I Universidade Camilo Castelo Branco Instituto de Engenharia Biomédica RENAN FAVA MARSON USO DA ÁGUA OZONIZADA PARA A DESINFECÇÃO DE ENDOSCÓPIOS GASTROINTESTINAS USE OF OZONATED WATER FOR DISINFECTING GASTROINTESTINAL ENDOSCOPES São José dos Campos, SP 2014 II Renan Fava Marson USO DA ÁGUA OZONIZADA PARA A DESINFECÇÃO DE ENDOSCÓPIOS GASTROINTESTINAS Orientadora: Profa. Dra. Adriana Fernandes Barrinha Co-orientador: Prof. Dr. Carlos José de Lima Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Bioengenharia da Universidade Camilo Castelo Branco, como complementação de créditos necessários para obtenção do título de mestre em Bioengenharia. São José dos Campos, SP 2014 III FICHA CATALOGRÁFICA IV V DEDICATÓRIA Dedico aos meus pais, Luiz e Ana, por me educar, ensinar e sempre fazer acreditar que devemos seguir em frente, superando assim qualquer obstáculo da vida. VI AGRADECIMENTOS É difícil agradecer todas as pessoas que de algum modo, nos momentos serenos e ou apreensivos, fizeram ou fazem parte da minha vida, por isso agradeço principalmente a Deus por minha vida, me guiar e fortalecer principalmente durante este curso, e me compreender nas horas mais difíceis, e a todos de coração. Aos meus pais Luiz e Ana pelo imenso esforço empreendido para a minha formação escolar e acadêmica, e pelo ensinamento da verdade como principio norteador das nossas vidas.Minha família pelo imenso apoio de seguir em frente. À minha irmã Raiane, minha companheira de todas as horas, que me acalma com sua paciência e tranquilidade. À minha querida avó Maria Conceição (in memoriam) que torceu e me apoiou em todos os momentos, sempre com seu carinho e atenção no que eu estava a fazer, principalmente durante este trabalho, até quase o seu fim. Em especial a Profa. Dra. Adriana Fernandes barrinha minha orientadora e ao Prof. Dr. Carlos José de Lima co-orientador pela credibilidade conferida na realização deste trabalho, mesmo com o conhecimento das dificuldades que seriam enfrentadas, esforço e dedicação, presença constante, e comprometimento. Ao membro externo e grande amiga Profa. Dra. Jeanete Moussa Alma, por toda ajuda e confiança; Ao Dr. José Flavio Guerra, pela confiança e interesse em minha pesquisa, acreditando e cedendo seu espaço; À Santa Casa de Misericórdia de Tupi Paulista e se Laboratório por me cederem seu espaço físico para que eu pudesse executar este trabalho; Às queridas Fernanda, Tota e Sara pelo imenso apoio, ajudando incondicionalmente em todos os momentos da pesquisa prática deste trabalho; VII Às queridas Vania Sato, Daiane Mastrocola e Elisabete Cardiga Alves pelos ensinamentos durante minha graduação, que levo e vivo-os até hoje, muito obrigado pela formação profissional e pessoal. A todos os meus amigos. Aos vínculos criados durante este Programa de Pós Graduação, em especial a Andréia, Audiel, Marcia, Dione, Paula, Natalia, Cido e Sandra todo o meu carinho e agradecimento, obrigado pelos ótimos momentos que passamos juntos durante a realização deste curso, e que esta amizade seja eterna. VIII ”... mas o Senhor esteve ao meu lado e me deu forças...” (2Tm 4:17) IX USO DA ÁGUA OZONIZADA PARA A DESINFECÇÃO DE ENDOSCÓPIOS GASTROINTESTINAIS RESUMO O reprocessamento dos endoscópios é uma etapa complexa, devido ao seu desenho estrutural. São artigos classificados como semicríticos e termossensíveis, recomendando-se que seja realizada uma desinfecção de alto nível através de algum agente químico como, por exemplo, o glutaraldeído. Na constante busca por novas substâncias antimicrobianas, o ozônio (O3) vem apresentando grandes vantagens e bons resultados em pesquisas. Com base nestas informações, o presente estudo avaliou o efeito da água ozonizada na desinfecção de endoscópios comparando a sua eficiência com a técnica convencional (glutaraldeído 2%). De acordo com os resultados obtidos, quando se utilizou água ozonizada (330 mg.min.L-1,) houve uma redução de 100% dos micro-organismos viáveis nas condições utilizadas. Assim, o ozônio foi capaz de desinfetar os endoscópios de forma melhor que a técnica tradicional quando se comparado somente o canal de biópsia. Foram realizadas análises microbiológicas incluindo provas bioquímicas no sentido de identificar os micro-organismos remanescentes ao processo de desinfecção de alto nível, assim as principais bactérias isoladas foram: Escherichia coli, Enterobactersp, Staphylococcussp, Streptococcus sp. Conseguiu-se a diminuição do tempo de reprocessamento dos endoscópios de 35 a 45 minutos para 25 minutos, ou seja, uma maior agilidade neste processo, uma vez que os centros de endoscopia digestivas realizam um grande número de exames diários, facilitando assim para os seus manipuladores. A água ozonizada mostrou-se um potente desinfetante para endoscópios gastrointestinais, o que sugere uma opção alternativa em termos de desinfecção. Palavras chave: Água ozonizada, endoscópios, desinfecção de alto nível. X USE OF OZONATED WATER FOR DISINFECTING GASTROINTESTINAL ENDOSCOPES ABSTRACT The reprocessing of endoscopes is a complex procedure due to their structural design. Since they are classified as semi-critical and thermosensitive materials, the use of high-level disinfectant chemicals such as glutaraldehyde is recommended. In the constant search for new antimicrobial substances, recent studies with ozone (O3) have yielded great benefits and good results. Based on this information, the present study evaluated the effects of ozonated water used to disinfect endoscopes comparing its efficacy with the conventional technique (2% glutaraldehyde). According to the results obtained, when ozonated water was used (330 mg.min.L-1), there was a reduction of 100% of the viable microorganisms under the conditions tested. Thus, ozone has a better disinfecting effect than traditional technique when comparing the biopsy channel. Microbiological analysis including biochemical tests were used to identify the remaining microorganisms after high-level disinfection process. The most frequently isolated bacteria were: Escherichia coli, Enterobacter sp, Staphylococcus sp, Streptococcus sp. It was possible to decrease the time for endoscope reprocessing from 35-45 minutes to 25 minutes, i.e., it offers faster endoscopic disinfection as the gastroenterology endoscopy clinics perform a large number of daily tests, thus facilitating the disinfection process. Ozonated water was a potent gastrointestinal endoscopic sanitizer, suggesting it is a feasible alternative for disinfection. Keywords: Ozonated water, endoscopes, high-level disinfection. XI LISTA DE FIGURAS Figura 1: Procedimento de esofagastroduodenoscopia (EGD) ou endoscopia digestiva alta (EDA)..................................................................................................18 Figura 2: Cabeça do endoscópio flexível gastrointestinal, Tupi Paulista, 2014. .......19 Figura 3: Esquema interno de um videoendoscópio Pentax. ...................................19 Figura 4: Monitor e processador para análise das imagens durante endoscopia gastrointestinal, Tupi Paulista, 2014.........................................................................20 Figura 5: Métodos de reprocessamento de endoscópio gastrointestinal flexível......35 Figura 6: Estrutura molecular do O3. ........................................................................37 Figura 7: Esquema de geração do ozônio por meio do processo corona. ...............38 Figura 8: Mecanismo de ação do ozônio em bactérias. 1- Bactéria; 2 – Parede celular da bactéria sendo atacada pelo ozônio; 3 – Oxidação da parede celular; 4, 5 e 6 – Ruptura e destruição da bactéria. ............................................................40 Figura 9: Fluxograma dos pontos de coleta de amostras microbiológicas do endoscópio gastrointestinal. .....................................................................................43 Figura 10: Porcentagem de redução das UFCs no canal do gastroscópio após a aplicação do Detergente enzimático (DE) e após o reprocessamento deste material com Glutaraldeído 2% (grupo controle) e Ozônio (264 e 330 mg.min.L-1)..49 Figura 11: Porcentagem de redução das UFCs na região proximal do gastroscópio após a aplicação do Detergente enzimático (DE) e após o reprocessamento deste material com Glutaraldeído 2% (grupo controle) e Ozônio (264 e 330 mg.min.L-1). ................................................................................49 Figura 12: Porcentagem de redução das UFCs na região distal do gastroscópio após a aplicação do Detergente enzimático (DE) e após o reprocessamento deste material com Glutaraldeído 2% (grupo controle) e Ozônio (264 e 330 mg.min.L-1). ..............................................................................................................50 XII LISTA DE TABELAS Tabela 1: Média (± desvio padrão) das Unidades Formadoras de Colônias (UFC/mL) após detergente enzimático (Após DE); após o reprocessamento (RP), nos três pontos de coleta do endoscópio (canal, proximal e distal). ...............48 Tabela 2: Bactérias remanescentes ao processo de desinfecção de alto nível. ......51 XIII LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AAE – Água Ácida Eletrolisada ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária BGN – Bacilo Gram Negativo CDC – Centers for Disease Control and Prevention E. coli – Escherichia coli ED – Esofagogastroduodenoscópio EDA – Endoscopia Digestiva Alta EPS – Exopolissacarídeos FDA – Food and Drug Administration H. pylori – Helicobacter pylori LPS – Lipopolissacarídeo O2 – Oxigênio O3 – Ozônio OPA – Ortoftalaldeído pH – Potêncial de Hidrogênio SOBED – Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva SOBEEG – Sociedade Brasileira de Enfermagem em Endoscopia Digestiva TAF – Triplice Açúcar e Ferro UFC – Unidade Formadora de Colônia XIV SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................16 1.1. Objetivos gerais ..............................................................................................17 1.2. Objetivos específicos ......................................................................................17 2. REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................18 2.1. As infecções associadas ao mau processamento dos endoscópios...............22 2.2. Reprocessamento dos endoscópios ...............................................................26 2.3. As etapas de reprocessamento do endoscópio gastrointestinal .....................26 2.3.1. Etapas pré-desinfecção ............................................................................26 2.3.1.1. Pré-limpeza ........................................................................................27 2.3.1.2. Limpeza ..............................................................................................27 2.3.1.3. Enxágue .............................................................................................28 2.3.1.4. Secagem ............................................................................................28 2.3.2. Desinfecção de alto nível..........................................................................28 2.3.2.1. Glutaraldeido ......................................................................................30 2.3.2.2. Ácido paracético .................................................................................31 2.3.2.3. Ortoftalaldeído 0,55% (OPA) ..............................................................31 2.3.2.4. Água ácida eletrolisada (AAE)............................................................32 2.3.3. Etapas pós-desinfecção............................................................................33 2.3.3.1. Enxágue .............................................................................................33 2.3.3.2. Secagem ............................................................................................33 2.3.3.3. Estocagem..........................................................................................34 2.4. Métodos manuais e automatizados para limpeza e desinfecção dos endoscópios ...........................................................................................................34 2.5. Ozônio.............................................................................................................36 2.5.1. Produção de ozônio ..................................................................................37 2.5.2. Método de descarga corona .....................................................................37 2.5.3. Ação antimicrobiana do ozônio .................................................................38 2.5.4. Toxidade do ozônio...................................................................................40 3. MATERIAL E MÉTODOS ......................................................................................42 3.1. Natureza e local de estudo .............................................................................42 3.2. População e amostra ......................................................................................42 XV 3.3. Amostras dos endoscópios .............................................................................42 3.4. Procedimento realizado ..................................................................................43 3.4.1. Análise quantitativa dos resultados...........................................................44 3.4.2. Análise qualitativa .....................................................................................44 3.5. Isolamento e identificação dos micro-organismos...........................................45 3.5.1. Identificação de cocos gram positivos ......................................................45 3.5.1.1. Prova da catalase ...............................................................................45 3.5.1.2. Prova da coagulase em tubo ..............................................................45 3.5.1.3. Resistência a novobiocina ..................................................................46 3.5.2. Identificação presuntiva de bacilos gram negativos (BGN).......................46 3.5.2.1. Identificação de bastonetes Gram negativos não fermentadores.......46 3.5.2.2. Identificação de bastonetes Gram negativos fermentadores..............47 4. RESULTADOS ......................................................................................................48 4.1. Análise quantitativa da desinfecção ................................................................48 4.2. Análise qualitativa ...........................................................................................50 5. DISCUSSÃO .........................................................................................................52 6. CONCLUSÕES .....................................................................................................55 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................56 Anexo A.....................................................................................................................63 16 1. INTRODUÇÃO A endoscopia integra a moderna Gastroenterologia, sendo um procedimento imprescindível no recurso diagnóstico e terapêutico, exame no qual se utiliza um equipamento (endoscópio) que permite a visualização de imagens do interior de órgãos e/ou cavidades corporais, agregando tecnologias cada vez mais avançadas,tendo seus benéficos bem reconhecidos.(1) De acordo com o Centers for Disease Control and Prevention - CDC (2008)(2), entre os procedimentos endoscópicos realizados, a esofagogastroduodenoscopia, a colonoscopia, a proctosigmoidoscopia, a enteroscopia e a colangiopancreatografia retrógrada, são os exames de endoscopia gastrointestinal mais utilizados. A endoscopia gastrointestinal é um exame recomendado para pacientes com sinais e sintomas inespecíficos como dor epigástrica, vômitos, disfagia e emagrecimento, podendo assim contribuir para um diagnóstico e auxiliando na prevenção de câncer do trato gastrointestinal. É indicada como procedimento terapêutico nos casos de hemorragia digestiva alta e baixa, ingestão de cáusticos, controle clínico de doenças ulcerosas pépticas, resseção de tumores, colangite hipertensiva aguda, descompressão intestinal, pancreatite aguda biliar, ingestão de corpo estranho dentre outras.(1, 3) Por se tratar de um procedimento complexo e invasivo está sujeito a complicações imediatas como perfurações e sangramento, ou tardia como ocorrência de infecções.(4) São raros os relatos de ocorrências indesejáveis na realização de endoscopia do trato gastrointestinal, mas dentre elas as mais relatadas são: a perfuração da hipofaringe e do esôfago resultante da passagem forçada pelo endoscópio; hemorragia; aspiração de conteúdo gastrointestinal; luxação têmporo-mandibular; dor abdominal; flebite em decorrência da administração endovenosa de sedativos e embolia gasosa.(1, 3, 5) A esterilização é o processo de destruição e eliminação de todas as formas de vida microbiana das superfícies, podendo ser realizada por processos químicos e físicos.(6) A uma constante busca por tecnologias que esterilizem frente a baixas temperaturas, devido às características e fragilidades de produtos lançados no mercado, e também a maior rapidez, conveniência e apelos ambientais diante dos 17 métodos utilizados. Dentre os métodos disponíveis para esterilização a baixa temperatura os mais utilizados são: plasma de peróxido de hidrogênio, radiação gama, óxido de etileno, tecnologia por feixe de elétrons, vapor de baixa temperatura de formaldeído (VBTF), e mais recentemente o ozônio.(7) Desde o inicio do século XX o O3 é utilizado como antimicrobiano no tratamento, armazenamento e processamento de alimentos, purificação e tratamento de água e esgoto, desinfecção de galões de água, descontaminação de ambientes, tratamentos de diversas enfermidades sobre várias formas de aplicação, entre outras.(8) Este estudo abordará apenas a avaliação do efeito desinfetante da água ozonizada em esofagogastroduodenoscópios (ED), utilizados em endoscopia digestiva alta (EDA). A EDA se classifica como endoscopia digestiva simples, ou seja, realizada somente com sedação consciente, com finalidades de diagnóstico e terapia, que não necessitam de controle radiológico durante sua realização.(9) 1.1. Objetivos gerais • Avaliar a efetividade da água ozonizada no processo de desinfecção de alto nível em endoscópios gastrointestinas (gastroscópios), em duas concentrações diferentes, e comparar ao método tradicional de desinfecção através do uso de glutaraldeido. 1.2. Objetivos específicos • Avaliar qual a melhor dose de água ozonizada para a desinfecção de alto nível dos gastroscópios, e comparar com a técnica tradicional utilizada com glutaraldeido, sem os efeitos indesejados do glutaraldeído e seus problemas com o meio ambiente e descarte. • Identificar a carga microbiana do endoscópio logo após o uso do detergente enzimático e após o reprocessamento com agua ozonizada, por meio de análises microbiológicas, e identificar os possíveis micro-organismos que remanescerem após o processo de desinfecção. 18 2. REVISÃO DE LITERATURA Existem no mercado diversos tipos de endoscópios gastrointestinais disponíveis, apresentando diferença de comprimento e diâmetro dos canais, de acordo com a área a ser analisada. O gastroscópio é um dos tipos de endoscópios utilizados para a realização da endoscopia digestiva alta apresentando um comprimento médio de 1,25 m à 1,4 m, sendo introduzido pela cavidade oral do paciente percorrendo a faringe, o esôfago, e estômago (gastroscópios).(10) A Figura 1 mostra a simulação de um exame de endoscopia digestiva alta. Figura 1: Procedimento de esofagastroduodenoscopia (EGD) ou endoscopia digestiva alta (EDA). Fonte: http://www.cidpitombo.com.br/especialidades_refluxo.htm O endoscópio é constituído de duas partes: a cabeça e o tubo de inserção. Na cabeça encontram-se as válvulas de ar, água e sucção, o que permite ao manipulador controlar a inserção de ar ou água e a sucção de líquidos do interior dos órgãos do trato gastrointestinal, e o comando de controle conforme apresentado na Figura 2. 19 Cabeça de Controle Figura 2: Cabeça do endoscópio flexível gastrointestinal, Tupi Paulista, 2014. Fonte: Registro do pesquisador Já na porção do “tubo de inserção” ou corpo do endoscópio encontram-se os canais do endoscópio e um lúmen para a condução da imagem através de fibra ótica. As pinças são inseridas e as secreções são aspiradas pelo canal de sucção/biópsia, já pelo canal de ar/água é inserido ar para distensão do órgão e água para a limpeza da lente do equipamento, mostrados na Figura 3. Figura 3: Esquema interno de um videoendoscópio Pentax. Fonte: Muller & Lagemann (2002) A Figura 4 mostra o processador que possui uma fonte de luz, de onde as imagens são transferidas para um monitor, permitindo assim a avaliação do órgão a ser analisado. 20 Monitor Processador – Local de inserção do endoscópio Figura 4: Monitor e processador para análise das imagens durante endoscopia gastrointestinal, Tupi Paulista, 2014. Fonte: Registro do pesquisador A área destinada à endoscopia é composta por vários setores, nos quais são realizados os procedimentos, em condições de segurança para os pacientes e equipe multiprofissional, sendo que o seu planejamento deve ser elaborado de acordo com as bases normativas propostas pelo Ministério da Saúde.(11) Diversos países recomendam que o reprocessamento dos endoscópios deva ser realizado em área designada para este reprocessamento e separado do local da realização do exame.(12) Recomenda-se que o local de reprocessamento de endoscópios seja composto por duas áreas, uma contaminada e uma limpa, permitindo assim que não haja cruzamento de materiais contaminados e limpos.(13) Sendo assim na área contaminada serão realizados os devidos procedimentos para reduzir a carga microbiana, tornando assim os aparelhos endoscópios seguros para os manuseios posteriores e na área limpa serão realizados os processos de desinfecção, enxague e secagem do material para posterior armazenamento.(11) Em 1999 houve o lançamento do “Manual de Reprocessamento de Limpeza e Desinfecção de Aparelhos e Acessórios Endoscópicos”, criado pela Sociedade Brasileira de Enfermagem em Endoscopia Gastrointestinal (SOBEEG) juntamente com a Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED), em que padronizaram a limpeza e desinfecção de endoscópios, evitando ao máximo a exposição do paciente a qualquer tipo de risco.(14) 21 O serviço de endoscopia gastrointestinal constitui-se de uma importante ferramenta de âmbito terapêutico e diagnóstico, devido ao equipamento permitir uma visualização direta de órgãos corporais, com isso os endoscópios disponíveis hoje são flexíveis e utilizados inúmeras vezes devido a grande demanda de exames e pouca quantidade de equipamentos.A endoscopia digestiva alta, exame das cavidades superiores e internas do trato gastrointestinal é realizada através do esofagogastroduodenoscópio, sendo que este endoscópio entra em contato direto com a mucosa e secreções contaminadas com micro-organismos.(15) Por se tratar de um procedimento invasivo e possível de complicações como perfurações e sangramentos ou ocorrência de infecções, tem se dado mais importância a estes endoscópios na ultima década devido à alta possibilidade de transmissão de micro-organismos.(4) O processamento dos endoscópios é uma etapa complexa, desde a lavagem até o seu reprocessamento, pelo fato de seu complexo desenho estrutural, são artigos classificados como semicríticos e termossensíveis. Assim recomenda-se sua desinfecção de alto nível através de algum agente químico como, por exemplo, o glutaraldeído.(16) Segundo manual da Sociedade Brasileira de Enfermagem em Endoscopia Gastrointestinal (2006) reprocessar estes aparelhos constitui hoje um desafio para o profissional responsável por se considerar a sua complexidade, compostos de canais longos e estreitos. Embora procedimentos de limpeza estejam disponíveis verifica-se a necessidade de um maior detalhamento nas recomendações para o reprocessamento destes aparelhos, principalmente em seus canais de água/ar, sucção/biópsia.(5) Os casos relatados de infecção por endoscópios vêm sendo vinculados à maneira errada de limpeza e desinfecção, enxague e secagem inapropriados, aumentando assim o risco de transmissão de patógenos que dependem de três principais fatores: a exposição do endoscópio ao micro-organismo; procedimentos inadequados de limpeza, desinfecção, enxágue e secagem e a complexidade dos aparelhos que acabam dificultando a limpeza mecânica.(17) As infecções adquiridas por este procedimento podem ser por duas principais vias: endógena ou exógena, sendo que a transmissão por via endógena ocorre principalmente quando as superfícies colonizantes do trato gastrointestinal ganham acesso a corrente sanguínea ou outros sítios estéreis, sendo assim o principal fator 22 para o risco de infecção ao paciente é seu próprio sistema imunológico. Já a transmissão por via exógena ocorre quando micro-organismos presentes nos equipamentos não são eliminados corretamente durante o reprocessamento dos equipamentos.(18)Há relatosque este risco de infecção vem sendo reduzido devido a implantação de rigorosas politicas de controle de infecção hospitalar.(19) A escolha do método adequado para o processamento de produtos utilizados em assistência em saúde é primordial para certificar que não serão transmitidos patógenos que possam vir a causar infecções em pacientes. A qualidade do processamento é o princípio para a prevenção de infecções associadas a determinados tipos de procedimentos assistenciais por meio da redução ou destruição microbiana nos equipamentos e produtos utilizados bem como a manutenção e integridade dos mesmos.(20) 2.1. As infecções associadas ao mau processamento dos endoscópios A transmissão de micro-organismos e seus efeitos adversos que podem ocorrer em pacientes que realizam endoscopias gastrointestinais podem ser desde o simples fato de transmissão de patógenos da microbiota local até patógenos que realizaram a formação debiofilmes nos equipamentos, sendo assim as recomendações para desinfecção dos mesmos já estão estabelecidas por diversas sociedades e envolvem todas as etapas necessárias, incluindo o controle de qualidade.(21) O risco de infecção em um procedimento de endoscopia está sempre presente, desde uma bacteremia transitória até à septicemia e morte, relatando também que a esofagogastroduodenoscopia é um procedimento seguro, com 0,1% de morbidade e 0,004% de mortalidade.(4) A bacteremia transitória é comum (2% a 8%) e geralmente os micro-organismos mais encontrados são os da orofaringe.(22) Destaca-se que a ocorrência de infecção hospitalar relacionada a endoscopias envolve a transmissão de micro-organismos virulentos como: Helicobacter pylori, Salmonella sp, Pseudomonas aeruginosa,Escherichia coli, Klebisiella e Enterobacter, e os vírus como, hepatites B (HBV) e C (HCV).(23) Em uma revisão realizada pelos mesmos autores, foram identificados e registrados doze casos de infecção por H. pylori, cinco pelo vírus da hepatite B e oito pelo vírus da hepatite C, sendo todos atribuídos a procedimentos de endoscopia. 23 O risco de contaminação bacteriana aumenta quando se usa endoscópios flexíveis como o esofagogastroduodenoscópio, devido o fato de ser utilizados em local com abundante microbiota (principalmente as enterobactérias),ficando assim altamente colonizados.(12) As enterobactérias são bacilos Gram negativos, apresentam membranas citoplasmáticas, sendo que a maioria apresenta filamento flagelar que nasce no citoplasma, a maioria possui capsulas e a membrana externa contém o lipopolissacarídeo (LPS). São anaeróbios facultativos, reduzem nitrato a nitrito e são oxidase negativas, capazes de metabolizar varias substâncias como os carboidratos, aminoácidos e proteínas, produzem catalase, utilizam a glicose e são capazes de fermentar a lactose com produção de gás, em 24 a 48 h a 35°C.(24) O grupo inclui cerca de 30 gêneros e 130 espécies, sendo que menos de 20 espécies são responsáveis por mais de 95% das infecções. São micro-organismos ubíquos sendo encontrados no solo, água e vegetação além de fazerem parte da microbiota intestinal da maioria dos indivíduos, incluindo os humanos.(25) O gênero Salmonella é pertencente à família Enterobacteriaceae, que consiste em bacilos Gram negativos não formadores de esporos. Ao contrário das espécies desta família, as salmonelas não fermentam a lactose, contribuindo para a sua identificação em meios que contenham lactose. Porém algumas amostras podem adquirir plasmídeos que transportem genes que codificam enzimas para a fermentação da lactose, se tornando lactose positiva semelhante a E. coli nos meios de identificação.(26) A maioria das infecções por salmonelas ocorrem por ingestão de alimentos contaminados e, em crianças, da disseminação fecal-oral direta, sendo sua maior incidência em crianças menores de cinco anos e adultos com mais de sessenta anos de idade, que são infectados durante os meses de verão e outono, período mais propício para refeições fora de casa, sendo está infecção mais causada por aves domésticas, ovos, laticínios, e alimentos ou bebidas que tenham sido manipuladas em superfícies contaminadas, ocorrendo assim uma contaminação cruzada.(25) Os casos de transmissão de Salmonella sp, estão diretamente associados as falhas no reprocessamento dos endoscópios, principalmente na limpeza dos canais internos e também através do desinfetante inadequado e o não respeito do tempo para desinfecção.(27) 24 Shigella é um gênero de bactérias em forma de bastonete, Gram negativas, anaeróbias facultativas, que fermentam o açúcar, mas não produzem gás, altamente infecciosa, sendo necessários apenas de 10 a 100 micro-organismos ingeridos oralmente para causar infecção, devido à maior resistência que a Shigella apresenta ao suco gástrico, infectando principalmente o homem e outros primatas como macacos e chimpanzés, podendo causar desenteira Bacilar ou shigelose.(28) Segundo Franco e Landgraf (2005)(29), Enterobacter se apresenta como bacilos imóveis e que fazem parte da microbiota intestinal do homem, são pertencentes ao grupo dos coliformes, podendo causar a deterioração dos alimentos e de grande importância em causar doenças de origem alimentar. As espécies (E. cloaceae e E. aerogenes) são predominantes sobre todas as demais como causa de infecção humana, e tem como característica marcante a capacidade de contaminar equipamentos médicos e soluções para uso parenteral.(25) Pseudomonas se apresentam como bactérias Gram negativas, aeróbias e não esporuladas, podendo ser encontradas em diversos ambientes como solo e água, ou ainda juntamente a plantas e animais, podendo causar infecções oportunistas. P. aeruginosa é quase sempre associada a infecções hospitalares, devido sua capacidade de aderência em diversos materiais, contaminando cateteres, endoscópios, próteses e lentes de contato, sendo que algumas cepas apresentam resistência e crescem até em algumas soluções germicidas.(30) É uma bactéria preocupante devido sua preferência por lugares úmidos tais como os canais internos dos endoscópios e a rede de abastecimento hospitalar(27), e ainda é o micro-organismo mais comum relacionado a surto de decorrência do uso de endoscópios contaminados, principalmente os broncoscópios e duodenoscópios.(31) Helicobacter pylori é uma bactéria Gram negativa, que infecta a mucosa estomacal provocando enfermidades de gravidades variáveis, tais como gastrite, ulceras e câncer de estomago. Sua principal característica é interagir com a célula do hospedeiro de forma a garantir sua permanência. Apesar da H. pylori possuir todo este espectro de virulência a maioria dos portadores são assintomáticos.(32) H. pylori apresenta alto risco de contaminação de endoscópios e seus acessórios, durante o procedimento de EDA, sendo que sua transmissão é atribuída a procedimentos inadequados de limpeza e desinfecção dos endoscópios.(27) É uma 25 bactéria tão resistente que sobrevive até mesmo ao ambiente ácido do estômago, característica que a amônia à confere neutralizando parcialmente esta acidez.(32) Em um estudo realizado por Ishino et al. (2005)(33) foi avaliado a contaminação dos vírus das hepatites B e C em canais de endoscópios gastrointestinais utilizados em pacientes positivos a vírus da hepatite B (HBs-Ag)e também positivos aos anticorpos do vírus da hepatite C (Anti-HCV), apresentando como resultados a não detecção do DNA do vírus da hepatite B e do RNA do vírus da hepatite C, após reprocessamento com enfoque na limpeza dos canais de água e ar dos endoscópios. Há alguns anos tem se dado uma atenção especial as micobacterias e esporos bacterianos e príons, sendo que o risco de transmissão de Mycobacterium tuberculosis aumenta devido à emergência de cepas resistentes a antimicrobianos, principalmente nos procedimentos de broncoscopia, ainda destacando-se que a desinfecção de alto nível utilizada comumente não destrói totalmente os esporos que estão envolvidos na transmissão via endoscopia. Um dos fatores determinantes para a ocorrência de infecções associadas aos procedimentos endoscópicos é a formação de biofilmes, estes constituídos de multicamadas celulares bacterianas ou fúngicas, agrupadas e envoltas por um material extracelular composto de exopolisacarídeos (EPS) de origem bacteriana, que tem como função unir as células às superfícies dos materiais, formando uma matriz extracelular composta de carboidratos, proteínas, DNA extracelular e detritos de células mortas.(34) Pelo visto a formação de biofilmes em estruturas e canais dos equipamentos de endoscopia são inevitáveis, sendo assim relacionados com a má qualidade no reprocessamento, já que os endoscópios são materiais que apresentam um grande desafio no seu processamento.(20) Apesar das recomendações já estabelecidas por diversas sociedades especializadas sobre como reprocessar e realizar as etapas de limpeza e desinfecção, ainda observa-se muitas irregularidades nos centros especializados de endoscopia, o que nos leva a discutir sobre a transmissão destes micro-organismos ou outros efeitos adversos em pacientes submetidos a endoscopias gastrointestinais, por isso os autores propõem a necessidade de estudos que avaliem a adesão de protocolos para limpeza e desinfecção e elaboração de 26 métodos que permitam o monitoramento e testes que verifiquem a eficiência destes protocolos.(19, 35) 2.2. Reprocessamento dos endoscópios Os artigos hospitalares são classificados em: críticos, semicríticos e não críticos, levando em conta o risco de infecção envolvido na utilização destes.(36) Segundo a Resolução da Diretoria Colegiada 06/2013(37) os artigos considerados críticos são aqueles utilizados em procedimentos invasivos onde há penetração da pele, mucosas, espaços ou cavidades estéreis assim como tecidos subepiteliais e o sistema vascular, e devem ser esterilizados entre seus usos. Já os artigos semicríticos são aqueles que entram em contato com a pele não íntegra ou mucosa, devendo ser livres de bactérias, fungos e vírus e requerem uma desinfecção de alto nível ou nível intermediário.(37) Os artigos não críticos são aqueles que entram em contato apenas com a pele íntegra ou não entram em contato com o paciente e requerem um baixo nível de desinfecção.(37) Sendo assim, os endoscópios que entram em contato com mucosas são classificados como artigos semicríticos devendo ser submetidos a um alto nível de desinfecção após cada utilização.(12, 38) Este reprocessamento seria facilitado se a estrutura do endoscópio, que é feito com materiais sensíveis ao calor pudesse ser esterilizado, mas como isto não é possível é realizado a desinfecção de alto nível, manual ou automaticamente.(39) Pinças de biópsia, agulhas de escleroterapia e eletrocautério são matérias que penetram em mucosas, devendo assim ser esterilizados após seu uso, ou de uso único.(2) 2.3. As etapas de reprocessamento do endoscópio gastrointestinal 2.3.1. Etapas pré-desinfecção Parte do processo de reprocessamento do endoscópio que compreende quatro etapas: pré-limpeza, limpeza, enxágue e secagem. 27 2.3.1.1. Pré-limpeza É o procedimento em que é retirada toda e qualquer sujidade grosseira da superfície externa, interna e dos canais, sendo realizada geralmente ainda dentro da sala de procedimento, visando à diminuição de sujidades e a não formação de biofilme. É recomendado retirar as sujidades do aparelho com compressa úmida, aspirar solução de detergente enzimático através do canal de sucção/biópsia e manter o canal de ar/água acionado por 15 s, ainda com o equipamento conectado na fonte luminosa, após o término deste procedimento, o aparelho e desconectado e segue para a sala de limpeza.(2, 21) 2.3.1.2. Limpeza Dois métodos de limpeza são recomendados: manual ou automático, sendo que neste estudo será dado ênfase ao método manual devido ao fato do local de estudo fazer uso deste método.(2, 21) Etapa que consiste na remoção de sujidades como sangue, micro-organismos de superfícies, sendo recomendado a utilização de água e detergente neutro ou enzimático, desde que seja concentrado e biodegradável, não oxidante e bacteriostático, para que diminua os riscos ao meio ambiente e/ou equipamento e auxilie na inibição do crescimento de micro-organismos, também é recomendado pelos fabricantes o preenchimento completo dos canais de ar e água do endoscópio com solução de limpeza, desinfetante e água durante o enxague com o auxilio de uma seringa para a inserção destes produtos nos canais.(2, 21) O uso do detergente enzimático é preferido por apresentar em sua composição diversas enzimas como protease, lipase e amilase, que atuam degradando a matéria orgânica, minimizando assim danos à superfície do equipamento, sendo que alguns detergentes enzimáticos apresentam melhores resultados, devendo assim o responsável pela compra dos produtos deve-se atentar aos registros dos produtos junto aos órgãos competentes.(2, 21) Para que se alcance uma boa limpeza é recomendada uma ação mecânica, friccionando a superfície externa com compressa ou tecido macio, de uso individual e também realizando a escovação dos canais e inserção de detergente e água nos canais do endoscópio, sendo que os canais e orifícios do aparelho requerem 28 escovas com diâmetro e tamanho apropriados, e as mesmas devem ser rigorosamente limpas e desinfetadas entre seu uso, e substituídas por novas nos intervalos preconizados pela unidade responsável pelo serviço de endoscopia.(2, 21) 2.3.1.3. Enxágue Etapa que visa à remoção das sujidades e da carga microbiana das superfícies externa, interna e canais dos endoscópios, após o desprendimento destes detritos durante a limpeza, devendo ser dada uma atenção especial aos canais internos, sempre utilizando o adaptador fornecido pelo fabricante para proceder a irrigação dos canais utilizando seringa para uma irrigação de baixa pressão(21), etapa que segundo a CDC (2008)(2) deve ser realizada com água estéril de preferência, já na impossibilidade desta recomenda-se que haja um controle eficaz da qualidade da água potável e filtrada para o enxágue do endoscópio.(40) Quando se utiliza detergentes enzimáticos, deve haver um ótimo enxágue eliminando assim qualquer resíduo de proteínas no equipamento, evitando o comprometimento do mesmo, e ao final de cada enxágue deve realizar o devido descarte da água utilizada.(41) 2.3.1.4. Secagem De acordo com a RDC(37) após o processo de limpeza os endoscópios e seus acessórios devem ser secos antes de qualquer método de desinfecção ou esterilização, prevenindo assim a diluição do germicida durante o processo seguinte. 2.3.2. Desinfecção de alto nível Processo que causa a destruição de micro-organismos sendo eles patogênicos ou não, através de métodos físicos e químicos, com exceção de esporos bacterianos, já que a termossensibilidade do endoscópio gastrointestinal o impossibilita de esterilização a altas temperaturas como, por exemplo, a autoclave.(42) O processo de desinfecção é classificado em três tipos: de baixo nível, eliminando somente micro-organismos em sua forma vegetativa, de nível intermediário, que inativa bactérias vegetativas, Gram negativas, Mycobacterium 29 tuberculosis, leveduras e a maioria dos fungos e vírus, porém não elimina esporos bacterianos, e a de alto nível que é capaz de destruir todos os micro-organismos, com a exceção de alta carga de esporos bacterianos, lembrando que a desinfecção é um processo com capacidade de redução microbiana na ordem de 1 milhão de UFC/mL.(43) Morsoletto, Amarente e Ardengh (2006)(44) relatam que um instrumento contaminado (secreção purulenta apresenta 1 bilhão de bactérias; fezes também apresenta 1 bilhão de bactérias) e se o processo de limpeza for inadequado acabará comprometendo a desinfecção, não sendo assim capaz de reduzir a carga microbiana podendo atingir uma quantidade de 1000 micro-organismos, quantidade capaz de expor o paciente a risco de infeção. Ou seja, se este instrumento for submetido a rigorosa limpeza terá uma redução de 10 UFC/mL de bactérias ou vírus, e ao processo de desinfecção terá 0,00001 UFC/mL, sendo esta a redução esperada e conteúdo biologicamente aceitável, para equipamentos considerados semicríticos.(44) Com isso o endoscópio deverá ser reprocessado através de desinfecção por algum agente químico, como o glutaraldeido, ácido paracético, plasma de peróxido de hidrogênio ou óxido de etileno (ETO), contudo estes métodos de baixa temperatura exigem um tempo de contato com o agente esterilizante mais prolongado, o que acaba dificultando os serviços de endoscopia devido a pouca quantidade de equipamentos e a demanda de exames.(2) Diante das dificuldades de esterilização a baixa temperatura, é predominante em todo o mundo a desinfecção de alto nível, processo este que destrói todos os micro-organismos com exceção dos esporos bacterianos e príons.(2, 45) No mundo encontramos uma grande diversidade de desinfetantes para este fim, porém no Brasil, o registro e autorização destes desinfetantes deve ser feito junto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), mediante comprovação de eficácia. De acordo com a Resolução 35 de 16 de agosto de 2010, no Brasil são permitidos desinfetantes que cumpram as normas estabelecidas pela Comunidade Europeia e pelo FDA que estabelecem que estes desinfetantes de alto nível devem promover a eliminação de todos os micro-organismos, com exceção de esporos bacterianos.(45) 30 Glutaraldeido, áicdo paracético, ortoftalaldeído (OPA) 0,55% e água ácida eletrolizada (AAE) são alguns dos desinfetantes mais utilizados e aprovados em âmbito nacional. 2.3.2.1. Glutaraldeído Apresenta-se como um dialdeído saturado (1,5 pentaodial), potente biocida, utilizado para o reprocessamento de artigos odonto-medico-hospitalares, que não suportam altas temperaturas como, por exemplo, esterilização por calor úmido, estando disponível no mercado como desinfetante em concentrações de 2,% e 2,2%, sendo que a FDA preconiza que sejam de no mínimo 2,4% de concentração, porém no Brasil se preconiza o uso de glutaraldeído a 2%.(45) É um produto eficaz contra grande variedade de micro-organismos, com ação bactericida, fungicida, viricida, micobactericida e com efetividade mais lenta a frente de esporos.(16) Seu modo de ação se dá na alteração da síntese de proteína, ácido desoxirribonucleico (DNA) e ácido ribonucleico (RNA) dos micro-organismos, mediante aquilação dos grupos sulfidril, hidroxil, carboxil e amino.(2) Na concentração de 2% é utilizado tanto para desinfecção como esterilização, diferenciando-se através do tempo de imersão dos instrumentos, sendo necessários 30 minutos para desinfecção e período superior a 8 horas para esterilização.(16) Apresenta vantagens como desinfetante de alto nível possuindo um amplo espectro de ação, resistência à inativação pela matéria orgânica, possui propriedades anticorrosivas frente a metal, borracha e plástico sendo utilizado tanto para reprocessamento manual como automático de endoscópios e é recomendado pelos fabricante Pentax, Olympus e Fujinon pelo baixo custo.(41) Já como desvantagens ele fixa proteínas e permite a formação de biofilme, além de possuir resíduos tóxicos, causando efeitos adversos em manipuladores e pacientes, além de não ser biodegradável.(46) No Brasil são comercializados sob formulação aquosa e pH ácido, necessitando que antes de seu uso para que alcance a ação microbicida, é adicionado um pó ativador e a solução deve ser agitada, passando a apresentar uma concentração alcalina entre 7,5 e 8,5.(2) Já se encontram disponíveis soluções que depois de ativadas podem ser reutilizadas por 14 até 28 dias.(46) 31 De acordo com a Portaria do Ministério da Saúde nº 15/88(47) é necessário que o tempo de exposição do artigo ao glutaraldeído seja de 30 minutos para que seja alcançada uma desinfecção de alto nível. A literatura internacional relata um tempo menor, em torno de 20 minutos a uma concentração de 2%, sendo este também o tempo mínimo para eliminação de Mycobacterium tuberculosis. 2.3.2.2. Ácido peracético É encontrado no mercado sob diversas apresentações e formulações e variação de pH de 3 a 8,5(48), sendo que ainda não se conhece muito bem o seu mecanismo de ação, acreditando-se que seja semelhante ao dos agentes oxidantes, por meio de desnaturação de proteínas, alteração da permeabilidade da membrana e oxidação do radical sulfidril, como o rompimento das ligações de enxofre das proteínas, enzimas e outros metabólitos.(2) Desinfetantes de alto nível que possuem ácido peracético em sua composição requerem que após a abertura dos frascos e antes do uso, sejam adicionados a ele inibidores de corrosão. Na Europa é recomendado que para que se alcance uma desinfecção de alto nível os artigos devem ser imersos na solução por 10 minutos e a temperatura pode variar entre ambiente e 56ºC.(48) O ácido peracético é mais vantajoso em comparação ao glutaraldeido, sendo menos tóxico a manipuladores e pacientes se decompondo em: água, oxigênio, peróxido de hidrogênio e ácido acético, causando menos danos ao ambiente, porém com a desvantagem de ser menos estável em relação ao glutaraldeido, possuindo uma vida útil de 12 a 18 dias na forma líquida dependendo das condições de armazenamento e de três anos sob a forma de pó, também apresenta a desvantagem de oxidar cobre, bronze, aço liso, efeito que pode ser revertido com o uso de aditivos e alteração de pH.(48, 49) A Olympus não recomenda a utilização do ácido peracético em seus equipamentos, ao contrário das marcas Pentax e Fujinon.(41) 2.3.2.3. Ortoftalaldeído 0,55% (OPA) Dialdeido que apresenta em sua formulação 1,2 benzenodicarboxaldeído 0,55% apresenta natureza lipofílica, tornando assim a parede celular das micobacterias e 32 bactérias Gram negativas mais susceptíveis a sua ação, já que sua ação microbicida ocorre através da interação entre o ácido amino e as proteínas dos microorganismos.(50) Para que se alcance uma desinfecção de alto nível, varia-se o tempo de acordo com o fabricante, devido às diferenças metodológicas laboratoriais utilizadas para testes de aprovação da eficácia dos desinfetantes(2), e os quatro produtos aprovados pela FDA que possuem este principio ativo em sua composição, são recomendados o tempo de cinco minutos no método automatizado e doze minutos no tempo manual.(45) De acordo com alguns fabricantes uma solução de OPA pode ser utilizada por até 50 ciclos em lavadora automatizada ou até 14 dias em método manual. Além de se obter o processo de desinfecção em tempo reduzido e um maior aproveitamento de produto se tratando de ciclos, a solução também apresenta uma excelente estabilidade em uma faixa ampla de pH (3 a 9), apresenta uma melhor compatibilidade com o endoscópio gastrointestinal, atividade micobactericida superior, desnecessidade de ativação e de odor pouco perceptível.(2, 51) Todavia de forma similar ao glutaraldeído, o OPA pode causar irritação nos olhos e trato respiratório, apresentando riscos ao manipulador(48), recomendando-se também que se enxágue com pelo menos 250 mL de água por canal do endoscópio gastrointestinal, reduzindo a menos de 1 ppm os riscos deste desinfetante.(52) 2.3.2.4.Água ácida eletrolisada (AAE) É um desinfetante que se apresenta em forma líquida, contendo substâncias oxidantes, como por exemplo, o cobre, sendo preparado a partir da mistura de pequenas quantidades de sal a água em um eletrolizador, e suas propriedades físico-químicas dependem da preparação da solução, e seu mecanismo de ação se dá através da desnaturação de ácidos nucleicos, oxidação de membranas e inativação de enzimas.(53) Uma das vantagens que a AAE apresenta sobre o glutaraldeído é o fato de ser pouco tóxica, não promove a irritação de pele e mucosa, e não causa dano ao meio ambiente, se decompondo em substâncias ácidas e alcalinas que após se misturarem, tornam-se neutras, e pelo método automatizado promove desinfecção em 7 minutos.(48) 33 Como principal desvantagem apresenta um curto período armazenamento, sendo 24 h após o seu preparo, e caso não haja um bom enxágue, as substâncias geradas pela eletrólise, como o cloro podem ficar aderidas ao aparelho, podendo causar danos ao endoscópio.(48) 2.3.3. Etapas pós-desinfecção Após a correta desinfecção com o germicida de preferência e de forma adequada o endoscópio gastrointestinal estará reprocessado, porém sem condições de uso. Deverá passar ainda por etapas de enxague, secagem e estocagem, que devem ser seguidas de acordo com as normas existentes, podendo sofrer consequências pelo processo de recontaminação.(5) 2.3.3.1. Enxágue Etapa minuciosa, que deve garantir a remoção por completo dos resíduos do desinfetante, prevenindo a contaminação e introdução de resíduos no trato gastrointestinal do paciente durante a realização do exame.(41) O enxágue dos canais internos deve ser realizado com uso de adaptador fornecido pelo fabricante, procedendo à irrigação dos canais, por uso de seringa com água estéril ou filtrada por no mínimo cinco vezes.(5) 2.3.3.2. Secagem Esta etapa é primordial para os parâmetros de desinfecção e durante o armazenamento do endoscópio, devendo contemplar desde a superfície externa até os canais internos do endoscópio, sendo recomendado que se utilize um tecido macio, seco e limpo para a superfície externa.(5) Já para os canais internos recomenda-se que após o enxágue se aplique álcool entre 70% e 90% no interior dos canais, e após proceder a secagem com ar comprimido medicinal (sob baixa pressão) para que se percorra todos os canais, afim de remover toda a unidade que acaba se tornando favorável ao crescimento bacteriano.(2, 5) 34 2.3.3.3. Estocagem A literatura disponível preconiza que o ideal seria que o endoscópio, após seu reprocessamento tivesse uso imediato, pois não há período seguro de armazenamento para um produto submetidoa reprocessamento por meio químico. De acordo com as normas da SOBEEG (2006)(5)depois de reprocessados e secos devem ser estocados em armários que permitam uma fácil limpeza, em temperatura ambiente e que evitem umidade e calor excessivos. É recomendado que sejam armazenados em posição vertical e entre temperaturas de 10 e 40ºC em local limpo e não exposto a luz solar direta. Há protocolos que recomendam o reprocessamento dos endoscópios gastrointestinais antes do primeiro uso do dia, porém esta prática demanda tempo, o que impossibilita grandes centros de endoscopia gastrointestinal que possuem um grande número de endoscópios e exames por dia(27, 46), porém Muscarella (2006)(31) relata que não existam dados clínicos fundamentando os benefícios desta prática. 2.4. Métodos manuais e automatizados para limpeza e desinfecção dos endoscópios Para o reprocessamento do endoscópio gastrointestinal flexível, são recomendadas três maneiras sendo elas: manual, semi-automatizado e automatizado, conforme representado esquematicamente pela Figura5. 35 Figura 5: Métodos de reprocessamento de endoscópio gastrointestinal flexível. Fonte: Adaptado de Beilenhoff et al.(2008) Através do método manual todas as etapas do reprocessamento do endoscópio são realizadas manualmente por um profissional, já no método semiautomático, a desinfecção química a temperatura ambiente é realizada utilizando uma desinfetadora, sendo que a limpeza enxague e secagem são realizados manualmente; e pelo método automatizado é realizado por uma lavadora e desinfetadora automatizada todas as etapas do reprocessamento, não descartando a necessidade de uma pré-limpeza na sala de exames.(54) O método automatizado oferece a vantagem de menor exposição do manipulador e pacientes a gentes químicos, com o risco de desencadear reações alérgicas ou infecciosas menores(40, 54) , mas há de se considerar que pode haver contaminação na máquina reprocessadora, principalmente na parte de ligação entre ela e os endoscópios, sendo necessário definir um protocolo de desinfecção das maquinas, a monitoração da água utilizada e a troca da solução desinfetante recomendada pelo fabricante.(55) Encontram-se disponíveis no mercado brasileiro lavadoras-desinfetadoras nacionais e importadas, entretanto com uso restrito a poucos serviços de endoscopia gastrointestinal. 36 2.5. Ozônio Na constante busca de novas substâncias antimicrobianas, o ozônio (O3) vem apresentando grandes vantagens e bons resultados em pesquisas. É um gás bastante reativo, sendo que o prefixo ozo é derivado do grego “ozein”, o qual significa de aroma ou cheiro, característico do ozônio, sendo penetrante e desagradável. É encontrado naturalmente nas camadas superiores da atmosfera (camada de ozônio) que se localiza aproximadamente de 25 a 30 quilômetros de altura, tendo o importante papel de absorver a radiação ultravioleta que são tão prejudiciais a saúde do homem.(56) Este gás foi descoberto pelo químico Christian Friedrich Schonbein quando observou em meados do século XIX que após e descargas elétricas na atmosfera, era perceptível um odor diferente, o mesmo percebível na composição da água por uma corrente voltaica, acreditando assim que este odor característico poderia ser atribuído a um gás atmosférico.(57) O ozônio teve sua ação germicida evidenciada no final do século XIX, na França, quando começaram a utilizar este gás como desinfetante no tratamento de água.(58, 59) Desde então vem sendo estudado e aplicado para várias finalidades, intensamente na desinfecção e purificação da água. O gás ozônio de arranjo molecular triatômico e instável do oxigênio pode ser gerado através da excitação do oxigênio molecular, em um ambiente energizado que permite sua recombinação de átomos. É considerado um potente oxidante, se apresentando azulado em temperatura ambiente, porém em concentrações utilizadas para desinfecção de torna-se incolor(59), é um gás instável com odor característico e altopoder oxidante tendo a habilidade de destruir bactérias e inativar vírus.(60) Apresenta-se como um poderoso oxidante, em contrapartida é muito instável o que necessita que seja gerado “in situ”, sendo assim deve ser produzido no local a ser utilizado, através de um gerador de ozônio.(61) Os três átomos de oxigênio da molécula de ozônio são dispostos de forma triangular, formando um ângulo de ligação de 116º 49’ entre os três átomos, e a ligação tem um comprimento de 1.278 Å, sua molécula possui três átomos de oxigênio(62), conforme apresentado na Figura 6. 37 Figura 6: Estrutura molecular do O3. Fonte: Rakovsky, Anachkow e Zaikov (2009) 2.5.1. Produção de ozônio O ozônio pode ser produzido de três técnicas diferentes, sendo elas: a exposição do O2 a luz ultravioleta, eletrólise do ácido perclórico e por meio de descarga eletroquímica (elétrica).(63) O ozônio é produzido por meio de uma ruptura na molécula de oxigênio, podendo se recombinar a outras moléculas incluindo também o oxigênio, e esta ruptura pode acontecer devido à passagem do oxigênio com altas descargas de voltagem elétricas com variadas frequências, chamado de descarga corona, método utilizado pela maioria dos ozonizadores comerciais devido ser o método que mais converte oxigênio em ozônio.(63, 64) 2.5.2. Método de descarga corona O gerador de ozônio que utiliza o processo corona é constituído de dois eletrodos submetidos à elevada diferença de potencial (aproximadamente 10 kV), gerando o ozônio pela passagem de ar ou oxigênio puro entre os dois eletrodos. Com isso ocorrem colisões que desassociam as moléculas de oxigênio, causando assim a desintegração do oxigênio e a formação do ozônio.(65) 38 Figura 7: Esquema de geração do ozônio por meio do processo corona. Fonte: Adaptado de Rice et al. (1981) Tanto o ozônio como outros oxidantes pode ter sua atividade influenciada por diversos materiais oxidáveis presentes no meio, desde radiação ultravioleta a microorganismos. Por ser um gás instável, porém potente, deve ser produzido no seu local de utilização. O processo de geração de ozônio corona pode converter oxigênio molecular em ozônio a concentrações de até 4% em massa para geração a partir de ar e de até 14% para geração a partir do oxigênio puro.(65) No modo de geração através de oxigênio puro, é utilizado um cilindro do oxigênio alimentando o gerador precedido de um evaporador. As principais vantagens de utilizar um ozonizador alimentado com oxigênio são o maior rendimento no processo de transformação e menor custo de manutenção, apresentando somente a desvantagem do alto custo do oxigênio puro.(66) Porém para geração de ozônio, a partir do ar é necessário seu pré-tratamento, incluindo etapas de filtração, compressão, resfriamento e desumidificação. Já a concentração de ozônio depende relativamente da composição do gás empregado em sua geração (oxigênio ou ar), voltagem aplicada nos eletrodos, frequência e fluxo de distribuição do sistema. 2.5.3. Ação antimicrobiana do ozônio O ozônio age oxidando as paredes celulares e membranas citoplasmáticas das bactérias, e também agindo sobre vírus, fungos e protozoários, devido o fato do gás formar radicais oxidantes na presença de água, penetrando e atacando as 39 membranas, afetando assim o equilíbrio osmótico e promovendo a oxidação de ácidos nucleicos e aminoácidos, causando a sua lise celular.(56, 67, 68) O processo de inativação de bactérias pelo ozônio é complexo, pois o gás age oxidando vários componentes celulares como: proteínas, lipídios insaturados e enzimas respiratórias nas membranas celulares, os peptidioglicanos dos envelopes celulares, enzimas e ácidos nucleicos no citoplasma, proteínas e peptidioglicano das paredes de esporos até as cápsulas virais. A inativação completa ou redução da carga microbiana devido à ozonização depende diretamente da concentração de ozônio, do tempo de aplicação e do micro-organismo envolvido.(69) Seu foco de atuação inicialmente é a membrana celular, sendo a superfície da célula microbiana o primeiro ponto a ser atingido. Sua ação antimicrobiana é decorrente da oxidação de glicolipídeos, glicoproteínas e aminoácidos da parede celular, alterando assim sua permeabilidade e causando sua lise. O ozônio atua também atacando grupos sulfidrila de enzimas, ocorrendo assim o colapso da atividade enzimática celular. Além disso, sua ação sobre o material nuclear dos microrganismos altera as bases púricas e pirimídicas dos ácidos nucléicos, como ocorre com alguns vírus, onde o ozônio destrói seu RNA além de alterar as cadeias polipeptídicas do capsídeoproteico.(70, 71) O efeito antimicrobiano do ozônio vem sendo estudado em uma ampla variedade de micro-organismos, mostrando-se mais eficaz em células vegetativas de bactérias do que em vírus e fungos(62, 72) , sendo também as bactérias Gram negativas mais sensíveis ao ozônio do que as gram positivas, fato explicado pela camada das bactérias Gram positivas possuir mais camadas de peptidioglicano, formando uma estrutura mais espessa e rígida.(25) A grande diferença entre o ozônio de outros agentes biocidas é o seu mecanismo de destruição de micro-organismos (Figura8), sendo que o ozônio age diretamente na parede da célula, causando sua ruptura e morte celular em menor tempo e inviabilizando a recuperação dos micro-organismos após sua oxidação, diferentemente do cloro, por exemplo, que atua por difusão através da parede celular agindo sobre elementos vitais encontrados no interior da célula, como proteínas, enzinas, DNA e RNA.(73) 40 Figura 8: Mecanismo de ação do ozônio em bactérias. 1- bactéria; 2 - parede celular da bactéria sendo atacada pelo ozônio; 3 - oxidação da parede celular; 4, 5 e 6 - ruptura e destruição da bactéria. Fonte: Snatural & Naturaltec (2013) O ozônio vem sendo muito utilizado na esterilização de materiais e mostrando sua eficácia. Esta sendo utilizado na esterilização de água e cerveja, e também em embalagens para produtos alimentícios, sendo reconhecido devido a sua eficácia contra agentes microbianos e por não liberar ou deixar resíduos tóxicos após sua decomposição.(60) Alguns trabalhos relataram que de o poder de ação antimicrobiana do ozônio depende da relação de sobrevivência do micro-organismo versus o tempo de exposição(67, 74) , também esta intimamente associado a concentração inicial de micro-organismos e a concentração do gás, e também da dissipação de um microorganismo em relação ao outro expostos a água ozonizada.(75) 2.5.4. Toxidade do ozônio É um gás que se não usado corretamente pode apresentar malefícios a saúde, dependendo de sua concentração, tempo de exposição, e da capacidade do metabolismo celular do organismo para regular a produção de radicais livres, capazes de produzir danos às moléculas biológicas.(76) Quando inalado em altas concentrações pode produzir danos prejudiciais a saúde, como deficiências neurológicas, cefaleia, fadiga e insônia.(77) Ao atingir o sistema respiratório, o ozônio pode causar sintomas de toxidade como, por exemplo: dor de cabeça, tonturas, sensação de queimação nos olhos, irritação da garganta e tosse. No entanto estudos relatam que o ozônio é toxico para o sistema pulmonar 41 durante longa inalação de 0,0002 µg/mL (0,2 ppm)(60, 62) , sendo que um indivíduo pode detectar o cheiro característico do ozônio em concentrações 0,01 a 0,05 ppm.(72) 42 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1. Natureza e local de estudo Foi definido como local de estudo o serviço de endoscopia digestiva localizado na Santa Casa de Misericórdia de Tupi Paulista, que só realiza endoscopias digestivas diagnóstico-terapêuticos em pacientes adultos e crianças. As análises microbiológicas foram realizadas no Laboratório de Analises Clínicas da Santa Casa de Misericórdia de Tupi Paulista - SP. 3.2. População e amostra Constituída unicamente de endoscópios utilizados no procedimento de endoscopia digestiva alta (EDA), sendo realizada a desinfecção por agua ozonizada após o ultimo procedimento do dia, pelo fato da unidade só possuir dois endoscópios, o que permitiu apenas uma ou duas análises diárias. 3.3. Amostras dos endoscópios A coleta de dados foi realizada no período de fevereiro a abril de 2014, sendo que todas as coletas aconteceram no período matutino, em virtude do horário de realização dos exames. Os endoscópios foram avaliados em dois momentos: 1) após a lavagem com detergente enzimático e 2) após a desinfecção de alto nível com água ozonizada em que foram utilizadas duas doses diferentes 264 mg.min.L-1 e 330 mg.min.L-1. Além disso, um grupo foi desinfetado com glutaraldeído à 2% (Glutaron®), fabricado pela Rioquimica, como controle do processo de desinfecção. A coleta do material da superfície externa denominada proximal e distal dos endoscópios foi realizada por meio de swab, friccionando todo seu diâmetro cinco centímetros antes de cada extremidade. Este swab foi colocado em um tubo estéril e identificado para ser encaminhado ao Laboratório. Em contrapartida, o material proveniente do canal de sucção/biópsia dos gastroscópios foi coletado através da introdução de 10 mL de água destilada e coletado na outra extremidade do aparelho 43 endoscópio em tubo estéril, também enviado ao Laboratório de Analises Clinicas da Santa Casa de Misericórdia de Tupi Paulista onde o pesquisador realizou as análises microbiológicas. Figura 9: Fluxograma dos pontos de coleta de amostras microbiológicas do endoscópio gastrointestinal. Critérios de Inclusão: Foram incluídos endoscópios utilizados para diagnóstico, que após o seu uso realizou-se o estudo para comprovar a eficácia da água ozonizada, sendo reprocessados novamente com o método utilizado pela unidade cedente a fim de garantir uma perfeita desinfecção enquanto se realizava o estudo. Critérios de exclusão: Endoscópios utilizados em endoscopias complexas que exigissem anestesia. 3.4. Procedimento realizado O procedimento realizado consistiu na pré-limpeza com papel toalha logo após a retirada do aparelho do canal gastrointestinal do paciente para retirar resíduos de secreção, lavagem com detergente enzimático Indazyme4 PLUS (1:250) por 15 minutos, juntamente com um processo de fricção do canal com escova apropriada fornecida pelo fabricante e enxaguado com água de torneira. Na sequência, foi realizada a desinfeção de alto nível, sendo que 6 amostras foram desinfetadas com ozônio por um tempo de 8 minutos, 6 amostras desinfetadas com ozônio por 10 minutos e 4 amostras desinfetadas pela técnica tradicional com glutaraldeído a 2% por vinte minutos. Os endoscópios desinfetados pela técnica com ozônio foram submergidos em 1,5 L, utilizando uma proveta de 2 L, sendo ligado o gerador de ozônio após a inserção do endoscópio, assim a água foi ozonizada 44 simultaneamente com o aparelho endoscópio. Todas as amostras das diferentes técnicas utilizadas tiveram a inserção de 10 seringas de 50 mL de água ozonizada ou glutaraldeído nos primeiros dois minutos e por mais 10 inserções nos últimos dois minutos de cada técnica. A concentração de O3 fornecida pelo gerador utilizado foi equivalente a 33mg/L, com uma vazão de O2 de 0,5 L.min-1; sendo assim, as doses de O3 utilizadas foram 264 e 330 mg.min.L-1, respectivamente. Após o processo de desinfecção de alto nível foi realizado um novo enxágue, desta vez com água destilada, posteriormente o endoscópio foi seco utilizando O2 medicinal e armazenado. 3.4.1. Análise quantitativa dos resultados Os resultados obtidos foram tabulados em planilha do Excel® (Microsoft, USA), sendo que foram determinadas as UFC/mL depois do detergente enzimático e após os diferentes procedimentos de reprocessamento dos endoscópios. Foi utilizado o software INSTAT3 para a análise estatística dos dados e estes foram submetidos ao One-way Analysis of Variance (ANOVA), seguido do pós-teste Tukey-Kramer Multiple Comparisons Test. Além disso, foi determinada a porcentagem de redução microbiana a partir da seguinte fórmula: Redução Microbiana (%) = [(Número de UFC após o DE – Número de UFC após o reprocessamento) / Número de UFCs após o DE] x 100 onde UFC - Unidade formadora de colônia; DE - Detergente Enzimático. 3.4.2. Análise qualitativa As análises microbiológicas foram realizadas seguindo protocolo de testes bioquímicos, e as bactérias remanescentes aos processos de desinfecção foram identificadas através de provas bioquímicas segundo Konemam(78). 45 3.5. Isolamento e identificação dos micro-organismos As amostras coletadas e encaminhadas ao Laboratório (swab e solução de água destilada) foram inoculadas em ágar Mueller Hinton e ágar Mac Conkey. As amostras da superfície externa foram semeadas diretamente com o swab, já as amostras do canal de sucção/biópsia foram semeadas adicionando na placa 10 µL do lavado e realizando a semeadura com alça de Drigalski, em seguida incubados a 37º C por 24 a 48 h, após este período foi realizada a contagem de colônias. Foi realizada a identificação das bactérias somente quando apresentaram crescimento após o processo de desinfecção de alto nível tanto com água ozonizada como com o glutaraldeído, tendo suas colônias identificadas com base em seu crescimento colonial e provas bioquímicas.(79) 3.5.1. Identificação de cocos Gram positivos Após coloração de gram e reconhecimento de cocos gram positivos, uma colônia foi isolada e inoculada em ágar nutriente, a fim de se obter colônias isoladas, para posteriormente serem submetidas a prova de catalase, coagulase em tubo e novobiocina. 3.5.1.1. Prova da catalase Identifica a presença da enzima catalase, sendo utilizada para diferenciação de estafilococos, micrococos e estomatococos, dos estreptococos que são catalase negativa. A catalase é uma enzima que decompõe o peróxido de hidrogênio (H2O2) em água e oxigênio, sendo positivo quando há formação de bolhas, e negativo quando não há formação de bolhas ou efervescência no contato da bactéria com o peróxido de hidrogênio. 3.5.1.2. Prova da coagulase em tubo Esta prova verifica a capacidade de um micro-organnismo coagular o plasma através da enzima coagulase, sendo muito utilizada na identificação de Staphylococcus aureus. A prova da coagulase em tubo detecta tanto a forma livre 46 quanto ligada da coagulase, portanto foi a prova de escolha neste estudo. A prova é realizada colocando-se uma alça de estafilococos em 0,5 mL de plasma liofilizado de coelho, sendo incubado por 18 a 24 h, observando se ocorre a coagulação caracterizando a prova positiva. 3.5.1.3. Resistência a novobiocina Técnica utilizada para identificação de estafilococos não produtores de coagulase, a prova de resistência a novobiocina permite distinguir cepas de Staphylococcus saprophyticus, de outros micro-organismos, as cepas de interesse são turvadas seguindo escala 0,5 de Mac Farland, semeadas em placas contendo ágar Muller Hinton com auxilio de swab adicionando um disco de novobiocina, em seguida incubado por 18-24 h e após este período é verificado o halo de inibição formado pelas bactérias. O Staphylococcus saprophyticus é resistente a novobiocina. 3.5.2. Identificação presuntiva de bacilos gram negativos (BGN) Foi utilizado o meio de cultura ágar tríplice açúcar e ferro (TAF) que é utilizado para diferenciar bastonetes Gram negativos, com base na fermentação de carboidratos, produção de sulfeto de hidrogênio e gás. A sua fermentação é indicada pela mudança de cor, indicador de pH, de vermelho para amarelo. Este meio de cultura contém três açucares: glicose, lactose, sacarose e vermelho de fenol para a detecção de fermentação de carboidratos e sulfato de ferro, para a detecção da produção de sulfato de hidrogênio que é indicado pela presença da cor negra na base do tubo. 3.5.2.1. Identificação de bastonetes Gram negativos não fermentadores Os bacilos gram negativos não fermentadores foram repicados em ágar nutriente, incubados por 24 h a 37º C em estufa bacteriológica, em seguida foi realizada a prova da oxidase, que difere bastonetes gram negativos não fermentadores (oxidase positiva) das enterobactérias (oxidase negativa). O teste é fundamentado na produção da enzima oxidase pela bactéria, utilizando fitas impregnadas com o reativo (N,N,N,N-tetrametil-p-fenileno diamima mono-hidroclirato), e que se ao 47 esfregar a colônia na fita, esta mudar sua cor para roxo o teste é positivo e se não houver alteração de cor negativo. 3.5.2.2. Identificação de bastonetes Gram negativos fermentadores Neste estudo os bastonetes Gram negativos fermentadores (enterobactérias) foram identificados utilizando o meio de cultura RUGAI, que reúne em um único meio provas de produção de indol, fermentação da sacarose e glicose, produção de gás, fenilalanina, uréia, H2S, lisina e motilidade. 3.6. Aspectos éticos Diante do aceite do responsável do Serviço de Endoscopia Digestiva localizado na Santa Casa de Misericórdia de Tupi Paulista, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi apresentado e assinado. Ao término do experimento a análise dos dados e as análises microbiológicas dos endoscópios, os resultados obtidos foram fornecidos para a instituição e o pesquisador colocou-se a disposição para quaisquer esclarecimentos. 48 4. RESULTADOS 4.1. Análise quantitativa da desinfecção A Tabela 1 apresenta os dados referentes às contagens microbianas expressas UFC/mL, após o detergente enzimático e após o reprocessamento com as diferentes técnicas. De acordo com os resultados apresentados, o canal apresentou uma maior contaminação do que as regiões proximal e distal após a aplicação do detergente enzimático. Neste sentido, nas regiões proximal e distal, após o reprocessamento com glutaraldeído e ozônio (264 e 330 mg.min.L-1) a contagem microbiana foi nula. Entretanto, no canal o glutaraldeído e o ozônio (264 mg.min.L-1) ainda restaram UFC remanescentes nas amostras, diferentemente do ozônio que quando utilizado na dose de 330 mg.min.L-1 o número de UFC foi igual a zero. Tabela 1: Média (± desvio padrão) das Unidades Formadoras de Colônias (UFC/mL) após Detergente Enzimático (Após DE); após o reprocessamento (RP), nos três pontos de coleta do endoscópio (canal, proximal e distal). 264 mg.min.L-1 Glutaraldeído 2% Regiões Antes DE Após DE RP Canal 195,3 (± 169,9) 53,5 (± 49,3) 2* (± 4) 330 mg.min.L-1 Antes DE Após DE RP 142,3 (± 62,4) 56,3* (± 40,2) 0* 58,0 19,3 137,2 (± 42,7* 117,3 40,0* (± 0* (± 38,2) (± 19,4) 88,7) (± 40,3) (± 52,2) 39,6) 0* 38,3 142,5 55,7 180,2 57,8* Distal 0* 125,2(±75,4) (± 122,9) (± 29,6) (±70,9) (± 87,1) (± 43,0) * representa p<0,05 na análise comparativa dos grupos antes do DE com os demais grupos. 0* Proximal Antes DE Após DE 189,3 (± 69,1) 95,3* (± 54,0) RP 13* (± 8,8) 0* 0* Na Figura 10, os resultados são apresentados na forma de porcentagem de redução microbiana observada no canal após aplicação das diferentes técnicas de desinfecção. Desta maneira, pode-se notar que o ozônio aplicado na dose de 330 mg.min.L-1 foi capaz de reduzir 100% dos micro-organismos viáveis. Além disso, a água ozonizada (264 mg.min.L-1) e o método convencional com glutaraldeído, a porcentagem de redução foi de 92,2 e 98,3%, respectivamente. 49 105 100 98.3 92.2 Redução Microbiana (%) 90 73.9 62.2 54.5 75 Após DE 60 Reprocessado 45 30 15 0 Glutaraldeído 2% 264 mg.min.L-1 330 mg.min.L-1 Figura 10: Porcentagem de redução das UFCs no Canal do gastroscópio após a aplicação do Detergente enzimático (DE) e após o reprocessamento deste material com Glutaraldeído 2% (grupo -1 controle) e Ozônio (264 e 330 mg.min.L ). De acordo com os dados apresentados na Figura 11, a porcentagem de redução microbiana na região proximal foi de 100% após o reprocessamento com glutaraldeído e ozônio. 105 72.5 100 71.6 90 Redução Microbiana (%) 100 100 72.2 75 Após DE 60 Reprocessado 45 30 15 0 Glutaraldeído 2% 264 mg.min.L-1 330 mg.min.L-1 Figura 11: Porcentagem de redução das UFCs na região Proximal do gastroscópio após a aplicação do Detergente enzimático (DE) e após o reprocessamento deste material com Glutaraldeído 2% (grupo controle) e Ozônio (264 e 330 mg.min.L-1). 50 De acordo com a Figura 12, a porcentagem de redução de micro-organismos viáveis na região distal foi de 100%, considereando-se as duas doses de ozônio utilizadas e no grupo controle com glutaraldeído. Figura 12: Porcentagem de redução das UFCs na região Distal do gastroscópio após a aplicação do Detergente enzimático (DE) e após o reprocessamento deste material com Glutaraldeído 2% (grupo controle) e Ozônio (264 e 330 mg.min.L-1). 4.2. Análise qualitativa Foram realizadas análises microbiológicas incluindo provas bioquímicas no sentido de identificar os micro-organismos remanescentes ao processo de desinfecção de alto nível. A Tabela 2 apresenta as bactérias remanescentes ao processo de desinfecção de alto nível quando se utilizado ozônio e glutaraldeído. 51 Tabela 2: Bactérias remanescentes do Canal de sucção/biópsia após processo de desinfecção de alto nível. Glutaraldeído 2% Água Ozonizada 264mg mg.min.L-1 Escherichia coli Escherichia coli Enterobacter sp Enterobacter sp Staphylococcus coagulase Staphylococcus coagulase positiva positiva Staphylococcus coagulase Staphylococcus coagulase negativa Streptococcus sp negativa 52 5. DISCUSSÃO O ozônio vem se mostrando muito promissor em diversos trabalhos relacionados à desinfecção e esterilização de artigos médico-hospitalares. Neste estudo, em que foi realizada a analise microbiológica de gastroscópios, a carga microbiana logo após o seu uso foi relativamente baixa em algumas amostras, fato explicado devido o aparelho ser utilizado no trato digestivo superior, incluindo o estômago, que apresenta pH extremamente ácido. A definição da carga microbiana em endoscópios gastrointestinais ainda é controversa(80, 81) , assim neste estudo foi-se considerado contaminado todas as amostras que apresentaram algum crescimento bacteriano após o seu reprocessamento, ainda que alguns autores(80) sugiram um ponto de corte em 100 UFC/mL. Uma contaminação esperada após o reprocessamento de endoscópios deve ser menor que 20 UFC/mL, para as amostras coletadas por meio de introdução de salina nos canais, já no caso da superfície externa onde se realiza a coleta com swab umedecido, o foco se torna a presença de micro-organismos indicadores de contaminação e não sua quantificação.(81) Artigos recentes relatam conseguir uma redução de 2 log de Streptococcus mutans com uma concentração de 25 a 30 ppm de ozônio na água. Esta redução atingiu 100% de redução microbiana quando se associou água ozonizada com ultrassom.(82) Com relação aos dados qualitativos obtidos neste estudo, entre os microorganismos resistentes à desinfecção obtivemos bactérias Gram negativas, como por exemplo, Escherichia coli e Enterobacter sp. Esse achado está de acordo com o esperado uma vez que estes micro-organismos estão presentes trato gastrointestinal superior, micro-organismos também descritos por outros autores em seus trabalhos.(19, 53) Há estudos que demonstram que a presença destes micro- organismos em canais de endoscópios estão relacionados diretamente a falhas na concentração e tempo de exposição ao germicida.(81) Cabe ressaltar que o ozônio foi capaz de eliminar eficientemente estes micro-organismos e assim reduzir o risco de infecção associada ao uso deste tipo de material, uma vez que a endoscopia não é somente utilizada por pacientes hígidos, mas também em pacientes 53 imunocomprometidos e imunossuprimidos, os quais apresentariam risco potencial de apresentarem infecções.(68) Já no caso das bactérias isoladas como Streptococcus sp e Staphylococcus sp, que não fazem parte da microbiota local, podem ter sido adquiridas por contaminação cruzada ou falhas no reprocessamento. Estes micro-organismos requerem uma atenção especial, já que podem comumente causar quadros de febre, diarreias, flatulência abdominal, interrupção e dificuldade de movimentos intestinais, entre outras.(25) Estudos “in vitro” relatam a eficácia da água ozonizada frente a micro-organismos frequentemente isoladas de endoscópios como: Escherichia coli, Staphylococcus aureus, Pseudomonas aeruginosa, e Candida albicans, porém neste mesmo estudo a água ozonizada não conseguiu a redução total de micro-organismos como: Helycobacter pylori, Mycobacterium avium e Bacillus subtilis.(83) A solução de glutaraldeído a 2% é amplamente utilizada para a desinfecção de alto nível de diversos materiais como endoscópios, instrumentos odontológicos e materiais de plástico e borracha que não podem ser esterilizados frente a altas temperaturas e, conforme algumas referências, o tempo médio e ideal é de 20 a 30 minutos com um pH de 7,5 à 8,5.(38, 84) Em contrapartida, é um agente muito irritante e sensibilizante de pele e mucosas em condições de trabalho desfavoráveis, porém classificado como não carcinogênico, não mutagênico e sem toxidade sistêmica.(85) A principal vantagem do uso da água ozonizada na desinfecção de alto nível de endoscópios gastrointestinais está no fato de se obter um perfil de desinfecção semelhante à forma convencional com glutaraldeído. Entretanto, a água ozonizada não requer um controle diário estrito do pH; o glutaraldeído necessita de um descarte adequado sendo que este deve ser acondicionado em galões próprios e recolhidos pelo fornecedor do produto. A validade do glutaraldeído é restrita (14 a 28 dias depois de preparado)(86) e na questão do tempo de reprocessamento, neste sentido o tempo de reprocessamento dos endoscópios que, no método convencional, deve ficar submerso de 20 à 30 minutos em glutaraldeído, no caso da água ozonizada 10 minutos foram suficientes para obter o mesmo nível de desinfecção (sem considerar o tempo da imersão no detergente enzimático). De acordo com os resultados obtidos no presente estudo, quando se utilizou água ozonizada (330 mg.min.L-1) houve uma redução de 100% dos microorganismos viáveis nas condições utilizadas. Assim, o ozônio foi capaz de desinfetar 54 os endoscópios de maneira mais eficiente que o glutaraldeído 2%. Cabe ressaltar que a dose de ozônio utilizada é de extrema importância, pois define o potencial desinfetante deste. Assim, com base nestes dados, sugere-se que novos estudos sejam realizados com o intuito de determinar um protocolo eficiente e que possa na prática substituir o glutaraldeído na desinfecção deste tipo de material. A água ozonizada mostrou-se um potente desinfetante para endoscópios gastrointestinais, podendo ser um substituto ao glutaraldeído devido às diversas vantagens mencionadas anteriormente. 55 6. CONCLUSÕES Conclui-se que a água ozonizada foi capaz de desinfetar os endoscópios de maneira eficiente (se mostrando ainda mais eficiente que o glutaraldeído) já que eliminou 100% de micro-organismos em todos os pontos de coleta testados quando utilizado a dose de 330 mg.min.L-1. Trata-se de uma técnica promissora para o reprocessamento deste material, diminuindo assim o tempo de reprocessamento. Neste sentido, conseguiu-se reduzir o tempo total de reprocessamento dos endoscópios, incluindo sua imersão em detergente enzimático, de 35 para 25 minutos quando utilizada a água ozonizada. 56 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Costa Junior AB. Endoscopia Digestiva de Urgência. São Paulo: Editora Santos, 2009. p. 312. 2. Rutala WA, Weber DJ e HICPAC. Guideline for disinfection and sterilization in healthcare facilities, 2008. Atlanta (USA): Centers for Disease Control and Prevention (CDC) 2008. Disponível em: http://www.cdc.gov/hicpac/Disinfection_Sterilization/acknowledg.html Acesso em: 11 jan. 2014. 3. SOBED Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva. Endoscopia Digestiva. 3a. ed. Rio de Janeiro: Medsi, 2000. p. 6-11; 94-6. 4. Costa ML, Cardo DM, Ferrari AP. Levantamento de rotinas de reprocessamento de endoscópios em hospitais do munícipio de Säo Paulo. Gastroenterol Endosc Dig. 1997; 16(2):41-6. 5. Muller S, Graziano KU, Hoefel HHK. 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Para tanto, solicitamos a autorização para a realização do referido estudo, sendo que a obtenção de dados será mediante a coleta e análise microbiológica dos endoscópios. Esclarecemos que a realização da pesquisa não envolverá pacientes, ou seja, sem riscos aos mesmos, sendo garantido também sigilo sobre a publicação de dados, que serão divulgados e publicados em periódicos especializados, eventos científicos, porém assegurando o sigilo institucional. Para tanto, contamos com a sua aquiescência no sentido de autorizar a coleta de dados. Colocamos-nos à sua disposição para quaisquer esclarecimentos que se fizerem necessários. Atenciosamente Mestrando: Renan Fava Marson