito de antimicrobianos pode ter consequências persistentes na redução da diversidade dos microrganismos e mesmo após sua suspensão, não é garantida a recuperação total da microbiota saudável12. • O uso de antibioticoterapia empírica precoce em RNPT está associado a um aumento no risco de desenvolver enterocolite necrosante, sepse e morte13-15. • Aberrante colonização precoce intestinal pode contribuir para a fisiopatologia da enterocolite necrosante8,11,16. HIPÓTESE A SER TESTADA • Os autores testaram a hipótese de que o uso intensivo de antibiótico precoce nos pré-termos altera a ontogenicidade da microbiota e diminui a diversidade microbiana em um estudo longitudinal de colonização intestinal em 74 recém-nascidos prétermos. • Amostras seriadas de fezes foram coletadas entre 423 dias de vida para testar qualquer diferenças no estabelecimento precoce do microbioma intestinal pelo uso empírico precoce e intensivo de antibiótico Metodologia • Foram registradas crianças de 3 UTIN de Cincinnati, Ohio, como parte de um estudo de coorte sobre novos biomarcadores para casos de enterocolite necrosante (ECN), sepse ou morte em RN≤ 32semanas de idade gestacional (IG). • Nenhuma criança teve ECN, sepse ou óbito na primeira semana de vida e não foram identificadas anomalias congênitas. Metodologia • Exposição à antibioticoterapia empírica precoce foi definida como início do antibiótico (ATB) no primerio dia de vida. • A duração foi determinada com base no total de dias de uso contínuo de ATB com culturas negativas. • Sepse foi definida de acordo com resultados positivos de hemocultura, cultura de líquor, urocultura ou cultura estéril de sítio. • A ECN foi baseada nos critérios II ou III de Bell. Metodologia • Nessa coorte a antibioticoterapia empírica consistiu no uso de ampicilina e gentamicina, usando- se dose padrão. Foram divididos 3 grupos: Sem ATB: 0 dias. Uso curto de ATB: 1-4 dias. Uso prolongado de ATB: 5-7 dias. Metodologia • Foram coletadas várias amostras de fezes durante as primeiras três semanas. – 1ªsemana: 4-7 dias. – 2ªsemana: 10-16 dias. – 3ªsemana: 20-23 dias. • DNA bacteriano foi extraído dessas amostras através de um dos dois métodos: – Fenol- clorofórmio – Kit QiaAmp DNA (Qiagen, Valencia, Califórnia) • A sequência 16S do DNA ribossomal foi feita pelo Instituto Broad. Análise Estatística • Dados sequenciais foram gerados de 256 amostras a partir de 81 crianças. • Amostras seguidas de ECN e sepse foram excluídas, assim como 5 crianças com apenas 1 semana de coleta de amostras. • Um total de 74 pacientes com 239 amostras ficaram disponíveis para estudo. Análise Estatística • Variáveis categóricas foram testadas pelo teste de Fischer e as contínuas pelo ANOVA. O teste nãoparamétrico de Kruskal- Wallis foi usado para comparar diferenças na diversidade entre os grupos. • Foram usadas as percepções quantitativas do Programa de Ecologia Microbiana para calcular o índice de diversidade de Simpson, que media tanto a riqueza de espécies quanto a regularidade delas. Análise Estatística • Para considerar as múltiplas amostras por criança, foram usadas modelos alfa de equações de estimação generalizadas (GEE), para analisar as diferenças entre o índice de Simpson entre as crianças com níveis diferentes do uso de ATB. • A associação entre uso precoce de ATB e abundância relativa das duas unidades taxonômicas operacionais mais comuns, foi avaliada por um modelo de regressão linear. • Essa duas unidades foram classificadas como Enterobacter e Staphylococcus. Resultados • Das 74 crianças: – 13 (18%) não receberam ATB; – 48 (64%) fizeram uso curto; – 13 (18%) fizeram uso prolongado. • A duração e início da antibioticoterapia empírica precoce foi determinada a partir da percepção clínica do risco de infecção. • Na tabela II, as características clínicas e demográficas dos 3 grupos estudados, sendo evidenciadas as diferenças significativas Resultados Resultados • Uso prolongado de ATB foi maior na 1ª semana de vida em 14 crianças que posteriormente desenvolveram ECN ou sepse ou morreram (P=0,04). No entanto, como esses casos ocorreram em RN< 29 semanas de IG, o maior uso de ATB nesse grupo pode confundir os resultados. • Se analisar apenas o grupo de RN< 29 semanas, o uso de ATB na 1ª semana não diferiu significantemente quando comparado com os controles (P=0,208). Resultados • 1ª semana de vida: - Sem ATB: Staphylococcus (41%), Enterococcus (26%), e Enterobacter (19%). - Curto período de ATB (1-4 dias): Enterococcus e Staphylococcus. Enterobacter (40%), - Tratamento intensivo com ATB (5-7 dias): Enterococcus (34%), Clostridium (33%), Staphylococcus (11%) e Escherichia (8%). Figura 1 Resultados • 2ª semana de vida: - Sem ATB: Enterobacter, seguido por: Staphylococcus, Enterococcus e Escherichia. - Curto período de ATB: Staphylococcus, Enterococcus e Escherichia. - Tratamento intensivo com ATB: Enterobacter (57%), Escherichia (21%), Enterococcus (15%) e Staphylococcus (7%) = 90% da microbiota. Figura 1 Resultados • 3ª semana de vida: - Sem ATB: Enterobacter (36%), Enterococcus (17%), Clostridia (17%), Veillonella (16%) e Escherichia (11%). - Curto período de ATB: Enterobacter (48%) e Enterococcus (16%) gêneros mais comuns, seguidos por: Escherichia (13%), Clostridia (9%) e Veillonella (7%). - Tratamento intensivo com ATB: gênero mais comum: Enterobacter (47%), seguido por: Enterococcus (35%). Figura 1 Resultados Qual seria a importância estatística dessa mudança na microbiota intestinal pósantibioticoterapia precoce? -Quantificar a associação entre a exposição precoce aos ATB e a abundância relativa dos dois maiores grupos de unidade taxonômica (Enterobacter e Staphylococcus). Resultados • Enterobacter: - Aumentou significativamente com o uso de ATB empírico na semana 2 (com exposição intensiva a ATB – P=.016 e curto período de ATB – P=.006). - Entretanto, não houve aumento significativo na semana 3 pós-natal com exposição intensiva a ATB durante a primeira semana. • Staphylococcus: - O uso intensivo de ATB na primeira semana mostrou relação apenas com a diminuição relativa de Staphylococcus na semana 2 (P<0.001), mas não na semana 3. - Uso de ATB por curto período foi associado com aumento relativo de Staphylococcus na semana 3. Discussão • Os dados do presente estudo sustentam a hipótese de que o uso intensivo e precoce de ATB no RN pré-termo está associado com importante alteração na microbiota intestinal e potencializa os riscos de Enterocolite Necrosante, Sepse ou Morte. • A REDUÇÃO DA DIVERSIDADE MICROBIANA PERSISTIU POR MAIS DE 3 SEMANAS, com o uso intensivo de antibióticos Discussão • O uso intensivo de ATB cursa principalmente com aumento relativo de Enterobacter. • Por ser um estudo pequeno, pode haver viés de confundimento (principalmente pela diferença entre casoscontrole e fatores como a IG). • Entretanto, estes achados são consistentes quando comparados a grandes estudos realizados previamente13-15. • Em um estudo de caso e controle de 20 pré-termos com e sem ECN, Wang et al8 demonstraram pronunciada baixa diversidade bacteriana nos RN que desenvolveram ECN, com aumento de proteobactéria próximo ao dia da ocorrência da ECN. • Achados semelhantes ocorreram nos estudos de Morrow Al et al16 e Walsh MC et al17. Discussão • O uso de ATB seleciona Enterobacter muitas vezes patogênicas e resistentes a beta-lactamase27. • O aumento de Enterobacter devido a antibioticoterapia pode ocorrer através de mecanismos alternativos, notavelmente pela modificação de imunidade inata. • Bebês que receberam ATB por curto período, tiveram padrão de alteração na microbiota (SUPRIMIRAM A DIVERSIDADE DA MICROBIOTA TEMPORARIAMENTE|), mas na 3ª semana, voltaram a diversidade inicial (ao contrário dos que fizeram o uso de ATB por mais de 5 dias). • Os RN que não receberam antibióticos tiveram um aumento da diversidade da microbiota, como relatado por outros autores33. • Uso intensivo de ATB foi bastante significativo em crianças que evoluíram com ECN, sepse ou morte13-14. • Especula-se que o mecanismo subjacente desta associação esteja relacionado á morte de bactérias comensais, resultando no crescimento de bactérias patogênicas. É neste mecanismo que se baseam os estudos com probióticos na proteção da ECN34-35. Discussão • Outros fatores importantes para a composição da microbiota intestinal: tipo de parto e tipo de alimentação (neste presente estudo, mais de 90% dos RN receberam leite humano da própria mãe ou pasteurizado, iniciado no segundo dia de vida, alcançando nutrição enteral plena por volta de 2 semanas37).Assim, o viés da alimentação não interferiu no presente estudo (foi seguido protocolo de alimentação e a grande maioria recebeu leite materno). • Entre as limitações: infrequente defecação precoce nos prétermos nos primeiros dias de vida, com obtenção de poucas amostras, podendo não captar totalmente o efeito na microbiotas; baixa incidência de ECN, sepse e morte Discussão • A duração da antibioticoterapia empírica de ampicilina + gentamicina em RN pré-termo tem correlação com a redução da diversidade da microbiota intestinal que continuou através da 3ª semana do estudo • Antibioticoterapia intensiva disbiose precede ou precipita ECN, sepse e morte. Nota do Editor do site, Dr. Paulo R. Margotto Estudando juntos! Aqui e Agora! Microbiota intestinal e o uso de probióticos:perspectivas futuras (I Seminário de Controle de Infecção em Neonatologia, 6 de maio de 2014) Autor(es): Paulo R. Margotto • Microbiota (flora gastrintestinal): população de organismos microscópicos que habitam um órgão do corpo ou parte de uma pessoa. • Microbioma: única população inteira de microrganismos e seus elementos genéticos completo que habitam o corpo de uma pessoa. Adulto: 1 trilhão de bactérias no intestino (10 a 100 vezes que as próprias células humanas) Ao nascimento: trato gastrintestinal é estéril Maioria: Bidifobacteria, Enterobacteria, Clostridia, Lactobacilo, Enterococo (mais de 1000 diferentes espécies de bactérias) Vandenplas Y et al,2011;Sdepaniun V, 2012 Microbiota intestinal Efeitos significativos sobre a microbiota intestinal • Composição difere entre alimentados ao seio (mais bifidobacterias) e fórmula (flora “tipo adullto”:mais E.coli e bacterioide) Leite materno:oferece 109 bactérias vivas por litro! • Tipo de parto: cesariana os recém-nascidos não são expostos as floras vaginal e fecal maternas -atraso na colonização (composta por bactérias anareróbias, como Enterobacter -RN cesarianas: mais diabetes tipo 1, asma e alergia • Pré-termo: -colonizados por baixo número de bactérias benéficas (bifidobacteria e Lactobacilli). -alto número de bactérias potencialmente patogênicas (Enterobacteria e E.coli). -alto número de espécies de Baterioide, Enterococo e Estreptococo; Clostridium, Sthaphylococcus e Klebsiella: UMA FESTA! Cileborg MS et al (2012); Douglas-Escobar M et, 2013; Vandenplas Y et al,2011;Sdepaniun V, 2012; Neu J, 2010; Mshvildadze,2010 Microbiota intestinal Efeitos significativos sobre a microbiota intestinal: Uso de antibióticos • a ampla utilização prolongada de antibióticos pode prejudicar importantes eventos de transição necessários para a homeostase intestinal. • interação anormal entre o epitélio intestinal e a microbiota luminal quando a colonização é interrompida com antibióticos de amplo espectro. • A ativação dos receptores toll-like por bactérias comensais parece ser crítica para a proteção contra lesões do intestino e mortalidade associada. • A falta de diversidade de espécies bacterianas e a abundância de espécies Proteobacteria associadas com o uso amplo de antibióticos • A falta pode predispor à estimulação inflamatória que pode ajudar a explicar a susceptibilidade dos recém-nascidos prematuros a sepse tardia e a enterocolite necrosante. Kupala VS, 2011 Microbiota intestinal Antibioticoterapia empírica prolongada (≥5dias;culturas negativas) Patel, 2011:50% sem bacteremia provada recebem tratamento para a sepse (situação diagnostica problemática!) • Cottom et al(2009):enterocolite necrosante e morte • 4039 RN<1000g Regressão logística multivariada -Tempo prolongado de antibióticos altera o desenvolvimento fisiológico e imunológico intestinal enterocolite necrosante -Redução da flora bacteriana colonização por fungo candidíase neonatal Microbiota intestinal Antibioticoterapia empírica prolongada (≥5dias;culturas negativas ) • Alexandre et al (2011):estudo caso-controle (com e sem enterocolite necrosante-ECN) Após 1-2 dias de exposição ao antibiótico, o risco de desenvolver ECN aumentou 1,19 vezes e continuou a aumentar com a exposição adicional ao antibiótico ( 1,43 para 3-4 dias; 1,71 para 5-6 dias; 2,05 para 7-8 dias; 2,45 para 9 a 10 dias e 2,94 acima de 10 dias) Nos RN SEM SEPSE, A exposição ao antibiótico foi um risco significativamente independente para ECN Microbiota intestinal Antibioticoterapia empírica prolongada (≥5dias;culturas negativas) • Kupala VS, 2011:365 RN ≤32sem;≤1500g • Regressão logística (controle de IG, peso, rotura prematura de membrana, vent mec, uso de leite materno) para cada dia de antibioticoterapia empírica inicial, a odds ratio (OR) para sepse tardia, enterocolite necrosante ou morte e para sepse tardia, aumentou significativamente. MICROBIOTA INTESTINAL E ENTEROCOLITE NECROSANTE Á luz dos conhecimentos, como prevenir • Dieta precoce com leite humano (Colostroterapia nos RN pré-termos extremos) Menos ECN:(4.6 vs 14%)(RR:0,3;IC a 95%: 0.13–0.71) Menos ECN/Morte (6,3 vs 15,1%): RR:0,28;IC a 95%:0.13–0.58) • Evitar a Antibioticoterapia prolongada • Evitar o uso de Ranitidina Hamilton,2014 Infecções (OR 5.5; IC a 95%:2.9-10.4, P < 0,001) Sepse, Pneumonia,ITU Enterocolite necrosante (OR 6.6; IC a 95%: 1.7– 25.0 Taxa de mortalidade :6 vezes maior O suco gástrico é o maior mecanismo de defesa não imune Terrin,G, 2012 Muito mais precisa ser aprendido sobre a flora intestinal e suas interações com o desenvolvimento do trato intestinal antes de podermos rotineiramente manipular o ecossistema microbiano intestinal. Neu J, 2014 OBRIGADO! Dr. Paulo R. Margotto, Ddas Mônica, Camila, Tainá, Aressa, Vanessa, Nathalia e Laisa Estudantes da Escola Superior de Ciências da Saúde e Universidade Católica de Brasília