DANIELA VIEIRA NARDI SARAVALLE
REABILITAÇAO NO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA (PSF):
PRÁTICAS EDUCATIVAS
Tese apresentada à Universidade Federal
de São Paulo – Escola Paulista de
Medicina para obtenção do título de Mestre
Profissional em Ensino em Ciências da
Saúde.
São Paulo
2007
DANIELA VIEIRA NARDI SARAVALLE
REABILITAÇÃO NO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA (PSF):
PRÁTICAS EDUCATIVAS
Tese apresentada à Universidade Federal de
São Paulo – Escola Paulista de Medicina
para
obtenção
do
título
de
Mestre
Profissional em Ensino em Ciências da
Saúde.
Orientadora:
Prof. Dr.ª Paulete Goldenberg
São Paulo
2007
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA
CENTRO DE DESENVOLVIMENTO DO ENSINO SUPERIOR EM SAÚDE
MESTRADO EM ENSINO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
Diretor (a) do Cedess: Prof Maria Cecília Sonzogno
Coordenador do curso de Pós-graduação: Prof Nildo Alves Batista
DANIELA VIEIRA NARDI SARAVALLE
REABILITAÇÃO NO PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA (PSF):
PRÁTICAS EDUCATIVAS
Presidente da Banca: Prof Dr. ª Paulete Goldenberg.
BANCA EXAMINADORA
Prof Dr. ª Vera Lúcia Ferreira Mendes ____________________________________
Prof Dr. ª Regina Maria Giffoni Marsiglia __________________________________
Prof Dr. ª Otília Maria L.B. Seiffert________________________________________
Ao Meu Grande e Eterno Amor, Ricardo (TUTO), com muito amor.
AGRADECIMENTOS
A amável Professora Paulete Goldenberg, pelo acolhimento de minha ansiedade,
pelas horas de conversa e dedicação.
Aos todos profissionais da Equipe de Reabilitação, que generosamente
contribuíram para este trabalho.
A todos do CEDESS, que me acolheram de forma ímpar, pelas aulas, pela
escuta, por tudo.
A Professora Vera Lúcia Ferreira Mendes que me ensinou muito sobre Saúde
Pública, e que após a graduação, tenho o privilégio de encontrá-la no mestrado.
Ao meu grande amor, Tuto, que me acompanhou incansavelmente durante este
trabalho, pelas leituras cuidadosas do texto e principalmente pelo amor, cuidado e
compreensão.
A minha mãe, Dora, que tanto admiro, por me apoiar sempre, pelo seu amor
incondicional.
Ao meu pai, Norberto, pelo carinho e apoio.
A minha irmã Ale, pelas palavras de apoio e compreensão das minhas ausências.
A minha linda sobrinha, Júlia, pelos momentos de alegria.
Ao meu irmão, Rodrigo, pelo carinho.
A Regina e Clóvis, pelas palavras de incentivo e o carinho de sempre.
A Marisa, Gabriela, Adriana Castro, Adriana Fernandez pelo apoio em todos os
momentos.
As amigas Adriana e Jéssica, pela compreensão e apoio durante todo o trabalho.
A minha grande amiga, Alessandra, pelos momentos de desabafo e compreensão
de minhas ausências.
SUMÁRIO
RESUMO ........................................................................................................ 20
ABSTRACT .................................................................................................... 21
1 Introdução ................................................................................................... 22
1.1 Reabilitação: das origens ................................................................ 22
1.2 Discurso higienista e institucionalização da Reabilitação ................ 25
1.3 Reabilitação na assistência curativa................................................. 29
1.4 Reabilitação diante das novas perspectivas...................................... 32
1.5 Reabilitação: Promoção de Saúde e práticas educativas................... 39
2 Objetivos...................................................................................................... 48
2.1 Objetivo Geral ................................................................................ 48
2.2 Objetivos Específicos ..................................................................... 48
3 Metodologia................................................................................................. 49
3.1 Delineamento do estudo.................................................................. 49
3.2 Perfil profissional e práticas educacionais ....................................... 49
3.3 Modelos de prática, limites e potencialidades.................................. 52
3. 4 Análise de dados ............................................................................ 53
3.5 Procedimentos éticos ...................................................................... 56
4 Resultados ................................................................................................... 57
4.1 Perfil profissional e exercício de uma prática educativa .................. 57
4.2 Qualificação das práticas educativas ............................................... 81
5 Considerações Finais................................................................................. 101
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 103
ANEXOS....................................................................................................... 115
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - Perfil dos Profissionais de Reabilitação no PSF/Zona Leste do Município
segundo Sexo, Idade e Tempo de Formação, 2007....................................................... 58
TABELA 2 - Formação e Capacitação dos Profissionais de Reabilitação no PSF/ Zona
Leste no Município de São Paulo, 2007....................................................................... 59
TABELA 3 - Atuação dos Profissionais de Reabilitação no PSF Zona Leste no
Município de São Paulo/ Santa Marcelina, 2007.......................................................... 60
TABELA 4 - Atividade Educativa Grupal Referida pelos Profissionais de Reabilitação
no PSF/ Zona Leste no Município de São Paulo, 2007................................................. 63
TABELA 5 - Atividade Educativa Grupal Referenciada pelos Profissionais de
Reabilitação no PSF/ Zona Leste no Município de São Paulo, 2007............................. 66
TABELA 6 - Estratégias Didáticas na Atividade Educativa Grupal de Referência dos
Profissionais de Reabilitação no PSF Zona Leste no Município de São Paulo, 2007. ... 72
TABELA 7 - Avaliação da Atividade Educativa Grupal de Referência dos Profissionais
de Reabilitação no PSF / Zona Leste no Município de São Paulo, 2007. ...................... 77
SIGLAS UTILIZADAS
CECCO – Centros de convivência e cooperativa
ECA – Instituto da criança e do Adolescente
ESF – equipe de saúde da família
OMS – Organização Mundial de Saúde
PSF – Programa de Saúde da Família
QUALIS – Qualidade integral a saúde
SMS – Secretaria Municipal de Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
TO –Terapia Ocupacional
UBS – Unidade básica de saúde
APRESENTAÇÃO
Na graduação de Fonoaudiologia, na PUC-SP, tive a oportunidade de estagiar
em várias áreas, entrando em contato, no quarto ano da graduação, com a Disciplina
Saúde Pública e feito estágio em uma Unidade de Saúde/Programa de Saúde da Família.
Em 2002 cursei o aperfeiçoamento em Fonoaudiologia e Saúde Coletiva,
também na PUC-SP.
Atualmente atuo no Programa de Saúde da Família em São Paulo. Durante
minhas atividades profissionais, percebi a necessidade de aproximação com outras áreas
do conhecimento que me auxiliassem, principalmente, no que se refere às práticas
educativas, que realizo com freqüência, em meu cotidiano.
Assim, realizei o curso de especialização em Ensino e Ciências da Saúde, no ano
de 2004 e em seguida ingressei no Programa de Mestrado em Ensino em Ciências da
Saúde da UNIFESP. Neste percurso elegi, como projeto de pesquisa, a prática educativa
que constitui o objeto da presente investigação.
RESUMO
No contexto da implantação do Programa de Reabilitação no PSF, ressalta-se, no
âmbito da Promoção de Saúde, a relevância das atividades educativas grupais.
Neste sentido o estudo teve como propósito caracterizar as práticas educativas
grupais
dos
Profissionais
da
Equipe
de
Saúde
do
Deficiente/Reabilitação
(Fonoaudiólogos, Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais) no Programa de Saúde da
Família, tendo em vista subsidiar proposta de capacitação.
Circunscrevendo o levantamento à equipe de reabilitação na Zona Leste de São
Paulo, com a Parceria da Casa de Saúde Santa Marcelina, o estudo envolveu três
movimentos de investigação. O primeiro, focalizou o perfil profissional, sendo
caracterizada uma prática educativa grupal recente. Num segundo movimento, foram
levantadas as concepções de educação que orientam as práticas educativas. No terceiro
movimento, foram apontados os limites e potencialidades do exercício das práticas
educativas, buscando subsídios para uma proposta de capacitação.
O estudo mostrou ausência de capacitação formal e específica para o exercício
das atividades educativas grupais, na preparação para atuação no PSF. Todos,
entretanto, referiram-se a realização de atividades educativas em grupos, ressaltando o
caráter esporádico da realização, que poderia estar a associado à questão da sobrecarga
de trabalho. Quanto à organização das atividades educativas foram abordados vários
elementos que integram o planejamento, os quais, não sendo tratados de forma
sistemática, apontaram para o caráter informal de sua realização. A qualificação das
atividades educativas grupais, levando-se em conta as estratégias adotadas, aponta para
o exercício de práticas de caráter dialógico, ao lado da permanêcia do modelo de caráter
tradicional, no âmbito do PSF. Além da falta de tempo os profissionais referiram
restrições de ordem material e espacial, como condições limitantes a realização das
atividades educativas grupais.
Ao lado da constatação do exercício de práticas educativas grupais pelos
profissionais de reabilitação, o estudo apontou para a heterogeneidade da qualificação
do seu exercício no âmbito da Promoção de Saúde. Nesse sentido, a investigação
registra a propriedade de ser pensado o aprimoramento desses profissionais, integrada
ao processo de repensar as atividades educativas grupais da reabilitação no contexto da
Promoção de Saúde, em âmbito institucional.
Palavras chave: REABILITAÇÃO; PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA;
EDUCAÇÃO EM SAÚDE; PROMOÇÃO DE SAÚDE; PRÁTICAS EDUCATIVAS.
20
ABSTRACT
In the Family Health Program, Rehabilitation Program Implementation context,
it is important to emphasize the relevance of group educational activities, regarding
Health Promotion. In this perspective, this study tried to define the group educational
practices of Special Needs Health / Rehabilitation professionals team (Speech Therapy,
Physiotherapists, Occupational therapist) in the Family Health Program, in order to
develop a proposal of capacitating. This assessment was done in Sao Paulo east zone,
with partnership with “Casa de Saúde Santa Marcelina”, and the following study
involved tree investigation movements. The first movement keeps the focus on
professional profile, being characterized a recent group educational practice. At the
second movement, the education concepts that guide the educational practices where
raised. At the third movement, education practices limits and potentials where
appointed, searching requirements to a proposal of capacitating. The study showed the
absence of formal and specific capacitating to the practice of group educational
activities, at the preparation to Family Health Program actuation. However, all
interviewed referred to group educational activities realization, emphasizing the not
regular frequency, that can be associated to overtime work issue. When the educational
activities were discussed, many elements that participate in planning, but not been
treated in a systematic way, showed the informal characteristic of it’s organization. The
group educational activities qualification, considering the strategies adopted showed the
realization of practices of dialogic characteristics, besides of the traditional
characteristics model remaining at Family Health Program context. Besides lacks of
time, the professionals mentioned supplies and space restrictions as limit conditions to
develop group educational activities. Regarding the Rehabilitation professionals group
educational practices, the study showed a heterogeneous qualification on Health
Promotion. In this way, the investigation registers the importance of professionals
capacitating development, integrated to the process of group educational activities rethinking, in an institutional forum of Health Promotion.
Key words: REHABILITATION; FAMILY HEALTH PROGRAM; EDUCATION IN
HEALTH; HEALTH PROMOTION; EDUCATIONAL PRACTICES.
21
1 Introdução
1.1 Reabilitação: das origens
As
deficiências,
originalmente, eram associadas
a
aberrações,
sendo
consideradas de formas diversas, em contextos sociais distintos. Na ótica da sociedade,
a deficiência era resultante de possessão demoníaca, a punição era a única forma de se
livrar do pecado, da possessão que recaia sobre o deficiente (ARANHA, 1995).
No Século XVI, no contexto da Revolução Burguesa, revoluções de idéias, na
forma de ver o homem e a sociedade, acompanharam mudanças no sistema de
produção. No que se refere à deficiência, começaram a surgir novas idéias quanto a
organicidade de sua natureza, produto de infortúnios naturais, conforme Paracelso e Sir
Antony Fitz-Hebert. Assim concebida, passou a ser tratada através de alquimia, da
magia e da astrologia (ARANHA, 1995).
No século XVII, o fortalecimento do modo de produção capitalista se fez
acompanhar da consolidação da classe burguesa no poder. A educação, com padrão de
ensino tradicional, até então assumido exclusivamente pela Igreja, passou também a ser
oferecida pelo Estado. Concomitantemente, novas idéias foram sendo produzidas tanto
na área da medicina, como na da filosofia e na educação (ARANHA, 1995). Thomas
Willis baseou sua explicação para a deficiência na neurofisiologia, recorrendo às idéias
de “fluido nervoso, suco nervoso, líquido dos nervos e, principalmente, a idéia de
fluídos voláteis ou espíritos animais” (PESSOTTI, 1984). Santo Agostinho adotara a
doutrina da localização das funções cerebrais nos ventrículos que, para ele, eram três,
“ficando no anterior as sensações, no médio a memória e no posterior o raciocínio”
(PESSOTTI, 1984).
Foi John Locke quem mais contribuiu para alterar a visão da sociedade sobre as
causas da deficiência, fundamentando tal explicação na teoria do conhecimento. Ele
defendia a elaboração de uma didática para o trabalho pedagógico, pois acreditava que
22
todos os seres humanos eram como uma tábula rasa onde, tudo o que se ensinava seria
impresso nesta, possibilitando formar o conhecimento e suprir as carências encontradas
(PESSOTTI, 1984). Ainda, assim, prevalecia a idéia de que os deficientes não traziam
nenhum proveito para a sociedade, gerando o sentimento de que melhor seria segregálos: “não se pune, nem abandona o deficiente, mas também não sobrecarrega o governo
e a família com sua incômoda presença” (PESSOTTI, 1984). Nesse momento surgiram
os hospícios que passaram a funcionar em antigos leprosários, lugares para onde eram
levados todos que fossem julgados não pertencentes aos padrões sociais vigentes, como
prostitutas, loucos, deficientes, delinqüentes, mutilados, etc.
Na verdade, as instituições de assistência aos pobres e doentes (incluindo os
“deficientes”) funcionavam como recurso de “exclusão social” afastando o “perigo” do
resto da sociedade. FOUCAULT (1977) afirma:
Antes do século XVIII, o hospital era essencialmente uma instituição de
assistência aos pobres. Instituição de assistência, como também de separação
e exclusão. O pobre como pobre tem necessidade de assistência e, como
doente, portador de doença e de possível contágio, é perigoso. Por estas
razões, o hospital deve estar presente tanto para recolhê-lo, quanto para
proteger os outros do perigo que ele encarna. (p.101-102).
Teve origem nessa trajetória, paralelamente ao fortalecimento da visão
organicista, a busca de abrigos, sobre a qual se assentaria a prática do cuidado
institucional. Nestas condições se estruturava a preocupação ambígua da assistência: de
um lado os “ociosos”, buscando-se encaixar os que ainda estivessem “válidos” no
aparelho produtivo, de outro lado, afastando-se ou isolando-se os “não-aproveitáveis”.
Na época do Brasil-Império (1831/1840), as pessoas, com recursos, que queriam
estudar, iam, em sua maioria, para o exterior, a França, em particular. Uma vez estando
lá, recebiam diretamente influências de teóricos e de movimentos sociais, os quais já
vinham discutindo o atendimento e direitos dos deficientes e traziam esta reflexão para
o Brasil. Nesta época o médico do Imperador, pai de uma menina cega, influenciado
pela obra de José Álvares de Azevedo, interveio junto ao monarca e assim foi criado o
Instituto de Meninos Cegos, em 1854. O Instituto dos Surdos-Mudos foi implementado
pelo educador francês Edouard Hüert, portador de surdez congênita. Apoiado pelo
Embaixador da França no Brasil, fora apresentado ao Imperador, o qual concedeu o aval
23
para construir o Instituto. Inaugurou-se, nesse movimento, a emergência de outras
instituições especializadas para atendimento de deficientes físicos, deficientes sensoriais
e doentes mentais, baseadas nos modelos asilares já existentes (SOARES, 1987).
Os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais foram pioneiros, na
fundação de hospitais especializados em atender deficientes visuais, auditivos, doentes
mentais e de escolas especializadas como: o Hospital do Juqueri, em 1858, em SP, o
Instituto Padre Chico, por volta de 1900, em SP, a Colônia Juliano Moreira, em 1911,
no RJ e o Centro Psiquiátrico Nacional, em 1929, também no RJ. (SOARES, 1987).
Diante do reconhecimento do deficiente e da deficiência, como uma doença que
merece tratamento em serviços especiais, delineou-se o ponto de partida para situar a
recuperação do deficiente em meio ao desenvolvimento das práticas higienistas,
subjacentes à educação em saúde em nosso meio.
24
1.2 Discurso higienista e institucionalização da Reabilitação
Segundo COSTA (1987), o Estado tinha função de civilizar e moralizar a
população visando assegurar o desenvolvimento das forças produtivas. Objetivando o
controle social, o discurso desenvolvido em torno da questão saúde no século XVIII era
essencialmente normatizador e regulador. Instrumentalizando a prática, a educação em
saúde, historicamente, se fazia marcada por um arraigado e disseminado discurso,
literalmente, higienista, segundo COSTA (1987). “A estratégia da educação em saúde
foi regulamentar, enquadrar, controlar todos os gestos, atitudes, comportamentos,
hábitos e discursos das classes subalternas e destruir ou apropriar-se dos modos e usos
do saber estranhos à sua visão do corpo, da saúde, da doença, enfim do ‘bom’ modo de
andar a vida” .
Na Europa, a prática educativa, no tocante à saúde, era feita recorrendo a
elaboração de almanaques, visando difundir cuidados com a higiene que deveriam ser
praticados por gestantes, pelas mães, no incentivo de cuidado das crianças, ao lado da
preocupação com o controle de endemias (CHIESA; VERÍSSIMO, 2001). As práticas
tinham como objetivo ampliar as informações para a população sobre as principais
doenças, enfatizando recomendações sobre comportamentos “certos” e “errados”,
relacionados à vivência das doenças e sua prevenção.
Na segunda metade do século XIX, o crescimento de cidades européias, em
virtude da industrialização, favoreceu a precarização das condições de trabalho, moradia
e nutrição das classes populares. Este cenário configurava uma ameaça às classes
dominantes, seja, pelo risco de rebelião dos populares, cuja aglomeração nos bairros
poderia precipitar a organização política, seja, pelas epidemias que já então eram
associadas às condições de vida, atingindo em seguida as classes dominantes. Assim,
justificavam-se as ações de disciplinamento das classes populares, com difusão de
regras de higiene e de condutas morais, e o exercício do controle social e sanitário
(COSTA, 1987).
25
No Brasil do século XIX, o discurso sanitário seguiu a tendência européia,
concentrando-se nas cidades e desenvolvendo-se em torno da moralidade e da
disciplinarização higiênica. O hospital, o hospício, a prisão e a escola despontaram
como espaços de atenção, de cuidado e de educação em saúde. Esta época foi
identificada por COSTA (1987) como sendo a de fortalecimento do saber técnico do
profissional, detentor exclusivo do poder da cura e do controle sobre a doença.
Com o desenvolvimento da visão técnico-científica as deficiências foram sendo
sistematicamente estudadas, analisadas sob o ponto de vista anatômico, funcional e
sintomático. Paralelamente ao desenvolvimento do processo de industrialização,
passou-se a se desenvolver uma visão mecanicista do mundo e conseqüentemente, do
homem que, tendo o corpo comparado à máquina, se tornava alvo de estudo a partir de
sua fragmentação. As ciências e suas produções tecnológicas passaram a buscar a
especialização, consubstanciada a normatização do corpo deficiente, no sentido de
utilizar capacidades remanescentes de forma a torná-lo útil, produtivo, ou seja, apto ao
trabalho.
Com base nestes desdobramentos, desde o fim do século XIX e início do século
XX, começaram a ser estruturadas as primeiras intervenções ampliadas do Estado,
voltadas para a saúde das classes populares, para combater as epidemias de varíola,
peste e febre amarela nos grandes centros urbanos, considerando os transtornos que
representavam para a economia agro exportadora brasileira (VASCONCELOS, 1999).
Neste contexto surgiram as primeiras práticas sistemáticas de educação em saúde
direcionada para as classes populares, caracterizadas pelo autoritarismo, a imposição de
normas e medidas de saneamento e urbanização, com apoio científico (SMEKE;
OLIVEIRA, 2001).
As atividades educativas tinham como objetivo mudar as práticas e atitudes dos
indivíduos, consideradas inadequadas pelos profissionais, supondo que garantiriam a
resolutividade dos problemas de saúde. Estas práticas eram organizadas com aulas ou
palestras, sem espaço para a manifestação do educando a menos que fossem a
apresentação de dúvidas pontuais a serem respondidas pelos profissionais. Estas
26
posturas traziam a idéia de que a doença se devia à falta de cuidado e desleixo da
população. O discurso higienista predominou no campo da educação em saúde durante
décadas, podendo ser encontrado, ainda hoje, como orientador de práticas educativas
(ALVES, 2005).
Vale dizer que após a I Guerra Mundial, diante do grande número de mutilados e
inválidos, (re) estruturam-se as práticas de reabilitação que pudessem proporcionar a
absorção da mão-de-obra deficiente.
Os programas para incapacitados físicos surgiram no Brasil na esteira do
movimento internacional de Reabilitação. Os órgãos responsáveis pela divulgação e
pela implantação dos serviços de reabilitação eram entidades governamentais e não
governamentais. Nesta última vertente, registraram-se a Organização das Nações
Unidas (ONU); a Organização Internacional do Trabalho e a Organização das Nações
Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura (UNESCO), entre outras, difundindo leis
protecionistas aos deficientes mentais e físicos e propondo a implantação de programas
especiais para essa população (MANGIA; NICÁCIO, 2001).
A grande maioria dos serviços de reabilitação no Brasil foi criada a partir da
iniciativa da sociedade civil, constituindo-se em instituições assistenciais, beneficentes e
filantrópicas. O setor público realizaria propostas pontuais e específicas (como os
Centros de Reabilitação Profissional), limitando a distribuição de subsídios a
instituições beneficentes e filantrópicas de tratamento e reabilitação do deficiente
(OLIVER, 2000).
Por volta dos anos 20, a organização da atenção aos trabalhadores daria origem
ao desenvolvimento da assistência previdenciária. Num contexto de grave crise
econômica mundial, tensões políticas e sociais internas, sob a crise da economia de
exportação, o Brasil buscava uma nova forma de inserção no mundo capitalista. Para
além das instituições especiais, a partir de 1930, a população começou a organizar-se e a
criar instituições clínicas, centros de reabilitação, revitalizando-se as práticas de
recuperação do deficiente nos serviços assistenciais – todas de natureza privada. Tal
postura, condizente com o discurso higienista prevalente, comportava, na perspectiva da
educação em saúde "a expressão ensino emendativo, de emendare (latim), que significa
27
corrigir falta, tirar defeito e traduziu o sentido diretor desse trabalho educativo em
muitas das providências da época” (JANNUZZI, 2004).
Diante do assistencialismo, que privilegiava ações curativas, com uma visão
biologicista do processo saúde doença, a reabilitação se apóiava no caráter
“emendativo”, no âmbito da educação em saúde vigente. Essa vertente, voltada para a
individualização da assistência, encontrou pleno desenvolvimento no período pós
Segunda Guerra Mundial, associada à profissionalização do campo específico de
conhecimentos e práticas.
28
1.3 Reabilitação na assistência curativa
A II Guerra, no contexto da reorganização econômica mundial, marcou um
período de reorganização dos serviços de reabilitação, com a criação de propostas mais
especializadas, que se fez acompanhar da estruturação das profissões correspondentes
como: fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, técnicos de prótese e órtese,
dentre outras.
Diante da necessidade de terapia ocupacional em hospitais civis e
militares, os primeiros serviços especializados surgiram dentro dos asilos e hospitais
gerais, que foram se transformando em entidades de reabilitação.
Enquanto o movimento da reabilitação se originava, principalmente entre os
países participantes da II Guerra, como conseqüência do grande número de
incapacitados físicos, no Brasil, a preocupação se voltava para os pacientes crônicos,
com deficiências congênitas, acidentados no trabalho, no trânsito ou doenças
ocupacionais.
Com a crise do modelo de substituição de importações na década de 50, o
sistema previdenciário paralelamente ao desenvolvimento industrial subsequente,
cresceu em volume de recursos, em aparato institucional, aumentando a demanda por
serviços médicos assistenciais, vinculados às instituições previdenciárias, que se
expandiram nos anos subseqüentes, em detrimento da saúde pública (COHN, 1996).
Nessa vertente proliferaram as primeiras instituições brasileiras especializadas no
atendimento de pessoas deficientes e doentes mentais (SOARES, 1987).
Em São Paulo foram criadas instituições como o Lar Escola São Francisco –
1943, voltado às crianças portadoras de deficiência física; a Fundação Para O Livro Do
Cego No Brasil – 1943, iniciando o ensino de crianças cegas; a Associação De Amigos
Da Criança Defeituosa (AACD) – 1950, destinada a tratar crianças portadoras de
seqüelas de poliomielite, paralisia cerebral ou defeitos congênitos (SOARES, 1987;
ROCHA, 1990).
29
No plano internacional, a Organização Mundial do Trabalho, colocava a
necessidade de ampliar a atenção ao deficiente ao lado da preocupação com a prestação
da assistência ao trabalhador. Nesse contexto, se inscreveu a renovação da questão da
assistência ao deficiente, lastreando o movimento de sua expansão de atenção ao
deficiente na rede assistencial.
Em 1960 foi criada a Lei Orgânica da Previdência Social que propunha a
universalização dos benefícios prestados pelos Institutos, de aposentadorias e pensões,
que passaria a ser assumida pela Previdência Social, com institucionalização do INPS.
Nesta condição se colocava a extensão da assistência médica individual aos seus
beneficiários, dentre os quais se incluiriam os deficientes. Na década de 60, tornou-se
marcante a promoção de mudanças no padrão da relação das sociedades com o
deficiente, estabelecendo-se uma ruptura com a institucionalização segregacionista, de
caráter asilar. O fracasso destes empreendimentos no sentido da incorporação do
deficiente, aliados aos elevados custos de sua manutenção, induziu a idéia de
desinstitucionalização dos pacientes (ARANHA, 1995). Nesse movimento havia que se
providenciar a possibilidade de atendimento dos deficientes na rede assistencial regular.
Tendo por base, entretanto a consideração da deficiência como um desvio da
normalidade, estas disposições propiciaram a restrição do atendimento, ao plano
curativo, envolvendo a avaliação, tratamento e encaminhamentos do paciente
(ARANHA, 1995).
Estas mudanças no modelo de assistência aos deficientes, tiveram seu correlato
no modelo de História Natural das doenças de LEAVELL e CLARK (1965). Visando as
ações preventivas, o modelo previa três níveis de prevenção. A prevenção primária
(primeiro nível) incorporava medidas de Promoção de Saúde e Proteção Específica. As
primeiras dirigidas à população em geral, não se restringiam a uma doença em especial.
Nessa categoria o autor (LEVELL e CLARK, 1965) destaca a educação e motivação
sanitária destinada a saúde em geral, envolvendo boa nutrição, o atendimento às
necessidades afetivas, educação sexual, orientação pré-nupcial e parental, boas
condições de moradia, trabalho e lazer. Já a proteção específica, destinada aos
indivíduos “sadios”, teria em vista estabelecer barreiras contra agentes do meio,
pressupondo, portanto, a consideração do risco de ocorrência de doenças específicas.
30
Na prática dos serviços, observava-se, isto sim, uma separação entre a atuação
curativa e preventiva, sendo privilegiada na atenção hospitalar o tratamento e a
reabilitação dos pacientes, enquanto que os centros de saúde se voltariam para a
educação para a proteção específica - e, secundariamente, à promoção de saúde, cujo
equacionamento
envolveria,
inclusive,
atuações
no
plano
das
políticas
(GONDENBERG, 1988). Reafirmaram-se, neste contexto, as práticas preventivistas ao
lado da ampliação das atividades relacionadas com a prática assistencialista da
reabilitação. A consideração da Promoção da Saúde acabaria por se interpor, juntamente
com o desenvolvimento da Reforma Sanitária, que tomava vulto na seqüência dos
acontecimentos.
As tensões que se seguiam ao governo militar, comportariam uma reorganização
da assistência, paralelamente ao processo de redemocratização do país. Em meio às
resistências ao centralismo do governo, se desenvolveu a disposição de romper com o
modelo autoritário. Destacou-se a propósito a Educação Popular em Saúde
(VASCONCELOS, 2001), priorizando a relação educativa direta com a população.
Rompendo com a verticalidade da relação entre profissional usuário buscava-se pelo
diálogo, a compreensão e explicação do saber popular. Como desdobramento dessa
vertente, nos serviços de saúde o usuário era reconhecido como um sujeito que tinha um
saber sobre o processo saúde-doença-cuidado, capaz de participar de uma situação
dialógica com o serviço de saúde e de desenvolver uma análise crítica sobre a realidade,
que o capacitaria para o aperfeiçoamento das estratégias de luta e enfrentamento
(VASCONCELOS, 2001). Tal reconhecimento seria potencializado em anos
subseqüentes com a institucionalização do SUS e da reconsideração correspondente do
conceito de Promoção de Saúde.
31
1.4 Reabilitação diante das novas perspectivas
No final da década de 70 e início dos anos 80, surgiram no Brasil movimentos
organizados pela luta dos direitos das minorias, entre eles o das crianças e adolescentes
e dos deficientes (BRASIL, 1993). Considerado o Ano Internacional do Deficiente, em
1981, foi aprovado na Assembléia Geral das Nações Unidas, o Programa de Ação
Mundial para os deficientes, observando-se os avanços no tocante às regulamentações
sobre os direitos e a assistência a esta população.
Em meados dos anos 70, o desencadeamento da Reforma Sanitária, envolvia
críticas à medicina preventiva e comunitária, ao lado da busca de outro modelo
explicativo do processo saúde-doença. Ao paradigma da multicausalidade se
acrescentava a consideração da dimensão social da doença. Preconizando a atenção às
demandas da população o novo modelo se pautava pela constituição de um sistema
integrado, ampliando o acesso em todos os níveis de atenção (HEIMANN;
MENDONÇA, 2005). Estas proposições se concretizaram com a institucionalização do
SUS, a partir da Constituição de 1988.
Retrocedendo no tempo, junto com a expansão da cobertura somada à crise
internacional, que ocorreu nos países centrais, desde os anos 70, se instalou um período
de recessão. À entrada dos anos 80, diante das medidas de contenção de despesas e a
compreensão dos gastos com a assistência médica, foram criadas as AIS (Ações
Integradas de Saúde) e posteriormente os SUDS que anunciariam as propostas
contempladas no SUS - acompanhando a luta pela democratização e melhoria dos
direitos sociais e qualidade de vida segundo (CONH, 1996); (HEIMANN E
MENDONÇA, 2005).
Na contramão da concepção restrita do biologicismo, foram criticadas as práticas
pedagógicas persuasivas, a transmissão verticalizada de conhecimentos, refletindo no
autoritarismo entre o educador e o educando. Assim como a negação da subjetividade
no processo educativo começou a ser questionada. Passou a existir uma preocupação
32
com a autonomia dos sujeitos, ou seja, com a constituição de sujeitos sociais capazes de
reivindicar seus interesses (SMEKE; OLIVEIRA, 2001).
Nessa vertente a Promoção de Saúde, foi ressignificada. LALONDE (1974)
afirmava que, até aquele momento, a maioria dos esforços da sociedade para melhorar a
saúde, e a maior parte dos gastos em saúde, se concentraram na organização do cuidado
médico. Destacava-se a atenção integral à saúde e, tendo como eixo principal o apoio
aos indivíduos e aos grupos sociais para que assumissem mais o controle de sua vida e
saúde (VASCONCELOS, 1999). A Conferência Internacional Sobre Cuidados
Primários de Saúde em 1978, em Alma –focalizaria a primeira aproximação à Atenção
Primária (HEIMANN; MENDONÇA, 2005).
O eixo da assistência possibilitaria maior integração entre ações preventivas e
curativas tornando mais permanente a discussão sobre hierarquização e territorialização
a assistência à saúde - os primórdios do Sistema Único de Saúde (VASCONCELOS,
1999). Nesse sentido, o SUS se norteou pela Universalidade, Eqüidade e
Integralidade1(BRASIL, 1990).
A partir da Reforma Sanitária e do modelo assistencial definido pela constituição
de 1988 - o Sistema Único de Saúde (SUS), o Estado direcionou as ações
governamentais no sentido de criar uma rede de serviços de saúde, com maior
abrangência e com propostas mais integradas à vida e às necessidades da comunidade,
de forma que fosse possível garantir o acesso de toda população a estes serviços.
1
A Universalidade envolve a garantia de atenção por parte do sistema, a todo e qualquer cidadão. O
individuo tem direito de acesso a todos os serviços públicos de saúde. Saúde é direito de cidadania e
dever do Governo: municipal, estadual e federal.
A Eqüidade pressupõe assegurar ações e serviços de todos os níveis de acordo com a complexidade de
cada caso.Todo o cidadão é igual perante o SUS e deve ser atendido conforme suas necessidades.
A Integralidade postula que o reconhecimento nas práticas dos serviços que o individuo é um todo
indivisível e integrante de uma comunidade, as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde
formam também um todo indivisível e não podem ser compartimentalizadas, as unidades prestadoras de
serviços, com seus diversos graus de complexidade, formam também um todo indivisível configurando
um sistema capaz de prestar assistência integral.
33
Este direcionamento deveria evitar a segregação dos deficientes ou de doenças
crônicas em serviços fechados e de alto custo, por oferecer o atendimento às suas
necessidades em locais próximos a sua residência e integrados à comunidade,
possibilitando a manutenção dos vínculos familiares.
No novo texto da Constituição
Federal, foi possibilitada a criação de vários Conselhos para se pensar, propor e lutar
pelos direitos dos deficientes, agora a representação de deficientes.
Uma das ações governamentais neste sentido foi a implantação de uma rede de
serviços públicos de Saúde Mental com diversos níveis de complexidade, constituída de
atendimentos em Unidades Básicas de Saúde (UBS), assim como a criação Centros de
Convivência e Cooperativa (CECCO) que passariam a oferecer diversas atividades em
locais públicos, com objetivo de possibilitar a convivência dos diversos segmentos
populacionais marginalizados, como deficientes, doentes mentais, idosos e moradores
de rua, com as demais pessoas da região - entre outras medidas visando a redução das
internações em Hospitais Psiquiátricos.
Outra conquista importante da época foi a elaboração do Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA) que gerou a criação de órgãos responsáveis por fazer cumprir as
regras de atenção a esta população, tendo também a diminuição de internações como um
dos objetivos principais.
Em relação à questão da deficiência foram redigidos diversos documentos sobre
a Atenção à Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência no Sistema Único de Saúde, nas
três esferas de governo (federal, estadual e municipal) que passaram a constituir
referências aos direitos desta população. As diretrizes para a assistência aos deficientes
redigidas pelo Ministério da Saúde e pelas Secretarias Estadual e Municipal de Saúde,
subsidiando a implantação de uma Rede de Serviços de Atenção à Saúde dos
Deficientes da qual fariam parte, além das já mencionadas Unidades Básicas de Saúde e
Centros de Convivência e Cooperativa, a instalação de Ambulatórios de Especialidades,
Centros de Reabilitação, Centros de Referência em Saúde do Trabalhador, Hospitais
Gerais, Hospitais de Retaguarda, entre outros (BRASIL, 1993).
34
Nesse movimento, a desinstitucionalização ganharia nova dimensão, não só no
sentido da incorporação da minoria, mas ampliando a atenção ao deficiente no âmbito
da comunidade voltado para a constituição da autonomia.
Na década de 1990, o Ministério da Saúde reuniu alguns coordenadores, de
experiência, na atenção primária à saúde centrada nas dimensões da comunidade e da
família para discutir um projeto nacional de reorientação dos serviços básicos de saúde,
sendo então lançado o Programa de Saúde da Família. Contribuindo para a construção e
consolidação do SUS, a estratégia do PSF traz, no centro de sua proposta, a expectativa
relativa à reorientação do modelo assistencial a partir da atenção básica (BRASIL,
1997).
“Ao contrário do modelo tradicional, centrado na doença e no hospital, o PSF
priorizava ações de proteção e promoção da saúde dos indivíduos e da família, tanto
adultos, quanto crianças, sadios ou doentes de forma integral e continua” (BRASIL,
1994). Este Programa deslocava, assim, a proposta de medicina familiar que tinha a
preocupação centrada no médico para uma preocupação com toda a equipe de saúde
envolvida com a atenção no nível primário – preconizada pela reunião de Alma Ata,
realizada em 1978 que propunha Saúde para Todos no Ano 2000.
Neste contexto a questão da Promoção de Saúde passaria a ser requalificada
como perspectiva da implantação da atenção renovada conforme preconizada pelo PSF.
Esta proposta foi lastreada pela I Conferência Internacional em Promoção de Saúde, em
1996, em Ottawa no Canadá, patrocinada pela OMS, Ministério da Saúde e Bem Estar
do Canadá e Associação Canadense de Saúde Pública, deu origem a Carta de Ottawa
para a Promoção da Saúde. Marco fundamental na história da Saúde Pública, a carta
reconheceu como "pré-requisitos fundamentais para a saúde: a paz, a educação, a
habitação, o poder aquisitivo, um ecossistema estável, e conservação dos recursos
naturais e a equidade" (BRASIL, 1996). Neste contexto a Promoção da Saúde foi
conceituada como "o processo de capacitação na comunidade para atuar na melhoria da
sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste
processo". A carta de Ottawa propunha cinco campos de ação: elaboração e
35
implementação de “políticas públicas saudáveis”; criação de “ambientes favoráveis à
saúde”; reforço da “ação comunitária”; desenvolvimento de “habilidades pessoais” e
“reorientação dos sistemas de Saúde”.
Quando referia o “desenvolvimento de habilidades e atitudes pessoais”, segundo
BUSS (2003) esse componente resgatava a dimensão de educação em saúde, avançando
para a idéia de empowerment, no plano individual, ou seja, no processo de capacitação e
de consciência política.
A segunda Conferência Internacional de Saúde (Adelaide, 1988), tinha como
tema principal as políticas públicas saudáveis, tendo em vista avaliar o impacto destas
políticas. Segundo BUSS (2003) a terceira Conferência Internacional (Sundsval, 1991)
foi a primeira a focar a dependência entre saúde e ambiente em todos os seus aspectos, e
insistindo na elaboração de propostas de ação capazes de viabilizar a criação de
ambientes favoráveis.
A Conferência de Jakarta (1997), por sua vez, reafirmava a posição central da
participação popular e do empowerment, realçando, para isso, a importância do acesso à
educação e à informação.
A partir destas conferências, a promoção da saúde passou a ser cada vez mais
considerada nas políticas de saúde de diversos países. Na América Latina, a OPAS
colocou-a como prioridade programática, definindo-a como "a soma das ações da
população, dos serviços de saúde, das autoridades sanitárias e de outros setores sociais e
produtivos, dirigidas para o desenvolvimento de melhores condições de saúde
individual e coletiva" (MENDES, 1996, p.246-247).
De acordo com BUSS (2003, p.34-35) a “promoção de saúde apresenta-se como
uma estratégia de mediação entre as pessoas e seu ambiente, combinando escolhas
individuais com responsabilidade social pela saúde (as chamadas políticas saudáveis)”.
Assim, as estratégias de promoção de saúde (entre elas as atividades educativas) se
tornavam integradas e intersetoriais, bem como supunham uma efetiva participação da
população desde sua formulação até a intervenção.
36
BUSS (2003) citando Fernández e Regules referia que a promoção de saúde “é
uma estratégia complementar, não de substituição das demais estratégias em saúde
pública, mas (e não há contradição) por sua vez integral, por afetar a todos os elementos
que até agora vinham intervindo, aportando novos instrumentos e reorientando suas
finalidades” (p.25).
Para CZERESNIA (2003) a idéia de Promoção de Saúde envolvia
O fortalecimento da capacidade individual e coletiva para lidar com a
multiciplicidade dos condicionantes da saúde. Promoção, nesse sentido, vai
além de uma aplicação técnica e normativa, aceitando-se que não basta
conhecer o funcionamento das doenças e encontrar mecanismos para o seu
controle. Essa concepção diz respeito ao fortalecimento da saúde por meio da
construção de capacidade de escolha, bem como a utilização do
conhecimento com o discernimento de atentar para as diferenças e
singularidade dos acontecimentos. (p.47-48)
De acordo com BUSS (2003)
Entre os muitos desafios colocados para aqueles que demonstram interesse
ou têm experiência profissional no campo da promoção da saúde esta o
aperfeiçoamento do conceito, método e práticas desta área, que tem sido
avaliada de forma promissora por todos aqueles que, insatisfeitos com os
modelos assistenciais vigentes, buscam alternativas mais eficazes para
estender a vida com qualidade e assim contribuir com a plena realização do
potencial de saúde de indivíduos e comunidade em todo mundo.(p.37).
Nos documentos elaborados pelo Ministério da Saúde, a promoção da saúde
aparecia sempre em destaque, como parte da lista de elementos e princípios definidores
do Programa de Saúde da Família. Com efeito, se a lógica do PSF era a da
responsabilização pela saúde de uma determinada população, o serviço deveria
necessariamente, superar as preocupações unicamente curativas do modelo tradicional
para buscar a promoção da saúde e da qualidade de vida de sua clientela (MATTOS,
2001).
A perspectiva de que as políticas de saúde se materializavam na “ponta” do
sistema, ou seja, mediante ação de atores sociais e suas práticas no cotidiano dos
serviços (PINHEIRO; LUZ, 2003), foi relevante para a reflexão crítica sobre os
processos de trabalho em saúde, visando à produção de novos conhecimentos e
desenvolvimento de novas práticas de saúde consoantes com os princípios e diretrizes
37
do Sistema Único de Saúde (SUS). Neste sentido se inscreve a indagação sobre as
condições de implantação do PSF levando em conta a sua instalação em São Paulo,
particularmente no tocante à reabilitação, enquanto medida da qualidade da
incorporação das diretrizes relativas à Promoção de Saúde – na qual se inscrevem as
propostas educativas.
38
1.5 Reabilitação: Promoção de Saúde e práticas educativas
O PSF, em São Paulo, se instalou em 1996, integrando o projeto QUALIS I2
(Qualidade Integral a Saúde) a partir de um convênio entre o Ministério da Saúde,
Secretaria Estadual de Saúde e a Casa de Saúde Santa Marcelina. Em 2002, as unidades
estaduais do Projeto Qualis, foram absorvidas pela prefeitura.
Atualmente o PSF conta com 28 unidades de Saúde da Família, localizadas na
região leste do Município de São Paulo, com 95 equipes responsáveis pelo atendimento
de, aproximadamente, 115 mil famílias ou 336 mil pessoas. A atenção à família no
atendimento básico de saúde é efetuada por quatro equipes: a da Família, da Saúde
Bucal, da Saúde Mental e, mais recentemente, da Saúde do Deficiente/ Reabilitação.
As atribuições dessa equipes3 são amplas. Elas visam proporcionar uma atenção
integral às famílias que estão sob sua responsabilidade, implicando identificar os
problemas de saúde prevalentes, desenvolver processos educativos em saúde, dar ênfase
às ações de prevenção e promoção da saúde, incentivar ações comunitárias
intersetoriais, bem como fomentar a participação da população local na solução dos seus
problemas e no exercício do controle social (BRASIL, 2000)
A Equipe de Saúde do Deficiente/Reabilitação tem como objetivo estabelecer no
Programa de Saúde da Família uma política e uma cultura de defesa dos direitos dos
deficientes, com o objetivo de favorecer o desmonte dos processos de exclusão social
desta população, bem como constituir uma intervenção que articule prevenção às
deficiências, reabilitação e educação, envolvendo a mobilização de órgãos
governamentais e não-governamentais.
2
3
Outros QUALIS (II,III,IV) também estabeleceram convênios.
Cada equipe de saúde é composto por um médico generalista, um enfermeiro, um auxiliar de
enfermagem além de cinco ou seis agentes comunitários de saúde. Uma equipe atende entre 1000 a
1200 famílias. Esta equipe possui potencial para identificar problemas coletivos, que não são
exclusiva do setor saúde, mas que são realidade na saúde da comunidade.Nesse sentido deve ir a
busca de parcerias com outros setores, como educação, ação social, meio ambiente, trabalho/renda e
outros.
39
Por estar atrelada ao PSF, a Equipe de Saúde do Deficiente/ Reabilitação4
estabelece compromisso com a integralidade da assistência oferecida (atendendo desta
forma toda a demanda das UBS, não só deficientes5). As ações dos profissionais desta
equipe podem ocorrer nas residências dos usuários (geralmente aqueles com
dificuldades de acesso ao serviço de saúde por meios próprios), na comunidade (em
sociedades de bairro, escolas, clubes e igrejas), nas Unidades Básicas de Saúde da
Família e no próprio ambulatório de referência. As ações estão voltadas aos problemas
detectados pelas Equipes de Saúde da Família, sendo as prioridades definidas em
conjunto com a Equipe de Família.
O serviço de reabilitação na Coordenadoria Leste6 passa por reestruturação desde
2005, apoiado pela Área Temática Saúde da Pessoa com Deficiência/ Cogest-SMS
(Secretária Municipal da Saúde), tendo como objetivos articular políticas, diretrizes e
estratégias para o desenvolvimento da atenção integral a saúde da população com
deficiência no Município de São Paulo e implementar ações de promoção de saúde,
prevenção e diagnóstico continuado das deficiências e reabilitação da pessoa com
deficiência.
______________________________________________________________________
4
A Equipe de saúde do deficiente/ reabilitação teve início em 2000 através de uma parceria do curso de
Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo com a Secretaria Estadual de Saúde. Posteriormente o
Projeto piloto foi ampliado com a criação de um grupo técnico de trabalho com membros da Secretaria
Estadual da Saúde, Fundação Zerbini, Casa de Saúde Santa Marcelina, Universidade de São Paulo – curso
de Terapia Ocupacional, PUC-SP – curso de Fonoaudiologia e APAE-SP, que teve como objetivo
estender a proposta para a região Leste da Cidade de São Paulo, PSF/Casa de Saúde Santa Marcelina.
5
Acredito que este não seja o melhor nome para equipe, pois os profissionais não atendem
exclusivamente deficientes.
6
A Coordenadoria Leste conta com a equipe de saúde do deficiente/reabilitação (parceria com o Santa
Marcelina) nas supervisões de Ermelino Matarazzo, São Miguel, Itaim Paulista, Guainazes, Penha,
Itaquera, Cidade Tiradentes, São Mateus. Totalizando 8 supervisões, 22 Unidades Básicas de
Saúde/Programa de Saúde da Família.
40
Nesta organização a equipe7 realiza as seguintes atividades: atendimentos
individuais, atendimentos em grupo, atendimento e visita domiciliares, adaptação e
confecção de objetos para atividades da vida diária e prática, confecção e adequação de
órteses, reuniões com as equipes de família, bucal e mental, organização e planejamento
das atividades, divulgação do projeto, trabalho administrativo (ficha de produção,
prontuários, entre outros), atividades de inclusão e atividades educativas em grupo.
A atenção básica é um cenário privilegiado para o desenvolvimento da Educação em
Saúde, uma vez que é um dos possíveis recursos pelo qual o conhecimento científico
atinge a vida cotidiana das pessoas por intermédio dos profissionais de saúde (ALVES,
2005). A propósito, a portaria n.2.023/GM de 2004 definiu como uma das
responsabilidades dos municípios e do Distrito Federal na gestão e execução da atenção
básica a saúde o “desenvolvimento de ações educativas que possam interferir no
processo saúde-doença da população e na qualidade de vida” (Brasil, 2004). Segundo
VASCONCELOS (1999), a Secretaria Municipal da Saúde8 tem o discurso de mudança
da prática biologizante, porém, existe forte cobrança de maior produtividade de
atendimentos individuais, limitando disponibilidades para as atividades educativas. O
repasse financeiro do Ministério da saúde aos municípios depende, essencialmente, do
volume de atendimentos individuais prestados.
Diante da complexidade do quadro de atribuições da equipe de reabilitação, no
contexto de sua realização, uma das questões que se coloca é a da fidelidade do
programa para com seus princípios básicos, entre eles, o da promoção da saúde. A
propósito, ao lado das condições institucionais do exercício das práticas educativas que
no âmbito da implantação do PSF, coloca-se a preocupação com a capacitação
profissional.
7
A Equipe, atualmente conta com 29 profissionais de saúde na Parceria com a Casa de Saúde Santa
Marcelina são 10 fisioterapeutas, cinco terapeutas ocupacionais e cinco fonoaudiólogos. O serviço é
organizado a partir dos profissionais distribuídos em duplas ou trios que são referencia para 8 a 10
Equipes de Família.
8
A SMS sugere diretrizes para os profissionais da reabilitação que estabelece parâmetros: 60% da carga
horária em atendimento terapêutico, 10% em atividade de promoção e proteção de saúde.
41
A Educação em saúde é função de todos os profissionais que atuam no PSF
(BRASIL, 2004) inclusive dos que fazem parte da Equipe de Saúde do
Deficiente/Reabilitação. Espera-se que elas estejam capacitadas para propiciar a
assistência integral e contínua da comunidade assistida, em consonância com os
referenciais teóricos e metodológicos subjacentes às transformações da prática
educativa. Os referenciais devem propiciar a construção de um projeto educativo que
responda às bases conceituais e objetivas da assistência: integralidade, tratamento do
indivíduo como sujeito integrado a família, ao domicílio e a comunidade e o aumento da
capacidade resolutiva da rede básica de atenção e a vinculação dos profissionais e
serviços de saúde com a comunidade, tendo como perspectiva promover a ação
intersetorial.
A prática educativa no PSF, porém, não conta necessariamente com um espaço
restrito e definido para o seu desenvolvimento. Antes disso, adverte-se os profissionais
que devem oportunizar seus contatos com os usuários, ou seja, educar para a saúde
implica ir além da assistência curativa, seja em espaços educacionais, a exemplo dos
grupos educativos, ou espaços informais como a consulta médica na residência das
famílias por ocasião da visita domiciliar, expressando a assimilação do princípio da
integralidade.
Toda ação em saúde é uma ação educativa. O processo de promoção-prevençãocura-reabilitação é também um processo pedagógico, no sentido de que tanto
profissional de saúde quanto cliente-usuário aprende e ensina. Estes conceitos podem
mudar efetivamente a forma e os resultados do trabalho em saúde, transformando
pacientes em cidadãos co-participantes de um processo de construção da saúde
L’ABATTE (1994). Mesmo considerando que toda ação em saúde é uma ação
educativa, o estudo focaliza uma das formas de ação educativa em saúde: as atividades
educativas grupais, no âmbito da promoção de saúde. Nesse eixo se circunscreve a
indagação sobre as condições de seu exercício entre profissionais da reabilitação,
ressaltando o caráter inovador do programa.
Nas atividades educativas grupais o profissional deve considerar que nas classes
populares há uma diversidade de grupos e para otimizar uma ação educativa é
42
necessário planejar, reconhecendo esta diversidade, ter escuta, observar e desenvolver
uma interação com o outro. Isto implica tanto numa expertise técnica, como numa
disposição teórico-metodológica frente ao processo de ensino - aprendizagem, coerente
com as diretrizes de implantação do PSF.
Do ponto de vista instrumental, o exercício dessas práticas coloca em questão a
capacitação para a sua realização, envolvendo um domínio do planejamento enquanto
sistemática de organização. e operacionalização. Segundo PADILHA (2002):
Planejar, em sentido amplo é um processo que visa dar respostas a um
problema estabelecendo fins e meios que apontem para a sua superação, de
modo a atingir objetivos antes previstos, pensando e prevendo
necessariamente o futuro, mas sem desconsiderar as condições do presente e
as experiências do passado, levando em conta os contextos e pressupostos
filosóficos, cultural, econômico e político de quem planeja e com que se
planeja (p. 63)
Para além do planejamento normativo, ROVERE (1993) destaca a variante do
planejamento participativo que busca, em última instância, o comprometimento dos
vários atores sociais com um determinado projeto institucional.
Ao lado dessas
variantes, ressalta-se que o planejamento implica, sobretudo, no exercício de uma
racionalidade à busca de maior eficiência/eficácia. Isto pressupõe o entendimento do
planejamento como um processo capaz de incorporar a avaliação como um feedback
necessário à reavaliação constante (VASCONCELOS, 1999; PADILHA, 2002;
GOLDENBERG, 2005). Isso equivale dizer que a avaliação deve subsidiar todo o
processo, fundamentando novas decisões, direcionando os destinos do planejamento e
reorientando-o quando necessário.
Concretamente, ”algumas atividades educativas e comunitárias isoladas
começam e terminam sem desdobramentos, o que pode fortalecer a visão do
profissional de que as práticas de educação em saúde são enfeites na rotina de
atendimentos, com aparência progressista, mas sem resultados significativos”
(VASCONCELOS,1000).
43
O que parece existir, na verdade, é uma grande dificuldade de transpor para a prática
o discurso da Promoção e pouca valorização de estudos e experiências nesta área
(ALBUQUERQUE, 2006).
Num outro plano, CHIESA E VERÍSSIMO (2001) afirmam que a organização
das ações educativas demonstra fragilidade na operacionalização, devido à falta de
discussão, sobre referenciais teóricos adequados para estruturação nos modelos
assistenciais adotados. “Há no educar muito mais do que atitudes e técnicas educativas
ou conteúdos importantes que devem ser aprendidos. Tem que existir o compromisso
pessoal com a educação” (FREIRE, 1979). Relativisando a dimensão da questão, não se
pode desconsiderar o contexto social no qual se inscrevem as práticas educativas
grupais. De acordo com ALVES (2005), “o desenvolvimento de promoção de saúde e,
conseqüentemente, das ações educativas, precisam ter um papel de destaque, que
funcione como um eixo condutor do processo de trabalho e da prática dos profissionais
do PSF. Entretanto, a visão assistencial ainda predomina nos documentos oficiais sobre
o PSF.
Prevalece, assim, as condições para o exercício do modelo tradicional de ensino, sob
o qual se inscrevem as práticas higienistas - fundamentadas no referencial biologicista
do processo saúde-doença, que valoriza a intervenção curativa (CHIESA E
VERÍSSIMO, 2003). Privilegiando o caráter normativo as práticas educativas utilizam
informações verticalizadas que dizem quais os comportamentos a serem adotados para a
manutenção da saúde. Os usuários são tomados como indivíduos carentes de
informação em saúde e a relação estabelecida entre profissionais e usuários é
assimétrica, um tem o poder do saber técnico cientifico, enquanto o outro necessita ser
informado. A comunicação tem um caráter transmissivo, na qual o profissional assume
uma posição paternalista, explicitando ao outro hábitos e comportamentos saudáveis, o
que fazer e como fazer para manter a saúde. Pressupõe-se que a partir da informação
obtida os usuários serão capazes de tomar decisões para a prevenção de doenças e
agravos, assim como assumir novos hábitos e condutas.
Na perspectiva das estratégias, o profissional dá uma aula (ou palestra) para a
população usuária, que na maioria das vezes só escuta. As informações são repassadas
44
de forma prescritiva, como se estivesse explicando uma receita em público, sem
considerar o conhecimento pré-existente do usuário ou mesmo no seu contexto social,
emocional e cultural. Muitas vezes o usuário é culpabilizado por sua própria doença ou
seu agravamento. Mas, a principal crítica a este modelo, por referência às disposições
do PSF, é a não consideração dos determinantes psicossociais e culturais dos
comportamentos de saúde. Ao tomar o usuário como objeto das práticas educativas e
carentes de um saber sobre a saúde perde-se de vista que os comportamentos são
orientados por crenças, valores, representações sobre o processo saúde-doença (ALVES,
2005). Nesse sentido se impõe pensar o modelo dialógico como postura alternativa,
conseqüente com a concepção de promoção de saúde no âmbito do PSF.
No modelo dialógico as práticas educativas são sensíveis às necessidades da
população; trabalha-se com a perspectiva de sujeitos das práticas educativas. Neste
modelo o sujeito é reconhecido como portador de um saber que, embora diverso do
saber técnico científico, não é deslegitimado pelos serviços. (ALVES, 2005)
O objetivo da educação dialógica não é informar para a saúde, mas de transformar
os saberes existentes, visando o desenvolvimento da autonomia e da responsabilidade
dos indivíduos no cuidado com a saúde. A estratégia valorizada por este modelo é a
comunicação dialógica, que visa a construção de um saber sobre o processo saúdedoença-cuidado que capacite os indivíduos a decidirem quais as estratégias mais
apropriadas para promover, manter e recuperar a saúde (CHIESA E VERÍSSIMO,
2003).
Na comunicação dialógica valoriza-se o espaço das relações interpessoais
estabelecidas nos serviços de saúde, como contextos de práticas de saúde. O respeito ao
saber previamente existente na cultura, a idéia de diálogo, de construção coletiva do
conhecimento e de ação participativa na busca de um cidadão saudável e feliz, com
autonomia, deveriam representar uma premissa da promoção de saúde – que está muito
longe de ser efetivada nos sistema de saúde, como afirma ALBUQUERQUE (2006).
Diante da matriz tecnicista do ensino profissional - que se aplica, em particular, para
os integrantes da equipe de reabilitação - GUEDES (1990) considera que a formação
45
dos profissionais na área tem ênfase curativa. O autor destaca que os cursos de
graduação habilitam os alunos para a atuação no nível terciário.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (1996), objeto de longa
discussão nos anos 90, buscou assegurar maior flexibilidade à organização dos cursos
de graduação. Priorizando a formação generalista, a nova proposta destaca a
necessidade de formar profissionais da saúde humanistas e técnicos competentes, que
possuam conhecimentos, habilidades psicomotoras, atitudes, comportamentos éticos e
compromisso social, tendo em vista responder às demandas sociais de forma condizente
com a proposta de implantação do SUS. A propósito, as Diretrizes Curriculares (2001)
especificam competências e habilidades relacionadas, na área da saúde, às ações de
prevenção, promoção e reabilitação da saúde, tanto em nível individual quanto coletivo,
assim como a capacidade de aprender continuamente; aprender e assumir
responsabilidades com sua própria educação e com o treinamento das futuras gerações
de profissionais.
Diante da concomitância, entre a instalação da Lei e do PSF em São Paulo, não
se pode pretender que os profissionais envolvidos no Programa de Reabilitação deixem
de sentir o peso da formação convencional. Nesse sentido o incentivo à participação
comunitária e desenvolvimento do controle social sobre os serviços de saúde, também,
colocam em xeque as tradicionais relações sociais distanciadas, sem envolvimento
emocional, tecnicistas e autoritárias, tão presentes nos serviços de saúde
(VASCONCELOS, 2001).
Sendo notório o desencontro entre a formação e os requerimentos profissionais
as práticas no âmbito do PSF ressalva-se que nas situações de implantação da lei, não
basta a formação dos profissionais para o exercício da medicina de família, na
perspectiva em que foi implantada em países europeus, no Canadá ou em Cuba;
provavelmente a formação não se esgotará em nível de graduação, mesmo que as
instituições de ensino passem por grandes transformações para formar profissionais
“generalistas”. Outros conhecimentos, competências e habilidades provavelmente
precisarão ser desenvolvidos após a graduação, em nível de especialização
(MARSIGLIA, 2004).
46
Vale dizer que o documento da Secretaria de Estado da Saúde, 1997, sobre a
estratégia do Programa de Saúde da Família refere a necessidade contínua de
capacitação, tendo em vista a adequação da atuação dos profissionais com a nova
proposta. Nesse sentido se inscreve a criação dos Pólos de Capacitação, Formação e
Educação Permanente para o pessoal de Saúde da Família ao lado de cursos como o
Aprender SUS e VerSUS (ALMEIDA,2003). A propósito, é necessário reconhecer os
desafios de realizar as práticas educativas dialógicas no cotidiano dos serviços de saúde.
Para os profissionais de saúde, o saber técnico acumulado ao longo da formação
é um instrumento de trabalho; é a partir dele que as decisões são tomadas no exercício
da prática. Reconhecer-se portador de um saber inacabado, implica em assumir um
confronto, na maioria das vezes angustiante, em vista das próprias limitações,
impotências e frustrações (VASCONCELOS, 2001) – o que impõe pensar no
requerimento percebido pelos profissionais, no sentido da realização de cursos de
capacitação / atualização nesse campo de atividades.
Em vista da complexidade do quadro subjacente às práticas educativas grupais,
tanto de ordem instrumental quanto de ordem teórico metodológica, coloca-se a
disposição de focalizar as condições de seu exercício junto à equipe de reabilitação, no
âmbito das unidades básicas de saúde, tendo por suposto os requerimentos das diretrizes
do PSF quanto á Promoção de Saúde.
47
2 Objetivos
2.1 Objetivo Geral
Caracterizar as práticas educativas grupais dos Profissionais da Equipe de Saúde do
Deficiente/Reabilitação (Fonoaudiólogos, Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais)
no Programa de Saúde da Família, tendo em vista subsidiar proposta de aprimoramento.
2.2 Objetivos Específicos
Identificar o perfil dos profissionais de reabilitação no Programa de Saúde da
Família e o exercício da prática educativa grupal.
Qualificar as práticas grupais de educação em saúde dos profissionais de
Reabilitação, apontando os limites e potencialidades associadas ao seu exercício.
48
3 Metodologia
3.1 Delineamento do estudo
Considerando que as práticas na saúde guardam relação com as políticas
vigentes e os cenários institucionais que circunscrevem a atuação profissional, de um
lado, com a capacitação desses atores, de outro lado, nos detivemos, para efeito do
presente trabalho, na consideração desta última vertente da questão. Focalizando a
perspectiva dos sujeitos envolvidos com a reabilitação no PSF, privilegiamos a
abordagem qualitativa que, segundo Minayo, implica “considerar sujeito de estudo:
gente, em determinada condição social, pertencente a grupo social ou classe com suas
crenças, valores e significados” (MINAYO, 1998, p.22).
Diante dessa disposição, optamos pela realização de um levantamento junto aos
profissionais que atuam na Equipe de Saúde do Deficiente/Reabilitação na
Coordenadoria de Saúde Leste/ Santa Marcelina. Atualmente compõem este quadro: 5
Fonoaudiólogos, 10 Fisioterapeutas e 4 Terapeutas Ocupacionais
O estudo comportou três movimentos. Num primeiro momento, focalizamos o
perfil profissional e sua formação no tocante à atividade educativa, sendo caracterizada
uma prática educativa grupal recente. Num segundo movimento, buscamos identificar,
junto aos profissionais de reabilitação, as concepções e modelos de educação que
orientam as práticas educativas. Finalmente, no terceiro movimento, buscando subsidiar
uma proposta de capacitação, focalizamos os limites e potencialidades do exercício das
práticas educativas no âmbito do Programa de Saúde da Família (PSF).
3.2 Perfil profissional e práticas educacionais
A incursão no primeiro movimento de investigação levou em conta informações
colhidas a partir da aplicação de um questionário que consta do ANEXO 1.
49
Dos dezoito profissionais da equipe de reabilitação, das unidades básicas/PSF,
coordenadas pela Casa de Saúde Santa Marcelina, um se recusou a participar do estudo
e cinco não responderam ao questionário. Totalizamos assim o estudo com informações
de doze profissionais – tendo sido mantida a representação das três categorias
profissionais (7 Fisioterapeutas, 3 Fonoaudiólogos e 2 Terapeutas Ocupacionais).
Entregue aos profissionais com antecedência, os questionários, devidamente
preenchidos, foram devolvidos posteriormente no momento da entrevista.
Num primeiro plano o questionário contemplou:
Identificação do perfil profissional (sexo, idade e tempo de formação)
Formação após a graduação.
Trabalho (tempo de trabalho, supervisões que atuavam e trabalho na UBS)
No tocante à identificação dos profissionais, consideramos a caracterização da
população do estudo quanto à idade a partir das seguintes grupos etários: 20 a 30 anos,
30 a 40 e 40 a 50 anos de idade. Em relação ao sexo, os dados foram classificados em
masculino ou feminino.
No caso de tempo de formação, consideramos as seguintes categorias: 3 a 5
anos, 6 a 8 anos, 9 a 11 e mais de 11 anos.
Na seqüência, as respostas às questões sobre a formação no âmbito da pósgraduação foram classificadas segundo os seguintes níveis: residência, aperfeiçoamento,
especialização, mestrado, doutorado, outros e nenhum. De forma complementar os
profissionais foram inquiridos sobre a realização de cursos da capacitação para atuar no
PSF, ressaltando-se, em caso positivo, o registro da abordagem do tema atividade
educativa grupal (categorizada sim e não).
Em relação ao trabalho atual dos profissionais, foi solicitado há quanto tempo
atuavam no PSF, utilizando-se para classificação das respostas as categorias: de 0 a 2
50
anos, de 2 a 4 anos, 4 a 6 anos ou mais. Além disso, os profissionais foram solicitados a
informar o número de participação em supervisões (variando de uma a três) e sobre o
número de Unidades Básicas de Saúde nas quais exerciam suas funções.
Num segundo plano, o questionário focalizou a atividade educativa de referência
– a última desenvolvida até a data de realização do questionário. Nesse sentido, foram
contemplados os eixos de informações que se seguem:
Organização da prática (população alvo, profissionais envolvidos, data,
horário, local).
Justificativa do tema e especificação da população alvo;
Divulgação da atividade;
Escolha do tema (s) abordado (s);
Técnica utilizada na realização de atividade em grupo;
Participação de outros profissionais;
Objetivos da atividade;
Avaliação;
Fatores que facilitaram e dificultaram a execução da atividade.
Para caracterizar a prática de referência o entrevistado apontou o período de sua
realização (menos de 1 mês, de 1 a 2 meses e mais de 3 meses) registrando se, estas
atividades eram realizadas de forma eventual ou freqüente. Além disso, foi solicitado ao
profissional o local de realização da atividade (UBS, comunidade, outros) e qual era a
população alvo da atividade educativa (funcionários, comunidade, outros).
A seguir, o questionário contemplou a questão da organização prévia da
atividade de referência, envolvendo a realização de divulgação da atividade e
participação de outros profissionais (sim ou não/ explicite). A propósito, eles foram
inquiridos sobre número de participantes presentes no evento (menor ou maior que 10).
Questionados sobre estratégias utilizadas foram registrados os recursos didáticos
mobilizados na realização das atividades educativas (palestras, dinâmicas de grupo, uso
51
de transparências ou outras). Dando conta da metodologia adotada foi indagado se os
usuários trocavam informações durante a realização da atividade (sim ou não/ explicite).
Focalizando questões relativas à avaliação das práticas educativas os
entrevistados foram convidados à explicitar se os objetivos da atividade realizada
haviam sido alcançados. Neste tópico, ainda, foi considerada a existência de fatores que
facilitaram ou dificultaram a atividade desenvolvida (sim ou não/ explicite).
Finalizando o questionário, os entrevistados foram convidados a descrever,
livremente, como havia sido organizada a atividade de referência, pressupondo que o
respondente articularia os itens constitutivos da caracterização precedente.
3.3 Modelos de prática, limites e potencialidades
Partindo do plano das atitudes para o plano do conhecimento, buscamos
identificar, junto aos sujeitos da investigação, sua postura frente às atividades
educativas grupais – por oposição as práticas educativas individuais – buscando
identificar os modelos correspondentes de atuação. Nesse movimento precedemos à
realização de entrevistas semi-estruturadas, cujo roteiro segue anexo (ANEXO2)
Foram contemplados nas entrevistas os seguintes eixos:
Conceituação de atividade educativa;
Objetivos da atividade educativa em grupo;
Importância da atividade educativa;
Conteúdo e estratégias;
Freqüência;
Avaliação da atividade.
Na continuidade da entrevista - contemplando o terceiro movimento da
investigação - solicitamos aos profissionais que descrevessem como obtinham
52
material de apoio para a construção das atividades educativas. Além disso, os
entrevistados foram convidados a apontar as dificuldades e facilidades encontradas,
no exercício da prática educativa grupal, que poderiam estar associadas às condições
institucionais e aspectos relativos ao próprio programa, aos profissionais ou
usuários.
Os entrevistados, também, foram questionados sobre a necessidade de
aprimoramento profissional, sendo solicitado que fizessem sugestões para futuras
capacitações em função de suas necessidades.
Finalizando as entrevistas, solicitamos que os profissionais relatassem uma
prática de sucesso, tendo em vista obter dados adicionais à consideração da
organização das atividades educativas.
3. 4 Análise de dados
Os dados do questionário foram quantificados e tabulados para efeito da análise.
Originalmente os dados do perfil profissional, particularmente em relação à
especialidade, idade e tempo de participação na Equipe de Reabilitação do PSF, seriam
cruzados com as demais variáveis do levantamento. Este procedimento, entretanto, foi
descartado na presente etapa do estudo, tendo em vista o propósito de evitar
comparações entre os membros da equipe.
No tocante às questões abertas, levamos em conta, no plano discursivo, a análise
temática.
A análise temática consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem
uma comunicação cuja presença ou freqüência signifiquem alguma coisa
para o objetivo analítico visado. Ou seja, tradicionalmente, a análise temática
se encaminha para a contagem de freqüência das unidades de significação
como definitórias do caráter do discurso, ou, ao contrário, qualitativamente a
presença de determinados temas que denotam os valores de referência e os
modelos de comportamento presentes no discurso. (MINAYO, 1998, p.135).
53
Recorrendo igualmente a técnica da análise temática, para efeito de disposição
dos dados das entrevistas, procedemos à categorização das unidades de sentido,
referenciadas, com base no referencial teórico, à realização das atividades educativas
em grupo no âmbito da reabilitação.
A análise de conteúdo pode ser considerada como um conjunto de técnicas de
análise de comunicação visando obter, por procedimentos sistemáticos e
objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos
ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção dessas mensagens. (BARDIN, 1977, p.38).
As análises destas informações se pautaram no plano conceitual pelo Modelo
proposto por ALVES (2005) a propósito da caracterização do modelo tradicional e
dialógico. De forma esquemática, as características destes modelos encontram-se
especificados no Quadro 1.
54
Quadro1. Elementos dos modelos de educação tradicional e dialógico.
Modelo
Tradicional
Dialógico
Planejamento
Diagnósticos de necessidades
Consideração das condições
realizadas pelos profissionais de Saúde de existência dos sujeitos
assistidos/ coresponsabilidade no
diagnóstico dos problemas
Considera os determinantes
Concepção de Saúde/doença Focaliza a doença; privilegiando a
dimensão biológica e a intervenção
psicossociais e culturais dos
curativa
comportamentos de saúde
Produção social do processo saúdedoença
Centrado na doença
Centrado no sujeito a que se
Concepção de Promoção
Enfoque preventivista
destina a prática educativa;
saúde
Enfoque em promoção de saúde
Educação normativa
Participação comunitária idéia
Concepção de Educação
Relação linear entre o saber instituído e (Paulo Freire)
o comportamento
Relações interpessoais
Caráter transmissivo
Integração entre assistência e
educação em saúde
Contextos formais de ensino
Contextos formais ou informais de
ensino
Redução dos riscos individuais;
Constituição de sujeitos para a
Objetivos
prevenção de doenças
transformação de condições de
saúde e melhoria da qualidade de
vida
Profissional detentor de saber técnico Profissional - detentor de um saber
Estratégias
científico
técnico científico inacabado/
Reaprende através do diálogo com
o saber popular
Usuários carentes de informação ou
Usuário é portador de saberes,
portadores de saberes inacabados
sujeito da prática educativa e em
busca da autonomia.
Relação assimétrica entre
profissional/usuário
Problematização e reflexão
Comunicação unilateral de caráter
informativo
55
Comunicação dialógica
3.5 Procedimentos éticos
O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética da UNIFESP (ANEXO 3).
Na seqüência foram obtidas autorizações para levantamento de dados junto à
Secretaria da Saúde do Município de São Paulo (ANEXO 4) e pela Casa de Saúde Santa
Marcelina (ANEXO 5).
No caso das entrevistas e questionários, os participantes assinaram um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido que consta em anexo (ANEXO 6).
56
4 Resultados
4.1 Perfil profissional e exercício de uma prática educativa
Perfil Profissional
De acordo com a Tabela 1, dos 12 profissionais de reabilitação que responderam
ao questionário, 17% eram do sexo masculino e 83% do sexo feminino.
Estes profissionais na maioria dos casos eram jovens, com idade variando de 20
a 30 anos. De forma correspondente, 72% dos profissionais tinham mais de 6 anos de
formado, evidenciando que haviam feito graduação antes da vigência das Diretrizes
Curriculares Nacionais (2001), que balizariam o Ensino Superior no sentido de
estimular novas perspectivas de ensino aprendizagem subjacentes à consideração das
atividades educativas.
De acordo com a Tabela 2, 58% dos profissionais de Reabilitação realizaram
algum curso de pós-graduação. Dentre eles 33% fizeram especialização, 17% mestrado
e 8% residência multiprofissional.
Após terem ingressado no serviço público (PSF), 83% dos profissionais
participaram do curso promovido pelo Pólo de Capacitação do Santa Marcelina. Chama
atenção, neste caso, a ausência do registro de temáticas relacionadas às atividades
educativas. O curso Introdutório possui carga horária de 48 horas (BORGET, 2005),
porém, o manual deste curso, também não contempla o tema Atividade Educativa e/ou
mesmo Educação em Saúde (ANEXO 7). Estes resultados evidenciam a
desconsideração dessas questões na capacitação para o PSF, que se acrescenta à
tradicional falta de preparo sobre este campo na graduação.
Explicitando o trabalho desenvolvido no PSF - Tabela 3 - chama atenção a
presença de profissionais (42%) que estariam no serviço há 7 anos, tendo ingressado, na
maioria dos casos, juntamente com a implantação do Projeto de Reabilitação; 25%
deles haviam sido incorporados ao serviço há menos de 2 anos.
57
TABELA 1 - Perfil dos Profissionais de Reabilitação no PSF/Zona Leste do Município
segundo Sexo, Idade e Tempo de Formação, 2007
TABELA 1
Perfil dos Profissionais de Reabilitação no PSF/
Zona Leste do Município de São Paulo
segundo Sexo, Idade e Tempo de Formação, 2007
Variáveis
Sexo
n
%
Feminino
Masculino
15
3
83
17
20 a 30 anos
31 a 40 anos
41 a 50 anos
12
3
3
67
17
17
3 a 5 anos
6 a 8 anos
9 a11 anos
mais de 11 anos
3
5
2
2
12
25
42
17
17
100
Idade
Tempo de Formado
Total
58
TABELA 2 - Formação e Capacitação dos Profissionais de Reabilitação no PSF/
Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
TABELA 2
Formação e Capacitação dos Profissionais de Reabilitação no PSF/
Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
Variáveis
Nível de Formação Pós Graduada
Residência
Especialização
Mestrado
Nenhum
Participação no Curso do Pólo de Capacitação
Sim
Não
Capacitação para Atividade Educativa
Sim
Não
Total
59
n
%
1
4
2
5
8
33
17
42
10
2
83
17
2
10
12
17
83
100
TABELA 3 - Atuação dos Profissionais de Reabilitação no PSF Zona Leste no
Município de São Paulo/ Santa Marcelina, 2007.
TABELA 3
Atuação dos Profissionais de Reabilitação no PSF
Zona Leste no Município de São Paulo/ Santa Marcelina, 2007.
Variáveis
Tempo de trabalho no PSF
n
%
De 0 ano a 2 anos
De 2 anos a 4 anos
De 4 anos a 6 anos
Mais que 6 anos
Atuação em Supervisões de Saúde
1
2
3
Atuação em Unidades Básicas de Saúde
1 UBSF
2 UBSF
3 UBSF
Mais de 3
Total
3
2
2
5
25
17
17
42
4
6
2
33
50
17
4
4
3
1
33
33
25
8
12
100
60
Na falta de informações e treinamentos, no tocante às atividades educativas,
passa a ter relevância, a consideração da vivência prática (informal) desses
profissionais, lembrando o curto espaço tempo de sua vinculação com o serviço.
Chama atenção a sinalização da intensa atividade dos profissionais envolvidos
no Programa de Reabilitação - 67% referiram atuar em mais de uma unidade básica.
Lembrando que cada unidade é composta por até 6 equipes de saúde da família, e que
cada equipe atende de 1000 a 1200 famílias, totalizando uma área de abrangência de,
aproximadamente, 5 000 habitantes para cada equipe (BRASIL, 2000). Nestas
condições, cada profissional da equipe de reabilitação se responsabiliza, no conjunto das
atividades, por um contingente aproximado de 70 000 habitantes – quando, a
recomendação realizada por MENDES (2004) preconiza um fonoaudiólogo para
aproximadamente 20 000 habitantes.
Registra-se, além disso, a participação deles em distintas supervisões de saúde –
67% em mais de duas – o que amplifica os deslocamentos e cobranças, que
sobrecarregam as atividades desses profissionais. Sem pretender utilizar isto como
justificativa, esta sobrecarga de atividade, aponta para limitações referentes à
organização do exercício das atividades educativas no desempenho do profissional.
Resumindo, estes resultados apontam para o perfil jovem desses
profissionais – quase todos incorporados ao serviço juntamente com a
instalação do Programa de Reabilitação, sendo que alguns ingressaram mais
recentemente. Na ausência de capacitação formal e específica para o
exercício das atividades educativas grupais no âmbito do PSF - num
programa que é novo - ressalta-se a sobrecarga de trabalho diante da
demanda associada à participação em diferentes UBS/PSF e supervisões.
61
Práticas Educativas
Embora todos os entrevistados tivessem relatado o exercício de atividades
educativas grupais, de acordo com a Tabela 4, em meio ao acúmulo de atividades,
somente 25% referiram sua realização há menos de um mês; 75% referiram que essa
última atividade havia ocorrido há mais de três meses. Estes dados coincidem com a
categorização das práticas educativas grupais como sendo eventuais (67%).
Ressaltando que as atividades educativas constituem o diferencial do PSF
(BOUGET, 2005) os dados apresentados sinalizam para o não aproveitamento do
espaço proporcionado para o exercício das práticas de Promoção de Saúde – estipulado
em 10% do conjunto das atividades (SMS, mimeo).
Dentre os profissionais, 85% realizaram a atividade de referência na UBS, ou
seja, apenas um profissional relatou ter realizado tal atividade na comunidade. Ele
possuía experiência prévia como auxiliar de enfermagem, cuja rotina do Programa de
Saúde da Família, envolvia visitas domiciliares regulares para serem cumpridas
semanalmente, o que poderia ter facilitado a opção apontada.
Mesmo não correspondendo às disposições que valorizam a atuação fora da
UBS, as atividades educativas realizadas em relação à população alvo foram dirigidas
tanto para os funcionários como para a comunidade – a que concentrou uma proporção
de 85% das menções. Justificando a escolha da comunidade, enquanto população alvo,
os profissionais remeteram as atividades educativas aos problemas prevalentes no
território da Unidade Básica de Saúde em que atuavam, destacando – se as seguintes
respostas:
“[A atividade foi realizada para] cuidadores de pessoas com
deficiência, pelo grande número de doentes acamados que são
excluídos da assistência de saúde e de outros recursos sociais”.
(Profissional 7)
62
TABELA 4 - Atividade Educativa Grupal Referida pelos Profissionais de
Reabilitação no PSF/ Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
TABELA 4
Atividade Educativa Grupal Referida pelos Profissionais de Reabilitação no PSF/
Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
Atividade Educativa/Variáveis
Período de realização
n
%
0 a 1 mês
1mês a 3 meses
Mais de 3 meses
3
0
9
25
0
75
Eventualmente
Frequentemente
8
4
67
33
UBSF
Comunidade
Outros
11
2
0
85
15
0
Funcionários da UBS
Comunidade
Outros
4
4
2
40
40
20
Menor que 10
Maior que 10
2
10
12
17
83
100
Frequência da Atividade
Local
População Alvo
Número de participantes
Total
63
“[A atividade foi dirigida para a] população infantil, devido ao
fato do PSF priorizar ações com crianças menores de 1 ano e
desta ser uma demanda da comunidade”. (Profissional 6)
“A equipe definiu como prioridade desenvolver ações com
pessoas depressivas, restritas ao lar sem motivação; é um
aspecto que aparece bastante na queixa dos usuários”.
(Profissional 9)
Em relação às atividades dirigidas aos funcionários, enquanto população alvo, a
justificativa de sua eleição envolveu as seguintes respostas:
“A idéia era trabalhar com os funcionários da unidade, neste
primeiro momento [tendo em vista] capacitá-los, discutir um
olhar diferenciado para a população sobre questões da
fisioterapia e fonoaudiologia, já que o serviço está sendo
estruturado na região, para depois realizar grupos com a
comunidade sobre questões específicas”. (Profissional 18)
“Foi uma solicitação dos próprios agentes, pois se sentiam
excluídos e desmotivados”.(Profissional17)
Quanto ao número de participantes nas atividades educativas grupais, 83% dos
profissionais conseguiram um número maior que 10 integrantes. O documento da
Secretária Municipal de Saúde (SMS, 2005) aponta diretrizes para os profissionais de
Reabilitação de São Paulo, estabelecendo como parâmetro a realização das atividades
educativas para grupos envolvendo no mínimo 10 participantes, para efeito de
faturamento.
Resumindo, todos os profissionais entrevistados desenvolveram
atividades educacionais. Dirigidas para funcionários e comunidade, ressalta-
64
se que elas se circunscreveram ao espaço da UBS. Os grupos contaram com
o número mínimo de 10 participantes, conforme preconizam as diretrizes da
Secretária
Municipal
de
Saúde.
Ressalta-se,
outrossim,
o
caráter
esporádico da realização das atividades educacionais – o que nos remete a
uma dupla ordem de consideração. De um lado, a questão da sobrecarga de
trabalho e, de outro, o despreparo ou a falta de familiaridade com as
práticas educativas grupais.
Organização
Focalizando, agora, a organização das atividades educativas de referência, de
acordo com a Tabela 5, os respondentes afirmaram que em 50% dos casos eles atuaram
como responsável único e, em 50%, como colaboradores.
Apesar das resistências pontuais ou impossibilidade circunstancial, vale dizer
que, em 67% dos casos a atividade contava com a presença de outros profissionais ,
sinalizando para as recomendações a mobilização da equipe multiprofissional (BRASIL,
1997). Especificando estas presenças os entrevistados responderam:
“[A atividade de referência] era para profissionais. Estavam
presentes coordenando o grupo os especialistas de: fono, fisio,
assistente social e enfermeira. Como participantes do grupo:
enfermeiros, médicos, agentes comunitários de saúde, auxiliares
de
enfermagem,
auxiliar
de
consultório
dentário
e
administrativo”.(Profissional 18)
“Participaram
fisioterapeuta,
fonoaudióloga,
psicóloga,
nutricionista e assistente social; (...) com temas específicos da
área, realizaram palestras, dinâmicas e ensino de técnicas
(noções básicas) de cuidados à pessoa acamada com
deficiência”.(Profissional 7)
65
TABELA 5 - Atividade Educativa Grupal Referenciada pelos Profissionais de
Reabilitação no PSF/ Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
TABELA 5
Atividade Educativa Grupal Referenciada pelos
Profissionais de Reabilitação no PSF/
Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
Atividade Educativa/Variáveis
Responsabilidade organização
n
%
Responsável único
Colaborador
Participação de outros profissionais
Sim
Não
Realização de organização prévia
Sim
Não
Realização de divulgação da atividade
Sim
Não
Total
6
6
50
50
8
4
67
33
12
0
100
0
11
1
12
92
8
100
66
Questionados sobre a organização da atividade, apareceram respostas abordando
alguns itens que integram o planejamento da atividade. Algumas respostas foram
lacônicas não deixando transparecer, na verdade, o recurso de um planejamento prévio.
A maioria, entretanto, apontou questões significativas da elaboração de um
planejamento de atividade educativa:
“Organizei [a atividade educativa para ser realizada] em
quatro dias, em meio período, com temas específicos e com
participação e colaboração de outros profissionais, como fisio,
psicóloga, assistente social e nutricionista”.(Profissional 7)
“Depois de definida a população alvo, [organizamos o fluxo
de] encaminhamentos, a data e o material utilizado”.
(Profissional 4)
“[A organização foi feita a partir do] levantamento da demanda.
Após um estudo sobre o assunto, [fiz a] preparação de material
didático (apostilas), escolhi a data, local e [a forma de]
divulgação”. (Profissional 15)
“[Foi organizado] nas discussões em equipe. Discutimos as
ações e os materiais utilizados”. (Profissional 9)
Dando conta da organização prévia da atividade educativa, a maioria dos
profissionais (92%) referiu ter realizado a divulgação do evento, recorrendo, em ordem
decrescente, em primeiro lugar, à divulgação realizada por agentes comunitários de
saúde e médicos de família; em segundo lugar, ao recurso de cartazes, reunião de
equipe, enfermeiros, e, em terceiro lugar, às visitas domiciliares e à supervisão de saúde.
Foram significativas, a propósito, as falas que se seguem, combinando várias formas de
divulgação:
67
“A divulgação foi realizada pelos agentes comunitários,
auxiliares
de
enfermagem,
enfermeiros
e
médicos”.
(Profissional l1)
“Através
dos
profissionais
de
equipe
de
saúde
da
família”.(Profissional 15)
“Através dos médicos, avaliações, cartazes no posto e
ACS”.(Profissional 8)
“Realizada na própria unidade, com informação dada pelos
profissionais
envolvidos
diretamente
com
os
agentes,
acrescentando-se a confirmação [do evento] via telefone,
reforçada pela gerência”. (Profissional14)
“Através da supervisão de saúde que divulgou para a unidade e
convidou
os
funcionários
a
participar
da
discussão”.
(Profissional18)
“Orientando profissionais médicos e enfermeiro a encaminhar
o grupo paciente com queixas osteo-muscular”. (Profissional 4)
Estas respostas referenciam, a propósito do planejamento, itens como:
profissionais envolvidos, levantamento da demanda, marcação de data e horário, assim
como a divulgação. Porém, nenhum depoimento contemplou todos o itens que compõe
o planejamento. Tais dados sinalizaram para a informalidade com que é tratado o
planejamento, no sentido em que não é concebido como uma atividade sistemática.
Resumindo, os profissionais afirmaram organização prévia das
atividades educativas realizadas no âmbito das UBS, tendo atuado como
responsáveis únicos ou como colaboradores das atividades educativas
grupais. Estes dados registram a presença de participação de outros
68
profissionais, em que pese as dificuldades de contar com o suporte da sua
presença. Foram abordados vários elementos que compõe a atividade de
planejamento, ressaltando-se, entretanto, que em nenhum momento eles
tivessem sido considerados em sua totalidade. Os relatos não deram conta
do planejamento como uma atividade sistemática, aventando-se, a propósito,
a possibilidade de não terem sido suficientemente preparados para tanto.
Temas
Questionados sobre os temas escolhidos, foram observados basicamente dois
eixos de respostas. Num deles, situaram-se referências ao direcionamento das atividades
educativas com enfoque na doença e numa intervenção curativa, fundamentadas num
referencial biologicista como dispõem SMEKE; OLIVEIRA (2002) CHIESA;
VERÍSSÍMO (2003). No outro eixo foi destacada a questão da qualidade de vida,
consistente com a Promoção de Saúde.
Dentre as respostas referidas a atuação voltada para doença, figuraram respostas
expressando o propósito de:
“Propor ao participante uma postura ergonômica mais
adequada”. (Profissional 4)
“[Focalizar] a coluna, problemas comuns, posturas adequadas
e exercícios”.(Profissional 6)
“[Focalizar] voz, coluna e postura”. (Profissional14)
Numa situação intermediária, contemplando uma preposição mais abrangente,
embora relacionada, ainda, com a doença, figuraram propósitos tendo em vista:
69
“Fazer com que o paciente, mesmo com uma doença
diagnosticada, não desista de poder ter uma vida normal e que
saúde não é apenas ausência de doença”. (Profissional 16)
“Melhorar o quadro clinico, relaxamento, melhora da autoestima, convívio social e também uma nova postura frente sua
vida e seus problemas”. (Profissional 10)
“O que é a doença, como curar, importância dos hábitos
saudáveis, orientações para os momentos de crises e
reabilitação”. (Profissional15)
Na vertente mais próxima da concepção de Promoção de Saúde, sem levar em
conta a questão de uma doença específica, colocaram-se as seguintes referências:
“Melhorar
a
qualidade
de
vida
dos
participantes”.
(Profissional 9)
“[Estimular] a auto estima, cuidar de si, busca de qualidade de
vida”. (Profissional 12)
Resumindo, o levantamento, no âmbito do questionário, apontou para
uma ampla temática contemplada nas atividades educativas apontadas pelos
entrevistados. Em meio às dificuldades associadas à aplicação do conceito
de Promoção de Saúde à reabilitação, as propostas temáticas, na forma
como foram apresentadas, apontaram para a convivência de concepções
ancoradas na prática higienista, como em concepções que se aproximariam
da Promoção de Saúde, na forma contemporânea de sua expressão.
70
Estratégias
Ao lado dos relatos sumários, contidos nos questionários, focalizamos
especificamente as estratégias didáticas utilizadas na realização das atividades. De
acordo com a Tabela 6, todos os profissionais referiram realizar dinâmicas de grupo.
Em menores proporções foram citadas palestras e o uso de transparências. Convidados a
explicitar a escolha de outras técnicas eles apontaram o recurso da escuta (33%), da
utilização de música (25%), problemas para discussão (17%) e técnicas de grupo (17%).
A propósito,foram significativas as falas que se seguem:
“Uso
retroprojetor,
apostila,
dinâmica
e
exercícios”.
(Profissional 14)
“Criar no grupo vínculo entre os participantes, para criar
ambiente favorável. Realizar discussão sobre o tema e técnicas
específicas sobre reabilitação labiríntica”. (Profissional 15)
“Foi oferecido um problema para reflexão e depois
apresentado e discutido por todo o grupo. Foi utilizado:
acolhimento, escuta, participação em grupo, técnicas de grupo
de terapia ocupacional.”(Profissional 7)
Tendo em vista focalizar as estratégias, do ponto de vista metodológico
(vinculadas às teorias de ensino aprendizagem) perguntamos se os usuários trocavam
informações durante a atividade desenvolvida. Dentre eles, 75% responderam
afirmativamente:
71
TABELA 6
Estratégias Didáticas na Atividade Educativa Grupal de Referência
dos Profissionais de Reabilitação no PSF /
Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
Variáveis
Recursos Didáticos
Dinâmica
Palestra
Uso de transparências
Música
Escuta
Exercícios
Problema para discussão
Troca de informações entre usuários
n
Sim
%
Total
n
%
7
12
4
3
4
2
2
9
58
100
33
25
33
17
17
75
12
12
12
12
12
12
12
12
100
100
100
100
100
100
100
100
TABELA 6 - Estratégias Didáticas na Atividade Educativa Grupal de Referência
dos Profissionais de Reabilitação no PSF Zona Leste no Município de São Paulo,
2007.
72
“Cada participante relata sua vivência com o problema que o
trouxe ao grupo”. (Profissional 10)
“Através de citação de casos, inclusive pessoais”. (Profissional
14)
“Cada um teve a liberdade de colocar seu ponto de vista, com
esta dinâmica conseguiram atingir o objetivo”. (Profissional 16)
“Por meio de diálogo, identificação entre as histórias de vida e
necessidades, cada um vai repensando na sua vida e isso gera
mudança na vida e conseqüentemente na saúde”. (Profissional
9)
No plano discursivo, ao lado de indícios de apego ao modelo transmissivo, estes
relatos mostraram aproximação com a prática dialógica da educação, revelando a
valorização dos espaços interpessoais na prática voltada para a população, conforme
preconiza ALVES (2005).
Vislumbrando compensar as restrições das informações disponibilizadas pelo
auto preenchimento do questionário, solicitamos aos respondentes que descrevessem a
atividade educativa de referência de forma a obter uma versão mais articulada da
experiência focalizada. Solicitada uma descrição livre da atividade de referência as
descrições foram dirigidas, indistintamente, para a comunidade e funcionários.
Os relatos abaixo evidenciam atuação com a comunidade, trazendo implícita a
consideração dos usuários como um segmento carente de saber sobre saúde, cabendo
pensar a mudança de comportamento como produto da transmissão de informações,
como coloca CHIESA; VERÍSSIMO (2001) a propósito de estudo realizado junto aos
enfermeiros.
73
“Iniciamos com palestras sobre o tema, depois trocamos
experiências e dúvidas (...) foram orientados [quanto à
realização de] exercícios”. (Profissional 1)
“[As
atividades
educativas
grupais]
são
realizadas
semanalmente, com uma hora de duração. Programo os
exercícios de relaxamento para atingir globalmente a todos [os
pacientes que participam da atividade]”. (Profissional 11)
“Chamamos [as pessoas], avaliamos [as queixas] e colocamos
no grupo. Fizemos exercícios dinâmicos, orientação e
relaxamento”. (Profissional 10)
Da mesma forma, o modelo tradicional também foi observado em relatos
dirigidos para profissionais:
“Agendada a data [a atividade educativa foi desenvolvida junto
aos] agentes comunitários, [utilizando-se] de aulas expositivas,
com auxílio de projetor [coordenada pela] presença de fisio e
fono”.(Profissional 14)
Como contraponto destas posturas, no tocante as estratégias mobilizadas, foram
significativos os depoimentos que seguem, tanto dirigidos para a comunidade, quanto
para os funcionários. No caso dos primeiros, destaca-se a consideração dos saberes
populares e do espaço dos sujeitos no processo de construção da aprendizagem,
condizente com os princípios colocados por FREIRE (1996).
“Conversamos sobre o que cada um gostava de fazer e
[discutimos] porque não faziam mais(...) e depois prepusemos a
atividade relacionada ao que cada um gostava de fazer [com
objetivo de] potencializar o que sabiam fazer de melhor”.
(Profissional 9)
74
No caso de depoimentos relatando atividades educativas voltadas para
funcionários das UBS, registra-se a alusão à participação ativa dos sujeitos envolvidos
na dinâmica grupal:
“A equipe de fisio e fono, mais os funcionários da UBSF, e duas
profissionais da supervisão de saúde da região fizeram uma
discussão das questões de fisioterapia e fonoaudiologia,
[explicitando-se] casos e sugestões para [realização de] novos
grupos”. (Profissional 18)
“Primeiramente foi realizada uma dinâmica para intervenção
no grupo. Após, foram discutidos os anseios e aflições de cada
participante e o que poderia ser feito para melhora”.
(Profissional 8)
Resumindo, a consideração das estratégias, quando não reduzida aos
recursos técnicos, apontou para a possibilidade de concretização do modelo
dialógico de ensino aprendizagem, ao lado da permanência do modelo
transmissivo. Diferenciados em torno das condições de participação dos
educandos – passiva ou ativa – este achado é relativisado na medida em que
não é cotejado com a concepção de saúde que permitiria identificar modelos
ideais, relacionados, ou não, à concepção de Promoção de Saúde.
Avaliação, limites e potencialidades.
De acordo com a Tabela 7, a maioria (67%) dos profissionais realizaram avaliação
da atividade referida, recorrendo a questionários, perguntas para os usuários,
depoimento, trocas de informações com o grupo, bem como, a observação de mudanças
na vida dos freqüentadores da Unidade Básica de Saúde. Encontramos a propósito
dizeres que expressaram o movimento da avaliação:
75
“Através da troca de informação com o grupo”. (Profissional
17)
“Pelo
bom
entendimento
da
atividade
pelo
grupo”.
(Profissional 4)
“Por haver maior entendimento sobre a doença e maior
colaboração no tratamento”. (Profissional 15)
“Através dos relatos dos usuários e acompanhamento posterior
do ACS”.(Profissional 9)
É interessante o registro de mudanças nos hábitos e atitudes das pessoas, verificável
diante da convivência oportunizada pelo PSF – recurso este que pode ser explorado em
avaliações futuras. A identificação de mudanças potencializadas pelas atividades
educativas, no contexto da atuação da UBS, foram citados em resposta à indagação: “se
os objetivos haviam sido alcançados”. Afirmando positivamente, os respondentes
argumentaram, ao se referirem aos trabalhos com a comunidade:
“Por ocorrer mudanças na vida e nos hábitos das pessoas que
participaram”. (Profissional 9)
“Por ter falado dos assuntos colocados pelos pacientes e nunca
ninguém discutiu antes com eles [tais assuntos], [o que permite
levar] para casa, com seus familiares, suas experiências (...)
ampliando assim a divulgação do assunto...” (Profissional 16).
Em relação às práticas realizadas com os funcionários, foram sugestivas
menções, valorizando as transformações do desempenho associadas às atividades
educativas, ancoradas na percepção subjetiva dos educadores.
76
TABELA 7 - Avaliação da Atividade Educativa Grupal de Referência dos
Profissionais de Reabilitação no PSF / Zona Leste no Município de São Paulo,
2007.
TABELA 7
Avaliação da Atividade Educativa Grupal de Referência
dos Profissionais de Reabilitação no PSF /
Zona Leste no Município de São Paulo, 2007.
Variáveis
Realização de avaliação da atividade
Sim
Não
Objetivos alcançados
Sim
Não
Fatores que facilitaram o grupo
Participação da equipe
Interesse dos envolvidos
Profissionais capacitados
Fatores que prejudicaram o grupo
Espaço inadequado
Recursos materiais inadequados
Tempo disponível
77
Sim
n
%
Total
n
%
8
4
67
33
12
12
100
100
12
0
100
0
12
12
100
100
2
7
2
17
58
17
12
12
12
100
100
100
1
3
11
8
25
92
12
12
12
100
100
100
“Para um primeiro contato pode-se perceber o esclarecimento
de dúvidas e também a orientação do profissional que já passou
a pensar em seus usuários trazendo-os para discussão. Também
se pode constatar, através do encaminhamento correto que
recebi destes profissionais, enviando crianças menores que já
possuem
alterações
e
não
somente
os
casos
gritantes”.(Profissional 9).
“Sim, pois ouve melhora na conduta dos ACS (Agentes
Comunitárias de Saúde), bem como no olhar diante das
dificuldades”. (Profissional 17)
Estas avaliações positivas das atividades educativas, apoiadas na percepção
subjetiva dos profissionais de reabilitação, no papel de educadores, evidenciam a
disposição para o exercício das atividades no âmbito do Programa, paralelamente a sua
valorização.
Vale dizer que não há registros dessas avaliações, que são esporádicas e
pontuais, sugerindo a informalidade de sua realização.
Convidados a se pronunciarem sobre fatores que facilitaram a execução da
atividade (Tabela 7), os profissionais mencionaram, entre outros quisitos, a demanda do
serviço e o interesse da população na participação de atividades educativas grupais:
“A disposição do grupo em participar”. (Profissional 17)
“A boa vontade da comunidade”. (Profissional 11)
“A população bastante prestativa, interessada”. (Profissional
10)
78
“A demanda e o encaminhamento virem da equipe médica”.
(Profissional 15)
No tocante aos fatores que prejudicaram a realização da atividade grupal, um
profissional referiu espaço inadequado; três referiram recursos materiais insuficientes;
e, 11 profissionais se reportaram à falta de tempo. No plano discursivo foram
relacionados:
“Pouco espaço e muita gente”. (Profissional 11)
“Falta de recursos materiais e participação de outros
profissionais”. (Profissional 15)
“Falta
de
recursos
visuais
e
materiais
adequados”.
(Profissional 8)
“As dificuldades que encontro são: a falta material, tempo, a
carga horária, trabalhar em várias unidades”.(Profissional 3)
Resumindo, os resultados apontados evidenciam a realização da
prática avaliativa, das atividades educativas, realizada pelos profissionais.
Explicitando os recursos utilizados, os entrevistados ressaltaram, como
critério de aferição, a mudança de comportamento dos participantes. Sem
questionar o alcance atribuído à capacidade transformadora das atividades
educacionais. Os relatos fazem pensar no caráter informal e subjetivo de
sua realização.
Considerando a presença e a disposição da população como fiel do
sucesso, ou não, do empreendimento educativo, as dificuldades relativas ao
exercício destas atividades incluíram limitações associadas às condições
79
materiais e à falta de tempo, em meio à sobrecarga de trabalho. Nesse
sentido, ao lado da observação das condições limitantes na perspectiva da
formação para realizar o planejamento das atividades educativas –
associável à provável falta de capacitação - situam-se as limitações relativas
às condições institucionais.
80
4.2 Qualificação das práticas educativas
Concepção de atividade educativa
Os profissionais de reabilitação foram questionados, durante a entrevista, sobre o
que entendiam por atividade educativa grupal. Recorrendo à concepção de educação em
geral – apoiados no senso comum – eles se reportaram ao efeito propiciado pela
educação, incluindo mudanças comportamentais:
“A atividade educativa tem temas específicos, objetivos a longo
prazo; [ela] se propõe a promover mudanças nas pessoas”.
(Profissional 15)
“Atividade educativa é um grupo que interage de acordo com a
necessidade da comunidade, educando-a no sentido de mudar
sua rotina”. (Profisssional1)
“Considero [atividade educativa] algo que possa estar
acrescentando,
beneficiando
um
grupo
de
pessoas”.(Profissional 3)
De forma mais explícita alguns profissionais ressaltaram a prática educativa
como um espaço para informar e transmitir conhecimento. Neste sentido destacaram-se
menções a:
“Atividade educativa visa dar informações às pessoas”.
(Profissional 14)
“Atividade
educativa
é
um
espaço
para
se
passar
conhecimento, não no sentido de capacitar, mas de informar o
que não se sabe e reforçar o [conhecimento]” (Profissional 4)
81
“É uma atividade não só com objetivo de esclarecer, mas
também, de que possa ser assimilado seu conteúdo”.
(Profissional 11)
Tais falas reportam aderência dos profissionais da reabilitação ao modelo
tradicional de ensino, de caráter transmissivo no dizer de GUEDES (1990), centrado na
figura do professor, ancorado numa perspectiva comportamentalista que consubstancia
o preventivismo da educação sanitária, como refere BUSS (1999).
Numa outra vertente, os depoimentos dos profissionais remeteram ao
pressuposto de que o usuário, reconhecido como um sujeito dotado de um saber sobre o
processo saúde-doença-cuidado, é capaz de participar de uma situação dialógica com os
profissionais dos serviços de saúde conforme preconiza AYRES (2001). Neste sentido,
se inscreveram as falas que se seguem, acrescentando-se a associação com
contemporâneas concepções de Promoção de Saúde:
“A atividade educativa contém um teor diferente de quando
reúno um grupo para discutirmos um tema especifico”.
(Profissional 7)
“É uma prática educativa que pode ser realizada na unidade
básica de saúde ou na comunidade, voltada à população em
geral, sem preocupação de cura, somente visando ações de
prevenção da saúde. É uma atividade de educação em saúde;
[isso] depende da maneira [como o profissional] responde, sua
postura, o que propõe e orienta”. (Profissional 9)
“É uma prática que você trabalha autonomia, há um enfoque
mais aberto, um conceito mais aberto e amplo de saúde, de
formação da pessoa, de cidadania”. (Profissional 6 )
82
“[Atividade educativa é] uma prática onde a pessoa reflete
sobre a vida no geral, não só na saúde, e mesmo quem não
tenha problemas vai adquirir conhecimentos. Por exemplo:
trabalho situações – problema a partir da própria vivência dos
participantes do grupo, onde cada um coloca sua idéia a
respeito e aos poucos introduzo meus próprios conceitos e
experiências”. (Profissional 2)
Estas práticas nos remeteram ao modelo dialógico na medida em que são
sensíveis à participação da população; trabalha-se com a perspectiva dos sujeitos das
práticas educativas o que condiz com a conceituação de AYRES (2001), ALVES (2005)
e FREIRE (2005). Neste modelo o sujeito é reconhecido como portador de um saber
que, embora diverso do saber técnico cientifico, não é deslegitimado pelo profissional e
pelo serviço.
Além da preocupação com a cura, trata-se de ampliação do conceito saúde –
doença que guarda relação com a concepção de promoção de saúde, preconizada nas
diretrizes do PSF (BRASIL, 1997). Nesta perspectiva se inscrevem discursos referindo
o caráter dialógico da atividade educativa em saúde, o que pressupõe, segundo
VASCONCELOS (2001) “percepção crítica sobre a realidade e aperfeiçoamento das
estratégias de luta e enfrentamento” – aonde se inscrevem a referência ao exercício da
autonomia.
Objetivos
A gama de concepções educativas especificadas anteriormente, se reafirmou por
ocasião da explicitação dos objetivos pretendidos com a atividade educativa grupal.
Alguns se pautam, explicitamente, pelo modelo tradicional:
“Promover mudanças, trazer mais informações (...) visa mudar
o comportamento a fim de melhorar a função cognitiva, física e
social”.(Profissional 7)
83
“[A educação implica em fazer] com que as pessoas realmente
entendam o assunto que está sendo abordado”. (Profissional 8)
Esses dois depoimentos, trazem a idéia de que a prática educativa irá reduzir os
riscos individuais, prevenir doenças e agravos à saúde; estão vinculados à idéia de que a
apreensão de um saber instituído leva “automaticamente” à aquisição de novos
comportamentos e práticas. Nesse sentido, as atividades educativas têm como objetivo
divulgar informações para a população sobre as principais doenças. Enfatizando
normatizações de comportamentos “certos” e “errados” no tocante à prevenção, as
propostas educativas visam mudar as práticas e atitudes dos indivíduos consideradas
inadequadas pelos profissionais.
Como contraponto dessa postura, exprimindo o ideário dialógico de prática
educativa, alguns profissionais levaram em conta o plano relacional, ao lado da
constituição de sujeitos para a transformação de condições de saúde e melhoria da
qualidade de vida. Nesse sentido são significativos os seguintes relatos:
“É importante ouvir e saber o que o grupo quer de você, e
então fazer a abordagem do assunto. Não levo nada pronto e
não fico só falando”. (Profissional 9)
“Na atividade educativa o objetivo é maior. Você trabalha
autonomia, há um enfoque mais aberto, um conceito mais
amplo de saúde, de formação da pessoa, de cidadania”.
(Profissional 6 )
Nesta condição podemos pensar num profissional cujas atividades educativas se
orientam para o usuário como sujeito a que se destina a prática educativa, em contextos
formais ou informais das relações interpessoais, na linha de colocações de AYRES
(2001) ALVES (2005) e FREIRE (2005).
84
Importância da Atividade Educativa
Sobre a importância das atividades educativas, algumas respostas lacônicas
falam da importância sumária das atividades educativas, limitando a possibilidade de
qualificação das posturas educacionais. Entre elas situamos:
“Tem toda a importância”. (Profissional 3)
“Acho
muito
importante,
faz
diferença
na
vida
dos
participantes”. (Profissional 7)
“Importante porque é uma demanda deles para nós.
(Profissional 5)
Ressaltam-se, por outro lado, depoimentos que atribuem importância à atividade
educativa como recurso para dar conta da demanda, potencializando o efeito da
intervenção na lógica da produção em série. São ilustrativos, a propósito, os relatos que
se seguem:
“Considero importante, pois, pela demanda não conseguimos
atender a todos e, com a atividade educativa podemos abordar
o assunto para um maior número de pessoas que precisam de
esclarecimento”. (Profissional 4)
“Acredito que a atividade educativa diminui as consultas
médicas, as dores, a angústia das pessoas”. (Profissional 8)
“Algumas dão bons resultados, os pacientes ficam mais
esclarecidos. As mães controlam os problemas em casa mesmo
e ensinam as vizinhas e acabam trazendo novos participantes”.
(Profissional 10)
85
Estas posturas norteadas pela perspectiva de diminuir a demanda sugerem
aderência à concepção instrumental de educação em saúde, de caráter transmissivo e
normativo,
inerente
ao
modelo
tradicional,
-
condizente
com
informações
disponibilizadas anteriormente no questionário quando classificamos os relatos dos
profissionais.
Numa apreciação mais elaborada da questão da atividade educativa, fica
evidente entre os depoimentos explicitados a seguir, o reconhecimento da concepção de
promoção conforme recomendações das diretrizes do PSF.
“Esta atividade deve ser vista com mais seriedade. Enquanto a
população não for bem instruída, educada, nossa campanha
será apenas” tapa buraco”. Deveria ter um maior investimento
na saúde como um todo”. (Profissional 11)
“É um excelente momento para trocas de experiências, para
compartilhar saberes, e isso não acontece dentro do
consultório. O clínico diz: “você deve fazer isso, isso, isso...”.
Na atividade educativa [grupal] o saber vai sendo construído
de acordo com a realidade, de modo que, se chega a um
consenso do assunto abordado, com a ajuda profissional”.
(Profissional 6)
“É fundamental porque você pode orientar como funciona o
sistema de saúde, o que [cada um] tem direito e o que pode
pedir. A população pedindo o que tem necessidade tem um peso
maior do que o profissional sozinho. Trabalha-se prevenção, a
comunidade fica consciente dos seus direitos, de suas
potencialidades”. (Profissional 12)
86
Estratégias utilizadas
Os profissionais quando solicitados a explicitarem quais as estratégias utilizadas
em suas atividades educativas grupais, remeteram suas respostas ao papel da
comunicação e dos meios utilizados para realizar as atividades educativas, em
detrimento da consideração da estratégia enquanto metodologia de ensino –
aprendizagem.
No plano discursivo algumas falas evocam estratégias do modelo tradicional:
“(...) Uso transparências, faço cartilhas para verem em casa,
porque eles esquecem o que ouviram. A posição sócioeconômica dificulta a absorção do conteúdo, o nível de
entendimento, e às vezes eles têm vergonha de perguntar o que
não entendem”.(Profissional 1)
“(...) monto algo visual, trabalho o assunto dando liberdade
para as pessoas tirarem suas dúvidas. Dependendo do tema
também faço uma atividade prática”.(Profissional 4)
“Como fisioterapeuta, faço [as atividades educativas] com
menos
freqüência,
mas
procuro
trocar
experiências,
conhecimento e informação. Há a necessidade de saber lidar
com as pessoas, saber manipula-las. Se [a população] assimilar
40% do que aprenderam, já é um resultado satisfatório. Tento
perceber o quanto eles absorveram e pontuo o que acho mais
importante para ser gravado na memória”.(Profissional 11)
“Aproveito o material que tenho à disposição: música,
colchonetes, lençóis, papel, caneta, etc.”.(Profissional 2)
87
É importante dizer que, dentro dos limitados recursos materiais existentes, o
profissional que trabalha na rede pública tem de dispor de muita criatividade para
realizar certas atividades, quando se considera a estratégia como recurso didático.
Tais observações referenciam instrumentos e técnicas que privilegiam uma
comunicação de caráter unilateral, associada à transmissão de informações - que
compõe uma das características do modelo tradicional conforme apontada por ALVES
(2005).
Numa nuance desta vertente a fala que segue evoca o processo de ensino aprendizagem onde o modelo dialógico poderia ser pensado (os dados, entretanto, não
são suficientemente elucidativos):
“Se o espaço é amplo, monto uma roda, explico o objetivo da
atividade, proponho um debate. Com crianças proponho uma
atividade inicial e depois o debate que vai levar a uma
reflexão”. (Profissional 6)
Numa perspectiva preventivista, sugestiva da concepção subjacente à educação
sanitária, de caráter normativo, apoiada no ensino transmissivo, evidenciam-se relatos
sobre atividades educativas dirigidas a doentes, sendo significativos os seguintes
relatos:
“Reuni um grupo de atendimento e trabalhei problemas da
coluna, com transparências, exercícios, mostrando quais
patologias afetam a coluna, porquê fazer exercícios, e (...)
procurei tirar todas as dúvidas. Foi um sucesso pelo retorno
que me deram em relação ao que acharam da atividade, (...) e
pediram mais”.(Profissional 14)
“Montei um grupo de pacientes que sofreram de AVE (acidente
vascular encefálico) e que já estão independentes, com a
presença de um acompanhante. Apesar de serem pacientes com
88
seqüelas irreversíveis, deu certo. Trabalhamos o físico e eles
contavam como foi a semana e levaram atividades para
casa”.(Profissional 13)
Destaca-se a seguir o relato de um mesmo profissional que refere duas práticas
educativas: a primeira direcionada a atividade para indivíduos sadios, com um tema
abrangente, evidenciando preocupação com relação a promoção de saúde; já, o segundo,
numa vertente preventivista refere a preocupação com um tema específico, com indícios
de uma abordagem transmissiva, ao lado da preocupação com a avaliação dos
resultados. Assim como o modelo tradicional se associa às atividades exitosas, um
mesmo indíviduo pode adotar práticas de diversas abrangências:
“Faço grupos trimestrais de orientação postural abertos a toda
comunidade e a profissionais também. É um grupo educativo de
posicionamento, de coisa que se pode mudar no dia-a-dia,
como: limpeza da casa, lavar roupa, etc. A participação das
pessoas é bem grande.
Junto com a equipe de saúde, também monto o grupo de pé
diabético, onde participam médicos e enfermeiros. Falamos
sobre prevenção. Os pacientes aderem e assimilam os
conhecimentos, pois quando faço visitas domiciliares vejo que
estão aplicando o que aprenderam “. (Profissional 1)
As falas que se seguem diferenciam das anteriores, na medida em que são
dirigidas a indivíduos sadios, relacionados à abordagem de temas mais amplos, sem dar
enfoque a uma patologia específica, aproximando, assim, a prática educativa ao
referencial de promoção de saúde:
“Foi realizada atividade educativa para agentes comunitários,
sobre o desenvolvimento da linguagem. Levei vários dados de
patologias da linguagem e pedia para que eles imaginassem a
criança e se encaminhariam para o atendimento de fono.
Surgiram associações [em relação aos] próprios filhos e de
89
pessoas
que
elas
conheciam.
Chegaram
até
a
fazer
encaminhamentos”. (Profissional 5)
“Fiz uma prática educativa sobre dor crônica, em oito
encontros. Trabalhamos vários temas para que se percebesse
que tudo é mais amplo, discutimos até temas políticos e valores
impostos pela sociedade. Alguns nunca tinham escutado sobre o
assunto, falamos bastante, opiniões foram dadas e assim vimos
às dificuldades que a comunidade tinha”.(Profissional 12)
“Montei um grupo de orientação postural e consegui atrair as
pessoas que ainda não têm problemas. Orientamos postura no
trabalho, em casa, na execução de certas atividades.
Participaram pessoas que trabalharam na montagem de peças e
costureiras.
Conseguimos
passar
boas
informações”.
(Profissional 4)
“Fiz uma atividade com filhos de pacientes com problemas na
coluna e percebi que a maioria tinha os mesmos problemas dos
pais. Através dos filhos, mostrei aos pais que desde criança
deve haver mudança de comportamento, que a dor não aparece
por acaso, que a patologia se estabelece desde a infância e deve
haver tratamento para a doença não evoluir, que tudo começa
numa
doença
simples
e
avança
para
algo
mais
complexo”.(Profissional 10)
Outros, ainda, se referiram às atividades educativas destinadas a grupos
profissionais, agentes comunitários e para cuidadores.
“A comunidade vê a unidade básica como um ponto de
referência, um lugar seguro, que auxilia na conquista dos seus
direitos. Uma atividade educativa que fiz com os agentes
comunitários sobre verminose, montei um teatrinho com pipoca
90
e filmes também. Houve uma conscientização para as crianças,
elas
se
concentraram
e
foram
contando
sobre
suas
famílias”.(Profissional 12)
“Fiz um curso de cuidadores, com a participação de outros
profissionais, com dinâmicas de grupo. Todos gostaram muito,
porque achavam que ouviriam só uma palestra, mas demos
oportunidade para colocarem suas experiências, expectativas e
a partir disso conseguimos desenvolver temas específicos”.
(Profissional 7)
Estes relatos remetem à atividade educativa no âmbito da Promoção de Saúde,
sendo sugerida uma postura diferenciada em relação às estratégias didáticas,
evidenciando a possibilidade da participação ativa dos educandos.
Freqüência
Quanto à freqüência das atividades educativas, foram significativas as seguintes
falas:
“As atividades educativas são esporádicas”.(Profissional 14)
“Atividade educativa é algo que acontece, esporadicamente,
fora do contexto, especificamente, terapêutico. Não cria
vínculo, mas organiza-se num trabalho com começo, meio e
fim”. (Profissional 5)
Considerando a realização de atividades regulares registramos falas explicitando
espaços de tempo tão prolongados entre elas que caracterizariam, na verdade, como
sendo esporádicas.
91
“Promovo atividades de dois em dois meses, [com vagas] para
vinte pessoas; depois troco a turma [de pacientes, mas], só que
poucos aderem[ao grupo]”. (Profissional 4)
“Há atividades [que são realizadas] de três em três meses”.
(Profissional 1)
“[As
atividades
são
realizadas]
a
cada
seis
meses”.(Profissional 7)
“Algumas [atividades] são semanais, outras
eventuais”.(Profissional 3)
O caráter esporádico foi mencionado repetidas vezes, variando o espaço de
tempo que separa uma atividade educativa das outras. Ao lado de respostas dessa
ordem, chama a atenção, a consideração de que:
“Gostaria que [as atividades educativas] fossem freqüentes,
mas, não consigo”.(Profissional 2)
Além do caráter esporádico das atividades educativas no Programa de
reabilitação, vale dizer que algumas delas começam e terminam sem desdobramentos
posteriores. Tais informações fortaleceriam a visão de que “as práticas de educação em
saúde são“enfeites” na rotina de atendimentos, com aparência progressista, mas sem
resultados significativos”, como coloca VASCONCELOS (1999).
Menos da metade dos entrevistados mencionaram a realização freqüente de
atividades educativas, considerando a periodicidade de menos de um mês:
“[É uma atividade realizada] uma vez por semana em cada
Unidade Básica de saúde”.(Profissional 8)
92
“Faço um grupo por mês e falo sobre um assunto que a
comunidade está precisando. O posto fica aberto à comunidade
e é lá que vão buscar ajuda que não encontram nas escolas e
em espaços culturais. Os profissionais da saúde têm obrigação
de orientar essas pessoas (....)”. (Profissional 12)
Em relação a este último depoimento registra-se o respeito à população, ao lado
do reconhecimento de que no ato de educar, muito mais do que a consideração de
técnica ou conteúdos a serem ministrados, pressupõe desenvolvimento de uma
participação responsável, atendendo aos princípios do PSF (BRASIL, 1997).
Avaliação das Atividades Educativas
A avaliação destas atividades nos depoimentos profissionais, aparece como
produto de relato de pacientes, de agentes comunitários de saúde, reportando a
constatação do número crescente de pessoas que participam destas atividades:
“Faço duas avaliações: (...) observo o retorno dos pacientes em
outras atividades, e (...) o retorno trazido pelas agentes
comunitárias, pelos médicos e enfermeiros da equipe de saúde
da família”.(Profissional 6).
“A avaliação que tenho vem do relato dos agentes
comunitários que acompanham de perto a vida dessas pessoas”.
(Profissional 9)
“(...) faço um questionário e eles próprios avaliam. O que
observo é que o número de participantes sempre aumenta”.
(Profissional 8)
93
“Sempre passo um questionário para saber o que acharam da
apresentação”.(Profissional 7)
Salvo indícios esporádicos da intencionalidade da avaliação, parece prevalecer o
caráter informal dessa prática, ancorado em apreciações pessoais, reiterando
observações realizadas anteriormente na consideração dos questionários. Ao lado do
possível despreparo apontado anteriormente, as referências aos componentes da
organização prévia das atividades educativas, não dão conta de um tratamento
sistemático, inexistindo informações relativas à realização de um planejamento
participativo – em contraposição ao normativo - nos termos apontados por BATISTA
(2005) e GOLDENBERG (2005), onde a avaliação constitui um instrumento de
reorientação das atividades em curso.
Em meio à sinalização de aproximações, tanto em relação ao modelo tradicional
de ensino, quanto ao modelo dialógico, no sentido atribuído por ALVES (2005), estes
resultados apontam para a heterogeneidade de formação dos profissionais da
reabilitação. Reafirmando a propriedade da atualização neste campo de conhecimento, a
consideração das práticas educativas, no âmbito do PSF induz à consideração das
condições propiciadas pela instituição – o que nos remete aos limites e potencialidades
identificadas no exercício das práticas referenciadas.
Limites e Potencialidades
Em relação às dificuldades e facilidades relativas ao desenvolvimento de
atividades educativas, os profissionais referiram, com destaque, a falta de tempo e/ou de
apoio institucional:
“[Encontro] dificuldade [pela falta] de tempo, burocracia,
disposição das pessoas, adesão de outros profissionais.
[Considero que] não têm facilidades, uma vez que convido as
pessoas, me empenho e elas não notam [o esforço que a
atividade envolve]”.(Profissional 2)
94
“As maiores dificuldades são a falta de tempo e dispor de
autorização da supervisão da saúde. E as facilidades acontecem
quando somos autorizados (...), há um bom espaço e temos
recursos materiais”. (Profissional 7)
“[As dificuldades que] encontro são a [falta de] tempo, falta de
material, falta de apoio. A facilidade é que a comunidade está
sempre disposta a ajudar”.(Profissional 12)
“As dificuldades que encontram são: a falta de material, tempo,
a carga horária, trabalhar em várias unidades. E a facilidade é
o
interesse
da
comunidade
neste
tipo
de
atividade”.(Profissional 3)
“Acho difícil montar uma atividade educativa com outros
profissionais, realizo sozinha. Quanto mais olhares sobre o
grupo, mais há possibilidades de mudanças. A facilidade é do
resultado [que] é visível; as pessoas mudam [com a
atividade]”. (Profissional 9)
O argumento da falta de tempo, reiterada pelos vários profissionais, se associa
certamente, ao trabalho em várias unidades. A falta do apoio institucional também se
traduziu, na expressão dos profissionais, referenciada a limitada valorização, da parte
dos profissionais, para participar das atividades educativas grupais, bem como, às
dificuldades burocráticas da autorização para a realização de atividade. Num outro
plano o apoio foi referenciado à questão da falta de recursos materiais. Nesse sentido, de
acordo com os relatos, pudemos constatar que, a instituição, não proporciona espaço
efetivo para o desenvolvimento das atividades educativas.
95
Mereceu destaque o reconhecimento de limitações relativas à capacitação
técnica para o desenvolvimento das atividades educativas grupais, conforme refere o
depoimento que se segue:
“Considero [dificuldade a] falta de uma estratégia mais
técnica; percebo que outros profissionais, como os da fono, têm
mais facilidade. A facilidade que tenho é de expressar-me muito
bem através das palavras”.(Profissional 11)
Esse relato distingue a falta de treinamento técnico relativo ao domínio das
questões referentes à dinâmica grupal, ressaltando a diversidade de formação existente
entre os profissionais que integram a equipe de reabilitação. Estes dados coincidem com
as considerações realizadas anteriormente sobre a falta de consideração das atividades
educativas no curso de capacitação para a atuação no PSF, que assim reduz o
aprendizado às vivências empíricas esporádicas enfrentadas na prática, sem um preparo
consistente.
A participação da comunidade, por sua vez, ao constituir a medida de sucesso
das atividades educativas, traz o contraponto das dificuldades referidas quanto à
possibilidade de sua mobilização para compor os grupos. Nesse contexto, contar com a
participação da comunidade, constitui de um lado como condição facilitadora; de outro,
sua ausência aponta para o insucesso do empreendimento:
“As dificuldades [estão relacionadas] aos horários limitados,
ao espaço físico e pouca ou nenhuma verba. [Como facilidade]
a adesão e o interesse da população”. (Profissional 1)
“[Como dificuldade encontro uma] comunidade que não adere,
e facilidade quando as pessoas compreendem o que está sendo
dito”. (Profissional 10)
96
Delineia-se, assim, o caráter contraditório e/ou complementar da consideração
da adesão da comunidade como uma condição que dificulta ou facilita a execução de
uma atividade educativa - o que, em certa medida, também pode refletir a capacidade do
profissional em planejar e executar a atividade educativa de forma competente.
Capacitação profissional
Dimensionando o contexto institucional do exercício das práticas educativas
grupais, coloca-se a questão do preparo para o exercício das atividades educativas em
grupo - 75% dos profissionais referiram falta capacitação:
“... estamos mais acostumados a palestras. O profissional
detém o saber e não está preparado para ouvir, valorizar e
conhecer a verdade do outro. Não somos formados para isso,
aprendemos
a
fazer
avaliação,
diagnóstico
e
terapêutica”.(Profissional 6)
Ao lado da capacitação técnica os depoimentos ressaltam os limites de uma
experiência fundada na prática, sem subsídios “teóricos” para avançar no desempenho
das atividades educativas:
“... se houvesse uma capacitação facilitaria muito, nós nos
sentiríamos mais estimulados para ler, pensar, discutir. Muitas
vezes, ficamos só na prática e é importante saber o que as
pessoas estão pensando”.(Profissional l2)
Conforme referido anteriormente é reiterada a diferenciação em termos de
formação no âmbito da graduação entre as categorias de profissionais da equipe de
reabilitação:
“... como fisioterapeutas não temos formação para isso. A
fonoaudiologia e a terapia ocupacional têm mais vivência.
97
Falta ao profissional conhecer esse tipo de abordagem e usa-la
a favor de seu trabalho”.(Profissional 4)
Estas diferenças, além de apontar para deficiências na formação, comportam
desencontros
no
exercício
das
práticas
educativas
no
âmbito
da
equipe
multiprofissional, associadas ao conceito de saúde subjacente à concepção de Promoção
de Saúde.
“Se a relação saúde/doença for entendida como uma causa e
você trabalhar somente a causa, há uma limitação. A saúde é
algo global, os profissionais têm que fazer parcerias, mas eles
não acham importante trabalhar em equipe. O conceito que eles
têm de saúde é diferente e isso implica na ação de cada um.
Não tem como preparar isso. Será que dar uma aula de como
fazer uma atividade educativa resolveria?” (Profissional 9)
“Falta-nos uma mudança no olhar. Se você acha que saúde só
tem a ver com algumas coisas e não com uma mudança
ambiental, social, psíquica, trata-se o assunto do ponto de vista
orgânico, como causa e efeito. Se você olha com uma visão
mais ampla suas ações e suas buscas na literatura serão
diferentes, entram questões de formação, de como a pessoa se
constituiu, a visão de saúde que ela têm, no que ela acredita”.
(Profissional 9)
Em 100% dos casos os profissionais pesquisam material de apoio para a
construção de atividades didáticas, sendo significativas as falas:
“... procuro material como fotos, material de fisioterapia;
estudo; anoto o que vou falar”. (Profissional 1)
“Recorro a textos de saúde pública, noticias de jornal, material
de artes. Há um site sobre uma revista que fala da interface
98
entre a saúde e a educação, que fala sobre vínculo,
acolhimento, com linguagem fácil, nada técnico”. (Profissional
12)
Estas falas remetem tanto à busca no âmbito das especialidades como no âmbito
da Saúde Pública. Tal esforço aponta para a necessidade de dimensionar as intervenções
no âmbito da Saúde Coletiva, o que pressupõe o equacionamento da reabilitação no
âmbito da Promoção de Saúde – que, certamente, constitui um campo de atuação em
construção.
Em relação às necessidades de capacitações profissionais foram enfáticos:
“Isso sim falta, porque muito do que faço é por iniciativa
própria: faço tudo sozinha. Tem profissionais que não tem esta
vontade, não por não querem, mas, porque têm um dia corrido.
Se esse assunto [atividade educativa] fosse focado no
Introdutório no Pólo de capacitação, por mais que fossem
momentos curtos e rápidos, talvez nos sentiríamos mais
estimulados a
ler,
a discutir,
a saber, o
que esta
acontecendo(...), é a coisa do estímulo, mesmo, de ir querer
pensar, querer discutir. Muitas vezes ficamos só na prática, mas
precisamos de um subsídio teórico para saber como esta aquilo.
Às vezes ficamos muito distantes só na prática, mas é
importante saber como os autores estão pensando. As vezes o
que estão escrevendo está muito longe do que estamos
fazendo”.(Profissional 12)
“Creio que é importante saber porque alguma atividade não
deu certo, assim uma capacitação seria muito útil”.
(Profissional 3)
Sem desconsiderar a importância de uma capacitação específica para o exercício
das atividades educativas grupais, alguns entrevistados questionam as restrições que um
99
curso pode comportar, diante da natureza e do contorno mais amplo da formação.
“Acho que tudo está relacionado à formação da pessoa. Se esta
formação for rígida, centrada, não vai adiantar (...) talvez fosse
interessante mostrar o quanto se ganha, ouvindo, trocando-se
idéias e não só falando, falando”. (Profissional 5)
“Mas acho que isso [a forma como é realizada a atividade
educativa] seja do conceito que eles tem de saúde que é
diferente [de uma concepção ampla de saúde], então, isso
implica na ação que eles irão fazer. Não acho que seja falta de
preparo, acho que nem tem como preparar muito para
isso”.(Profissional 9)
Estas manifestações de resistência conclamam a necessidade de uma capacitação
para além da instrumentalização das atividades educativas. Trata-se, a propósito, não só
de questionar os referenciais teóricos metodológicos do processo de ensinoaprendizagem, mas de compatibilizar estes processos com a concepção condizente de
Promoção de Saúde. Isso pressupõe, ao lado do movimento instrucional, a criação de
espaços de reflexão, em âmbito institucional, de forma a propiciar o desenvolvimento de
um campo de conhecimentos e práticas em construção.
100
5 Considerações Finais
Os profissionais de Reabilitação que atuam na Coordenadoria Leste de São
Paulo/ Santa Marcelina realizam atividades educativas grupais. Sendo jovens, eles
participam de um programa novo e inovador, chamando a atenção a ausência de preparo
para exercício destas atividades no curso de capacitação para o PSF.
Dirigidas para funcionários e comunidade, a grande maioria destas atividades
educativas ocorrem no espaço das UBS, não sendo utilizada a potencialidade que o PSF
proporciona, no sentido de uma atuação no espaço das vivências da população.
Em meio à abrangência da área de atuação sob os encargos dos profissionais de
reabilitação, as atividades educativas se fazem, na maioria dos casos, de forma
esporádica, envolvendo, inclusive, intervalos superiores a três meses. Não constituindo
propósito do presente estudo, verificar se esse volume atende, ou não, aos 10%
reservados para atividades de Promoção de Saúde, é preciso cuidar do fato de que esta
normalização, também, não esteja engessando as atividades que pretende resguardar considerada esta norma como indicativa das dificuldades de operacionalização do
conceito de Promoção de Saúde na prática profissional.
Cumprindo com os aspectos formais da organização das atividades grupais,
busca-se a participação de outros profissionais – em que pese as dificuldades
encontradas nesse sentido – assim como, tem presente a requisição do número mínimo
de participantes, que constitui um item de dificuldade a ser enfrentado.
As estratégias por sua vez, dão conta, em parte, da participação ativa dos
educandos, condição para a caracterização da incorporação de práticas dialógicas,
compatíveis com a lógica do PSF.
Quanto ao planejamento e avaliação das atividades educativas grupais, o estudo
sinaliza para a informalidade de seu tratamento. Estes resultados apontam para a
propriedade de investir na atualização dos profissionais de reabilitação, no sentido de
101
instrumentalizar, para além do planejamento normativo, o entendimento da avaliação,
como recurso de retroalimentação das disposições relativas às atividades desenvolvidas,
de forma a garantir a (re) adequação à dinâmica de uma realidade em construção.
A propósito da qualificação das práticas educativas grupais, o estudo observa
indícios de aproximações tanto à posturas higienistas como a concepções de promoção
de saúde, que conferem a marca distintiva do PSF – condizente com a falta de preparo,
nesse campo, para atuar no PSF.
As considerações sobre os objetivos e a importância das atividades grupais
reafirmam a convivência dessa dupla vertente associada ao modelo tradicional - de
caráter transmissivo, com a comunicação unilateral e de cunho comportamentalista tanto quanto ao modelo dialógico. Vários depoimentos são expressivos quanto a esta
identidade, explicitando, a propósito das estratégias adotadas, a participação ativa dos
educandos, partilhando a idéia de um processo de co-responsabilidade no
equacionamento dos problemas vividos na realidade, na abrangência da atuação das
UBS.
Estas apreciações comportam duas ordens de consideração. Num primeiro
plano, elas reportam a heterogeneidade e possíveis desencontros no seio da própria
equipe profissional. Num outro plano, para além da dicotomia estrita observada na
qualificação das atividades educativas grupais, ressalta-se a idéia de que os propósitos
da Promoção de Saúde no PSF se associam à estratégia dialógica, na medida em que
pressupõem o desenvolvimento da autonomia do educando, como requisito da coresponsabilidade entre o serviço e a população. E, é sobre este eixo que se delineia o
papel da atividade educativa: como elemento adicional aos procedimentos curativos,
que legitimam o caráter esporádico (enfeite) de sua realização, ou, como atividade que
mantém uma relação orgânica com a promoção de saúde.
Na verdade, a opção por qualquer estratégia e a correspondente concepção do
processo ensino-aprendizagem, não se estrutura independente da concepção de saúde e
de promoção. Sem excluir ou descaracterizar as atividades curativas, se trata de
redimensionar práticas no âmbito da Promoção de Saúde. A propósito, compatibilizar a
102
reabilitação com a Promoção de Saúde implica, certamente, num desafio. Ao lado do
movimento de desconstrução das marcas de um termo cunhado pelo modelo da História
Natural da Doença (LEAVELL E CLARK, 1965), esse desafio envolve o
desenvolvimento do espaço de uma nova construção.
Sem dúvida, esse esforço pressupõe investir na capacitação profissional – o que
implica numa disposição institucional de minimizar os limites apontados em relação à
falta de tempo dos profissionais, aos requisitos burocráticos e materiais para o exercício
das práticas educativas. Para além destas observações, entretanto, se trata de cuidar das
atividades educacionais a serem inscritas num espaço de reflexão compromissado com o
pensar e repensar a reabilitação, no âmbito da Promoção de Saúde e no âmbito do
Programa de Saúde da Família.
RECOMENDAÇÃO
Com base nessas apreciações, o estudo recomenda o
desenvolvimento de um aprimoramento dos profissionais de
reabilitação em relação às atividades educativas grupais,
como subsídio para a concretização da participação ativa da
comunidade associada à concepção de promoção de saúde,
no contexto do Programa de Saúde da Família.
Registramos a apresentação e discussão desta proposta no IV Encontro
ReabLeste da Prefeitura Municipal de São Paulo, no dia 12 de julho de 2007, a
qual foi endossada pelos profissionais (anexo 8).
103
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ANEXOS
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Resumo / Abstract