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Mercado imobiliário vive bolha ou ‘calo’?
03 de maio de 2012 | 9h 40
Eduardo Zylberstajn*
SÃO PAULO - Há mais de ano discute-se a formação de uma bolha imobiliária no Brasil. Boa parte
dos argumentos que podem confirmar ou não essa bolha já são amplamente conhecidos, mas a
dúvida persiste.
Uma definição amplamente utilizada para bolha é uma situação de preços descolados dos
fundamentos. O debate e a falta de uma resposta única surgem porque o problema é justamente
como medir corretamente os fundamentos. Qual o valor justo de um ativo? No caso dos imóveis no
Brasil, o problema é ainda mais grave, porque as estatísticas confiáveis do setor são
assustadoramente escassas.
Para auxiliar o acompanhamento do mercado, a Fipe lançou há pouco mais de um ano o Índice
FipeZap de Preços de Imóveis Anunciados. São cerca de 150 mil anúncios válidos por mês para
medir a variação do preço do metro quadrado em 7 regiões do país, coletados na internet. É fato
que o preço anunciado não é o mesmo do que o transacionado, mas é bastante razoável assumir
que, ao menos no médio e no longo prazo, esses valores têm a mesma tendência. Além disso, é
muito difícil observar com precisão preços dos imóveis. A informalidade e a (falta de) estrutura de
boa parte das imobiliárias impedem a coleta sistematizada dessas informações. Os bancos, por sua
vez, mantêm registros fidedignos dos imóveis financiados, mas atendem apenas uma parcela do
mercado (cerca de 50% das vendas) e utilizam, muitas vezes, os valores de avaliações e não
necessariamente o preço acordado entre compradores e vendedores. Em suma: não existe uma
fonte de dados perfeita.
Cabe também mencionar que a iniciativa do FipeZap não é inédita. Há outras experiências com
índices de preços de oferta, como o Home Asking Price Index, da Inglaterra, e o FotoCasa, da Espanha.
Este último, aliás, detectou o estouro da bolha espanhola antes do índice oficial, porque os preços
anunciados estão disponíveis aos institutos de pesquisa meses antes do registro oficial das
transações.
Os anúncios têm também outra grande vantagem: permitem o acompanhamento do preço para
novos aluguéis. Utilizando esta fonte de dados, podemos medir a rentabilidade de se investir em
imóveis, obtida por uma pessoa que escolhe comprar um imóvel e alugá-lo ao invés de investir em
outro ativo. Essa taxa permite inferir se o preço dos imóveis está alto ou baixo, já que compara o
preço de venda do ativo (o imóvel) com o retorno financeiro que ele propicia.
Se a rentabilidade do aluguel fosse alta (20% ao ano, por exemplo) as pessoas prefeririam comprar
imóveis e alugá-los a terceiros ao invés de aplicar o dinheiro em títulos do governo. Por outro lado,
se a rentabilidade do aluguel fosse baixa, como 1% ao ano, as pessoas prefeririam vender seus
imóveis, aplicar o dinheiro e viver em imóveis alugados. Se a rentabilidade do aluguel for baixa,
trata-se provavelmente de uma sitação de preços de venda inflados - a temida bolha.
Em São Paulo, a taxa de rentabilidade do aluguel corresponde a aproximadamente 6% ao ano,
segundo os dados do FipeZap. Muitos especialistas em finanças comparam esse número com a
taxa Selic ou com a poupança e concluem que vivemos uma bolha. A suspeita é reforçada ainda
mais se considerarmos que essa taxa vem caindo desde 2008, quando era de 9%, o que significa
que o preço para venda aumentou mais do que o do aluguel. O problema com essa análise é que ela
compara coisas diferentes: um rendimento real (que despreza a inflação) com um rendimento
nominal. Para ilustrar isso, imaginemos o seguinte: o leitor compra um imóvel hoje e espera
apenas que ele mantenha seu valor real ao longo dos próximos anos (o preço subirá de acordo com
a inflação). O aluguel desse imóvel também seria reajustado de acordo com a inflação, pois os
contratos costumam ser indexados. Assim, o aluguel seria um rendimento real. Para compará-lo
com outros rendimentos, teríamos que considerar o rendimento real e não o nominal.
O gráfico abaixo compara a rentabilidade do aluguel com a taxa de juros média dos financiamentos
imobiliários descontada a expectativa de inflação futura, desde janeiro de 2008. É notável como a
tendência das duas curvas é a mesma, apesar dos juros serem mais voláteis.
O gráfico mostra duas coisas. Primeiro, reforça o argumento de que o aumento nos preços de
venda dos imóveis dos anos recentes se deve principalmente a novas condições, muito mais
favoráveis, de crédito. Segundo, que atualmente há um descolamento de cerca de 1% ao ano entre
os juros reais para financiamento imobiliário e a taxa do aluguel. Para que os pontos finais das
duas linhas voltem a se encontrar, há três possibilidades: uma queda no preço de venda dos
imóveis de cerca de 15%, um aumento nos preços do aluguel de cerca de 18% ou, ainda, uma queda
nos juros reais do financiamento imobiliário de algo perto de 1%. Cabe a ressalva de que a taxa de
juros utilizada como referência é, provavelmente, maior do que a taxa média efetivamente
praticada no mercado, porque diz respeito aos financiamentos que têm os maiores juros.
De todo modo, os dados mostram que para responder se vivemos ou não uma bolha imobiliária,
precisamos responder na verdade se as condições atuais de crédito imobiliário são sustentáveis. Se
não forem, então uma correção um pouco mais forte nos preços pode surgir no momento em que o
crédito se deteriorar. Se forem, no pior dos casos estamos em uma situação de preços de imóveis
um pouco acima do seu valor fundamental. Chamar essa situação de bolha pode então ser um
exagero alarmista, esse sim sem fundamentos. Seria um caso mais simples, não de uma bolha talvez apenas um ‘calo’
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Mercado imobiliário vive bolha ou `calo`?