{1}
Attribution-NonCommercialShareAlike 3.0 Unported
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{3}
* Lúcia Fernandes Lobato
(Universidade Federal Da Bahia - BRA)
{em_01 - Estado da arte (da
arte). Junho– 2010
{{em_01 em Inglés e espanhol
disponível em
http://emergenciaemergencia
emergencia.com
Portada/Cover {{em_01: estado da
arte da arte.
Foto/Photo: Miler Lagos Sombrillas Luminosas (2001)
{{em_rgencia} e possível nesta
edição em agradecimiento a:
Colaboradores
* Santiago Eraso (ESP)
* Guillermo Vanegas
* Maria Mercedes Salgado
* Alvaro Herrera
* Miler Lagos
* Luis Camnitzer (URU)
* Paula Silva
* Hunza Vargas
* Lucas Ospina
* Victor Laignelet (Universidad Jorge
Tadeo Lozano)
* Carlos García (Universidad
Javeriana)
* David Lozano (Universidad
Nacional de Colombia)
* Milianie Lage Matos (BRA)
* Andres Murillo
* Liliana Cortés (Facultad de Artes
ASAB - Universidad Distrital)
* Amigos de la Libertad de Nicolas
Castro
Equipe Editorial - Colômbia
Maria Fernanda Ariza
Carlos Guzmán Cuberos
David Ayala Alfonso
Alix Camacho Vargas
Juliana Escobar Cuéllar
William Gutiérrez
Equipe Editorial - Brasil
Direção executiva/
Milianie Lage Matos
Produtor editorial/
Andres Sebastian Murillo
Tradução português/
Unamorinmanente
Dora á Curadora
Marcelo Delcampo
Gaston D’Maquilart
Desenho / Design
0,29 Edições
5 //Editorial
8 {{ENTRE_VISTAS}
Encuesta aos programas
universitários de artes
ROGOFF. (Tradução: Unamorinmanente)
20 IRIT
FREE*
VARGAS.
26 HUNZA
TEORIA E PRÁTICA, NA MINHA OPINIÃO
FERNANDA ARIZA.
30 MARIA
ESTADO DE EMERGÊNCIA
ERASO.
34 SANTIAGO
SEDUÇÕES E RUPTURAS
HERRERA.
42 ÁLVARO
UMA VOLTA RE-VOLTA
46 LUIS CAMNITZER.
A CORRUPÇÃO NA ARTE /
A ARTE DA CORRUPÇÃO
64 PAULA SILVA.
COPY WRIGHT - COPY WRONG
Salvo nos casos mencionados,
o conteúdo de {{em_rgencia} é e
pode ter distribuição pelas licenças
siguintes:
DE LA LIBERTAD DE NICOLÁS CASTRO.
78 AMIGOS
AMIGOS DA LIBERDADE DE NICOLAS CASTRO
90 LUCAS OSPINA.
O CIDADÃO KASTRO (COM K DE KAFKA)
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{4}
{5}
CORTÉS.
100 LILIANA
[RES] III Coloquio de estudantes de artes plasti-
cas e visuais em Bogotá-Colômbia
DELCAMPO
104 MARCELO
GASTÓN D´ MAQUILART
DORA A CURADORA
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{6}
{7}
social da arte na nossa sociedade
a partir dos seguintes eixos de
problematização:
Editorial
Equipe Editorial de {{em_rgencia}
[email protected]
}
Quando falamos da política e seu
exercício nos remetemos, por partes,
à série de fenômenos que involucram
ao ser em comunidade, além de
entender este fato extraordinário
como uma possível forma de
manifestação, nos referimos a um
amplo, porém torcido, processo
de reflexão tanto artística, quanto
acadêmica e política. Mas não
se trata unicamente de enunciar
o pouco quanto a ordem tem
mudado, ou melhor, o governo das
coisas, o importante deste assunto
seria a possibilidade de reconhecer
o por quê tem acontecido essas
mudanças, com o ânimo de
possibilitar uma transformação da
citada ordem nos cruzamentos onde
a academia e a prática artística se
vinculam com o cotidiano.
A nossa reflexão sobre o discurso
contemporâneo se situa desde
uma resignificação histórica e
política que se relaciona com a
proposta de uma ação cambiante
apropriada a nossa época, a qual
nasce do entendimento da relação
de sustentabilidade da arte desde
as instituições, de maneira que esta
dependência nos faz pensar na
prática artística em conjunto com
sua definição conceitual.
Desde este panorama acreditamos
que o alçar a voz, pronunciar
fortemente e estabelecer um
(contra)ponto de partida que ative
uma nova atitude, um temperamento
que discirna, que se oponha, que
seja propositivo e permita que a
consciência política se dissemine
pelo espaço. Achamos que é desta
maneira que o manhoso da arte pode
ser aproveitado, evitando a redução
do espectador à leitura de discursos
projetados
indiscriminadamente
sobre as formas permitiremos
que possa ser mobilizado a reestudar a própria imagem que vai
ser projetada agora enquanto ele
morre. {{em_01: estado da arte
(da arte) se distancia das unívoca
mirada jornalística e gera uma visão
crítica sobre a prática e a função
FENÔMENO.
Dinâmicas
particulares que afetam e dão forma
a nosso contexto. Por exemplo,
o narcotráfico na Colômbia e sua
relação com o mercado da arte é
fenômeno, que desde nosso ponto
de vista tem sido estudado demais,
agora de maneira propositiva nós
pensamos: Quais poderiam ser
outros fenômenos que importaria
estudar?
ACONTECIMENTO. Fatos que
durante
o
desenvolvimento
permitem refletir sobre a maneira
como os diferente agentes culturais
participam e constroem o campo da
arte. Neste eixo nós pensamos na
maneira como as disciplinas são
pensadas localmente e como se
constroem a partir das conexões,
contextualizamos e analisamos a
maneira como os temas se subjugam
os líderes de opinião internacionais
(revistas, eventos, personagens,
jornais, etc.). Nesta caso um exemplo
e o caso de Nicolas Castro[1] e
nosso questionamento, analise e
visualização se desenvolvem ao
redor da reflexão que o circuito da
arte gerou sobre o tema.
RECEPÇÃO/TRADUÇÃO.
As
perguntas que nos interessam são:
Por que se dão estas tendências?
Que dinâmicas são significativas
no intercâmbio local-internacional
em relação a arte contemporânea?
Que papel joga a história da arte
na construção do meio local e
vice-versa?
Quais
problemas
de tradução cultural surgem ao
interior das próprias dinâmicas
do campo artístico das diferentes
localidades?
ACADEMIA. A visão que tem
determinada «escola» da arte da
cidade e o país afeta profundamente
a construção dos diferentes
imaginários sobre a disciplina. Um
olhar sobre a olhar dos diferentes
programas
das
determinadas
cidades, em perspectiva com
alguns programas nacionais e
internacionais.
O projeto emergente esta para
pensar o acontecimento como uma
estrutura complexa sustentada por
meio da articulação de momentos
relacionados e característicos.
Por considerar mais que uma
urgência, a emergência não
redutível das partes ou processos a
suas diferentes interações.
Porque é possível afetar a trajetória
de nosso Tempo, através de
processos analíticos e conceituais
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{8}
{9}
com um caráter
visualizável.
pratico
e
Assim que frente a você tem esta
incitação a ser parte de um continuo
diálogo transformador, em uma
mutação associada que emerge
sem mais preâmbulos à novidade
“radical” do ser-em-comum.
}
Notas
1.
Estudante universitário
Colombiano
que
foi
preso
pelo governo por causa de um
comentário, que fez via Internet,
contra um dos filhos do presidente,
de maneira que agentes locais e até
o FBI estadunidense participaram de
sua captura, sendo posteriormente
preso até que a justiça mostrou que
tudo tinha sido um fato de paranóia
governamental que prejudicou a um
jovem ingênuo.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{11}
UNIVERSITÁRIOS
DE ARTES
1.
DANZA
CONTEMPORÂNEA - UNIVERSIDADE
FEDERAL DA BAHÍA (BR)
2. ARTES VISUAIES - UNIVERSIDADE JAVERIANA
3. BELAS ARTES - UNIVERSIDADE JORGE TADEO LOZANO
4. ARTES PLÁSTICAS - UNIVERSIDADE NACIONAL DE
COLÔMBIA*
*Disponível em versão de
audio no endereço: http://www.
emergenciaemergenciaemergencia.com/
revista/index.php/e-01-portugues/em-01encuesta-aos-programas-universitariosde-artes/
Encuesta aos programas
universitários de artes
Equipe editorial de {{em_rgencia}
revista@emergenciaemergencia
emergencia.com
}
{{entre_vistas}
{{em_01:
ENCUESTA
AOS PROGRAMAS
Com o intuito de oferecer leituras
diversas sobre o lugar outorgado
à prática e o discurso da arte no
espaço acadêmico, e como as instituições educativas concebem o
problema da arte em relação com
seu entorno e as dinâmicas sociais
e econômicas que lhe afetam (e às
que afeta), apresentamos algumas
perguntas que feitas atualmente em
diversas universidades da cidade
de Bogotá, algumas instituições
Brasileiras e dos Estados Unidos. A
seguir publicamos as respostas das
universidades que se manifestaram.
Revise esta página com freqüência
para conhecer as novas respostas
dos participantes.
1
Asumiendo as condições antagônicas próprias de cada contexto como se entiende a arte e
embaixo de que termino se ensina
desde a academia?
2
Num contexto que não está
familiarizado com as teorias que
sustentam as práticas artísticas
contemporâneas, para você, qual
é o efeito que a academia exerce
sobre a maneira de pensar-fazer
arte?
3
Partindo de uma reflexão
sobre os fenômenos que involucram a pessoa em comunidade,
como se pensa a arte através das
relações espaço-temporais que a
sustentam?
4
Neste sentido, para você,
quais podem ser os riscos de institucionalizar as diferentes práticas
artísticas inerentes a processos
dissidentes?
{12}
{13}
DANZA CONTEMPORÁNEA UNIVERSIDAD FEDERAL DA BAHÍA
LÚCIA FERNANDES LOBATO*
1
LÚCIA FERNANDES: Considero que a arte compreende as
escrituras sensíveis de cada tempo
e testemunhos de sobrevida na
morte das conjunturas civilizatórias. Nesse sentido, para mim
a arte é testemunho da vida dos
homens, suas ideologias, suas
histórias e trajetos coletivos no
mundo. Até pouco tempo a Arte
era pouco considerada na Academia em função da hierarquia
das ciências exatas e a primazia
da razão sobre o conhecimento
sensível. Hoje, no entanto, esta
questão está sendo superada, eis
que estamos em tempos da incerteza e do risco nos quais até as
ciências exatas já não se consideram tão exatas assim. Nem se ousa
pensar em verdade universal e a
probabilidade substitui a comprovação! Nesse contexto contemporâneo a Arte na academia alcançou
status, inclusive na pesquisa com
a criação dos cursos de pós-graduação em Artes e o grande número
de graduações que estão sendo
implantadas.
o constitui. O perigo não está na
institucionalização e sim em se
tornar um modelo tão rígido quanto
a sua referência. Segundo Derrida quando o sujeito tem que se
afrouxar do logocentrismo para se
reconhecer suas diferenças. Mas
desconstruir não significa destruir.
Ou seja, o risco existe com ou sem
a institucionalização. O risco é
você mesmo.
2
LF: Para mim academia fornece instrumentos para o pensar
sistemático sobre qualquer conhecimento, não é diferente com a Arte.
Vai dar condições ao artista para
um pensar mais crítico e analítico
sobre o fazer artístico
3
LF: Toda arte é territorializada na sua origem e provem
dos saberes locais. Só a partir daí
pode universalizar-se. Ou seja, o
artista tem território, carteira de
identidade, digitais e é dessas
impressões, ambiências, heranças
culturais, relações tribalistas (no
sentido contemporâneo Maffesoliano) que pode surgir sua sensibilidade e capacidade de criação.
4
LF: Todo dissidente é dissidente de alguma coisa. Não
pode negar as referências que
___________________________
*Lúcia fernandes Lobato. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais
(UFRJ-1969), graduada em Dançarina Profissional (UFBA-1981),
Licenciada em Dança (UFBA1982), mestre em Ciências Sociais
(UFBA-1990) e doutora em Artes
Cênicas (UFBA-2002). Professora
adjunta da Universidade Federal
da Bahia onde atua na Escola
de Dança e pertence ao quadro
permanente do Programa de Pós
Graduação em Artes Cênicas,
onde também é membro do colegiado..
{14}
{15}
ARTES VISUAiES - UNIVERSIDADE JAVERIANA
(COL)
CARLOS GARCÍA
1
CARLOS GARCÍA: Este é um
programa que se orienta para a formação de artistas em três campos:
O campo da expressão gráfica, o
campo da expressão plástica, e o
campo da expressão audiovisual…
Quando surgiu o programa, a pergunta era, Qual é a formação, ou
qual é a pertinência da formação
contemporânea nas academias?
E o que encontrávamos foi um
grande vazio, uma falta de diálogo
entre as novas tecnologias, e o que
considerávamos tradicionalmente
o oficio de um artista. De maneira
que nossa proposta se orienta a
partir desse ponto, porém tendo
em conta essas três perspectivas
que sinalei anteriormente, que
para nós se constituem em ênfase.
Nós consideramos que o termo
da “arte” varia de acordo ao contexto, portanto, se pensamos no
campo da formação, a formação
em artes tem que ser muito flexível
e tem que ser muito mutável com
respeito a um contexto, por isso
falamos de uma carreira de Artes
Visuais e não de uma carreira
tradicional.
{{em: Como e através de que
ferramentas vocês apropriam a
transformação desse conceito
num contexto como o nosso?
CG: Estando muito perto da prática
artística, do contexto e do meio de
emergência das próprias práticas
artísticas com diferentes orientações. Ou seja, o programa tem que
ser capaz de evoluir sobre o que
é a realidade, e essa realidade é
mutável.
2
CG: Poderia abordar da
seguinte maneira, a Universidade
Javeriana cada vez más está
interessada no assunto de interdisciplinaridade, esta é uma maneira
de assumir essa parte prática. Eu
poderia sinalar exemplos concretos em Artes Visuais, na matéria
Trabalho Social em Artes, que o
que busca é justamente criar uma
relação entre o exercício da prática
artística, e o contexto social. Digamos, este é um terreno que não
estava sendo manejado, ou se
manejava de uma maneira muito
romântica, o artista que chega
como um Rei Midas que tudo o que
toca vira ouro, não nos interessa.
Nosso interesse está no artista que
se mimetiza que faz parte de um
contexto e que desenvolve uma
prática artística, onde se envolve
no social.
{{em: Neste sentido, que função
desempenha a especificidade já
mencionada no campo interdisciplinar?
CG: Esta é uma disciplina que está
aberta, que é optativa de 4 créditos, ou seja, tem uma intensidade
considerável, aberta a diferentes
disciplinas. De maneira que, colocar um estudante de artes, com um
estudante de música, um estudante de literatura, um estudante
de arquitetura, um estudante de
psicologia, entre outras… O que
facilita é quebrar justamente essas
diretrizes disciplinares, e favorecer
a prática. E volto a insistir sobre
um programa de artes que seja
flexível, ou seja, impor um tipo
de prática que envolva o social,
não sempre é o interesse de todos os estudantes. Porém, este
é só um exemplo, a Universidade
conta com muitíssimos programas
de impacto social, nos quais, os
estudantes de artes também se
vinculam, e também com diferentes
disciplinas. Eu estou sinalando
só um exemplo de uma disciplina
optativa, porém poderia dizer que
as matérias de prática como as
oficinas, também permitem essas
observações, porque o estudante
é livre em algumas disciplinas para
propor suas próprias temáticas.
3
CG: Eu acredito que se vincula com o modo de pensar a arte,
já não se pensaria desde uma
definição, ou desde uma nominação tradicional, mas pelo contrário, se pensaria quebrar essas
condições tradicionais que definem
o termo, isto se alcança quando o
artista já não é o artista, é simplesmente um individuo a mais em uma
particularidade, um indivíduo que
é capaz de ativar processos de
diálogo. Quando se ativam processos de diálogo creio que o artista já
não é isso que entre aspas chamamos Arte…
Haveria que ampliar então o
campo da Arte, isto que chamamos uma prática artística contemporânea no é somente um terreno,
mas sim algo que pode ter mais
{16}
terrenos que podem interessar a
um artista, que não é necessariamente os processos sociais ou as
práticas, é possível que um artista
se interesse somente por ser um
pintor tradicional que a sua vez
pode querer ser consciente ou não
dos fenômenos sociais…
A mesma coisa poderia aplicar
para outras disciplinas, a pessoa
poderia se perguntar hoje em dia
se o advogado é o advogado em
termos tradicionais, se pensamos
que o que prevalece cada vez mais
é a perda das bordas, o fato de
que as disciplinas já não se constituem nas disciplinas pontuais,
senão em diálogos contínuos,
nessa medida é hora, talvez, de se
perguntar se o médico é o médico
tradicional.
4
CG: As universidades também têm que começar se questionar sobre sua função com este
tipo de contexto, a perda de limites
e como se diluem esses limites,
podemos considerar que a universidade também faz parte disso, eu
creio que não haveria riscos de
institucionalizar algumas práticas,
porque os programas se movimentam de acordo a os interesses e
de acordo a os movimentos que
propõe esse contexto, e os programas tem que, de uma ou outra
{17}
forma, garantir esses espaços. Nós
temos experiências muito similares
ou tendentes a essas perspectivas em projetos e trabalhos de
graduação que tem implicado uma
prática, uma perda da definição do
que tradicionalmente chamamos
artista, e o mesmo processo de
reflexão admite e permite isso, ou
seja, se não o permitisse poderia dizer que o programa se [des]
atualiza… Acredito que se existe,
é uma responsabilidade saber
como guiar esse tipo de propostas.
Nós, por exemplo, nos rodeamos
de uma boa equipe para isso, um
corpo docente que tenha experiência nesse caso, estava pensando
agora num projeto que é Cultus de
uma de nossas graduadas que se
deu na Cidade Bolívar propondo
exatamente a mesma coisa, desde
uma quebra acerca das definições
tradicionais da arte e do papel que
tem que cumprir o artista…
Vou ler um pouco a esse respeito:
“Este projeto buscou gerar através
do exercício artístico processos
de criação e resistência em espaços usualmente olvidados para a
centralidade da arte e do poder,
as ferramentas de dita resistência
não foram muralhas, nem barricadas, sua estratégia não concebe trincheiras nem uniformes,
tampouco se vale de fuzis, nem
de granadas, os elementos desta
resistência são frágeis e passam
despercebidos, têm a sutileza das
fintadas e a naturalidade das obras
que germinem, porém guardam
a força entrançada das redes,
dos tecidos e a nutrida couraça
das sementes”. O título é prática
artística na greta, articulações
periféricas da resistência, projeto
cultural no Bairro Cidade Bolívar .
Então, ela, Luzmila, trabalha com
uma população de manobrados**
que vivem em Cidade Bolívar1*, e
que chegam a esses espaços onde
nem sequer tem diálogo com a natureza, ou seja, o campesino vem,
chega à cidade, onde somente há
uma árvore, e ela começa a propor
um trabalho com essa comunidade, esse interesse ela já o tinha
manifestado aqui na universidade,
e começou a trabalhar com uma
das propostas dos jesuítas de
inserção social, com estudantes de
enfermagem, de psicologia, e ela
começou fazer toda uma série de
oficinas com estas pessoas. Cultus
tem uma origem em cultura, porém
Cultus é cultivar também, e o resultado disto é uma espécie de granja
na que se cultiva. Por exemplo,
ação social, tem algumas experiências muito similares, porém aqui,
obviamente, o artista passa a ser
outra coisa. O projeto Cultus se fez
somente no bairro Cidade Bolívar,
eu acredito que daí vem o respeito
por isto, e volto a insistir, o social
as vezes se borra quando pensamos que o artista que trabalha, isto
é, como o Rey Midas, que vai e
toca e logo vai para uma galeria e
expõe, isto não! Este é um projeto
que se desenvolve na Cidade Bolívar e somente ali, de fato, quando
se fez a apresentação pública,
porque tinha que fazer uma apresentação pública dos trabalhos de
graduação, se escolheu a Biblioteca do Tunal, porque era a mais
próxima ao contexto, nunca se fala
em termos de curadorias nesse
sentido. Eu acredito que neste
caso é clave ver como surge a
inquietude, porém é clave também
ver como se guia essa inquietude,
neste caso, Fernando Escobar foi o
assessor durante mais de um ano
de trabalho muito constante.
*: Cidade Bolivar é a favela mais
conhecida da cidade de Bogotá.
**: Na Colômbia a situação de
desplazamiento (manejo – manobra) dos campesinos às cidades
é constantemente acentuada por
causa do conflito rural armado que
há um século afeta este país.
{18}
{19}
BELAS ARTES - UNIVERSIDADE JORGE TADEO
LOZANO
VICTOR LAIGNELET
1
VICTOR LAIGNELET: O Programa de Artes Plásticas da Universidade Jorge Tadeo Lozano procura
abordar a dimensão paradóxica da
arte e seu ensinamento, reconhece
a complexidade e importância do
processo histórico e cultural da formação em artes, e busca assimilar
e compreender criticamente seu
desenvolvimento histórico. A partir
de um marco histórico amplo num
contexto diverso, a atualização do
Programa de Artes Plásticas entende a pedagogia contemporânea
em artes a partir de distintas posturas históricas e contemporâneas
contraditórias e as une simultaneamente. Nessa ordem de idéias
acolhe a tensão entre regra e a
falta de sistematização que há
acompanhado dialeticamente a educação da arte através da história.
Igualmente contrasta as diferentes
posturas históricas com a noção
de pedagogia poética, segundo a
qual a pedagogia é uma forma de
agenciamento criativo para fazer
visíveis dimensões não visíveis
ou excluídas do regime sensível.
Finalmente propõe modelos e alternativas pedagógicas diversas, com
o fim de procurar que seja o estudante quem, participativamente,
tome posições.
2
VL: As práticas e teorias
da arte contemporânea podem
representar um certo perigo em
contextos pouco familiarizados
com as práticas contemporâneas,
ainda que depende do contexto e
de quais teorias ou práticas estejamos considerando, portanto,
não se pode generalizar. As teorias contemporâneas podem gerar
expectativas de ação que estejam
muito distantes das possibilidades
do contexto, não obstante, também
podem aportar um marco de liberação e empoderamento, porém
de novo depende de quais teorias
e práticas estejam falando. Em
última instância o conceito “contemporâneo” dificilmente quer dizer
algo, pois compreende uma grande
diversidade de aproximações heterogêneas e de debate.
Com respeito à segunda parte da
pergunta; a academia exerce uma
importante influência nos modos
de pensar-fazer a arte, como o
demonstra uma análise da história
da formação em artes, desde as
escolas e colégios greco-latinos,
as oficinas monásticas e catedráticas, as oficinas gremiais da idade
media, o humanismo renascentista,
a academia nos períodos do absolutismo e a ilustração, a contracultura romântica, os ateliers privados
do século XIX, a Bauhause nos
albores da modernidade, o conceito disciplinar e profissionalizante
da universidade, a contracultura
dos sessenta e sua proposta de
uma formação em arte pela arte,
a significativa influência de Beuys
na academia de Dusseldorf, finalmente o domínio do paradigma
científico nas universidades e em
seus modos de gerar conhecimento segundo o modelo da investigação, para citar só alguns momentos relevantes. É inseparável
a relação entre os modos de fazerpensar nas práticas artísticas e os
contextos culturais nos quais se
inscrevem os modelos de formação
em artes, já seja desde uma perspectiva racionalista ou idealista,
fundamentalista ou liberal, dogmática ou emancipatória, individu-
alista ou coletivista, etc. A influência pode ser positiva ou negativa,
no sentido de sua capacidade de
persuadir, manipular e dominar,
ou pelo contrário, agenciar criativamente processos de formação e
liberação de potencialidades. Hoje
em dia convivem distintas aproximações à pedagogia em artes, o
assunto é: De qual academia concretamente estamos falando?
3
VL: A arte pode estar sustentada em contextos espaços-temporais, e de fato está condicionada
por eles, porém não necessariamente determinada. As práticas
artísticas podem se inscrever no
seio da grande massa cultural ou
na de una comunidade singular,
não obstante, simultaneamente podem defender seu direito a propor
uma margem de excepcionalidade
à regra cultural e temporal.
4
VL: A academia, em relação
com as artes, deve ser capaz de
pegar a tensão existente entre os
modos de expressão e produção
artística, e a avaliação acadêmica,
no marco da aceitação livre por
parte do estudante e do docente
de participar na instituição. A formação em artes comporta assumir
paradoxos: formar para liberar e
por outra parte construir e descon-
{20}
struir o sujeito. Simultaneamente.
Nesse sentido a formação em
artes com relação a suas práticas
mantém uma maior tensão com
os modos de formação de outras
disciplinas. O risco pode ser negativo no sentido de “oficializar” a
dissidência e pode ser positivo no
sentido de mobilizar transformativamente à instituição, depende se
a dissidência tem como fim conservar sua “pureza”, a qual síria outra
forma de institucionalização ou se
prefere atuar no regime do político
e aposta em afetar a instituição, no
sentido de modificá-la. As instituições não são negativas nelas
mesmas, nem as dissidências positivas em se mesmas, em ambos
casos depende como institucionalizam e com respeito a que diferem,
e qualquer que seja a resposta é
sujeito de possível dissenso já que
a dicotomia instituição-dissidência
se retroalimenta. É claro que as
instituições educativas em nosso
meio estão reguladas por paradigmas distintos à arte, e talvez
por causa disso é que as práticas
artísticas, incluídas as autodenominadas dissidências, podem
atuar como um fator de transformação institucional, nisso consiste
a política, posto em termos de
Rancière; propor um litígio para
gerar uma redistribuição do sensível que se institucionalizará no
{21}
seu momento e devirá uma forma
de “polícia”, seguindo de novo a
Rancière a “polícia” não é boa nem
má em si mesma, depende do que
procura preservar e administrar,
de todos modos outros num futuro
pleitearão novos litígios e novas
redistribuições do sensível num
processo sem solução de continuidade conhecido faz muito tempo
como solve et coaguala, não obstante há um poder mais sutil que
o “litígio” político e é o poder do
pensamento poético, posto graças
a sua polissemia ser incapturável,
juridicamente falando.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{22}
{23}
FREE*
Irit Rogoff. Tradução: Unamorinmanente
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
- Quem quer saber?
- Eu.
- O que você quer saber?
- Não sei!
Em algum momento do ano passado propus
na minha instituição, Goldsmiths, University of
London, que criássemos uma academia livre,
adjacente a nossa instituição e lhe daríamos o
nome de “Goldsmiths Free”. As respostas ante
esta proposta, que não eram sorrisos desbotados
frente a sua
natureza, aparentemente,
adolescente oscilavam entre a perplexidade –
“O que obteríamos com isso?” –, e o pânico –
“Como poderíamos financiar isso?”. Ninguém
discutiu o que seria ensinado ou de que maneira
se iria distinguiria o trabalho feito ali do que se
fazia em uma instituição como a nossa, onde se
pagam honorários, se outorgam graus e dirigem
investigações. Por suposto esse era o ponto: O
que faria diferente essa instituição – não só em
termos de redefinir o lugar de entrada dentro
da estrutura (exonerada de custos de inscrição
ou de matrícula e de qualificações prévias) ou
seu modus operandi de trabalho (não baseado
na obtenção de graus, sem exames e sem
estar sujeito aos mecanismos estaduais de
monitoramento e avaliação) -, e como se poderia
localizar ali um tipo de conhecimento distinto. E
sobre isso era o que eu queria que se pensasse,
sobre a diferença no próprio conhecimento, sua
natureza, seu status e sua influência.
A classe de conhecimento que me interessava
analisar na minha proposta tinha a ver com um
entendimento que não estivesse concebido pelas
ordens disciplinares ou temáticas, que pudesse ser
válido em relação a um problema urgente – e não
com problemas predefinidos pelas convenções
do conhecimento -, e que atendesse melhor as
pressões e lutas da contemporaneidade. Quando
o conhecimento está “desenmarcado”, está
menos fundamentado genealogicamente e pode
se deslocar com maior facilidade para adiante do
que para atrás. Essa forma de conhecimento teria
muito a ver, obviamente, com tudo aquilo que
adquiri com minha experiência no mundo da arte
(em grande parte um equipamento de permissões
que vêm no saber de um reconhecimento de
suas faculdades performativas – aquilo que o
conhecimento permite, mais que aquele que o é).
Porém as permissões que localizei no mundo da
arte vem com a sua própria carga de limitações,
uma tendência a reduzir as operações complexas
da especulação a sua ilustração ou a um gênero
que poderia se exemplificar visualmente como
“estudo” ou “investigação”. Poderia haver, me
perguntava, outro modo no qual o conhecimento
possa se liberar sem ter que assumir uma ampla
série de maneirismos genéricos, sem se converter
numa tropa estética posta em mãos de curadores
famintos por encontrar o último “giro”?
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{24}
Seguramente as cabeças entrechocariam! A
noção de “liberdade” tem sido tão degradada por
seu uso em expressões como “livre mercado”,
as propostas discutíveis da nova economia “livre”
da Internet ou as promessas historicamente
falsas de liberdade individual, que resulta ser
bastante difícil encontrar o que tem alem desses
lemas vazios. Sem embargo, a possibilidade de
produzir alguma proximidade interrogativa entre
“conhecimento” e “gratuidade” parece tanto
inevitável como irresistível, em particular desde
a perspectiva das lutas atuais sobre a educação
em Europa.
A atual direção para o conhecimento e, por
conseguinte, indo a alguma forma de sua
expansão e transformação, parece muita mais
importante que a simples discussão sobre as
categorias em que este opera. Para tentar esta
transição, gostaria de pensar em várias questões
que considero relevantes:
{25}
Evidentemente necessito pensar sobre as
lutas em torno da educação, suas localizações
alternativas, os tipos de economias emergentes
que poderiam ter algum interesse no seu
replanejamento y, finalmente, na maneira que a
“educação” pode ser percebida como um modo
organizacional alternativo, não de informação
ou de conhecimentos formais – com seu
mercadejo concomitante -, mas sim como outra
forma de estar juntos, não predeterminada pela
obtenção de logros, mas sim pelo seguimento de
direções. Aqui, tenho em mente um processo de
“singularização do conhecimento”, que discutirei
mais adiante.
3.- ¿Quais são as implicações institucionais de
albergar um conhecimento que seja “gratuito”?
Obviamente que, em relação com “livre” não tenho
em mente certa forma de liberação romântica.
O conhecimento não pode ser “liberado”, se
encontra infinitamente incorporado a largas linhas
de transformações que se enlaçam de formas
inexplicáveis para produzir novas conjunções.
Nem tampouco tenho em mente o romanticismo
do conhecimento de “vanguarda”, com seus
modos de confrontação da “inovação” como
ruptura e partida. Nem estou particularmente
interessado naquilo que se tem chamado
“interdisciplinaridade” que, com suas insinuações
de mobilidade e “cooperação” entre disciplinas,
deixa intactas de fato todas aquelas membranas
de divisão e suas lógicas de separação e
compartimentação.
4.- ¿Quais são aquelas economias do “livre” que
poderiam provar uma alternativa ao mercado
e das economias de obtenção de resultados
e de orientação através da comparação do
conhecimento institucionalmente estruturado no
presente?
Nem tampouco, finalmente, (e digo isto estando
algo qualificado), é minha principal meta desfazer
as categorias disciplinárias e profissionais que
tem dividido e isolado corpos do conhecimento
uns de outros para, assim, promover um campo
heterogêneo de corpos povoados de conhecimento
1.- Primeiro, e sobre tudo, o que é o conhecimento
quando é “livre”?
2.- Existem lugares, tais como os espaços da arte,
onde o conhecimento pode ser mais “espontâneo”
que em outros?
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{26}
{27}
similares às estratégias de mercado que
asseguram a eleição e multiplicidade, e dignificam
as práticas de segregação epistemológica através
da produção de infinitas novas subcategorias
para corpos herdados de conhecimento contido
e nomeado.
seja o conhecimento des-individualizado, desradicalizado –no sentido convencional da definição
do radical como ruptura - e ainda operativo dentro
dos circuitos da singularidade – do “novo modo
relacional do sujeito”-, que me preocupa nesta
instância.
Existe uma relação irritante entre liberdade,
individualidade e soberania, que possui uma
relevância particular no contexto do que se
está discutindo aqui, posto que o conhecimento
e a educação tem um ponto de apoio tanto
em processos de individualização como de
socialização. Hannah Arendt expressa isto
concisamente quando adverte que:
Desta forma, a tarefa que tenho entre as mãos
tem menos a ver com um tipo de liberação do
confinamento do que com um desfazer das
próprias condições deste confinamento.
Politicamente, esta identificação de liberdade
com soberania quiçá seja a conseqüência mais
perniciosa e perigosa da equação filosófica de
liberdade e livre vontade. Por esta via, qualquer
uma das duas conduz a uma negação da
liberdade humana – a saber, que se todo homem
pode realizar-la, então ninguém síria soberano
-, ou a idéia de que a liberdade de um homem,
grupo ou corpo político somente pode ser obtida
ao preço da liberdade, ou a soberania, de
todos os demais. Dentro do marco de trabalho
conceitual da filosofia tradicional, certamente
resulta bastante complicado compreender de
que forma a liberdade e não a soberania podem
existir juntas ou, em outras palavras, como pode
outorgar liberdade a homens que vivem baixo
condições da não soberania [1].
Finalmente, meu interesse é trabalhar ao redor de
ambos conceitos, liberdade e soberania; através
de operações de “singularização”. Talvez este
Enquanto a circulação ilimitada de capital, bens,
informação, alianças hegemônicas, temores
populistas, patrões de excelência, recentemente,
globalizados, etc., funcionem como alguns
dos distintivos da última fase neoliberal do
capitalismo, nós não podemos simplesmente
equiparar cada forma do ilimitado para julgálas a todas como igualmente insidiosas. “Livre”,
em relação com o conhecimento, me parece que
tem menos poder em sua expansão que num
movimento fundamentalmente centrípeto; menos
em um processo de penetração e colonização do
todo, segundo o modelo implacável do capital,
que em alcançar entidades inesperadas e logo
representá-las, projetando-as dentro do campo
da percepção.
_____________________
Guillermo Vanegas.
Psicólogo.Trabalha
como
professor
universitário e crítico
da arte em BogotáEste artigo está publicado originalmente em: Colômbia.
http://e-flux.com/journal/view/120. Última entrada:
María
Mercedes
maio 25 de 2010..
Salgado e formada
pelo Departamento da
Arte da Universidade
dos Andes de Bogotá.
}
1.
1.- Hannah Arendt,
“What is Freedom?”, capítulo
VI “Revolution and Preservation” em The Portable
Hannah Arendt, (ed. Peter
R. Baehr) (Penguin, Londres,
Penguin, 2000), p.455.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{28}
{29}
Teoria e prática,
na minha opinião
Hunza Vargas.
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
O primeiro semestre que ministrei algumas aulas
em uma faculdade de artes, escutei uma anedota
que quero compartilhar.
Durante uma aula numa escola de artes, uma
estudante apresenta os desenvolvimentos de seu
trabalho e começa falar a partir dos autores e autoras que tinha lido ao longo do semestre. A professora a detém e lhe diz que não leia mais, que
perdeu a capacidade de falar desde si mesma,
e que só está falando a partir dos autores, lembrando-lhe mais uma vez que há dissipado essa
capacidade, porém não o direito de falar. Sem
embargo, ao finalizar a disciplina, a estudante obteve 05 (nota máxima no sistema quantitativo da
educação colombiana) como qualificação definitiva, de modo que outros e outras estudantes respondem com frases depreciativas como “eu vou
ficar lendo livros para que me dêem 05”.
Como antropólogo e como docente, fiquei surpreendido com a história, pois nunca havia escutado uma professora desestimular a leitura entre seus estudantes. Sem embargo, esta não foi a
última vez que escutei esta contrariedade frente à
leitura no contexto universitário da arte.
Em mais de uma faculdade de artes tenho escutado que o fazer é tão importante quanto ler,
escrever ou investigar, ao mesmo tempo em que
se demérita a leito-escritura frente ao labor plástico. Por parte dos estudantes, é muito comum
escutar frases como “ler não faz falta” ou “li somente a primeira parte, porque achei o que me
servia” fazendo alusão a projetos que requerem
de uma sustentação teórica ao tempo que de um
exercício de escrita básica no momento de definir,
descrever, construir ou desconstruir um exercício
de criação. Por outro lado, dos docentes, podemse escutar frases como “o texto não é o que se
avalia a um artista” ou “os referentes plásticos
são claros, com isso basta”.
Não é minha intenção dar mais importância à teoria que à prática na arte, pois isso não depende
de um grande consenso, mas sim de cada projeto. Não obstante, quero outorgar à teoria um lugar
equivalente a pratica, pois de fato, ler e escrever
são práticas que tem muito de visualidade e de
criatividade e em muitos outros casos são em si
mesmos exercícios plásticos.
As qualidades argumentativas dos e das estudantes de artes plásticas, usualmente, estão ligadas a seus referentes plásticos mais do que a
um conceito que estejam trabalhando ao longo
do processo. Isso implica por um lado, um interesse permanente no processo de outras pessoas
que nutrem o próprio trabalho, porém, ao mesmo tempo uma falta de interesse pelas noções,
conceitos e argumentos que conduziram a essas
pessoas a desenvolver certos trabalhos de ma{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{30}
neiras particulares. Assim, a teoria começa a ser
entendida através de terceiros que tenham um
processo particular, e o próprio trabalho se torna
com facilidade em uma exegese do trabalho de
mais alguém.
Por suposto, não se pode esperar que em um só
projeto o ou a artista (menos o ou a estudante
de artes) enfrente por completo um conceito e o
delimite por completo, porém se é possível pedir
que haja uma abordagem a partir da teoria ao
redor de conceitos, idéias e formas, de maneira
tal, que una revisão crítica da teoria, nutra um
processo plástico que vincula materiais, meios,
procedimentos e reflexões pessoais sobre o que
esse processo plástico tem que dizer ao redor do
tema ou conceito que se está trabalhando. Neste
sentido, a teoria na arte passa pelo fazer, sem
deixar de ler nem de escrever.
A idéia decimonónica (pertencente a uma época
anterior – ultrapassada) do artista como inspirado
ou com capacidades além da percepção da maioria das pessoas, tem posto em dúvida e tem criticado duramente a arte, porém as críticas, que têm
conduzido a toda uma estrutura na que a teoria
tem aportado um andaime (construção, degraus
acima), tem levado ao mesmo tempo um apreço
da técnica passando por cima da reflexão cuidadosa em termos teóricos dentro da academia. A
que se deve isto, sobretudo nos estudantes?
{31}
das matérias que os estudantes de artes deveriam ver com estudantes de outras carreiras?
Estas perguntas nascem a partir de uma idéia:
a arte não produz conhecimento da mesma maneira que as ciências, porém isso não a exclui
da produção de sentido e significados na vida
social e cultural de um povo. Por isso, é de vital
importância gerar nas novas gerações perspectivas críticas, com capacidades analíticas e argumentativas dentro das formas em que a arte tem
se construído, sem esquecer que precisamente
a arte percorreu sempre a reinterpretações das
metodologias científicas e as fez suas através
de maneiras particulares, pois não há nada mais
prático que uma boa teoria.
}
__________________
Hunza
Vargas.
Antropólogo e docente
no Programa de Belas
Artes da Universidade
Jorge Tadeo Lozano
de Bogotá.
A relação problemática entre teoria e prática na
arte tem muito a ver com a academia, porém
Quais são as opções teóricas que os e as estudantes têm dentro da academia? São as aulas de
história ditadas por artistas ou por pessoas com
formação em história da arte? Qual é a ênfase
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{32}
{33}
Estado de
Emergência*
Agora bem, a idéia de penetrar e de algum modo
infectar este espaço de maneira simbólica substitui uma renovação constante de perguntas acerca
do exercício prático no ritual acadêmico.
María Fernanda Ariza.
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
A irrupção do tema dos imaginários políticos de
nação através de iniciativas muitas vezes performativas sobre a palavra e o rol que desempenha
a academia nestes processos politicamente intencionados é um fenômeno de grande atualidade,
porém de pouco alcance, e até com dificuldades
para sua própria compreensão, geradas pela tensão entre o pensar-fazer da arte, e o campo de
ação dela no projeto pedagógico da Colômbia.
Como abordar esta questão?
Há princípio, o grupo constituído para desenvolver esta iniciativa surgiu fruto de uma carência,
que chegou rapidamente a se converter em necessidade de reflexão enfocada para o desenvolvimento de um projeto conformado por 8 processos de investigação, a relação destes decanta no
cenário no qual foram concebidos, a Universidade
Jorge Tadeo Lozano, e a cadeia de ação–participação direta de alguns de suas integrantes na
transformação do que até então havia sido uma
campanha geral de inconformismo e resistência
passiva.
Notas
*
Sobre o projeto de
investigação – criação
Estado de Prova da
Universidade Jorge Tadeo Lozano de Bogotá.
A ação política que nestes projetos se transforma,
nos fala de um contexto específico, de uma experiência atravessada por tempos e espaços determinados, e de um compromisso politicamente
consciente sobre cada um dos sucessivos modos
de ser ou estar na comunidade. Estas formas que
se atualizam no espaço público, privado de corporalidade, são o corpo social que baila sem parar
a parodia do que comumente se conhece como
“o social” contemporâneo e que faz referência ao
modo em que estes seres sociais se identificam
no plano da vida cotidiana.
Esta aproximação permite se perguntar, por sua
vez, pelas dinâmicas institucionais, sejam individuais ou coletivas, que tenham sustentado historicamente a idéia de nação, fazendo visíveis o
cúmulo de efeitos culturais que conformam nosso
estado social de direito. Neste debate simbólico,
porém não menos importante, o que se quer
romper é com o unanimismo cultual no qual circulam todos os pressupostos nacionais, incluindo a
educação, se trata de entender o caminhar como
uma forma de intervir, como um mecanismo de
participação menos invisível, mais consciente, e
que de alguma maneira responde a uma familiaridade muito intuitiva sobre o que-fazer, que-dizer
disciplinado.
A reflexão se situa em espaços sociais de grande
impacto, cada um dos projetos põe em evidência
sua existência dentro de um contexto através de
diferentes táticas retóricas, imagens, discursos,
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
}
{34}
ações, metáforas que se materializam no fato de
se pensar e se localizar num espaço. Isto supõe
uma necessidade urgente de resignificar as estruturas e os compromissos sociais de antemão
presentes, e desta forma, reescrever cada um
dos capítulos que sustentam nossa maneira de
ver-passar a história.
{35}
social” (Vich e Zabala, 2004). Neste sentido, se
trata de potenciar e questionar o saber em outros
saberes diferentes, transmutáveis, que podem
ser ou não desiguais, e que estão presentes nas
explicações que eles mesmos reconstroem sobre
a experiência.
}
Tal exercício obriga à suspeita, pois produz simultaneamente a outro antagônico, que nos
princípios de inclusão e exclusão reproduz a esfera do público costumbrista amanhado no marco
do Estado-nação. Nestes processos o que se faz
público é a relação amplamente considerada do
termo, o espaço de diálogo como um âmbito aberto de debate onde os cidadãos deliberam sobre
os assuntos de interesse comum (Jürgen Habermas) e ainda mais mostram uma apropriação
sobre os processos de imersão que desde a instituição suportam os conteúdos de dita prática, os
estudantes, também cidadãos, tomam partida no
discurso da arte de maneira própria e é esta confrontação constante entre o que é necessário para
a continuidade do sistema de educativo e aquele
que emerge precisamente para sua transformação o que prova mais uma vez a possibilidade de
converter a empresa privada num meio de ação
política, no sentido consciente da palavra.
Estado de prova é, sobretudo, um estado de
emergência próprio de discussão, responde assim aos fenômenos manifestos na consciência
de um suceder diário, “forma de expressividade
que se atualiza no espaço público, encarregada
de dramatizar relações e identidades sociais, de
questionar as práticas ou símbolos que estruturam
a vida comunitária e de revelar as possibilidades
de agência dos sujeitos na constituição do mundo
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
Seduções e
Rupturas
{36}
Santiago Eraso.
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
Parece que as atuais políticas culturais hegemônicas estão cada vez mais fascinadas e seducidas
pelos modelos de produção cultural baseados
sobre todo na espectacularização da produção
subjetiva, na banalização dos discursos, a descontextualização das obras e sua conseguinte
mercantilização.Neste sentido, a proliferação
A actualidade Revisada. Tabacalera 2005
{37}
de museus, centros de cultura contemporânea
e acontecimentos artísticos -bienais, feiras- tem
muito que ver sobre todo com una visão utilitária da cultura, na que esta funciona, sobre
todo, como escaparate para o consumo passivo
-ou ativo para os que dispõem de recursos-, elemento de promoção turística, reforma urbana ou
aberta propaganda política e não como um médio de autêntica construção social. Não há que ir
muito longe para encontrar exemplos concretos
que funcionam como paradigma destas estratégias. Em Donostia/São Sebastião se consolida
uma feira de fotografia, que baixo os auspícios
de um coleccionista privado, se está convertendo
num dos referentes principais para prover de conteúdos ao futuro Centro Internacional de Cultura
Contemporânea que se prevê construir na antiga
fábrica de tabacos, ubicada no centro topográfico
da cidade e com más de trinta mil metros quadros
para sua utilização. Em seus imensos espaços,
ainda assim re-habilitar e coincidindo com a
feira, se ha organizado una mostra de vídeo -A
atualidade revisada- que reproduze até a última
conseqüência os clichês do internacionalismo
artístico mais convencional; a monumentalização
da experiência estética, por causa a uma desmedida utilização das técnicas de reprodução;
a construção de espacios “fascinantes“ que desenvolvem estrategias de sedução e alienação
do espectador; a anulaçnao de cualquier posibilidade de interação que não pase pela simples
contemplação; a neutralização da crítica e por
suposto o ocultamento e negação de todo tipo
de informação e documentação que permita uma
mutação nos comportamentos dos ciudadãos e
sua relação com as obras apresentadas. Nestas
condiciões, o público muitas poucas vezes se detem na frente de un vídeo de principio a fin e sua
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{38}
atenção rara vez é intensa e in-interrupta.
Faz muitos pocos meses, coincidiendo com o último Festival de Cine se celebró em Donostia/
São Sebastião um “evento cultural” - eufemismo
que a organización utilizou para nombrar o acontecimiento festivo- que sirvió para celebrar o fechamento da Bienal Manifesta. O fato teve lugar
tambem em Tabacalera.[*]
{39}
*.- O autor se refere a algunas localidades do Pais Vasco
do qual ele é residente.
oração, enquanto os assistentes à festa se deleitaban entre “pintxos”[**] sofistados e helados.
Por nossa parte, projetamos o documental no
contexto de um seminario que tratava de desvelar as contradições nas que se produz a
Durante aquela festa, à que assistiram varios
Tabacalera 2004
centos de invitados, se apresentó um dos mejores trabalhos que se pude ver em Manifesta:
Route 181, um documental sobre o conflito palestino, realizado por Eyal Sivan e Michel Khleifi.
O filme a apresentamos em Arteleku com ocasão da celebração do seminario Representações
Árabes Contemporâneas. Discursos críticosey
pensamento político coordinado por Gema Martín Muñoz. Agora bem, a organização do “evento
cultural” não teve ninhum reparo em descontextualizar sua proyeção e emitirla na fiesta, produciendo um efeito de extranhamiento e estetização
tal que o trabajo ficou convertido em simples dec-
1.
Representaçnoes árabes contemporáneas é um
projeto dirigido por Catherine David e organizado por
Witte de With, Rotterdam e
á Fundação Antoni Tápies de
Barcelona, em colaboração
com a Universidade Internacional de Andalucía (UNIA
arteypensamiento) e Arteleku
(Diputación Foral de Gipuzkoa).
Representações Arábes Contemporâneas. Eyal Sivan em Arteleku.
subjetividade no mundo árabe e intentando
conectar com públicos específicos. Este projeto
se inscribe numa rede máis amplia de colaborações que permite uma reflexão continua e ininterrumpida mediante um processo participativo de
todos os atores que participam na amplia rede de
colaborações internacionais. Do mesmo modo,
temos chegado a um acordo com a productora
para editar o filme e adicionarla à publicação que
**.- É uma palavra em euskera ou lenguagem vasco
que designa um pedasinho de
pão sobre o que se colocam
diferentes poucos de comida e se utiliza em brasil e
colômbia em coquetéeles e
eventos especiais, enquanto
no Pais Vasco e uma costume
comer-os.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{40}
recogerá as ponencias dos participantes e das
intervenções dos assistentes ao seminario. Tudo
este material se encontra disponivel em nossa
página de intenet e em algum momento fue emitido ao vivo pela internet.
Muitos agentes e productores culturais levamos
anos tentando re-pensar os medios de produção
e recepção da imagem-tempo para garantizar
umas condicições mínimas de visibilidade das
obras. Neste sentido, tratamos de desenvolver
fórmulas que permitam uma mayor e melhor adecuação entre o receitor e as condicições do espaço / tempo que se necesitam para que a interação se produça nas melhores circunstancias. Este
trabalho supõe, por suposto, uma menor eficacia
mediática e processos de produção menos espectaculares baseados, sobre todo, em conseguir o
máximo compromiso entre o autor, o análisis do
contexto no que surgem as obras e o receitor que
passa a ser sujeito activo.
Desacordos. Exposição. Mutações do Feminismo. Oficina de Diane Torr. Arteleku 2005
{41}
Catherine David, diretora da Documenta X, faz
pouco, numa entrevista para o projeto Desacordos
diz que nos anos 90 se produz o agravamiento de
uma cultura espectacular, mediática, que supõe o
abandono de qualquier tipo de política cultural que
tenha que ver com a produção e transmissão da
complexidade social, e com a toma de conciência
crítica dos falhos e faltas de dita sociedade. Como
consecuência se produz uma demissão generalizada de todo tipo de compromisso cultural, um
compromisso que é sempre político. Tras os 90, o
que fica bem claro é que se, de um lado, há todo
um setor do mundo da arte que se alinea com
essa espectacularidade, homogeneidade e evanescencia da cultura dominante, existem a parte
outras prácticas que tem máis futuro e que são
as que tem que ver con processos de longa duração e com espaços muito heterogéneos. Neste
sentido, Martha Rosler, da que tomo enprestado
o título deste texto, redunda no que o trabalho
artístico se deve centrar não só na produção, exposição ou difusão, sim não no contexto social e
político que o determina.
2.
Desacordos. Sobre
arte, política e esfera pública
no Estado espanhol é um
projeto em coprodução entre
Arteleku-Diputación Foral
de Gipuzkoa, Museu d’Art
Contemporani de BarcelonaMACBA e Universidade Internacional de Andalucia-UNIA
arteypensamiento. www.
desacuerdos.org
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{42}
A pretendida “neutralidade” da arte e a cultura
respeito a o político e á socialização do espaço
público pode conducir, deliberada ou inconscientemente, uma parcialidade vergonhoza que
ampara estrategias de privatização de todo tipo
de experiência. Em nosso tempo, a pertenência
irrenunciavel da arte e a cultura ao compromisso
social, se encontra obstruida pelas condições objetivas de certas políticas dominantes e a hegemonía consecuente de determinadas prácticas
artísticas e culturais, empenhadas em legitimar
certas actitudes complacentes e um sistema que
impide a visibilidade de outras formas emergêntes
de produção cultural. E como diz muito bem Marius Babias, em seu texto Produção de sujeito e
prática artística-política, publicado no Zehar nº
55, em perpetuar um sistema que reforza a função da arte e a cultura como mecanismo sociopolítico de integração, em vez de, como anticiparem as vanguardias, como medio para liberar as
posibilidades de emancipação.
Trata se de perguntarnos cómo e até ónde é posivel pensar e actuar de outra maneira. Parece
que ao exercicio de determinadas práticas culturais se lhe impõe um caráter decididamente
sacrificial e, em alguns casos, agónico, e em
antagonismo aberto com os consensos da opinião pública e o discurso político dominante. Sem
duvida, o límite pode ser transgredido porem se
recomponhe de inmediato. Em esse desplazamento continuo é onde podemos abrir espaços
para repensar as relações do sujeito, as palavras
e as cosas, crear novas formas, maneiras de ser
e estar, outros modos de pensar. Tambem em
esse antagonismo entre asimilação e resistência
se trata de pensar em estructuras de produção
social e colectiva que acentúem as perspectivas
{43}
políticas da práctica cultural. Neste marco, onde
o espaço público adquiere sua máxima significação, se trata de alertar sobre estrategias culturais
de liquidação que impidem o mantenimiento e desenvolvimento de espaços para a experimentação e de projetos de innovação. A pesar de certas
estrategias políticas que promuevem sua marginalização crecente, sobrevive e continúa evolucionando uma forma de práctica artística que apunta
a novas possibilidades de ressistencia cultural e
à construção de redes críticas nas que “intelectuais específicos”, no sentido foucaultiano, se
unam para formar um auténtico intelectual colectivo que possa dirigir seus pensamientos, ações
e rupturas de manera independiente.
3.
Tester é um projeto
coordinado pela Fundação
Rodriguez. Está enfocado
à produção e difusión de
propostas artísticas contemporâneas. Especialmente as
relacionadas com as novas
posibilidades tecnológicas.
Utiliza a tecnología como
ferramenta para a produção,
como medio de comunicaão
entre os participantes e como
vehículo para a difusión do
proyecto. TESTER quer prestar atenção a ámbitos locais
(internacionais) de creação,
que não tem presencia ou
visibilidade nos circuitos
internacionais ou que não
se conhecem atraves do
panorama hegemónico das
artes visuales. É um sistema
Neste sentido Tester é um projeto que ha intentado ser consecuente com estas premisas políticas
contrapondo a construção de modelos organizativos e sistemas de produção renovados às prácticas culturales hegemónicas e, do mesmo modo,
à retórica de uma crítica muitas vezes pensada
desde o simples espíritu destructivo.
Nossa apuesta se orienta nesta dirección. Não
se trata de negar a existencia de diferentes maneras de entender a acción cultural, sim não de
posibilitar a emergência de novas e impedir a
desaparição de outras, de tal maneira que a diversidade e a heterogeneidade possa seguir ocupando um lugar no complexo mapa cultural onde
se inscribe Arteleku e manter o valor añadido que
a o longo de estos anos ha incorporado o tesido
social.
}
de detecção de actividade
creativa, proposto como
projeto em processo, como
rede e como estructura de
produção.
Conta com a participação
de diferentes nodos de
produção: Marina Grzinic
–Eslovenia -, Oliver Ressler
–Viena -, Marcus Neustetter
– Johannesburg -, José Carlos Mariategui- Lima- y los
artistas Tanja Ostojic, Masaki
Hirano, Ralo Mayer, Philipp
Haupt, Sejla Kameric, David
Throrne, Usha Seejarim,
Robin Rode, Kathryn Smith,
Stephen Hobbs, Diego Lama,
Gabriela Golder, Iván Lozano,
Lucas Bambozzi, Yael Katz,
Kirmen Uribe, Ibon Saenz de
Olazagoitia, Hacklab Leioa,
Zoran Pantelic, Kristian Lukic,
Trinity Session, Iñaki Arzoz,
Andoi Alonso, Kien Nghi Ha,
Shulin Zhao, Jorge La Ferla.
__________________
Santiago
Eraso.
Gestor cultural. Reside
em Tolosa, Gipuzkoa.
Desde faz dizoito anos
dirige o centro de arte e
cultura contemporânea
Arteleku
em
São
Sebastião, País Vasco,
Espanha
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{44}
{45}
Uma volta Revolta
Álvaro Ricardo Herrera.
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
Escrevo este ensaio ou talvez devo dizer que ensaio escrever, enquanto meu cachorro morde o
próprio rabo. Tratarei de me enfocar em mostrar
porque sua imagem de cão hiperativo me lembra tanto a arte nacional (Colombiana). O estado
da arte talvez seja um assunto de Performance
canino, de saber fazer as ordens determinadas,
de ir aonde se tem que ir e claro, colocar boa pinta e fazer alguma macacada. Em que momento
de nossa formação universitária aprendemos a
nos comportar da maneira apropriada? Hoje em
dia várias Faculdades de Arte, tem espaços específicos de treinamento, por exemplo, aulas de
“Gestão Cultural”, porém à luz de várias coisas, a
queixa é que não se “sai” o suficientemente treinado nessas atitudes “extra artísticas”, que se vêm
como o augúrio de um “êxito” profissional. Como
melhorar a “performance” de um recentemente
graduado? Como medir-lo? Deveria ser de fato
a primeira pergunta. Se treinamos profissionais
ávidos de ganâncias, ou perseguidores do reconhecimento, se requerem exercícios diferentes,
ensaios diferentes para ofícios específicos.
O meio artístico nacional é especialista em esquecer. O novo espetáculo, não é mais que outra
revolta ao velho ensaio. Não quero dizer que a
atitude seja deplorável, mas que muitas vezes o
são seus resultados. O que pode existir de novo,
se tudo é um “restored behavior”? Existirão novas formas ou modos de recombinar esses comportamentos, um meio amnésico, sempre pensará que à ordem de se sentar, só se responde
sentando-se.
A emergência da Arte, talvez requeira cuidados
intensivos, esse é outro tema que as vezes me
tira o sono. À falta de sono, continua alguma frase
desconectada, que me perdoará o leitor com olhos menos vermelhos. Tenho pensado em sair
com minha ambulância a recolher enfermos terminais que as vezes se confundem com estrelas
fulgurantes. Tenho visto desde o camarote[1] e
metido até os joelhos, o transcorrer das danças
de acasalamento da feira de arte local, mas ainda
me falta poder escrever essa história animal de
ciúme, paqueras e “desplantes”.
Por outra parte, em meio a este estado, intui-se
que não se está preparado para tudo e que as
exposições de galerias as caracteriza o não-risco
e que seu valor principal é cotizar mais aos que
já foram cotizados. Na crise mundial, ainda há espaço para especular um pouco com a saúde e a
vitalidade da arte jovem.
Por que a idéia não tem o valor que deve ter em
um espaço onde se supõe que nós estamos brincando com o pensamento? Se fala de “retornos
ao ofício”, que talvez seja outra forma de chamar
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{46}
ao fato de que nos sentimos mais cômodos com
o mesmo ou quiçá que gostamos de falar o pouco
que sabemos falar. Não vou negar que talvez
também esteja contaminado, caso no qual a ambulância também deve vir por mim para me internar.
Qual seria o diagnóstico deste paciente? Visão
curta, apetite voraz (canibalismo), pouco olfato,
tato seletivo só para o conveniente e um sem
sabor amplo, que só o acalmam muitos poucos
placebos.
}
__________________
Alvaro R. Herrera.
é artista plástico e
visual, observador do
meio artístico e escritor
emergente.
Amigos da libertade de Nicolas Castro. Página 78.
A corrupção na
arte / a arte da
corrupção
{48}
Luis Camnitzer
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
Um dia muito preciso, faz quarenta anos, compreendi cabalmente a obviedade de que a mesma obra de arte que cumpria com meus propósitos como artista era, simultaneamente, um objeto
comercial. Era ainda um estudante de arte nessa
época nos ensinava fazer “arte” (acadêmico e
desconectado da vida real) e não negócios, e o
mercado eram, para mim, tanto uma utopia como
uma revolução social.
Apesar da distância das vendas (não totalmente
salva até o dia de hoje), desde o momento que me
afetou essa realização tive pânico com respeito à
negociação do meu trabalho. Não foi porque não
me interessara o dinheiro, ou porque considerara que minha obra era demasiado “pura” para o
comércio. Era mais devido a uma vaga intuição
e desconfiança de minhas próprias debilidades
– algo ao redor do medo a uma contaminação
de minha faculdade de julgar as coisas. Caso
chegasse a vender uma obra, nunca alcançaria
certezas sobre as motivações que gerariam a
Notas
1.
Quando o autor
escriveu o texto en
1995, a última Bienal
de La Habana havia
sido a quinta (nota do
redator)
{49}
criação da seguinte obra. Nunca saberia realmente se essa nova obra, no caso de seguir pelo
caminho da obra vendida, seria feita para repetir a venda ou porque a investigação merecia ser
continuada.
Infortunadamente o problema não se limitava
a minhas tribulações pessoais. A dicotomia comércio/arte na realidade também contaminava
as certezas sobre o próprio objeto. Pleiteava as
dúvidas sobre o respeito invertido num objeto,
sobre o qual era a cota de experiência autêntica
em relação com a intimidação produzida por um
preço e, em última instancia, sobre as causas dos
fetichismos que governam os gostos, as coleções
e os museus.
Como estudante, a percepção dessas contaminações foram estendendo à situações mais
complexas. Por exemplo, o fato de que os sinais
indicativos de uma identidade têm uma vida extremadamente curta logo morrem no estereótipo.
Esta foi uma percepção que, numa micro escala,
me foi revelada ao ver a obra repetitiva dos últimos anos de Chagall. Em uma escala maior e,
como adulto, o exemplo claro foi dado por certa arte latino-americana que culminou nos anos
oitenta. No caso de Chagall a conformação do estereótipo era conseqüência da perda de suas faculdades criativas. No segundo era conseqüência
de um processo de generalização imposto desde
fora. Em ambas foram produto do mercado.
Durante a década dos oitenta, a arte latino-americana teve uma reviravolta em direção aos artesanatos locais. A cerâmica, as costuras, o rústico
(o uso do barro, palha, pedras e materiais descartáveis) tenderam a substituir o selo de identifi{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{50}
cação que até então havia sido dado à arte pelo
realismo mágico. A mudança foi produzida por
uma confluência de vários fatores. Por um lado
estavam as ideais (mais que as próprias obras)
da “Arte Povera” (Arte Pobre – movimento criado
na Itália na segunda metade da década de 60)
ou, talvez mais, as férteis evocações geradas
pelo nome. Por outro, foi a consciência da relação centro/periferia no campo artístico. Depois de
as batalhas perdidas no campo político durante
as décadas anteriores ficou a tentativa de seguir
a luta em forma artística. Finalmente, por essa
época se renovou um interesse na busca das
raízes culturais – nacionais ou continentais.
O que começou como uma busca de identidade
coletiva foi rapidamente absorvida pelo mercado
intrernacional como uma identidade realizada. O
que era nada mais do que um proceso de tentativa, foi congelado em uma forma. Foi uma manobra inteigente, porque o que havia surgido como
uma resposta a uma necessidade local pode,
assim, ser insertado no mercado como uma categoria separada. Constituia uma categoria não
competitiva e, apesar disso, comercializante. E
ainda melhor, coincidia com uma estética avaliada pela exposição de “Primitivismo” do Museu
de Arte Moderna de Nova Iorque em 1984.
O processo esteriotipação foi ganhando uma
complexidade durante os últimos anos. Com uma
nova rede de galerias locais, economicamente,
forte e uja proliferação de feiras de arte em Latinoamérica, o mercado internacional deixou de atuar
unicamente de longe, e se sobrepôs à periferia. A
retroalimentação da transformação de identidade
em estereótipo se fez ainda mais imediata que no
sistema mais polarizado do passado.
{51}
A transição da identidade ao esteriótipo, desgraçadamente, não é reversível. No mesmo momento em que o artista preocupado por uma arte
de identidade, comunitário ou regionalista é comercializado, sua arte passa a ser estereótipo e
perde sua força comunicativa coletiva inicial. O
recurso artístico sobre que está embasada sua
obra perde efetividade e tem que ser descartado
para deixar lugar a novos recursos, ou tem que
ser reapropriado de tal forma que o estereótipo
volte a ser fresco e útil. Esta reapropriação é
difícil e geralmente vai mediada por períodos de
tiempo relativamente langos (o estereótipo tem
que chegar a ser identificável como tal e seus elementos des-internalizados).
Um dos veículos possíveis mais imediatos e
efetivos para esta reapropriação é o humor e a
ironia, os quais, o expor o processo, abrem as
portas para a reutilização de certos recursos. O
artista colombiano Nadín Ospina tratou de resolver o problema criando versões precolombinas
da família Simpson. As esculturas são feitas por
falsificadores professionais de peças arqueológicas em forma suficientemente precisa como para
confundir os esquemas culturais de arqueólogos
em séulos por vir. Uma exposição recente de três
artistas latino-americanos José Bedia, Carlos
Capelán e Saint Clair Cemin oferece um exemplo no qual, no lugar de uma obra utilizaram as
relações públicas. Os artistas, conscientes das
dinâmicas descritas, escreveram um comunicado
sardônico para a imprensa declarando que:
“Depois de longas discussões e autoanálises chegamos à siguente conclusão: somos ‘artesãos’ e,
portanto nossa atividade será concebida como
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{52}
o próprio ‘artesanato’ de nossa profissão [...].
Neste caso Nossa condição de latinoamericanos
nos permite introduzir uma nova brisa criativa na
produção artesanal ocidental, a qual carece da
‘irradiação espiritual’ e do ‘intangível’, resultando
hoje ainda mais codificada que o objeto mais ‘perfeito’. [...] A vocês, este pacote artesanal típico de
nossa condição canibal, pobre e periférica, porém
completamente pessoal.”
O interessante do caso foi que a mostra, que fora
organizada privadamente por um galerista para
coincidir con a 46º Bienal de Veneza, foi promocionada baixo o título de “Artesanato da Periferia”. Também foi notável o fato que o título tenha
sido criado pelo galerista e não pelos artistas. Assim, o que havia começado como ironia voltou ao
estereotipo.
Não é casual que tudo isto – tanto pelo lado do
galerista como por parte dos artistas – tenha sido
efetuado no contexto de uma bienal internacional. Até meados da década de oitenta estas bienais não vacilavan em presumir em que a arte
é única, universal e com valores homogêneos. A
equação de arte-comércio e arte-hegemonização
não eram ainda o objeto de desafios sérios. Em
1984 se inaugurou a Primeira Bienal de Habana,
começando assim uma nova série de mostras institucionalizadas disenhadas, queira ou não, para
criar uma caixa de ressonância específica para a
arte da periferia.
A distância de uma década, a Bienal de Habana
foi a mais ambiciosa, experimental (com relação
a sua própria estrutura), e mais claramente preocupada pelos temas da marginalidade. A parte
da exposição de obra foi posta num contexto de
{53}
discussões e de atividades culturais com a ideia
geral de alcançar um fórum para o intercâmbio de
ideais para os artistas do Terceiro Mundo (ainda
quando não se conseguira precisar quem pertence quem não a este mundo). Em suas cinco
versões, a mais recente em 1994 [1], a Bienal foi
se afirmando no âmbito internacional como o lu“Kuba O.K. – akgar de apresentação daquela arte que geralmente
tuelle Kunst aus Kuba”,
é invisível no mercado hegemônico.
2.
O projeto da Bienal não foi puramente filantrópico
e idealista. A imagen de Cuba se promocionou
efetivamente e a arte cubano, até então práticamente desconhecida no resto do mundo, começou
a circular rápidamente. O turismo artístico cresceu em progressão geométrica de bienal em bienal, incluído trabalho provenientes dos Estados
Unidos, desafiando as múltiples proibições do
embargo. Com o progressivo éxito da Bienal, as
galerias internacionais começaram a enviar seus
exploradores. Era claro que a Bienal era o lugar
para identificar novos talentos a baixo preço, um
abastecedor de material rejuvenecedor para o
mercado. Em uma das mesas redondas da V Bienal, foi precisamente esse comentário que o galerista norteamericano Alex Rosenberg usou para
elogiar a Bienal. Foi também um conselho que
o colecionador alemão Peter Ludwig havia posto em prática dois anos antes, quando adquiriu
práticamente toda a exposição “Kuba O.K.” que
aconteceu em Düsseldorf. [2]
A equação arte-comércio e arte-hegemonização,
portanto, començaram a substituir os ideais iniciais da Bienal. É assim que o êxito da Bienal de
Habana também simboliza sua morte e obriga a
uma séria revisão estrutural. [3] Os dilemas da Bienal sintetizados em um: é possível utilizar a Pe-
(arte atual de Cuba)
Städtische Kunsthalle
Düsseldorf, em colaboração com o Centro de
Desenvolvimento das
Artes Visuais, Cuba. 1º
de abril até 13 de maio
de 1990. A exposição
organizada pelo diretor
da Kunsthalle, Jürgen
Harten, e pelo artista e
curador cubano Antonio Eligio Fernández
(Tonel), gerou muita
atenção na Alemanha
com relação à arte
joven cubano. Por
meio dela Peter Ludwig
chegou a conhecer esta
arte, da qual adquiriu
numerosas obras. (nota
do redator)
3.
Os organizadores
da Bienal são conscientes do problema e
estão tratando de reorganizar o formato para
a bienal que vem.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{54}
ter Ludwig sem ser utilizado por ele? Provocados
por suas ofertas de dinheiro para marcar obras na
Bienal, se repitem para Cuba inteira. [4] Abel Prieto, presidente da União de Escritores e Artistas
Cubanos, frente à intimação de que Cuba estava
fazendo concesões, não somente ao capitalismo
senão também ao neoliberalismo, recentemente
respondeu:
“Estamos transitando em sentido contrário dos
esquemas clássicos do neoliberalismo: O estado
cubano se associa ao capital extrangeiro, porém
com o fim de gerar e redistribuir os beneficios com
um princípio socialista. Apelamos a certos instrumentos capitalistas para poder sobreviver, porém
não despojamos ao Estado de sua capacidade
de atuar sobre os processos econômicos.” [5]
Temos assim, com tudo dito anteriormente, três
casos representando o mesmo problema, um individual, um coletivo e um institucional (e nacional). Em outras épocas, como a minha pessoal há
quarenta anos, tudo o que se percebia como corrupção se enfrentava em uma forma maniqueísta. Esta percepção extrema das coisas gerava as
intermináveis trifulcas estudantis sobre o fim e os
meios durante minha juventude. Hoje o assunto
se converteu em algo mais borroso, complexo e
frágil: se trata do problema – traduzindo o encontro de Prieto a sua essência – de “como utilizar a
corrupção sem se corromper”.
O dilema não tem solução e, como consequência, armei, para mim mesmo, uma estrutura moral
que terminei denominando “cinismo ético”. A essência desta posição se baseia na ideia de que
se prostituir conscientemente é melhor que se
prostituir inconscientemente. No primeiro caso é
{55}
estratégia, no segundo é corrupção. Como uma
estratégia me serve para identificar a linha que
está por cruzar e, portanto me permite, até certo
ponto, a reversibilidade do ato. Limitando-se a ser
uma corrupção produto da inconsciência, o ato se
vê forçado a desembocar numa retórica justificativa, sem a possibilidade de que aluguém possa
assumir a responsabilidade da decisão.
4.
O uso de Ludwig
aqui quiz ser uma metáfora, porém adquiriu
outra dimensão ao ler
uma reportagem (La
Maga, Buenos Aires,
maio 24, 1995, pp.
36-37) que finaliza com
Ludwig declarando com
relação à Fundação
Ludwig que creara em
La Habana despois da V
Bienal: “Porém primeiro
o importante é ajudar
a artistas cubanos. Despois o siguinte passo
será também ensinar
arte internacional em
La Habana e em Cuba.”
5.
Nelson Cesin,
“Fórum de São Paulo:
Os primeiros aportes”,
Brecha, Montevideo,
Maio 25, 1995, p. 8
A vantagem do uso da estratégia é que permite uma análise das condições. Entre essas
condições, permite a utilização daquelas que
podem levar à implementação de uma ideologia,
mesmo quando esta possa parecer contraditória
pelos passos tomados para instrumentar-la.
Porém esta frase que acabo de escrever é realmente terrível, porque o que termina afirmando
é que o fim justifica os meios. E aquele dia em
que comprendi que o objeto de arte também é
um objeto comercial, a iluminação havia vindo da
crença profunda no oposto: de que o fim jamais
pode justificar os meios.
Os quarenta anos transcurridos não borraram
minha ideologia de então, porém me aclararam
que há uma diferença séria entre minhas crenças
utópicas e puras e a realidade que vivemos. Com
o “cinismo ético” consegui, ao menos, fabricar em
mim a ilusão de que posso seguir mantendo minhas ideas puras ou que, pelo menos, as posso
identificar. Essa pureza (ou, a partir de alguns
pontos de vista, ingenuidade) inclui várias crenças que ainda tratam de guiar meus pensamentos. Uma é que o trabalho artístico individual é
incidental e que a cultura é um processo coletivo.
Outra é que a comercialização é o que sublinha
o mito individualista. E, além disso, que é a comercialização a qual manipula e distorsiona as fun{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{56}
ções das artes nacionais de serem originalmente
expressões comunais a se converterem em expressões chovinistas. E, finalmente, que é a comercialização quem, no campo artístico, converte
a polaridade centro/periferia em uma relação de
poder.
{57}
atributos formais no lugar de comunicativos. Passam a ser uma parte do envoltório artístico no lugar de permanecer como um elemento intrínseco
da comunicação. De acordo com a escala de
valores que determina a qualidade, o envoltório
artístico tem que presumir de certas aspirações
de eternidade. Assim, como a comunicação local
está sujeita a parâmetros temporais variáveis e
passageiros, o “regionalismo” não serviria a menos que contribua com elementos formais à arte
hegemônica. Estabelece-se assim um semi-respeito hegemônico pela arte periférica.
Estas constatações me fecham irremediavelmente em um passado longínquo, porém particularmente a última aparece estupidamente banal.
Dizer que a relação centro/periferia é uma relação
de poder é uma declaração tautológica, já que
precisamente é a relação de poder a que gerou
a nomenclatura. Porém o que é uma obviedade
para os intercâmbios bélicos, políticos e econômicos (e também para os intercâmbios artísticos na
medida em que servem aos anteriores), é ainda
menos para o campo artístico discutido isoladamente.
É menos óbvio porque, em primeiro lugar, as
discussões sobre arte se concentram, ainda, na
“qualidade” do objeto no lugar da escala de valores que determina essa qualidade. Em segundo
lugar, porque presumem que se a qualidade é
legível, transferível, e válida no nível hegemônico, é também na periferia e, em menor grau,
porém também, ao contrário (neste caso a ilegibilidade muitas vezes é atribuída a uma falta de
qualidade). Em terceiro lugar, as discussões não
diferenciam entre função cultural e função comercial. Quando se fala de crise na arte, se fala
simultaneamente de crise formal e comercial no
mercado hegemônico. [6] Tudo isto é para projetar uma imagem da arte como uma atividade
incontaminada, de caráter universal, eterno e absoluto. É assim que os elementos identificatórios
culturais, regionais ou comunais passam a ser
6.
Em um recente
simpósio em que se
discutera a “crise” da
arte de hoje, um dos
artistas participantes,
Carlos Capelán, tratou
de reorientar a discussão pleiteando que
se sentia muito bem e
que estava criando com
toda tranquilidade e
satisfação.
Se os efeitos desta relação de poder consistirem
somente na aceotação de certa arte periférica
no mercado hegemônico e na comercialização
de seus produtos comerciabilizáveis, o tema não
mereceria maior discussão. A outra arte, a dirigida culturalmente a seu público local, poderia
continuar com sua função sem tropeços. Porém
as disjuntivas referentes à corrupção discutidas a
nível individual também operam a nível coletivo.
Os elementos identificatórios, uma vez digeridos
pelo mercado como elementos formais retornam
à periferia como um reflexo enviado por um espelho autoritativo e autoritário. A nível coletivo,
a adoção de certos recursos “refletidos” nesse
espelho impede determinar se está confirmando
um estereótipo com um potencial comercial ou se
está consolidando uma identidade.
As opções viáveis parecem cada vez mais limitadas e as cooptações e estereotipações cada
vez mais rápidas, fortes e, desgraçadamente,
inteligentes. O neo-conservatismo já havia conseguido o desprestígio de muitas posições progressistas simplesmente estereotipando-as com
o termo de “politicamente correto”, termo que,
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{58}
paradóxicamente, foi criado burlonamente pela
própria esquerda norteamericana e que resultara
sua primeira vítima. Um termo de aparição mais
recente, esta vez aplicado mais diretamente às
artes, é o de “arte de vítima”. Foi popularizado
por uma crítica de dança norteamericana, Arlene
Croce, em referência à peça de balé de Bill T.
Jones “Still/Here” (criada ao redor do tema da
SIDA) para justificar sua não assistência ao espetáculo. [7] Em seu artigo Croce tratou de separar
o voyeurismo da crítica, a queixa da expressão,
a terapia da criação. A primeira vista, esta tarefa
parece louvável e necessária. Croce sintiu que
Jones a forçaria demagogicamente a ter comArlene Croce,
paixão pelas vítimas da SIDA – pessoas que são
“Discussing
the Unentrevistadas e atuam na peça – e com isso a
discussable”, The New
invalida da possibilidade de um juizo crítico.
Yorker, dezembro 26/
7.
Croce, implicitamente, tratou de manter sua
própria escala de valores (e sua definição da arte)
intocada pelo conteúdo. Fala de “arte de vítima”
como “uma versão politizada da extorsão à que
apelam criadores, inclusive grandes criadores
como Chaplin em seus momentos de maior autocompaixão”, e termina seu ensaio dizendo que
“somente o narcisismo dos noventa pôde por o eu
no lugar do espírito”. Aos seis meses de existência, o termo “arte de vítima” pôs toda expressão
artística política ou representante de alguma minoria (ou maioria) moderadamente oprimida, em
um contexto de autocompaixão e de explosão
sentimental. Alcançou uma redireção política da
percepção da arte de uma efetividade como poucas obras alcançaram em toda a história da arte.
Se a Croce lhe escape a possível necesidade de
uma redefinição da arte que possa acomodar a
ambas, ética e estética, parece um fato incidental
e secundário dentro de sua ideologia. Uma vez
janeiro 2, 1995, pp.
53-60. O termo foi
criado pelo crítico de
Time Magazine, Robert
Hughes.
{59}
mais a necessidade de mudança e a prória mudança são denominadas “crise”.
Croce, dentro de suas limitações, trata de manter suas escalas de valores claras e separadas.
Nesse sentido, representa dentro do que podemos chamar de uma ideologia hegemonista, uma
posição tradicionalista e conservadora. A posição
de Croce se enfrenta, dentro desse mesmo hegemonismo, a uma tendência muito mais confusa.
É a posição paradigmáticamente representada
pelas campanhas publicitárias de Benetton. As
escalas de valores teoricamente incompativeis,
arte-causas ideológicas no caso de Croce, artecomércio em partes desta nota, todas confluem
completamente em direção a um total integrado
na obra publicitária de Benetton, a qual pareceria
tratar de validar a “arte de vítima”. A integração
é tão exitosa que ainda não encontrei nenhum
texto com uma estrutura teórica coerente capaz
de desarticular o que alguns chaman “benettonismo” sem destruir as próprias posições desde as
quais possa quebrar essa teoria. Por sorte Benetton ainda não teve a ideia de convidar a artistas
“políticos” para a produção de avisos para sua
campanha. O dia que o faça, estes artistas terão
dificuldades para rechaçar a oferta de forma que
não seja usando uma negação fanática, quase religiosa e não argumentativa. A tentação do poder
outorgado por uma difusão extrema, somada à
ausência de uma publicidade comercial explícita,
daria – aparentemente – uma espécie de pretexto
moral para aceitar a oportunidade. Porém seria
cair em uma situação na qual se pode crer que se
está utilizando a corrupção sem se corromper, e
onde se cai – pelo menos a partir do punto de vista aqui expresado – na prostitução inconsciente.
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{60}
Só posso dizer que sou consciente que o “cinismo ético” ao que me referia antes é uma resposta
de caráter esquizofrênico frente a toda esta situação. Com esta resposta trato de manter separadas nítidamente duas escalas de valores contraditórias. É meu único recurso (até este momento)
no meio onde sinto que a esquizofrenia, com
relação aos valores, há conseguido un estado
de implosão. Nesse estado as superposições de
escalas de valores não similares ocultam todas
aquelas discrepâncias que antes nos permitiam,
com tanta elegância, os maniqueísmos e os purismos essencialistas. Esta esquizofrenia implosionada, que mais superficialmente e com certo
simplismo se registra simplesmente como hipocresia, conseguiu o milagre admirável de elevar a
esquizofrenia aberta e tradicional a um nível ético
superior.
Tenho que terminar, entãos, confessando uma
saudade romântica pela época em que era possível crer solidamente que o fim jamais justifica
os meios. Não era realmente certo naquele, pero
a pessoa tinha o poder de pensar que era certo.
Quiçá, na atualidade, o único caminho que fica
transitável em direção a uma utopia seja o de
manter viva a facultad de especular, não que seja
certo, senão sobre a possibilidade de que seja
certo. Quiçá a luta de hoje, muito modesta, tenha
que se limitar a tratar de que não nos tirem isso
também.
Porém há outra coisa que é evidente. Se um
simples uso dos termos tão esquemáticos como
“políticamente correto” e “arte de vítima” alcança
para maltratar e desprestigiar ideias que percebimos como complexas e válidas, quer dizer que
há algo em nossas plataforma que necessita um
{61}
sério ajuste. E esta tarefa de ajuste provavelmente é uma tarefa na qual a saudade não tem
cabimento.
Este texto ia terminar aqui, porém na pude ficar
nisso. Entreguei a vários amigos para lê-lo para
ver que o pensavam. Um em particular, com a
metade de minha idade e autodefinido como esquerdista, fez três comentários. O primeiro, meio
fulminante consistiu em: “Muito bom, sem buracos, porém muito setentoide.” O segundo, meio
desconcertante, foi: “A mim não parece ruim a
compania de Benetton.” O terceiro, quiçá com
mais fermento, foi: “Não tenho uma solução clara,
creio que a ética é fundamental, e penso que o
assunto consiste em continuamente entrar e sair,
entrar e sair.”
Não consegui tirar arteiramente elaborações
teóricas sobre tudo isto e meu primeiro trabalho
consistiu em me levantar do descobrimento que a
quebra das gerações me tocou tão sério. Sempre
falo dessa quebra, porém é uma forma de charme,
uma afetação que tampa a crença de que sigo vivendo dentro da geração jovem. Porém uma vez
recomposto, a terceira observação se fez mais e
mais interessante. O que meu amigo pleiteava
era uma estratégia de infiltrações múltiples, suficientemente curtas como para não terminar absorvido ou coagido, porém aceitando a existência
da realidade em seus próprios termos no lugar de
negá-la em termos idealistas. O secredo do tipo,
que nunca alcançou a me dizer – quiçá porque
ele mesmo não se deu conta – era que aceitar a
realidade em seus próprios termos não é sinônimo de aproaar essa realidade. As infiltrações sucessivas – e estou falando teoricamente, porque
não tenho ideia de como se instrumenta isto na
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{62}
prática – tem a vantagem de não ter tempo para
contaminar ao infiltrado.
A diferença de generações, então, está em certa
inocência das novas generações e sua presumível capacidade de manter-la. Quando eu falo de
“prostituir-se conscientemente” como uma forma
de proteção contra a corrupção, estou na realidade pleiteando uma estratégia que também é
maniqueísta. Equipara o “entrar” com o “prostituir-se” e aceita a perda da inocência como algo
inevitável, como um evento de dimensões quase
bíblicas. A estratégia da infiltração múltiple e curta parece não tocar a inocência.
É interessante, voltando ao exemplo de Cuba,
que no principio desta década, quando a maioria
dos artistas consagrados tinham ido embora do e
a economia também, mi predição foi o desastre
artístico. O anel pedagógico entre os formados e
os formandos quase havia partido, os subsídios
para a arte desapareceram, a competição entre
os artistas por se estabelecerem em um mercado limitado se fez aguda. E sem embargo surgiu
uma nova geração fértil, estéticamente e éticamente crìtica. Que vende e que apesar de vender
mantem seu humor.
E no final da contas tudo parece confuso e confusionista, falsamente aclarado por esquemas
insatisfatórios, porque não enfocamos o nó do
problema. Na realidade todos estamos lutando
pelo poder em dar significado às coisas. Como
disse o antropólogo sueco Ulf Hannerz, está
o mercado, está o governo e está a “forma de
vida”, ou seja, a cultura produzida pelas pessoas
à margem do mercado e do governo. [8] Ainda
que às vezes coincidam em seus valores, cada
{63}
um destes entes tem suas próprias dinâmicas
para significar as coisas. É um fato que temos
que passar por alto, em grande parte porque o
artista, o significador por excelência, se prende a
distintas causas em distintos momentos, melhor
dizendo, distintos artistas se comprometem com
entes distintos. Então um governo e um mercado
podem ser nacionalistas enquanto a forma de
vida e os artistas são regionalistas, ou os artistas e o mercado são globalistas enquanto que o
governo e a forma de vida são localistas, ou o
governo serve a outro governo enquanto que os
artistas e a forma de vida resistem etc. As permutações são muitas, porém ao final o que fica é
uma acumulação de significados que determinam
a cultura a qual formamos parte, a qual, querendo
ou não, todos contribuíram.
O sociólogo francês Pierre Bourdieu analizou
algumas destas coisas em seu livro “O Campo
da Produção Cultural”. Descrive a arte autônoma como aquela que históricamente surgiu em
oposição a, por um lado, arte representante dos
valores burgueses ou dominantes no século XIX
e, àquele outro que, socialmente revolucionário,
foi criado para combater esses valores. Porém
também aqui tem uma tríade impura, onde as
alienações mudam constantemente de acordo à
situação social e a que poderes dominam a sociedade.
8.
Ulf Hannerz,
“Scenarios for Peripheral Cultures” en: Culture, Globalization and
the World System, pp.
107-128.
A verdade é que o purismo de minha juventude, rígido y dogmático, conduzia irremediávelmente a um
elitismo que minha generação, em termos políticos,
negava fervorosamente. Separava ao artista, ainda
quando politizado, da realidada, dessa realidade
que inclue governos, mercados e gente, para lhe dar
o monopólio do proceso de significar as coisas.
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SETEMBRO 1 - 2010
}
__________________
Luis Camnitzer.
1937
Lübeck,
Alemanha.
Crecseu
em Uruguay, país do
que é cidadão. Mora
em Nueva York EE.UU.
Em 2002 participou
na Documenta 11 de
Kassel.
Fotografías: Sub Cooperativa de Fotógrafos
{{em_2: BICENTENÁRIOS POSTMORTEM
{64}
O reconhecimento desses erros do passado não
implica uma mudança em minha posição ética.
Quiçá resulte, em um futuro, em uma mudança
de estratégias, ainda que em meu caso duvide. E
todas estas considerações tampouco geram em
mim uma maior simpatia pelos avisos de Benetton, ainda que não possa evitar certa admiração.
Assim que o único que alcanço com tudo isso é
voltar a sentir o principio das coisas e renovar a
certeza de que tudo é muito, muito complicado.
.
{66}
{67}
Paula Silva.
Versões em espanhol e inglês no endereço:
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}
Copy wright Copy wrong
De meu último projeto surgiu uma pergunta tremendamente importante que nunca tinha feito a
mim mesma e que nunca tinha perguntado a ninguém mais:
Está claro que quando um artista está vivo tem
todo o direito de decidir em que exibições participa, pelo menos quando as obras expostas ainda
lhe pertencem.
Porém o que acontece quando um colecionador
empresta uma de suas obras para que seja incluída em uma exibição?
É mais, há que perguntar o que acontece com
estas decisões quando o artista já não está vivo
e portanto já não pode emitir juízos e tomar decisões sobre os projetos os quais lhes propõe
participar?
Quem decide que é uma boa idéia, que tem sentido participar em uma exibição determinada e
não em outra?
Isto foi o que aconteceu:
1. O Centro de Formação da Cooperação Espanhola em Cartagena na Colômbia me pediu que
fizesse uma curadoria para uma exibição. O tempo de aviso foi realmente curto. A exibição estava
planejada para o mês de Maio, e fui avisada em
Março, de forma que só tive um par de meses
para planejar e executar tudo.
Da esquerda para direita: Isabel Ramirez, Adriana Marmorek, “Feliza Bursztyn”, Paula Silva
Foto: Angela María Arango
2. Decidi trabalhar com Adriana Marmorek. Faz
anos tive uma frutífera relação curador - artista
com ela, e me interessou muito a idéia de trabalhar com uma artista que já explorou o tema do
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{68}
desejo a partir de uma posição feminina, heterossexual (porém não feminista e militante) e exibir o
trabalho que costuma ser um claustro para seminaristas católicos.
3. O Centro (CFCE) me informou que sua política
é nunca fazer exposições individuais. Isto gerou
o dilema de encontrar um artista que pudesse
estabelecer um diálogo coerente com o trabalho
de Marmorek. Depois de pensar, profundamente,
por várias semanas e de revisar, literalmente, até
o último catálogo em minha biblioteca decidi trabalhar com Feliza Bursztyn. Ela foi uma das artistas conceptuais mais importantes da Colômbia,
porém morreu em 1982 enquanto almoçava em
Paris com Gabriel García Márquez; com uma brilhante carreira artística ainda diante dela. Cheguei
à conclusão que ambas são figuras insulares no
tratamento do tema do desejo a partir de um ponto de vista similar e que suas obras ressonam de
maneira surpreendente, tanto conceitual quanto
formalmente.
4. Encontrei o e-mail do viúvo de Feliza. Escrevilhe. Descrevi-lhe o projeto. Mandei-lhe um link ao
portfólio de Adriana e, mandei-lhe, ainda, o meu
currículo resumido.
5. Ele respondeu. Disse: “Muito obrigado por seu
interesse na obra de Feliza. Com relação à exposição neste momento eu não posso lhe colaborar porque estou com muitos compromissos que
ocupam todo meu tempo e atenção. A parabenizo
por seu currículo e lhe agradeço toda a informação que me enviou e lhe desejo os maiores êxitos
em seu trabalho. Cordialmente, Pablo Leyva”.
{69}
ele me desejou boa sorte! Consegui que dois museus me emprestassem obras de suas coleções
permanentes (Museu de Arte Moderna de Bogotá
- MAMBo e o Museu de Arte Moderna de Cali,
La Tertulia). De fato, me emprestaram as obras
mais representativas que Feliza fez falando clara
e abertamente sobre o sexo e o desejo. Emprestaram-me também duas de suas Camas [Obra
importante de Bursztyn].
7. O projeto ficou nas mãos da impecável coordenação logística de Isabel Ramírez. As obras
chegaram a Cartagena em caixas adaptadas,
perfeita e profissionalmente embaladas, na tarde
de 30 de Abril.
8. Justo antes de sair da oficina naquela tarde de
sexta-feira recebi uma ligação da assistente de
Isabel, que em pânico me falou que Pablo Leyva tinha ligado para ela e de maneira bastante
grossa alegava negar a permissão para utilização
do nome da artista e usar imagens de sua obra.
Disse-lhe que deveria estar agradecida por ele
ter telefonado e não o seu advogado. A chamada
veio acompanhada de um e-mail dirigido à diretora do Centro (CFCE) informando ambas as notícias.
9. Adriana e eu chegamos a Cartagena no domingo à tarde, prontas para iniciar o processo de
montagem na segunda-feira 03 de Maio. Justo
antes de começar o Centro me pediu para atender
as mensagens de Pablo Leyva. Deixei-lhe uma
mensagem no celular (que não respondeu) e lhe
enviei um e-mail (que também não respondeu).
Simplesmente lhe pedia que elaborasse um pouco os motivos de suas contestações.
6. Continuei com meu trabalho. Depois de tudo,
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{70}
10. Comentamos a situação a uma advogada especialista em direitos do autor. Ela nos explicou
algumas coisas que já sabíamos (que estamos
legalmente obrigadas a mencionar os nomes de
todos os artistas em exibição e que a pessoa ou
instituição que é dona do material fotográfico tem
que autorizar sua reprodução em meios impressos). Porém, também mencionou coisas que não
sabíamos (que os direitos morais de um artista
sobre sua obra são intransferíveis, que as imagens que se utilizam para jornal e comunicados
públicos não necessitam permissão porque estão
dentro da lei de liberdade de expressão e comunicação pública, e que a aplicação dos direitos do
autor tem limitações a favor da exibição de obras
em instituições educativas e com finalidades de
formação).
11. Ao ter recebido um e-mail do MAMBo no qual
autorizava a impressão e publicação da única foto
da obra de Feliza que havia no catálogo, liguei
para o museu para colocá-los a par da situação.
Ainda que não houvesse uma situação similar
com o Museu da Cidade de Cali “La Tertulia”,
também nos comunicamos com eles para informar sobre o tema.
12. A pessoa do MAMBo que havia enviado a autorização mencionou que conhece a Pablo Leyva
faz décadas e que se oferecia a chamá-lo para
convencê-lo a conceder-nos a permissão para
publicar a foto da obra no catálogo.
13. No dia antes da inauguração recebi uma
chamada do MAMBo. Eles tinham falado com
Pablo Leyva e ele havia dito que desde o principio tinha se manifestado, abertamente, contra
a exibição (o que é falso, como consta no único
{71}
e-mail que ele me enviou), e que não autorizaria
que se levasse a cabo o projeto. A diretora e a
curadora do museu se reuniram e decidiram retirar o empréstimo, no momento em que o projeto
estava a ponto de ser aberto ao público e quando
o Centro já havia pagado todos os custos de seguro, transporte, conservação e montagem.
14. Um pouco mais tarde, o Centro recebeu um email de Pablo Leyva dizendo que o MamBo tinha
ligado para lhe perguntar se ele tinha autorizado
a exposição (que não é o que a pessoa no MAMBo tenha dito que ia fazer) e no qual dizia que não
autorizaria usar o nome de Feliza ou imagens de
sua obra.
15. A reação do Museu La Tertulia foi exatamente
a oposta: nos comunicaram sua firme intenção de
manter a obra em exibição e sua fé no projeto.
16. Tomei a decisão curatorial de lacrar a obra
novamente e exibir a embalagem onde antes
teria ficado a Cama. Sem embargo, a direção do
centro cedeu às reclamações de Leyva. O nome
de Feliza está coberto com uma faixa preta em
todos os lugares onde aparecia no espaço destinado na exposição. Também decidiram manter a
obra retirada em exibição, porém fora do espaço
da exposição. Isto foi possível porque o MAMBo
nunca comunicou formalmente que tinha retirado
as obras emprestadas. Se isto tivesse chegado a
acontecer, o Centro lhe cobraria ao MAMBo todos os custos relacionados com esta obra.
Então: definitivamente, não é um debate fácil de
solucionar. Feliza doou a obra diretamente ao
MAMBo em um momento no qual não era usual
que os artistas deixassem um papel assinado
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{72}
explicando as condições nas quais se doava
uma obra. Isso não é surpreendente; depois de
tudo, isto só está começando a se converter, lentamente, em uma prática usual hoje em dia na
Colômbia.
Sem embargo, a lei Colombiana diz que os direitos morais são intransferíveis; que estes são
direitos que todo artista tem para decidir o que
fazer, onde exibir, como vender e como promover
suas obras. Se queremos ser legalmente justos,
Pablo Leyva não tem o direito de vetar ou aprovar
a exibição das obras de sua falecida esposa. Esses direitos morreram com ela. Serão dela para
sempre e agora essas decisões são do domínio
das pessoas e das instituições que hoje são donas de suas obras.
{73}
seguinte, a pessoa que estava encarregada de
responder pela obra era Pablo Leyva. Portanto,
não me surpreendeu de forma alguma que desde
sua morte em 1982 sua obra só foi exibida em
oito exposições coletivas (o que da uma média de
una exibição a cada três anos; porém é importante
mencionar que só teve uma exposição em toda a
década de 90) e em somente uma exposição individual (não sorprendentemente, organizada por
um grupo de três exclusivos curadores, incluindo
o filho de Pablo Leyva).
Porém a história se enreda mais: Feliza Bursztyn teve três filhas de um matrimônio anterior. Os
direitos patrimoniais (o direito de lucro de uma
obra de arte) são herdados de uma maneira genealógica, não através de contratos matrimoniais.
Isto quer dizer que quem tem direitos sobre as
obras de Feliza são suas filhas e não seu viúvo.
Não quero descartar a possibilidade de que é verdade que se precisará da autorização do herdeiro
para publicar a foto, porém acredito que há que
revisar esta questão porque o Centro de Formação da Cooperação Espanhola está dedicado à
promoção educativa e cultural, e está é uma das
circunstâncias que limita a aplicação da lei de
direito de autoria. Eu assumiria que ao estar atuando dentro de um entorno educativo poderíamos
promover a obra de Feliza livremente, incluindo
imagens. Porém, acredito que este é um veredicto que deve emitir um advogado especialista em
diretos de autoria.
Ainda que tenha sido possível distribuir as imagens da obra na imprensa, deduzimos que o
problema estava na publicação da foto no catálogo. Tínhamos a razão em pedir licença ao
MAMBo. Eles contrataram a um fotógrafo para
que tirasse a foto, e, portanto deveríamos dar-lhe
créditos (como, efetivamente, se fez na publicação). Sem embargo, depois da primeira ligação
de Leyva assumimos que também era necessária
a permissão dos herdeiros. As filhas de Feliza
vivem fora da Colômbia e não pudemos encontrar a maneira de contatar-nos com elas. Por con-
Não há debate no circuito artístico Colombiano
e Latinoamericano sobre a crucial importância
de Feliza Bursztyn no desenvolvimento da arte
colombiana contemporânea. Era una artista valente, irreverente e altamente inovadora. Cruzou
limites, burlou-se da sociedade conservadora
colombiana dentro da que viveu e trabalhou. A
tragédia não é só que tivesse morrido tão jovem,
mas também porque sua obra tivesse sido silenciada consistentemente, e, portanto tem estado
ausente da exibição, promoção e estudo do importante trabalho artístico de sua geração.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{74}
Suponho que a figura que oferece o maior contraste é a de Marta Traba, a crítica Argentina que
teve o poder de afundar a carreira de vários artistas porém que demonstrou ser fundamental
para a promoção da geração de artistas da que
Feliza fez parte. A obra de Traba ainda é publicada, revisada, estudada e lida. Ela é ainda uma
figura vivente na cultura contemporânea Latinoamericana, apesar de ter morrido apenas um ano
depois de Feliza.
Outra seqüência de perguntas surge de toda a
situação: Que classe de título Pablo Leyva tem
que lhe permita autorizar ou não a reprodução
de imagens da obra de Feliza? Tem um testamento, um poder legal que Feliza ou suas filhas
lhe tenha entregado que lhe permita fazer isto?
Estas são perguntas puramente práticas. Obviamente, eu imagino que a obra de Feliza é um assunto profundamente pessoal para ele (e isto é
algo que verdadeiramente respeito), porém, ele
não deveria pelo menos ser capaz de demonstrar
sua habilidade legal para atuar, especialmente se
sua intenção é impedir a promoção artística e cultural e o entendimento do seu trabalho da artista?
Ninguém nunca lhe pediu que apresentasse essa
documentação?
Terminamos com a pragmática. Agora vamos
passar às perguntas mais filosóficas:
Se uma instituição cultural, tal como é o Centro
de Formação da Cooperação Espanhola, contrata um curador e lhe encarrega a realização de
una exposição, seguramente isto quer dizer que
confiam no critério e habilidade da pessoa para
realizá-la. Mais ainda; dois dos mais importantes
museus da Colômbia, contando com a opinião de
{75}
suas equipes profissionais em arte, tomaram a
decisão (devidamente informada) de emprestar
suas obras para o projeto. Como é que alguém,
não só alheio ao mundo da arte como também
da esfera institucional envolvida na produção do
projeto, tem o poder de intimidar a equipe profissional de um museu e se converter em um obstáculo para o êxito deste? A julgar pelo número
de exibições nas quais se apresentaram obras de
Feliza durante os últimos 28 anos, assumirei que
esta não é a primeira vez que algo assim sucede
(e não deixarei de pedir desculpas se estiver
equivocada).
Mais ainda, se isto pode acontecer e de fato
ocorre, não poderia acontecer também o contrario? Não poderia alguém, qualquer pessoa,
apresentar uma autorização escrita para que a
exposição se celebrasse? Nenhum dos dois terá
a documentação escrita que contradiga ou afirme
suas ações. Qual síria a diferença?
Suponhamos que Pablo Leyva tem os seguintes
diretos (devidamente documentados por escrito,
firmados por Feliza):
* Proibir o uso de seu nome (tecnicamente, isto
queria dizer que teríamos que lhe pedir uma permissão para poder ter esta discussão).
* Proibir a reprodução de imagens de sua obra,
inclusive em esferas não comerciais e educativas.
* Vetar e aprovar as circunstâncias nas quais sua
obra pode e não pode ser promovida e exibida.
Nesse caso, não deveríamos estar revisando
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{76}
muito cuidadosamente a maneira como temos
escrito nossa lei de direitos de autoria? Não estamos condenando aos artistas ao olvido se esta é
a maneira como se deve aplicar essa lei?
Uma vez mais, chego a uma conclusão a partir de
assumir certas coisas. Assumamos que o objetivo de Pablo Leyva é preservar a memória de Feliza e honrar a importância de seu trabalho para
a arte colombiana. Não o alcançaria melhor se
apoiasse sua promoção, estudo e exibição?
Agora assumamos que talvez não esteja motivado por essas intenções altruístas, mas sim que
seu interesse é se beneficiar economicamente da
obra de Feliza. De acordo com o comportamento
normal do mercado da arte, os preços das obras
de arte tendem a subir, proporcionalmente, com
a visibilidade e atividade do artista no circuito
artístico. Não deveria então, Pablo Leyva, se dar
conta de que ajudar a promover a obra de Feliza
é uma opção muita melhor do que proibir sua exibição?
Ainda que Leyva nunca mencione em seus emails e o MAMBo não me disse em muitas palavras, entendo que Pablo Leyva se sente incômodo com o tema da exposição. Quando Feliza
exibiu suas Camas pela primeira vez no MAMBo
em 1974 (se, o próprio MAMBo que faz um par
de semanas retirou a mesma Cama da exibição
em Cartagena) teve dois debates que suas obras
motivaram: o primeiro ocorreu entre Marta Traba
e Álvaro Medina (Medina alegava que as obras
não eram originais e que Bursztyn tinha copiado
a idéia de uma artista dos Estados Unidos, enquanto que Traba a defendia); o segundo, sobre
sua alusão sexual, não esteve presente nas pági-
{77}
nas dos jornais e revistas, mas sim nas bocas dos
conservadores colombianos que viram a mostra.
Imagino que a Feliza deu muita risada dos comentários. Depois de tudo, não se suponha que
a obra fosse uma dissertação séria sobre o sexo
e sobre o desejo. Supor-se-ia que tinha que ser
divertida.
A ironia não é que a obra se deparara com a censura em 1974, mas sim que hoje em dia esteja
sendo submetida a esse mesmo tipo de censura,
porém desta vez exercida pela pessoa a quem
ela escolheu como companheiro na vida (e para
ela, a vida e a arte eram uma mesma coisa).
Tenho tentado analisar a situação desde o ponto
de vista do senhor Leyva. A melhor conclusão à
que posso chegar e que ele acredita que estudar
a obra de Feliza desde o ponto de vista de suas
alusões ao sexo e o desejo poderiam danificar a
percepção de sua obra. Quero dizer que sua obra
poderia perder seriedade, perder valor no mercado da arte, fazer-se menos interessante para que
críticos de arte e para que curadores trabalhem
com ela. A outra opção é que considere que a
obra de Adriana Marmorek é irrelevante.
O dia depois da inauguração “El Universal”, um
dos jornais mais importantes de Cartagena, publicou uma crítica da exposição. Dizia que “As obras
de Burzstyn estabelecem uma nova dimensão
contemporânea ao se apresentar com as obras
de Adriana Marmorek, quem integra a fotografia,
o vídeo e a instalação”. Tendo em conta o amplo interesse da arte contemporânea em relação
ao corpo e sua construção social, o redator da
seção cultural do jornal faz afirmações que tem
sentido. A obra de Feliza tem sido estudada,
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{78}
{79}
tradicionalmente, em seu aspecto formal. Tem
sido amplamente reconhecida como uma figura
crucial para a escultura colombiana e sempre
mencionada como a primeira artista que introduziu o movimento físico em seu trabalho. Porém
sua posição sobre ser mulher, sobre ser ativista,
sobre o corpo e sobre o sexo (ao que várias de
suas obras aludem) tem sido escassamente estudada. Não deveria, então, resultar um beneficio o
fato de sua obra ser considerada desde um ponto
de vista contemporâneo? Isto não valida sua importância tanto no passado quanto no presente
da arte contemporânea colombiana?
Poderíamos iniciar uma discussão distinta e muito
longa sobre como se entende e se aplica a lei de
direitos autorais nas artes visuais. Acredito que a
música e o cinema são gêneros que hoje têm regras mais claras às que nós devemos atender (e
há que aclarar que o caminho que tem levado ao
estabelecimento dessas leis não tem sido pouco
complexo e está longe de estar terminado), porém
acredito que é hora dos profissionais das Artes
Os museus deveriam ter o direito de reproduzir
imagens de obras que estejam em suas coleções.
Isto é parte de sua responsabilidade frente aos
artistas os quais acreditaram. Porém, os museus
deveriam estar mais interados dos direitos que
os herdeiros dos artistas têm e saber o quão tão
longe pode chegar na vigilância dos direitos da
obra do seu ser querido.
E triste ver como uma aplicação excessiva dos
direitos autorais (possibilitada pela profunda incompreensão das leis de direitos autorais, leis
simples, básicas e disponíveis publicamente)
pode silenciar e danificar um artista em vez de
protegê-lo. É claramente um péssimo uso das
leis de direitos autorais.
}
Já é hora de começar a ter esta conversa.
}
É correto assumir que Pablo Leyva impediu a celebração de outros projetos. Por que não há instituições que respondam e façam algo a esse
respeito? Sempre entendi que a missão de um museu não é somente a preservação de objetos culturalmente relevantes, mas também a promoção
de seu estudo em conferências cada vez mais
amplas no decorrer do tempo. Se o museu entra
em pânico ao perceber uma situação incômoda
(porém de nenhum ponto de vista problemática
ou paralisante) está faltando com sua missão?
Não está faltando se prefere evitar uma conversa
incomoda a defender sua decisão de promover
um artista em um evento determinado?
Visuais começarem a pensar nesta questão.
Este texto está dedicado a Adriana Marmorek e
a Feliza Bursztyn. Duas artistas valentes e inovadoras que nunca temeram manifestar suas opiniões abertamente.
}
__________________
Paula Silva.
Crítica e critica da arte
colombiana.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{80}
{81}
Amigos da libertade de nicolas.
http://amigosdelalibertaddenicolascastro.wordpress.com/
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
Amigos da
liberdade
de Nicolas Castro
Os amigos da liberdade de Nicolás é um grupo
heterogêneo de pessoas que desde dezembro de
2009, nos unimos baixo a consigna de sermos
“amigos da liberdade”. O grupo, inicialmente, formado por companheiros e amigos mais próximos
a Nicolás Castro, se expandiu rapidamente na
comunidade artística local, chegando inclusive a
receber apoio desde fora do país. O comunicado
inicial, que define a razão de ser desta coletividade foi redigido e enviado pela web, no dia 3
de Dezembro de 2009, data em que os meios de
comunicação na Colômbia mostraram a captura
do jovem universitário, por fatos que hoje em dia
parecem ser produto de uma montagem midiática, do que alguns qualificaram como um “falso
positivo judicial”[1]; o comunicado foi o seguinte:
Nicolás Castro de 23 anos, estudante de Belas
Artes da Universidade Jorge Tadeo Lozano de
Bogotá-Colômbia, foi levado pela policia judicial
no dia 2 de dezembro de 2009, acusado de criar
um grupo na rede social de internet Facebook,
intitulado “me comprometo a matar a Jerónimo
Alberto Uribe filho de Álvaro Uribe”. Na Colômbia
ele é acusado de instigação a delinqüir segundo
o artigo 348 do Código Penal, o qual significa que
Nicolás Castro estaria incitando a outras pessoas
a cometer o delito de matar a Jerónimo Uribe filho do presidente. Por tal razão, desde o dia 3 de
dezembro Nicolás está no Presídio “La Picota”
de Bogotá esperando ser julgado. Nós, os “amigos da liberdade de Nicolás Castro”, queremos
convidar a comunidade nacional e internacional a
se unir a esta causa, pois nós que o conhecemos
podemos dizer que Nicolás não seria capaz de
http://www.
atentar contra a vida de um ser, ou incitar a out- lasillavacia.com/
ros a fazê-lo. Suas expressões sempre têm sido historia/9091
pacíficas quando expressa seu desacordo com
Notas
1.
Nicolas Castro Plested na Universidade Jorge Tadeo
Lozano. 2009
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{82}
{83}
diferentes situações, como no caso do maltrato
animal, a falta de proteção às crianças ou quando
manifesta sua posição frente ao consumo; razões
pelas quais decidiu ser vegetariano e estar contra
às corridas de touros, participar de projetos sociais que vão a favor da infância, organizar venda
de frutas e alimentos saudáveis dentro da Universidade Jorge Tadeo Lozano (como forma de
gerar opções de consumo dentro da comunidade
estudantil), entre muitas outras ações que realiza
no seu cotidiano que confirmam as qualidades
humanas de Nicolás. Os “amigos da liberdade
de Nicolás Castro” apoiamos as palavras que ele
pronunciou durante sua primeira audiência: “Eu
somente sou um estudante, não sou um instigador, nem um terrorista”.
Os Fatos que este primeiro comunicado cita,
foram amplamente conhecidos pela opinião pública colombiana, desatando um boom midiático gigantesco, o qual teve cobertura nacional e internacional da imprensa, rádio e televisão. No dia 3
de Dezembro, o rosto de Nicolás já era conhecido
por todo o país. A imagem projetada na tela de
televisão e nos fragmentos de imprensa local do
jovem Nicolás Castro era o clássico retrato do terrorista, que inclusive parecia ter “conexões com
Al-Qaeda e afinidades com o regime político da
Irã” [1]. Esta situação, que para aqueles que o
conhecemos no diário viver de um estudante de
artes universitário era o reflexo alarmante de uma
mentira a gritos, uma macabra versão de nosso
amigo fabricada por aquela maquinaria midiática,
tão grande que o tinha engolido. Desde aquele
momento ele era um produto empacado, etiquetado e posto ao consumidor, com o típico discurso
do medo e do terror.
Esta situação nos conduziu a nos unir como amigos e companheiros de Nicolás. Aquela união foi
motivada pelo verdadeiro terror que se produzia
em nosso corpo, sentir esse grande poder imensurável, incontrolável, que os meios de comunicação e o estado poderiam chegar a exercer
sobre nossa subjetividade como indivíduos. Do
medo e do terror nasceu a união, a amizade e a
força que combateu o cenário no qual agora éramos partícipes. Desta forma, o pequeno grupo de
amigos começou a buscar a forma de expandir a
mensagem liberadora, sobre nossa versão (que
era verdadeiramente oficial) sobre Nicolás Castro
Plested.
2.
Para maior informação dirija-se à
página de internet dos
amigos da libertade de
Nicolás, para sessão
Blogroll: http://amigosdelalibertaddenicolascastro.wordpress.com/
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{84}
{85}
Aquela mensagem era por sua vez, uma forma de
expandir o grupo amigos da liberdade, de chamar
o desconhecido para formar parte dessa comunidade e a ser portador de nossa mensagem. Assim, nós amigos da liberdade de Nicolás geramos
uma rede de comunicações num grupo crescente
de pessoas (artistas, professores, estudantes,
etc.), aqueles que durante os quatro meses nos
quais Nicolás esteve na prisão, permitiram criar
um lugar para combater o medo e, de igual forma,
fazer ouvir a verdadeira voz do estudante universitário, calada por um grande tempo pelos meios
massivos de comunicação.
A mensagem que os amigos da liberdade de Nicolás levaram foi transmitida para o público, mediante uma série de ações artísticas levadas a cabo
no espaço urbano da cidade, assim como na web
onde o caso alcançou um seguimento permanente e onde se buscou expandir os efeitos das ações
que se desenvolveram na rua. Entre as ações
feitas em Bogotá podemos mencionar “É melhor
dar pouquinho mamão”[3], onde se entregava ao
transeunte um pequeno jornal com nossa mensagem sobre Nicolás, ao mesmo tempo que se tocava música e se oferecia pequenos pedaços de
mamão ao público, fazendo alusão a esta frase
popular colombiana. De igual forma, se desenvolveu a ação plástica “O carteiro”, realizada em
conjunto com o artista Mario Opazo. Nesta atividade convidavam ao público a se converterem
em “carteiro” de uma mensagem sobre a situação
e a realidade de Nicolás que era entregue nas
ruas e deixada embaixo das portas de casas e
apartamentos, para esta atividade se redigiu uma
carta que era assumida conceitualmente, como
uma prisão. A mensagem convidava a liberar a
mensagem, para que fosse replicado na comuni-
dade e no entorno de quem o recebera.
De igual forma, realizou-se uma jornada de impressão em camisetas com mensagens de apoio
3.
Para ver o registro da ação dirija-se a:
http://www.youtube.
com/watch?v=j_jxF0dpKHo
a Nicolás na Universidade Jorge Tadeo Lozano
no primeiro dia de aulas do primeiro semestre de
2010, tempo acadêmico durante o qual o jovem
universitário permaneceu preso na “La Picota”.
Esta atividade fez parte da ação “O carteiro”, a qual
se somou a palestra “A liberdade de expressão na
arte” [4], realizada na ASAB (Academia Superior
de Artes de Bogotá) como parte das atividades
desenvolvidas dentro da mostra de projetos de
graduação dos estudantes, com o Doutor José
Gregório Hernández, ex-magistrado da Corte
Constitucional, o Doutor Guillermo Hoyos, Diretor
4.
Para escutar o
registro completo da
palestra dirija-se a:
http://www.goear.
com/listen/393d6ae/
conversatorio-del2-de-febrero-en-laasab-sobre-el-casode-nicol%C3%A1scastro-y-la-libertadde-expresi%C3%B3nconversatorio-asab
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{86}
do Instituto Pensar da Universidade Javeriana e
Victor Laignelet, diretor de Artes da Universidade
Jorge Tadeo Lozano.
Paralelamente a estas atividades o artista Mario
Opazo, quem já tinha entrado no grupo amigos
{87}
da liberdade de Nicolás na ação plástica “O
carteiro”, levou a cabo uma performance que
intitulou “Aquí falta alguém”, no campus da Universidade Jorge Tadeo Lozano, como resistência
ou rechaço ante o aprisionamento do estudante.
Com os olhos vendados e um livro de filosofia
de Platão em sua mão esquerda, percorreu os
corredores e diversos lugares da universidade
no horário de classes diurno, desde as nove da
manhã até as cinco da tarde no dia 29 de Janeiro
de 2010.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{88}
{89}
Internacional errorista
Primeira Declaração
“Todos somos erroristas”.
1.- O “Errorismo” sustenta seu conceito e sua ação sobre a idéia que o
“erro” é o novo principio ordenador
da realidade atual.
2.- O “Errorismo” é uma posição
filosófica equivocada, ritual da negação, uma organização da inexistência desorganizada. A falha como
perfeição, o erro como acerto.
3.- O campo de ação do “Errorismo”
abarca todas as práticas que tendem para a LIBERAÇÃO do ser humano e da linguagem.
4.- A confusão e a surpresa são as
ferramentas preferidas dos “erroristas”.
O apoio ativo deste artista local se somou um tempo depois, o respaldo da Internacional Errorista,
que a partir do grupo Etc. da Argentina criaram
um movimento mundial, cujo principio se baseia
na reivindicação do erro como principio liberador
do homem. A Internacional Errorista realizou uma
manifestação no Fórum Social Mundial em Porto Alegre - Brasil, onde se fez presente o apoio
àliberdade imediata de Nicolás.
5.- O humor negro e o absurdo são
os métodos erroristas por excelência.
6.- Os “lapsos” e fatos falhos são
nosso deleite.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{90}
{91}
mente a Nicolás na criação do grupo virtual “me
comprometo a matar a Jerónimo Alberto Uribe,
filho de Álvaro Uribe”. Nós amigos da liberdade
de Nicolás seguimos esperando o fim do processo que, desde quarta-feira 02 de dezembro de
2009, enfrenta a um jovem de 23 anos estudante
de Belas Artes contra o maior poder da mídia e
governamental, que uma pessoa comum jamais
imaginaria sequer ver em seus pesadelos mais
crus. Esta situação, que pareceria de um livro de
Kafka, até a data se mantém vigente, esperando
fechar este duro capítulo de uma narração que
poderia voltar a aparecer em sua tela de televisão
ou no próximo cinema, muito perto de você.
}
Depois de ter passado quase dois meses desde
que um juiz de controle de garantias dera prisão
domiciliar a Nicolás Castro, em um processo que
vimos como todas as provas com que a Fiscalização o inculpava e com as quais justificou seu
confinamento durante quatro meses na prisão La
Picota de Bogotá, tem caído uma a uma por erros
de procedimento e manipulação. Onde inclusive
os advogados de Jerónimo Uribe, filho do presidente da república Álvaro Uribe e supostamente
“vítima” das ameaças postadas na rede social de
internet facebook, têm declinado sua intenção de
seguir com o caso, mencionando seu interesse
para que o jovem volte a seus estudos e a sua
vida ordinária. Sem mencionar que até a presente
data não existiram provas que vinculem direta-
__________________
Amigos da liberdade
de nicolas.
http://amigosdela
libertaddenicolas
castro.wordpress.
com/
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{92}
{93}
Lucas Ospina
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
O cidadão
Kastro
(com K de Kafka)
1. K.
“Não confunda a cibernética com a predição da
fortuna”, lhe diz uma funcionária de um banco de
dados a K, o protagonista do filme O Processo, na
adaptação da novela de Kafka que Orson Welles
levou ao cinema em 1962. A cena, suprimida do
filme, não aparecia na novela, ela era uma analogia do que Kafka apenas aguardava cautelosamente como um sistema imenso de arquivos, advogados leigos e corredores que Welles atualizou
e traduz a uma imensa maquina kafkiana de computação.
O começo do filme O Processo é simples, um
homem acorda sendo vítima de uma metamorfose, isto não quer dizer que ele tenha se convertido em um inseto (ao menos alguns bichos
podem voar), acontece algo pior: está capturado.
Em seu quarto tem dois agentes sem identificação, logo entra um supervisor, e lhe diz que está
vinculado em um processo por um crime sem
identificação, que está preso, porém que ainda
assim pode ir trabalhar, em breve será chamado
perante a lei.
Nos diálogos da cena suprimida do filme de
Welles, K quer que o poderoso computador do
banco onde trabalha lhe dê algum indício sobre o
seu futuro judicial, a funcionária que lhe ajuda é
escéptica (incrédula), não tem dados suficientes
e dar conselhos jurídicos não é seu território,
porém afirma que ainda assim tem algo para colaborar-lhe.
Orson Welles - El Proceso (1962). Escena omitida en la versión final.
K, voluntarioso, faz uma apologia à imparcialidade
da máquina, “Adivinho que o computador é mais
como um juiz… e Não seria isso um adianto? Não
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mais erros estúpidos, tudo limpo e preciso. Em
vez de se gloriar de sua inteligência, como os homens convencidos de si mesmos, os advogados
teriam que ser precisos. Como os contadores ou
os científicos. De fato, imagine uma corte de lei
como um laboratório… Você pensa que alguma
vez será assim?”
Quando K pede a resposta, a máquina vomita
um papelzinho onde está escrito o crime mais
provável que há de cometer. “Isso parece uma
adivinhação”, disse K ao ver na cartolina uns
pontinhos. “São fatores, a matemática da probabilidade”. Talvez meu caso, infere K, supera a
máquina, porém a mulher lhe informa que “se
a máquina se alimenta com besteiras ela só responde com silêncios… só podemos resolver o
que pode ser formulado… lingüística… até que
você não possa precisar com exatidão o que quer
dizer, não poderá saber o que você quer saber…
as perguntas sobre a lei ou o crime estão emaranhadas sem remédio nos chamados valores morais… consciência, inocência, culpa, bom, mau”,
“E tudo isso são besteiras?”, pergunta K. “É nada
para nós”.
No final, K diz que não entende o código do
cartão, pede uma tradução, um significado, a resposta é que o dito pela máquina é o “usual”. E o
crime mais provável que K tem que cometer é o
“suicídio”.
2. Uma Captura de cache
“Grande trabalho policial para capturar ao homem
que ameaçou de morte ao filho do presidente” foi
a maneira como intitulou a Polícia Nacional em
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sua página da Internet sobre detenção de Nicolás Castro. A página, agora que o caso caiu pelo
medíocre trabalho policial que propiciou a captura
de um inocente que nunca ameaçou ao filho do
presidente, esta queda, trocada, seu conteúdo
apagado. Só fica um fantasma na rede, o “cache”
como o chamam na informática, a “memória de
acesso rápido de um computador, que guarda
temporalmente as últimas informações processadas”. À página fantasma que ficou se perdeu a
foto que trazia de Nicolás Castro algemado no dia
de sua detenção, acompanhado por dois agentes
Na Colômbia os
sem identificação (seus rostos foram pixelados
ainda que em outros meios circulou a mesma foto militares desaparecem
cidadãos, principalsem essa alteração).
Notas
1.
Afortunadamente, no cache, o conteúdo se conserva. É uma auto-sátira involuntária e triunfalista
da velha brutalidade policial traduzida a linguagem do computador: uma série de eufemismos
“que tiram onda” e estúpidos, de agentes que
tentaram justificar este “falso positivo judicial”[1]
ante seus superiores e estes ante seus superiores e novamente estes ante seus superiores até
chegar ao Ministro da Defesa e ao primeiro mandatário da nação; em uma cadeia de fidelidade
que Álvaro Uribe seguramente terá em consideração no momento de celebrar sua orgia patriótica
de 13º salarial, condecorações, ascensões e nomeamentos, um ritual de auto-perpetuação onde
os “falsos positivos” são o sangue que mantém
ereto ao espírito de corpo.
Agora à Polícia que pouco lhe interessa que esta
informação seja lida é ainda mais importante que
as pessoas a leiam. O satirizado se condena por
suas próprias palavras, e isso é o que tem sucedido logo que todas as provas da polícia e da Fis-
mente estudantes de
baixos recursos, os
disfarçavam de guerrilheiros e os apresentavam frente aos altos
mandos como caídos
em combate, tudo isto
para ganhar privilégios,
como a extensão das
festividades, prêmios
militares, aumento
salarial e toda uma
série de benefícios que
os militares dão neste
país por matar o maior
número de “inimigos”.
No total alguns Entes
Militares do Estado
desapareceu e matou mais de 3000 mil
pessoas. No final os
militares presos foram
liberados porque a
justiça militar que os
julgava deixou vencer
os termos dos processos judiciais.
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calização se derrubaram uma atrás da outra. E as
evidências não caíram somente pela forma como
muitos destes dados foram conseguidos, mas
sim pela forma como de estes foram tratados. A
“prova real”, uma sessão de “chat” de três horas
que Castro teve com sua namorada, foi editada
para que se convertesse em uma auto-culpabilidade acomodada ao roteiro preestabelecido.
Onde Castro dizia, entre jocoso e assustado, que
a esse ritmo teria que trocar de identidade ou ir
embora com ela e se esconder em Medellín (Cidade Colombiana), a Fiscalização eliminou o contexto da frase e a incluiu em uma novela de um
criminoso capaz de apagar seu rastro e produzir
terror desde qualquer computador.
Vale a pena ler este comercial informativo punitivo disfarçado de operação contra-terrorista que
Imagem de Nicolas capturado, difundida amplamente pelos meios.
{97}
a Polícia fez. Agora, que querem ocultar o documento, há mais razões para mostrar-lo e guardarlo como tesouro.
3. Ante a lei
“¡Ah! Siga, você é pai da vítima”, disse ao padre
de Nicolás Castro o policial que regulava a entrada da última audiência, em frente do Juiz 48
Penal Municipal de Garantias de Bogotá, Javier
García Prieto, na audiência que finalmente se
julgou conceder ao detendo prisão domiciliar. O
agente estava certo, não todos os polícias são
insensíveis à dor, “vítima” era a palavra. Este
policial entendeu o que muitos outros não compreenderem desde o começo porque só sabem
cumprir ordens ou porque só são formados pela
informação da grande imprensa. Porém, entre os
formadores de opinião que dizem ter critério e
dizem poder separar a apresentação dos fatos da
representação da noticia também teve muitos que
falharam: desde mal-pensantes até professores
que pediram para Castro penas legais y “castigos
acadêmicos”. Talvez um dos casos mais notórios
de falsas manobras foi o de um político mais oportunista que oportuno, a candidata à presidência
Noemí Sanín, que pediu justo ao início do processo, em una entrevista radial, que Castro fosse
condenado. Ainda depois da última audiência o
caso continua sendo tergiversado com simplicidade: “Outorgam prisão domiciliar ao jovem que
criou grupo no Facebook contra Jerónimo Uribe”
dizia um titular.
Impressiona a imprecisão: ficou claro, pelas provas apresentadas nesta e na audiência anterior
ante um juiz especializado, que Castro não criou
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o grupo, só opinou e o fez com o seu nome, não
assumiu uma falsa identidade, e sobre o filho do
presidente escreveu o seguinte no muro de Facebook: “Este cara com seus artesanatos da Colômbia não faz mais que explodir indígenas e pessoas
de baixos recursos, além de estar acusado de plágio na universidade dos Andes, e é bem conhecido
por calar esse e outros tipos de problemas que tem
tido no interior dessa universidade, ameaçando de
morte a quem se enfrente com ele…fp (filho da
puta)”. Ou seja, se disser a verdade é “incitação a
delinqüir” e um palavrão é um ato de “terrorismo”,
os presídios não caberiam mais pessoas.
A respeito o juiz Garcia Prieto, que não é um funcionário da comum, como o juiz que Castro teve
anteriormente, mas sim é um intérprete cuidadoso
da lei, faz um tempo, disse em uma entrevista:
“Nós juízes não podemos fazer o que fez o Presidente da República em Buenaventura quando ordenou a captura de um funcionário supostamente
comprometido em um delito. Nós não podemos
atuar por impulsos e o Presidente não pode fazer
esse tipo de coisa”. E sobre o labor fiscal disse:
“Hoje o fiscal é quem acusa, este é quem deve
chegar à sentença com uma teoria do caso para
demonstrar-la, se não o faz o único caminho é absolver. Se falha a apresentação de provas, devese absolver e liberar”. E isto foi o que aconteceu na
última audiência do caso de Nicolás Castro: atuou
a lei, não o impulso, valorizou-se a prova, não o
espírito de corpo. Tanto é assim que apesar de o
juiz Garcia Prieto ter se mostrado favorável à liberação de Castro negou a revocatória da medida
de asseguramento que o advogado de defesa pedia, pois ainda não existia uma constância legal
válida e favorável da sentença dada na audiência
anterior.
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Na audiência a defesa apresentou todo tipo de
testemunhos de amigos e professores favoráveis
a Castro, sinalavam como havia tido uma posição
de mediador nos conflitos do programa de Belas
Artes da universidade —seu texto “Donde no hay
ni villano ni héroes” (“Onde não há vilões nem
heróis”) é prova disto— até como “Nicolás é vegetariano”. O juiz García Prieto afirmou que talvez
estas declarações estivessem mediadas pela camaradagem e pela amizade, preferiu centrar a decisão de outorgar-lhe a prisão domiciliar baseado
numa série de dados institucionais e numéricos
que antecederam a sua detenção: as notas das
médias semestrais da universidade. “4.1, 4.3, 4.2,
4.2” leu, e concluiu “estas não parecem ser as notas de um terrorista”.
O advogado que representa a Jerónimo Uribe, o
filho do presidente, que com certeza, falando de
rendimento acadêmico, teve uma matrícula condicional por plágio na Universidade de los Andes e
que ao ser acusado de copia por um professor
não pôde —por um mero erro de procedimento—
ser processado, ele manifestou que a seus clientes
—como no caso do plagio acadêmico— não lhes
interessa continuar com o processo. Ainda que a
Fiscalização, por ofício, ou por inoficiosa, insista
em manter o caso aberto, já não tem provas e o
que se deveria fazer é concentrar suas energias
onde há indícios de criminalidade latente, do contrário seguirão ocorrendo fatos como o de Ana Maria Chávez, que foi contatada —através de seus
contatos de Facebook— por um par de criminosos
que a assinaram, e que se não fosse pelo trabalho
investigativo de seu irmão jamais teria feito justiça;
tão seguro estava, um dos assassinos, da inoperância e analfabetismo informático da Fiscalização que
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Orson Welles – O Processo (1962). Cena omitida na versão final.
ao momento de ter sido detido ele disse às autoridades: “Pensei que nunca iam me encontrar”.
4. Fim…
Em uma entrevista feita na prisão “La Picota” perguntaram a Nicolás Castro o que ele estava lendo:
“Vigiar e Punir do filósofo Francês, Michael Foucault. O livro fala de todo este assunto das prisões,
de dar justiça e de como vigia as pessoas. Também estou lendo O Processo, de Kafka. Leio muito
sobre todo este assunto da parafernália de conceder justiça”.
Seguramente teria sinalado a página da cena inicial da novela quando K é apreendido:
“K incorreu sem querer em um intercâmbio de
miradas com Franz, porém agitou seus papeis e
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disse, “Aqui estão meus documentos de identidade.” “E que nos importa?”, replicou gritando o
avultado agente. “A maneira a qual o senhor está
se portando é pior do que a de uma criança. O que
o senhor quer? Por acaso pretende que ao falar
conosco sobre documentos de identidade e sobre
ordens de detenção seu maldito processo acabe
logo? Nós, somente, somos empregados subalternos. Oficiais menores que apenas podemos distinguir uma carteira de identidade de outra, o único
que temos que fazer com o senhor é vigiar-lo dez
horas diárias, para isso nos pagam. Isso é todo o
que somos. Não obstante, podemos informar às
instâncias superiores sobre o tipo de pessoa que
vão apreender antes que emitam a ordem de detenção. Aí não há erro algum. Nossas autoridades,
até onde eu sei, só conheço as instâncias inferiores, não se dedicam a procurar a culpa entre a
população; é a culpa que faz com que saiam a
buscar, como o diz na lei, e então eles nos envia
para fora. Isso é a lei. Onde pode ter um erro aí?” “Não conheço essa lei,” disse K. “Então muito pior
para o senhor”, disse o agente. “É provável que só
exista em suas cabeças”, disse K, querendo, de alguma maneira, influir nos pensamentos dos agentes, reformar esses pensamentos a seu favor ou ir
ganhando terreno. Porém, o agente, displicente, só
disse, “O senhor já saberá quando o afete.” Franz
se uniu e disse, “Olha isto, Willem, ele admite que
não conhece a lei e ao mesmo tempo afirma que
é inocente”. “Está muito certo, não podemos fazer
que entenda coisa alguma”, disse o outro.”
__________________
Lucas Ospina
Artista, crítico da
arte e jornalista
independente.
Atualmente trabalha
como professor nu
Departamento da Arte
da Universidade dos
Andes da Colômbia
Castro já terminou O Processo, uma novela que
na área de projetos
Kafka deixou sem terminar, porém à que alcanculturais.
çou a escrever um capítulo de encerramento no K,
diferente da maioria dos leitores desta história, não
pode evitar ou se esquivar de um trágico final.
}
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III Coloquio de
estudantes de
artes plasticas e
visuais em BogotáColômbia
Liliana Cortés ([email protected])
Versões em espanhol e inglês no endereço:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
}
No projeto curricular de Artes Plásticas e Visuais da Faculdade de
Artes ASAB, da Universidade Distrital Francisco José de Caldas, nasceu a idéia de gerar um espaço de
diálogo entre estudantes de artes
das diferentes Faculdades de Artes
da cidade de Bogotá, com o intuito
de realizar palestras que mostrem
investigações, criações e trabalhos
de impacto na cidade. Este projeto
desde o ano de 2008 vem trabalhando na realização de Colóquios de
estudantes através de um edital
público enviado a diferentes Faculdades de Artes da cidade, com a
finalidade de realizar uma seleção
de palestras e colocar em cena os
estudantes e seus trabalhos tanto
teóricos como práticos na atualidade. Durante o primeiro semestre
do 2010, 29 de abril na Biblioteca
Luis Ángel Arango, se reuniram os
organizadores: Universidade Distrital, Universidade Pedagógica Nacional, Universidade Jorge Tadeo
Lozano, Universidade Javeriana
e a Universidade Nacional, com o
objetivo de apresentar as propostas
de estudantes de artes sobre seus
trabalhos na cidade. Teve uma
assistência de aproximadamente
250 estudantes da cidade com 12
conferências de coletivos e estudantes.
Para quê e por quê?
vas reflexões do campo artístico e
promover conversas, trocas entre
diferentes perspectivas artísticas.
Um Colóquio de estudantes nos
permite tanto a professores, pesquisadores como a estudantes conhecermos e intercambiar experiências em nossas áreas de trabalho
teórico, plástico y visual.
A realização de um Colóquio de
estudantes em Artes Plásticas e Visuais permite construir espaços de
diálogo entre estudantes e docentes
das Faculdades de Arte da cidade Versões anteriores
e fortalece o âmbito artístico, ao
mesmo tempo em que permite es- Foram realizados dois Colóquios
tabelecer projetos comparados, no- durante os anos de 2007 e 2008.
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
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{105}
O primeiro foi organizado na Biblioteca Luís Ángel Arango com o
apoio de José Ignácio Roca, Gerente de Artes Plásticas do Banco
da República. Na segunda edição
do evento a Gerência de Artes Plásticas da Fundação Gilberto Álzate
Avendaño apoiou com difusão e
uma parte do financiamento do custo total da produção. Para o ano de
2010, a Faculdade de Artes ASAB
realizará sua terceira versão para o
primeiro semestre de 2010.
}
Texto no Blog. Site: http://coloquiodeestudiantesdeartesplasticas.
blogspot.com
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com
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Dora a Curadora
Marcelo Delcampo e Gaston D´Maquilart.
Versão para web no site:
http://www.emergenciaemergenciaemergencia.com/
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
{{emergenciaemergenciaemergencia.com}
seja, o assunto não é mudar, pelo
contrário a procura é pelo “como
(mudar)?”.
[1]: A palavra venias vem do verbo
em espanhol “venir” e sua conjugação em segunda pessoa e “venias”
(tu venias), consequentemente “venias” e “vénias” se confundem na
suas entonações no espanhol da
Espanha de tal forma que pode significar vir ou fazer uma reverencia,
esta última ação vem igualmente
com a colonização e mais que tudo
um costume do sistema monárquico
e cristão.
BICENTENARIO
Por favor não olvide re-bobinar a
fita
1. Toda cultura constrói desde o
passado, a política não é a exceção.
É ali quando as definições do passado se convertem em preconceito,
que possibilitam a mobilização e
atualização de uma cultura, e também possibilitam o mal-entendido
quando se utilizam desconhecendo
sua origem.
ira se caracteriza por ser psuedoconservadora, aceita o cambio por
estar justificado pelo ideal de independência igualitária e liberdade
fraternal e a “ordem e progresso” de
nossa bandeira.
3. Se compara que nos anos do regeneracionismo começávamos a
entender as artes como um exercício moderno no qual sua prática era
delimitada por um fazer medieval,
ligado às distinções entre a arte e o
oficio, o homem e a mulher, Europa
e América, e desde já, entre colônia
2. Combatem-se os costumes vin- e pátria independente. A questão
dos (vindas -venias [1] - da coloni- estriba na forma em que se toma
zação de costume taurina-espanho- consciência dessa transformação,
la nos países vizinhos) de Portugal, não só como mera mudança, mas
e ainda que a sociedade Brasile- sim no curso que este tomará, ou
e um pós-bicentenário à luz das
contingências atuais.
TEXTOS
Aceitamos contribuições em português, espanhol e/ou inglês. Os trabalhos selecionados serão publicados nos três idiomas. Estes poderão
ter uma extensão mínima de 2000
palavras, e quando forem resenhas
deveram ter entre 500 y 800.
OUTRAS CONTRIBUIÇÕES
(Imagem / Video / Interativo / etc.)
Outros materiais relacionados com
PÓS-BICENTENÁRIO
o tema deste edital serão recebidos,
e sua seleção dependerá da perConsidera a possibilidade de deslo- tinência com os assuntos tratados
car e/ou recompor os espaços e também a possibilidade de sua
políticos pensando-os como es- publicação em suporte eletrônico
paços públicos, onde tem lugar a (Web) e/ou formato para impressão
discussão das coisas comuns, um (PDF).
mundo proposto a partir da transformação do mobiliário da vida cotidi- DATA LIMITE DE ENTREGA
ana, que para ser possível deve encontrar um equilibro, também, entre SEXTA 20 de Agosto de 2010, a
as condições baixo as quais tem meia noite horário de Brasilia (GMT
sido produzidos, os meios que usa -3), através do correio eletrônico:
e o uso que faz e tem feito destes.
Este é um convite a retroceder- revista@emergenciaemergencinos na história, debatendo sobre aemergencia.com
nosso presente, da maneira como
se apresenta, procurando refletir, e
se fosse possível compreender as
múltiples relações entre um bicentenário de princípios do século XIX,
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