ALTERAÇÕES CONTRATUAIS
Os arts. 29 e 30 do Regulamento de Licitações e Contratos do Sistema
S disciplinam as situações de alterações nos contratos, que podem ser
realizadas por acordo entre as partes, ou de forma unilateral pela contratante,
nas hipóteses de complementação ou acréscimos que se fizerem nas obras,
serviços ou compras, desde que justificadas.
Para que a entidade possa se valer dessa possibilidade, faz-se
necessário que proceda à devida justificativa no processo, a fim de que se
identifiquem os motivos que respaldam a aludida modificação.
É preciso que exista um fato superveniente, devidamente justificado e
demonstrado no processo para que se vislumbre a alteração contratual. Por
evidente, tal fato posterior deve ser compatível com o interesse público
almejado. Deve restar evidenciado que um fato superveniente alterou a solução
inicialmente adotada pela entidade como a mais apta para a execução do
objeto.
Nessa esteira, é o posicionamento de Marçal Justen Filho:
“Ademais, cabe evidenciar que a alteração decorre de um fato ocorrido ou apenas
descoberto depois da instauração. A instituição do poder de promover a alteração
contratual não significa a ausência de submissão dessa competência à consumação
de um evento posterior à (ou somente conhecido depois da) instauração da licitação.
(...)
Como princípio geral, não se admite que a modificação do contrato, ainda que mútuo
acordo entre as partes, importe alteração radical ou acarrete frustração aos princípios
1
da obrigatoriedade da licitação e isonomia”.
O art. 29 não traçou as hipóteses de alteração por acordo entre as
partes. Apenas exigiu que elas fossem justificadas e formalizadas por termo
aditivo.
Porém, convém ressaltar que o silêncio do Regulamento não atribui às
1
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 15 ed.
São Paulo: Dialética, 2012, p. 880.
1
partes total liberdade, na medida em que nenhuma modificação pode alterar
radicalmente o objeto inicialmente contratado, nem tampouco frustrar os
princípios da obrigatoriedade da licitação e da isonomia.
Sendo assim, cogita-se a modificação do regime de execução, do
modo estipulado para o fornecimento, da forma de pagamento, dentre outras
hipóteses.
Não há no Regulamento nenhuma previsão expressa e clara acerca da
possibilidade de alteração qualitativa do objeto. Porém, interpretando-se
sistematicamente o Regulamento e considerando que, no decorrer da
execução do objeto pode a entidade constatar que a alteração qualitativa é
imprescindível para assegurar a consecução do interesse público, parece-nos
possível identificar tal situação na hipótese contemplada no art. 30 do
Regulamento, principalmente quando o dispositivo refere-se à possibilidade de
complementação.
Esta hipótese envolve, portanto, questões de ordem técnica que
respaldam a alteração do projeto ou de suas especificações para melhor
atendimento ao interesse público almejado pela entidade.
Entretanto, a alteração qualitativa não pode acarretar a desnaturação
do objeto licitado. A alteração do contrato, com assinatura de termo aditivo cujo
objeto, pelas suas características, não é semelhante ao do contrato original,
requer, na verdade, uma nova licitação.2
As modificações quantitativas estão expressamente previstas no artigo
30. Segundo este dispositivo, os contratos poderão ser aditados nas hipóteses
de complementação ou acréscimo que se fizerem nas obras, serviços ou
compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial e de até 50%
(cinquenta por cento) para reforma de edifício ou equipamento, ambos
2
Conforme decisão do Tribunal de Contas da União, processo nº TC 014.681/95-1, Decisão
63/97 – Plenário.
2
atualizados.3
Saliente-se que o artigo foi claro ao aduzir apenas em acréscimos, não
cogitando, portanto, supressões, o que nos leva a concluir que a intenção foi a
de impedir a aludida supressão, pelo menos de forma unilateral pela
contratante.
Dessa forma, os contratos celebrados pelos Serviços Sociais
Autônomos somente poderão ser objeto de acréscimo unilateral, com
fundamento no art. 30, não se vislumbrando supressão de forma unilateral,
imposta pela contratante. É possível cogitar, porém, a supressão decorrente
de comum acordo entre as partes, desde que não desnature o objeto, com
fundamento no art. 29 do Regulamento.
O limite de acréscimo é calculado em face do valor original do contrato,
porém devidamente atualizado (em virtude de reajuste ou revisões).
Considera-se valor inicial atualizado o preço constante no contrato,
acrescido dos reajustes e/ou revisões concedidos ao longo de sua vigência.
Porém, caso o contrato seja acrescido mais de uma vez, nos
acréscimos posteriores, considera-se o valor inicial descontando-se o montante
relativo aos acréscimos já efetivados, na medida em que a base de cálculo
para os 25% é o valor inicial (que será alterado apenas em virtude de reajustes
e/ou revisões, conforme destacado acima).
Nesse sentido, se um contrato que contemple o valor inicial de R$
1.000,00 sofrer um acréscimo de 10%, por exemplo, passando a R$ 1.100,00,
caso seja realizado um novo acréscimo, a base de cálculo será de R$
3
Conforme já decidiu o TCU, por meio do Acórdão 309/2000 – Plenário: “Prestação de Contas.
SENAI MS. Exercício de 1998. Inexigibilidade de licitação na contratação de serviços de
informática. Alteração contratual de serviços superando o limite de 25% previsto no
Regulamento de Licitações e Contratos da entidade. (...) Irregularidades: 2.2.1 - Alteração
contratual de serviços superando o limite de 25%, contrariando o artigo 25 do Regulamento de
Licitações e Contrato do SENAI (rescindiu-se o Aditivo 01 ao Contrato n. 012/97 e firmou-se o
Contrato 123/98)”.
3
1.000,00, tendo em vista que este é montante inicial do ajuste e não R$
1.100,00.
Por outro lado, não estão submetidas a estes limites alterações que
visem à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, tendo
em vista que o dever da entidade de preservar a equação econômico-financeira
do contrato, em sua plenitude, encontra amparo constitucional (art. 37, inciso
XXI).
Com efeito, “não é possível estabelecer limite à recomposição da
equação econômico-financeira. Far-se-á nos limites em que se fizerem
necessários”.4
Outra situação a ser enfrentada, diz respeito a qual valor deve ser
considerado para fins de acréscimo no que tange aos contratos que admitem
prorrogações (nos termos do art. 26, parágrafo único), se seria o valor relativo
ao primeiro período da contratação ou o referente a todo o possível prazo
contratual, inclusive as prorrogações.
Marçal Justen Filho destaca duas interpretações sobre esta hipótese:
“Uma alternativa consiste em reputar que o valor contratual coincide com a soma dos
diversos períodos previstos no ato convocatório. Assim, considere-se a solução
tradicional de o edital previr a contratação por um período de 12 meses, prorrogáveis
sucessivamente até o atingimento de 60 meses. Em tal suposição, o valor do contrato
seria de cinco vezes o montante previsto para cada período de 12 meses.
A segunda alternativa reside em considerar que as contratações se fazem pelo
período previsto no ato convocatório, produzindo-se renovações sucessivas. Nesse
caso, cada contratação é autônoma entre si. Essa solução tem sido adotada depois
da alteração da redação do art. 57, inc. II, da Lei n˚. 8.666 e, em especial, por efeito
das regras de responsabilidade fiscal.
(...)
A adoção da segunda alternativa não produz alteração em face da primeira. Nesse
caso, cada período constituirá uma contratação autônoma. Encerrado o período, o
contrato será renovado e reiniciar-se-á a sua vigência. As obrigações executadas
pelas partes ao longo do contrato serão reputadas como executadas e exauridas. Ou
seja, o valor ‘inicial’ será o valor de cada exercício em que se produzir a renovação.
Existirão cinco contratos diversos, cabendo aplicar o limite de 25% em relação a cada
4
JUSTEN FILHO, Comentários..., p. 924.
4
5
qual”.
Defende-se que, para se evitar a desnaturação do objeto, o limite de
25% deve ser aplicado em relação ao valor inicial do contrato e não em face do
valor de cada prorrogação.
Nesse sentido, se no primeiro ano de vigência contratual for realizado o
acréscimo integral autorizado pelo Regulamento, qual seja, de 25% do valor
atualizado do contrato, não mais será possível a realização de novos
acréscimos, pois já se esgotou, em relação a essa contratação, o limite
autorizado.
Isso porque a prorrogação apenas renova a contratação por um novo
período, nos mesmos moldes das condições iniciais, permanecendo, por
consequência, o mesmo objeto. Sendo o objeto da contratação o mesmo, o
fato de ocorrerem prorrogações do prazo contratual não autoriza a realização
de acréscimo do objeto a cada período, sob pena de desvirtuamento do
permissivo legal, qual seja, o acréscimo do quantitativo do objeto originalmente
previsto, no limite de 25% de seu valor inicial atualizado.
Então, o acréscimo realizado nos primeiros 12 meses de vigência, se
efetivado em sua totalidade, não se renova no ano seguinte, uma vez que para
o próximo ano o contrato já estará com seu valor inicial atualizado e acrescido
em 25%.
Apenas se cogitaria a possibilidade de no ano seguinte realizar-se nova
alteração se, no primeiro ano, o acréscimo tivesse sido menor do que o
máximo estipulado pelo Regulamento.
Ora, o dispositivo legal em comento prevê que o acréscimo considerará
o valor inicial atualizado do contrato, e não o valor referente a cada
prorrogação contratual. Se isto fosse possível, um contrato com vigência inicial
de 12 meses que admitisse prorrogação até o limite de 60 meses, se acrescido
5
JUSTEN FILHO, Comentários..., p. 922-923.
5
em 25% a cada ano, teria ao final sido alterado em mais de 100% seu valor
inicial, o que caracterizaria burla ao limite imposto pelo Regulamento.
Exemplificando, supondo que o contrato possua valor inicial de R$ 100;
vigência inicial de 12 meses, admitindo prorrogações sucessivas até o limite de
60 meses. Se a entidade, no primeiro ano, realizar uma alteração contratual de
10% do valor avençado, este contrato passará a ter valor de R$ 110 e, nos
anos subsequentes, poderá ser realizado acréscimo no percentual de até 15%
do valor atualizado do contrato, até se atingir o limite percentual estabelecido
pelo Regulamento, a saber, 25% do valor inicial do contrato, devidamente
atualizado.
Entretanto, se logo no primeiro ano a entidade contratante acresce o
quantitativo do contrato em 25%, limite máximo permitido, elevando o valor do
contrato para R$ 125, não mais poderá realizar acréscimos, com fulcro no art.
30, nos anos subsequentes de vigência do contrato.
Suscita controvérsia na doutrina, também, a aplicação dos limites
impostos no art. 30 às alterações qualitativas.
Jessé Torres Pereira Júnior defende a aplicação desses limites para
ambas as hipóteses, asseverando que “os limites de 25% e de 50% referem-se
tanto à hipótese da alínea “a” quanto à da alínea “b” do inciso I” da Lei de
Licitações.6
Nesse sentido é o posicionamento do Tribunal de Contas da União,
que já firmou entendimento de que esse percentual é aplicável também para as
alterações unilaterais qualitativas, decidindo que:
“A jurisprudência deste Tribunal, notadamente a partir da Decisão nº 215/99 Plenário, prolatada em sede de consulta, consolidou-se no sentido de considerar que
o limite de 25% para acréscimos contratuais, previsto no art. 65, §1º da Lei nº
8.666/93, aplica-se tanto a alterações quantitativas como qualitativas. Na mesma
66
PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei de licitações e contratações da
administração pública. 6.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 660.
6
decisão, o Tribunal firmou o entendimento de que alterações acima do referido
percentual são possíveis, desde que sejam consensuais, qualitativas, em
circunstâncias excepcionalíssimas, se verificada uma série de condições
especificadas naquela deliberação” (grifou-se) (TCU. Processo n° TC-007.307/20034. Acórdão n° 837/2004 – Plenário. Min Rel. Ubiratan Aguiar).
Aliás, na Decisão 215/99 – Plenário (TCU), que consolidou o
posicionamento da Corte acerca do tema, o Tribunal destacou que esses
percentuais somente poderão ser ultrapassados na hipótese de alterações
consensuais, qualitativas e excepcionalíssimas, sendo imprescindível o
atendimento aos seguintes requisitos:
“- observância aos princípios da finalidade, da proporcionalidade e da razoabilidade,
além dos direitos patrimoniais do contratante;
- não acarrete para a entidade encargos contratuais superiores aos oriundos de uma
eventual rescisão contratual por razões de interesse público, acrescidos aos custos
da elaboração de um novo procedimento licitatório;
- não dê ensejo à possibilidade de inexecução contratual, à vista do nível de
capacidade técnica e econômico-financeira do contratado;
- decorra de fatos supervenientes que impliquem dificuldades não previstas ou
imprevisíveis por ocasião da contratação inicial;
- não acarrete a transfiguração do objeto originalmente contratado em outro de
natureza e propósitos diversos;
- sejam tais alterações indispensáveis à completa execução do objeto original do
contrato, à otimização do cronograma de execução e à antecipação dos benefícios
sociais e econômicos decorrentes;
- seja comprovado que as conseqüências de outra alternativa (rescisão contratual,
acompanhada de nova licitação) importariam sacrifício insuportável ao interesse
público primário (interesse coletivo) a ser atendido pela obra ou serviço, ou seja,
gravíssimas a esse interesse, inclusive quanto à sua urgência e emergência”.
Em se tratando de licitação por lotes, como deve ser calculado o limite
de 25%? Sabe-se que, numa licitação por lotes, é como se cada lote
representasse uma licitação distinta, daí porque referido percentual deve ser
aplicado em cada lote, ou seja, tratando-se de três lotes distintos, cada lote
poderá ser acrescido em 25%, devendo-se, porém, aplicar referido percentual
proporcionalmente em relação aos itens que compõem o lote (caso o lote tenha
sido dividido em itens). Nessa linha tem defendido o TCU:
“Serão proporcionais aos itens, etapas ou parcelas os acréscimos ou supressões de
quantitativos que se fizerem necessários nos contratos. Diante da necessidade de se
acrescer ou suprimir quantidade de parte do objeto contratado, deve a Administração
7
considerar o valor inicial atualizado do item, etapa ou parcela para calcular o
7
acréscimo ou supressão pretendida”.
Questão que surge é pertinente à possibilidade de compensações
entre acréscimos e supressões. Ou seja, seria possível compensar uma
supressão de 30% do objeto, com posterior acréscimo no mesmo percentual,
ainda que o valor inicial não se altere? O Tribunal de Contas da União tem
manifestado posição no sentido de que os acréscimos e as supressões devem
ser calculados separadamente, sem qualquer tipo de compensação entre eles:
“2. Os limites mencionados nos §§ 1º e 2º do art. 65, da Lei nº. 8.666/93 devem ser
verificados, separadamente, tanto nos acréscimos quanto nas supressões de itens
ao contrato, e não pelo cômputo final que tais alterações (acréscimos menos
decréscimos) possam provocar na equação financeira do contrato (...).
(...)
Não é permitido, por exemplo, que haja um acréscimo de 30 e uma redução de 30,
mesmo considerando que o valor permanecerá inalterado (100)”. Decisão 215/99 –
Plenário.
“Alterações contratuais unilaterais quantitativas: 1. Aplicação dos limites legais ao
conjunto de acréscimos e ao conjunto de supressões, individualmente e sem nenhum
tipo de compensação entre eles”. Acórdão 1200/2010 – Plenário.
“O conjunto de reduções e o conjunto de acréscimos devem ser sempre calculados
sobre o valor original do contrato, aplicando-se a cada um desses conjuntos,
individualmente e sem nenhum tipo de compensação entre eles, os limites
estabelecidos no referido dispositivo legal”. Acórdão 1338-2010 – Plenário.
Por derradeiro, não se pode esquecer que as alterações qualitativas e
quantitativas, tidas como unilaterais, conferem à entidade prerrogativa de impôlas ao contratado até o limite legal previsto. Contudo, isso não afasta o dever
de a entidade comunicar previamente o contratado, que poderá se manifestar
acerca da referida alteração.
Em qualquer hipótese, a alteração deverá ser formalizada por termo
aditivo, no qual conste a identificação do contrato, o objeto, as alterações
introduzidas e os recursos para atendê-las, bem como cláusula de manutenção
das condições anteriores não modificadas pelo referido aditivo.
7
TCU. Licitação e Contrato..., p. 804.
8
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