6 Segunda-feira, 9 de novembro de 2015 ENERGIA Brasil investe em tecnologia nuclear O tema é polêmico. Não há como falar em energia nuclear sem mencionar episódios dramáticos que marcaram a história, caso do bombardeio de Hiroshima e Nagasaki, na Segunda Guerra Mundial, e acidentes radioativos como os ocorridos nas usinas de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986, e de Fukushima, no Japão, em 2011. No entanto, a tecnologia que causou tragédias também é utilizada para salvar vidas e gerar a tão sonhada energia sustentável. E é nesta segunda opção que muitos países querem apostar, inclusive o Brasil. Cristine Pires [email protected] A fonte nuclear envolta em uma nuvem de estigmas também permite a realização de diagnósticos e terapias para pacientes e se transforma em recurso de energia limpa. E, no que depender do esforço de diversos países, entre eles o Brasil, é a serviço da saúde e do abastecimento sustentável que esta tecnologia estará focada. Hoje, três grandes projetos estão na linha de frente do governo brasileiro: a instalação de novas usinas nucleares, o que inclui a conclusão de Angra 3, a construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) para a produção de radiofármacos e o desenvolvimento de reatores de propulsão naval. Em março do ano passado, 35 países comprometeram-se a adotar uma aplicação mais rigorosa das regras internacionais de segurança nuclear, de forma a minimizar riscos de acidente e proteção contra ações terroristas. A determinação dessas nações, que são signatárias do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, é para que os reatores nucleares deixem para trás o papel de vilões e passem a ser vistos como solução para necessidades diárias da população. “A energia nuclear carrega um estigma que não se justifica mais hoje em dia”, destaca Paulo Fichtner, professor titular do Departamento de Engenharia Metalúrgica e pesquisador da equipe do Laboratório de Implantação Iônica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). As técnicas nucleares em ou- tras áreas, na verdade, já são velhas conhecidas do público, caso da radioterapia, utilizada em pacientes com câncer. Além de diagnósticos, exames e terapia de tumores, também são aplicadas em pessoas que sofrem de doenças renais, pulmonares, neurológicas e cardiovasculares, entre outras. O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), em São Paulo, é o responsável por produzir a maior parte dos radiofármacos utilizados em cerca de 80% dos procedimentos adotados na Medicina Nuclear. Do reator IEA-R1, saem mais de 30 tipos diferentes, que permitem oferecer mais de 430 variações de serviços e a realização de 2 milhões de procedimentos, por ano, no Brasil, conforme dados da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). Deste total, cerca de 30% são cobertos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, o volume produzido pode crescer de forma exponencial ao eliminar a dependência de matéria-prima importada. Atualmente, apenas quatro reatores nucleares - no Canadá, na Holanda, na África do Sul e na Bélgica - atendem toda demanda mundial. Uma interrupção na produção do reator do Canadá já fez com que pacientes que dependem da Medicina Nuclear, inclusive no Brasil, ficassem sem atendimento por falta dos radiofármacos necessários. O RMB, que terá investimentos estimados de US$ 500 milhões, não só garantirá a autonomia de fontes radioativas para a área da saúde como também possibilitará que os radioisótopos também sejam aplicados para produtos na indústria, em processos de proteção ao meio ambiente e desenvolvimento da agricultura, com a preservação de alimentos. A licença prévia para instalação do reator, que será feita em Iperó (SP), foi liberada em maio deste ano pelo Ibama, e a estimativa é que entre em operação a partir de 2020. No caso do projeto naval, a iniciativa permitirá não apenas a Como é feita a produção dos radiofármacos Os radiofármacos são preparações farmacêuticas com finalidade diagnóstica ou terapêutica que, quando prontas para uso, contêm um ou mais radionuclídeos. (Anvisa, RDC no 64/2009). A produção se inicia com a obtenção do radioisótopo. Em seguida, o radioisótopo é ligado a uma molécula, capaz de carrear o elemento radioativo a um local de interesse. A produção e o fracionamento dos radiofármacos são realizados em instalações denominadas Células Quentes, que asseguram a proteção dos trabalhadores à radiação. O processo produtivo cumpre com as Boas Práticas de Fabricação de Radiofármacos. FONTE: INSTITUTO DE ENGENHARIA NUCLEAR DA CNEN fabricação de submarinos nucleares voltados ao patrulhamento da costa do País. A usina de conversão de urânio Usexa, no Centro Tecnológico da Marinha, em São Paulo, também irá contribuir para que usinas como Angra 1, 2 e 3, quando em operação concomitante, sejam autossuficientes na conversão da matéria-prima. MARCELO G. RIBEIRO/JC Estudos que pesquisadores desenvolvem sobre a estabilidade de materiais nucleares que compõem os reatores aumentam a segurança do processo