Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Lato Sensu em Serviço Social, Justiça e Direitos Humanos
Trabalho de Conclusão de Curso
O SERVIÇO SOCIAL E OS "ADOLESCENTES EM CONFLITO
COM A LEI": UMA CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE
Autora: Nayara Zacarias Gonçalves
Orientadora: Profª. MSc. Karina A. Figueiredo
Brasília - DF
2014
NAYARA ZACARIAS GONÇALVES
O SERVIÇO SOCIAL E OS "ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI": UMA
CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE
Artigo apresentado ao Programa de PósGraduação Lato Sensu em Serviço Social,
Justiça
e
Direitos
Humanos
da
Universidade Católica de Brasília, como
requisito parcial para obtenção do
certificado de especialista.
Orientadora: Profª. MSc. Karina Aparecida
Figueiredo.
Brasília - DF
2014
Ao meu filho Miguel, que me passa força
todos os dias para que eu continue
correndo atrás dos meus sonhos.
AGRADECIMENTO
Durante toda a minha vida, bem como nessa empreitada acadêmica, de
várias formas as pessoas contribuíram para que eu conseguisse concluir mais esse
ciclo da minha vida.
Minha família foi fundamental em toda essa caminhada, pois desde a
graduação vêm me apoiando muito.
Minha mãe Maria Aparecida e meu pai José Humberto sempre me apoiaram
de forma sabia e carinhosa juntamente com minha irmã Natália tão querida.
Ao meu namorado Christian pelo carinho, compreensão, paciência, respeito e
amor.
Á minha orientadora, a assistente social Karina Figueiredo, verdadeira
companheira e educadora, pelo apoio, paciência, orientação e por acreditar na
minha proposta de estudo, possibilitando o desenvolvimento do mesmo.
Aos colegas de turma pela energia transmitida, pelos momentos de alegria e
pela companhia fiel em todas as horas.
Á pessoa mais especial, meu filho Miguel, por ser minha fonte de inspiração.
E, finalmente, aos demais que acreditaram e, de alguma forma, contribuíram
para elaboração deste artigo.
5
O SERVIÇO SOCIAL E OS "ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI": UMA
CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE.
NAYARA ZACARIAS GONÇALVES
Resumo:
Este estudo tem por finalidade contribuir na sistematização do debate acerca do
trabalho profissional do Assistente Social com adolescentes em cumprimento de
medida socioeducativa, a partir dos artigos publicados na Revista “Serviço e
Sociedade” no período de 2010 até 2013. Trata-se de uma pesquisa qualitativa e
exploratória que será realizada por meio de análise bibliográfica. A discussão
apresentada discorre pelo campo teórico-metodológico, ético-político e técnicooperacional da ação profissional com vistas aos múltiplos desafios relacionados à
garantia de direitos e à efetivação de deveres dos respectivos adolescentes.
Contemporaneamente as questões sociais 1 envolvendo adolescentes em conflito
com a lei, instigam o debate sobre as legislações e a importância do Assistente
Social atuando nas instituições de medidas socioeducativas. Pretende-se, portanto,
através desta pesquisa evidenciar as estratégias adotadas na atuação dos desses
profissionais em relação à garantia da proteção integral dos adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa e levantar as dificuldades enfrentadas pelos
mesmos. Assim, este revela as possibilidades de atuação do Serviço Social frente
aos adolescentes em conflito com a lei. Os resultados alcançados mostram que
existe uma escassa produção bibliográfica sobre a questão da atuação profissional
do Serviço Social com relação às medidas socioeducativas, sendo este mais um dos
desafios para a atuação do assistente social.
Palavras-chave: Serviço Social. Trabalho profissional. Adolescentes. Medida
socioeducativa.
INTRODUÇÃO
O artigo busca através da pesquisa bibliográfica, compreender o significado
das ações realizadas pelo assistente social na aplicação das medidas
socioeducativas com adolescentes em conflito com a lei, aprimorando as técnicas e
processo de trabalho para possibilitar a garantia dos direitos dos adolescentes a
partir da análise histórica da infância.
Para compreender a situação dos adolescentes em conflito com a lei, se faz
necessário realizar uma contextualização do indivíduo na sociedade, que é marcado
por contradições, transformações e mudanças. No Brasil em 1926 institui-se o
Código de Menores que previa intervenções ao adolescente em “situação irregular”.
Para Rizzini (2000) existe uma nítida criminalização, da infância pobre, sendo o
1
O termo “questão social” foi empregado para designar o pauperismo, fenômeno resultante do
processo de industrialização no século XIII e que conforme demonstra Neto (2004, p. 42): “[...] a
pobreza crescia na razão em que o aumentava a capacidade social de produzir riquezas.” Deste
modo, “a gênese da ‘questão social’ na sociedade burguesa deriva de caráter coletivo da construção
contraposta à apropriação privada da própria atividade humana – o trabalho [...].” (IAMAMOTO, 2008,
p. 156).
6
termo “menor” utilizado como sinônimo de delinquência e abandono. Neste século
percebe-se várias mudanças na estrutura social e familiar devido a Revolução
Industrial e o desenvolvimento técnico-científico. Posteriormente, o século XX foi
marco legal que promoveu mudanças significativas no que diz respeito ao sistema
de garantia de direitos a partir da Constituição Federal de 1988 e do Estatuto da
Criança e Adolescente (ECA) de 1990.
Esta pesquisa tem como foco reconhecer a importância das intervenções dos
assistentes sociais em relação ao acesso e garantia do direito dos adolescentes,
independente da situação de conflito com a lei. Nesse sentido, as ações
desenvolvidas pelo assistente social devem estar alinhadas ao atual projeto éticopolítico da profissão, ao ECA e com o Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo (SINASE).
A atuação dos assistentes sociais junto ao adolescente em cumprimento da
medida socioeducativa de internação, ocupa papel de importante significado nas
diferentes etapas da trajetória deste nas unidades de internação, contudo, os
desafios apontam para a fragilidade da rede de proteção, o contexto familiar e a
atuação junto à equipe multiprofissional conforme preconiza o SINASE.
Em virtude da escassez de referenciais bibliográficos quanto à atuação do
assistente social junto aos adolescentes em conflito com a lei, se faz pertinente a
pesquisa sobre o tema para preencher essa lacuna no campo do conhecimento.
Além disso, existe uma ausência de pesquisas que valorizem a perspectiva do
assistente social no campo sociojurídico, especialmente no que se refere à questão
da intervenção no serviço social nesta temática. Os resultados proporcionarão mais
conhecimentos sobre o assunto para os profissionais de Serviço Social e,
especialmente, para aqueles que atuam na área dos direitos humanos e na garantia
de direito das crianças e adolescentes.
Sendo assim, o presente trabalho apresenta-se dividido em cinco tópicos. O
primeiro tópico descreve a trajetória da infância e adolescência até os dias atuais. O
segundo trata de uma análise do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo.
O terceiro descreve a inserção do assistente social nas medidas socioeducativas. O
quarto traz a metodologia utilizada no estudo. O último dispõe sobre os resultados e
reflexões e por fim as considerações finais.
1 A TRAJETÓRIA DA INFÂNCIA: O DESENVOVIMENTO DO DIREITO DA
CRIANÇA E ADOLESCENTE
Da antiguidade até a Idade Média, a criança só existia como extensão do pai,
ou seja, como um bem da família pertencente ao pai, e esse era o seu único papel
nas relações jurídicas da sociedade. A criança não existia como sujeito, e sim como
bem da família, não tendo outras relações jurídicas no seio da família. Até no século
XII ou XIII, inexistia na Europa o conceito de infância, como estabelecido
atualmente, surgindo especialmente a partir do Iluminismo. E ser criança não era
entendido como sinônimo de fragilidade. Essa infância tão como é conhecida, é uma
invenção da modernidade, concebida através de uma evolução cultural e histórica2.
No Brasil Colônia, segundo Faleiros (1995) os modelos de assistências a
essas crianças eram ditadas pela Corte, ou seja, eram os mesmos adotados em
Portugal e em toda a Europa. Discorrendo sobre tal assistência, a autora ressalta o
papel da Irmandade de Nossa Senhora, conhecida popularmente como Santa Casa
2
AEIES, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro, Zahar, 1981.
7
da Misericórdia, que, “embora de caráter leigo e gozando de autonomia [...],
mantinha estreitas relações com a realeza e a hierarquia da Igreja Católica, relações
estas de privilégios, mas muitas vezes conflitivas”3.
O número de crianças abandonadas nas portas das casas, de igrejas, nas
ruas e até nos monturos de lixo, em meados do século XVII, era assustador. E em
virtude do agravamento da situação das crianças abandonadas, órfãs e enjeitadas,
também chamadas de “expostas”, decorrente dos constantes atritos entre governo
real, foi criado a Roda dos Expostos. Segundo Faleiros:
[...] a Roda se constituía em todo um sistema legal e assistência dos
expostos até sua maioridade. Em realidade, Roda era dispositivo cilíndrico
no qual eram enjeitadas as crianças e que rodava do exterior para o interior
4
da casa de recolhimento .
Rizzini (1995) enfatiza que as preocupações em relação à população infantil e
juvenil até o advento da Independência do Brasil limitavam-se à prática do
recolhimento nas Casas dos Expostos. A questão penal referente aos menores de
idade não tinha maior expressão. “Apesar da menor idade constituir um atenuante a
pena desde as origens do direito romano, crianças e jovens eram severamente
punidos antes de 1830, sem a maior discriminação em relação aos delinquentes
adultos”5.
A separação do mundo adulto e infantil e a noção de infância relacionam-se
com o processo iluminista e a ideia de escolarização, pois se defendeu, ao longo da
história moderna, que as crianças fossem retiradas das ruas e inseridas nas escolas,
para que pudessem se ‘civilizar’, aprendendo a ler e desenvolvendo sua
racionalidade. A necessidade de instrução e preparação criou uma clara divisão
entre crianças e adultos6.
A criança era tratada como objeto de propriedade dos pais, sem qualquer
proteção do Estado contra abusos e maus tratos da própria família. Não havia
nenhum tipo de garantia legal que impedisse comportamentos abusivos dos pais em
relação a seus filhos. Além disso, eram as crianças encaradas e tratadas como
adultos pela sociedade no tocante as relações de trabalho. No sistema de produção
industrial do século XIX era a criança tratada como mais uma mão de obra
disponível a ser utilizada nas fábricas, sujeitas às extensas e rigorosas jornadas de
trabalho7.
Compreendia o menor privado de condições essenciais à sua subsistência,
saúde e instrumentos obrigatórios, em razão da falta, ação ou omissão dos pais ou
responsáveis; vítimas de maus tratos; os que estavam em perigo moral por se
3
FALEIROS, Eva Silveira. A criança e o adolescente: objetos sem valor no Brasil Colônia e no
Império. In: PILOTTI, Francisco; RIZZINI, Irene. A arte de governar crianças: a história de
políticas sociais, da legislação e da assistência à infância no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto
Interamericano Del Niño/USU/Amais, 1995. p. 221-236.
4
______. A criança e o adolescente: objetos sem valor no Brasil Colônia e no Império. In: PILOTTI,
Francisco; RIZZINI, Irene. A arte de governar crianças: a história de políticas sociais, da
legislação e da assistência à infância no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Interamericano Del
Niño/USU/Amais, 1995. p. 221-236.
5
RIZZINI, Irene. A arte de governar crianças: a história de políticas sociais, da legislação e da
assistência à infância no Brasil, Rio de Janeiro: Instituto Interamericano Del Niño/USU/Amais, 1995.
p. 99-168, p. 104).
6
POSTAMAN, N. O desaparecimento da infância. Rio de Janeiro: Graphia Editorial, 1999. p. 55.
7
ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério Sanches. Estatuto da
Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. P 51.
8
encontrarem em ambiente ou atividade contrárias aos bons costumes; o autor de
infração penal e ainda todos os menores que apresentavam desvio de conduta, em
virtude da grave inadaptação familiar ou comunitária. Aqui se apresentava o campo
de atuação do juiz de menores, restrito ao binômio carência de delinquência. Todas
as demais questões que envolviam a criança e adolescente deveriam ser discutidas
na vara de família e regidas pelo Código Civil8.
Conforme salienta Rossato et al., relativamente à mudança de cuidados da
sociedade com a criança:
Dois fatores foram marcantes para a eclosão de uma preocupação com a
criança, iniciando-se um novo ciclo: a- o descontentamento da classe
operário com as condições de trabalho existentes; b- os horrores da guerra
mundial, como conseqüência nefastas às crianças. Com efeito, apenas no
final do século XIX e inicio do século XX deflagraram-se vários movimentos
sociais em que se pleiteava, principalmente, a redução das horas
trabalhadas e da idade mínima para o trabalho, além das melhorias nas
9
condições de trabalho de um modo geral .
A Declaração de Genebra de 1924 é considerada o primeiro documento de
caráter amplo e genérico com relação à criança. De caráter genérico porque
contempla a proteção da infância em todos os seus aspectos. Posteriormente, a
declaração de direitos da criança em 1959 passa a atender a criança como “sujeito
de direitos”, e não somente objeto de proteção, com as declarações de 1924. Esta
foi influenciada pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, e cria numa
expectativa de fornecer garantias válidas, específicas e aperfeiçoadas a esta
Declaração. Este foi um momento de mudança de paradigmas no que se trata da
proteção da criança. Já a Convenção sobre os direitos da criança de 1989 destacouse como trabalho internacional de proteção de direitos humanos com o mais elevado
número de ratificações, especificando mais medidas de proteção integral das
crianças e adolescentes10.
Corrobora Maciel que:
Apesar dessas medidas para regularizar a situação do menor, na prática se
verificava uma atuação segregatória na qual, normalmente, estes eram
levados para internatos ou, no caso de infratores, institutos de detenção
mantidos pela FEBEM. Inexistia preocupação em manter vínculos
familiares, até porque a família ou falta dela era considerada a causa da
situação irregular. Em resumo, a situação irregular era uma doutrina não
universal, restrita, de forma quase absoluta, a um limitado publico infanto11
juvenil .
Durante quase todo o século XX as leis brasileiras que tratavam de temas
relacionados às crianças e adolescentes estavam ligados à doutrina da situação
irregular, de caráter assistencialista e repressivo, com papel central na figura do juiz
de menores. Com a constituição da República Federativa do Brasil, em 1988,
8
MACIEL, Kátia Regina Ferreira Andrade (Org). Curso de Direito da Criança e do Adolescente:
Aspectos Teóricos e Práticos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. P.13.
9
ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério Sanches. Estatuto da
Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. P 52.
10
______. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2011. P.56-65.
11
MACIEL, Kátia Regina Ferreira Andrade (Org). Curso de Direito da Criança e do Adolescente:
Aspectos Teóricos e Práticos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. P.13.
9
iniciou-se um novo paradigma, uma nova concepção social e jurídica sobre crianças
e adolescentes. Passamos para a era da proteção integral e a consagração do
princípio da prioridade absoluta no que diz respeito a seus direitos fundamentais.
A doutrina de proteção integral encontra-se definida no artigo 227 da
Constituição Federal Brasileira de 1988. Com essa doutrina superou-se o Direito
tradicional, que não percebia a criança como indivíduo, e o direito moderno do
menor incapaz, objeto de manipulação de adultos. Na era pósmoderna as crianças e
os adolescentes são tratados como sujeitos de direitos, em sua integralidade12.
A Constituição Federal Brasileira definiu de maneira clara o mandamento para
orientar a proteção integral da criança e adolescente. Refere o Artigo 227 da
Constituição:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
13
violência, crueldade e opressão .
Dessa maneira, a Constituição de 1988 afastou a doutrina da situação
irregular, até então vigente, assegurou a crianças e adolescentes com absoluta
prioridade, direitos fundamentais, determinando à família, à sociedade e ao Estado o
dever legal e concorrente de assegurá-los. Posteriormente, o Estatuto da Criança e
Adolescente foi promulgado para regulamentar a buscar a efetividade da norma
constitucional.
A prioridade absoluta tem por objetivos realizar a proteção integral,
assegurando a primazia que facilitará a concretização dos direitos fundamentais
enumeradas no artigo 227, caput, da Constituição Federal e renumerados no caput
do Art. C4 do ECA. Levando em conta a condição de pessoal em desenvolvimento,
pois a criança e o adolescente possuem uma fragilidade peculiar da pessoa em
formação.
Sendo assim, os direitos da criança foram garantidos na Carta Constitucional
pelo artigo 227, artigo este baseado nos postulados da Declaração Universal dos
Direitos da Criança, que mais tarde foram ordenados e detalhados pela Lei nº.
8.069/90 ou Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, o qual é um divisor de
águas que se refere aos direitos da criança e adolescente.
O ECA em seus primeiros artigos garantiu prioritariamente a proteção integral
a todas as crianças e os adolescentes – assegurando-lhes seus direitos e
conferindo, para tanto, deveres à família, à comunidade, à sociedade e ao poder
público –, reconhecendo-os por sua condição peculiar de pessoas em
desenvolvimento.
Além de garantia dos direitos da criança e do adolescente o ECA representa o
início de significativa transformação nas políticas públicas, direcionadas aos
adolescentes autores de ato infracional. O Estatuto prevê medidas socioeducativas:
advertência, obrigação de reparo do dano, prestação de serviços à comunidade,
liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade e privação de liberdade.
12
MACIEL, Kátia Regina Ferreira Andrade (Org). Curso de Direito da Criança e do Adolescente:
Aspectos Teóricos e Práticos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. P.11.
13
BRASIL. Constituição (1988). Constituição Federativa do Brasil. Brasília-DF: Senado Federal,.
Artigo 227.
10
Em 2004, criou-se o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo SINASE com o objetivo primordial o desenvolvimento de uma ação socioeducativo
com base nos princípios dos direitos humanos.
2 SISTEMA NACIONAL DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO (SINASE)
O SINASE é fruto da construção coletiva que envolveu diversos atores sociais que
promoveram encontros por todo país para debater o tema.
Em fevereiro 2004 a Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), por
meio da Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e Adolescente
(SPDCA), em conjunto com o Conanda com o apoio do Fundo das Nações
Unidas para a Infância (UNICEF), sistematizaram e organizaram a proposta
14
do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo - SINASE .
A mudança de paradigma e a consolidação do ECA ampliaram o
compromisso e a responsabilidade dos Estados e da Sociedade Civil por soluções
eficientes, eficazes e efetivas para o sistema socioeducativo e asseguram aos
adolescentes que cometeram atos infracionais as oportunidades de desenvolvimento
e uma autêntica experiência de reconstrução de seu projeto de vida. Dessa forma,
esses direitos estabelecidos no SINASE devem repercutir diretamente na
materialização de políticas públicas e sociais que incluam o adolescente em conflito
com a lei.
O SINASE é o conjunto ordenado de princípios, regras e critérios, de caráter
jurídico, político, pedagógico, financeiro e administrativo, que envolve desde o
processo de apuração do ato infracional até a execução da medida socioeducativa.
Deste modo “o SINASE vai além da discussão do tema, ele também destaca a
efetivação de uma política que complemente os direitos humanos, buscando
romper com a problemática atual em oportunidade de mudança15”.
O SINASE regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas
a adolescente que pratique ato infracional. Além de fazer uma análise do contexto
brasileiro dos adolescentes e através de dados estatísticos afere que aqueles que
estão cumprindo medida socioeducativo de internação ou internação provisória são
do sexo masculino, afrodescendente, não frequentavam a escola, vivam em famílias
de baixa renda e eram usuários de drogas.
Cabe registrar que, segundo o Censo Demográfico de 2010 do IBGE, a
população total de adolescentes (12 a 18 anos incompletos) é de pouco mais de 20
milhões, de maneira que apenas 0,09% desse total encontram-se em cumprimento
de medias socioeducativas em meio fechado. Já no que tange proporção e
comparativo por sexo no cenário brasileiro, não houve alteração nos últimos anos no
que se refere à proporcionalidade de adolescentes em cumprimento de MSE
apresentada em 2010, ou seja, 5% de meninas e 95% de meninos16.
De acordo com o Levantamento Nacional 2011 da Secretaria de Direitos
Humanos (SDH) “Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a
Lei” no Brasil houve um aumento de adolescentes em restrição e privação de
14
BRASIL. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Secretaria dos Direitos
Humanas. Brasília: Conanda, 2006, p. 16.
15
_____. Secretaria dos Direitos Humanas. Brasília: Conanda, 2006, p.16.
16
SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS. Atendimento Socioeducativo ao adolescente em conflito
com a Lei- Levantamento Nacional 2011. Brasília, 2012.
11
liberdade em 10,69% (de 17.703 para 19.595), sendo que em internação o aumento
foi de 10,97% (de 12.041 para 13.362); em internação provisória de 9,68% (de 3.934
para 4.315); e em semiliberdade de 11,00% (de 1.728 para 1.918); o que demonstra
uma uniformidade no crescimento entre as MSE de restrição e privação de
liberdade. Tal evolução, no entanto, se distribui de maneira sensivelmente diferente
nas 27 unidades federadas17.
A legislação que institui o SIANSE traz um novo status para as políticas
públicas e impõem desafios de melhoria na gestão do sistema, das unidades e dos
programas, no atendimento socioeducativo realizado, bem como no desempenho
do Sistema de Justiça. Propõe-se inovações que buscam a unificação dos
procedimentos de execução das medidas socioeducativas pelo judiciário, bem
como atribui a esse poder o novo papel de homologar o Plano Individual de
Atendimento (PIA). Inova também nos mecanismos de gestão, ampliando fontes de
financiamento, explicitando competências das esferas de governo e criando um
sistema de avaliação. Por fim, introduz e explicita uma série de direitos dos
adolescentes: atendimento individualizado; atenção integral à saúde; visita íntima;
capacitação para o trabalho, participação da família; dentre outros.
O SINASE especifica que para entidades e/ou programas que executam a
medida socioeducativa de semiliberdade e internação a equipe mínima deve ser
composta por uma equipe técnica multidisciplinar18 e dentre esses profissionais está
o assistente social.
3 SERVIÇO SOCIAL
O Serviço Social, como profissão, é definido por Iamamoto (2006, p. 83-84)
como uma “especialização do trabalho coletivo, dentro da divisão social e técnica do
trabalho, que participe do processo de produção e reprodução das relações sociais”.
Conforme Faleiros (2006, p.72), a intervenção em Serviço Social consiste
articulação combinada de medições de trajetórias 19 e estratégias 20 de ação de
diferentes atores que se entrecruzam numa conjuntura de saberes e poderes,
configurando-se a situação de relação entre profissional e usuários.
Assim o profissional de Serviço Social em suas intervenções trabalha com os
usuários, numa relação de quebra de paradigma, na perspectiva de dar a autonomia
do sujeito. Para isso precisa traçar estratégias de como driblar a burocratização dos
serviços, entre outras como mostra o trecho de Faleiros:
17
SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS. Atendimento Socioeducativo ao adolescente em conflito
com a Lei- Levantamento Nacional 2011. Brasília, 2012.
18
A Equipe técnica multidisciplinar são grupos de agentes de diferentes áreas do conhecimento e
especialidades que se formam levando em consideração, prioritariamente, a reinvenção de suas
interfaces. Devendo promover encontros sistemáticos e se guiar pelo projeto pedagógico do
programa de atendimento socioeducativo;(SINASE, 2006,p. 42).
19
As trajetórias sociais são processos de desestruturação como de estruturação de referencias e
patrimônios, pela articulação ou pela desarticulação de relações sociais num tempo e num espaço
determinado onde se produzem mudanças nas formas de reprodução como de identificação social.
(FALEIROS, 2006, p.75).
20
As estratégias são processos de articulação e mediação de poderes e mudanças de relações de
interesses, referencias e patrimônios (...). As estratégias implicam em projetos individuais e coletivos
que tragam a rearticulação dos patrimônios, referencias e interesses com vistas re-produção e a representação dos sujeitos históricos. (FALEIROS, 2006, p.76).
12
Quando um determinado sujeito procura ou se vê diante do serviço social,
ele esta numa trajetória de fragilização, de perda de patrimônio ou
referências, sem atendimento de suas necessidades básicas, e é por isso
que, em nosso paradigma de correlação de forças, propus o fortalecimento
do domínio do (empowerment) e sua defesa (advocacy) como objetivos
estratégicos da intervenção em serviço social contradição com a
perspectiva de reforço do poder dominante ou de mera reprodução.
Assistente social passa a ser um aliado do cliente/usuário em vez de um
gerenciador de recursos da instituição em função dos critérios, normas, e
21
itinerários por ela estabelecidos .
De acordo com Faleiros (2006, p. 62) o desenvolvimento da autonomia dos
sujeitos parte de processo de negação da subalternidade pela mediação da
afirmação da subjetividade e da construção das decisões sobre sua própria vida.
Em suma a intervenção profissional deve ser pautada nos princípios de seu
Código de Ética, no sentido de contribuir com a quebra de paradigmas, a efetivação
e garantia dos direitos e a construção de um novo modelo de sociedade que não
subalternize as minorias e não seja pautado em valores discriminatório e violador
dos direitos humanos.
A atuação do profissional de Serviço Social é construída a partir dos
processos teórico-metodológicos, ético-políticos e técnico-operacionais apreendidos
no contexto histórico e político da produção e da reprodução na/da relação capitaltrabalho. No momento contemporâneo entre outras habilidade e competências
profissionais do assistente social pode-se destacar as atividades relacionadas à
gestão, elaboração, avaliação e implementação das políticas sociais.
O Serviço Social, a partir de seu arcabouço teórico-metodológico, seus
instrumentais técnico-operativos e seu posicionamento ético-político, tem como
contribuir no âmbito de medidas socioeducativas por meio de reflexões sobre as
questões sociais que envolvem os adolescentes em conflito com a lei, a identificação
das necessidades e demandas, como também dos processos de violação de
direitos.
3.1 SERVIÇO SOCIAL NAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
Para a discussão proposta é necessário contextualizar que o assistente social
que trabalha em um centro socioeducativo faz parte de uma equipe de trabalho
multidisciplinar 22 e desenvolvem ações interdisciplinares junto aos demais
profissionais das áreas de conhecimento da Psicologia, da Terapia Ocupacional, da
Pedagogia, do Direito e da Enfermagem. Dessa maneira:
As diferentes áreas do conhecimento são importantes e complementares no
atendimento integral dos adolescentes. A psicologia, a terapia ocupacional,
o serviço social, a pedagogia, a antropologia, a sociologia, a filosofia e
outras áreas do conhecimento no campo do atendimento das medidas
23
socioeducativas .
21
FALEIROS, Vicente de Paula. Estratégias em Serviço Social. São Paulo: Cortez, 2006, p.78.
Vide Resolução CFESS 557/2009 em seu art. 4° estabelece que “o assistente social ao atuar em
equipes multiprofissionais, deverá garantir a especificidade de sua área de atuação”.
23
BRASIL. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Secretaria dos Direitos
Humanas. Brasília: Conanda, 2006, p. 23.
22
13
De acordo com o SINASE, existe uma composição mínima do quadro de
pessoal em cada modalidade de atendimento socioeducativo. Dessa forma, as
entidades e/ou programas que executam as medidas socioeducativas de
semiliberdade e de internação prevê o assistente social dentre outros profissionais.
No que se trata do acompanhamento técnico o SINASE apresenta:
É imprescindível a composição e um corpo técnico que tenha conhecimento
especifico na área de atuação profissional e, sobretudo, conhecimento
teórico-prático em relação à especificidade do trabalho a ser desenvolvido.
Sendo assim, os programas socioeducaticativos devem contar com a
equipe multiprofissional com o perfil capaz de acolher e acompanhar os
adolescentes e suas famílias em suas demandas bem como atender os
funcionários; com habilidades de acessar a rede de atendimento publico e
comunitário para atender casos de violação, promoção e garantia de
2425
direitos .
O espaço de atuação do assistente social junto aos adolescentes em
cumprimento de medidas socioeducativas tem algumas atribuições específicas no
seu cotidiano profissional e algumas competências em conjunto com as demais
áreas (ou técnicos), como por exemplo, na elaboração de relatórios, planilhas de
atividades, participação em reuniões de equipe, de estudo de caso e em atividades
promovidas pela unidade26.
O atendimento realizado ao adolescente e ao grupo familiar feito pelo
profissional de Serviço Social é um atendimento social, que tem como foco principal
os fatores referentes à prática infracional que envolvem trajetória sócio-histórica da
família e do adolescente, análise das demandas apresentadas por eles, leitura
dessas demandas e identificação de outras que, até mesmo a família e o
adolescente não tenham percebido. É de posse destas informações que o assistente
social elabora a sua estratégia de intervenção profissional. Ressalta-se que a
intervenção profissional é pautada para a efetivação continuada dos direitos sociais
e no que tange a especificidade das medidas socioeducativas que visa também
contribuir para o processo de responsabilização do adolescente27.
Os princípios fundamentais do Código de Ética Profissional do Serviço Social
pressupõem a defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e
autoritarismo, mesmo que o adolescente esteja privado de liberdade é preciso
garantir que essa privação de liberdade não seja também privação dos direitos
inalienáveis28.
O atendimento feito pelo assistente social inicia-se desde a admissão do
adolescente na unidade socioeducativo. Nesse momento acontece o acolhimento,
no qual o profissional busca identificar os principais elementos da história de vida,
para a construção do caso do adolescente. A partir de então o atendimento social
deve procurar conduzir o adolescente e a família, por meio de intervenções,
25
BRASIL. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Secretaria dos Direitos
Humanas. Brasília: Conanda, 2006, p.23.
26
ARRUDA, Daniel Péricles; Pinto, Patrícia da Silva. O trabalho do assistente social na medida
socioeducativa de internação: práticas e desafios.III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociai,
2013. CRESS 6 Região.
27
ARRUDA, Daniel Péricles; Pinto, Patrícia da Silva. O trabalho do assistente social na medida
socioeducativa de internação: práticas e desafios.III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais,
2013. CRESS 6 Região.
28
FREITAS, Tais Pereira de. Serviço Social e medidas socioeducativas: o trabalho na perspectiva da
garantia de direitos. Serviço Social e Sociedade. n. 105, São Paulo, 2011.
14
estratégias e reflexões, à construção da responsabilização frente às demandas
postas e construídas a partir de cada caso29.
Como instrumental para o atendimento é utilizado o Plano Individual de
Atendimento (PIA) para acompanhamento, conquista de metas e compromisso dos
adolescentes e suas famílias durante o cumprimento da medida socioeducativa. A
elaboração do PIA se da a partir do acolhimento do adolescente, por meio de
intervenções técnicas nas áreas: jurídica, saúde, psicológica, social e pedagógica.
Nos termos da lei de execução do Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo, Lei Federal nº. 12.594/2012 determinada no Art. 52 - “o PIA deverá
contemplar a participação dos pais ou responsáveis, os quais têm o direito de
contribuir com o processo ressocializador do adolescente, sendo esses passíveis de
responsabilização administrativa, nos termos do Art. 249 da Lei nº. 8.069, de 13 de
julho de 1990 (ECA), civil e criminal” e no Art. 53 “o PIA será elaborado sob a
responsabilidade da equipe técnica do respectivo programa de atendimento, com a
participação efetiva do adolescente e de sua família, representada por seus pais ou
responsável”.
Ademais, durante o cumprimento da medida socioeducativa são realizadas
visitas domiciliares pelo assistente social, sempre que possíveis pelo psicólogo que
acompanha o adolescente, ou outro membro da equipe técnica.
4 METODOLOGIA
A metodologia utilizada para realização deste artigo foi a pesquisa
exploratória, de natureza qualitativa, por meio de análise bibliográfica.
Para Silva (2005),
Pesquisa Qualitativa: considera que há uma relação dinâmica entre o
mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo
objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzido em
números. A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são
básicas no processo de pesquisa qualitativa. Não requer o uso de métodos
e técnicas estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta para coleta de
dados e o pesquisador é o instrumento-chave. É descritiva. Os
pesquisadores tendem a analisar seus dados indutivamente. O processo e
30
seu significado são os focos principais de abordagem .
A pesquisa é do tipo exploratório, pois será desenvolvida no sentido de
proporcionar uma visão geral acerca de determinado tema. De acordo com Andrade
(2002) a pesquisa exploratória tem como finalidade: proporcionar maiores
informações sobre o assunto que vai investigar, facilitar a delimitação do tema de
pesquisa, orientar a fixação dos objetivos e a formulação das hipóteses, ou descobrir
um novo tipo de enfoque sobre o assunto.
Nesse sentido, foi realizada a análise bibliográfica dos textos publicados na
Revista Serviço Social e Sociedade que terá o objetivo de melhor compreender o
assunto em tela e estruturar o estudo de forma argumentativa. Para Oliveira (2007) a
pesquisa bibliográfica é uma modalidade de estudo e análise de documentos de
29
ARRUDA, Daniel Péricles; Pinto, Patrícia da Silva. O trabalho do assistente social na medida
socioeducativa de internação: práticas e desafios. III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais,
2013. CRESS 6ª Região.
30
SILVA, Edna Lúcia da. Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. Edna. Lúcia da Silva,
Estera Muszkat Menezes. – 4. ed. Rev. atual. – Florianópolis: UFSC, 2005. p. 20.
15
domínio científico tais como livros, periódicos, enciclopédias, ensaios críticos,
dicionários e artigos científicos. Como característica pontua que é um tipo de “estudo
direto em fontes científicas, sem precisar recorrer diretamente aos fatos/fenômenos
da realidade empírica” 31 . Argumenta-se que a principal finalidade da pesquisa
bibliográfica é proporcionar aos pesquisadores o contato direto com obras, artigos
ou documentos que tratem do tema em estudo.
Os artigos científicos pesquisados para esse trabalho foram publicados entre
2010 e 2013. Nesse período a Revista Serviço Social e Sociedade publicaram14
edições, e dentre estas somente três artigos discorria sobre a atuação do assistente
social e as medidas socioeducativas.
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os três artigos utilizados na referida pesquisa foram escritos pelos seguintes
autores FREITAS (2011), MENICUCCI e CARNEIRO (2011), SARTÓRIO e ROSA
(2010). Para melhor compreensão da análise de dados observou-se nos artigos as
dimensões da questão social e a atuação do Serviço Social no contexto das
medidas socioeducativas.
Artigo 01: Novos paradigmas e velhos discursos; analisando processos de
adolescentes em conflito com a lei. SARTÓRIO e ROSA (2010).
O primeiro artigo faz uma análise do discurso dos operadores jurídico-sociais
em processos judiciais da Vara da Infância e Juventude em relação aos direitos da
criança e adolescente, a questão social e a análise do discurso.
De acordo com a autora o sistema penal traz características altamente
estigmatizado e criminalizador da pobreza, de forma que as condições sociais,
econômicas e culturais repercutem nas decisões e encaminhamentos dos
processos. Sendo que, no sistema socioeducativo encontram-se os adolescentes
em situação de maior vulnerabilidade. O que comprova a associação entre a
pobreza e a criminalidade, que leva a inferir que há brechas para se avaliar a forte
influência da judicialização da questão social, no contexto dos adolescentes em
conflito com a lei, tendo em vista que a questão social configura-se como pano de
fundo para a emergência da questão jurídica.
Como resultado da pesquisa a autora aponta que foi possível observar em
alguns processos judiciais a forma taxativa como o Ministério Público e a polícia
tratam os adolescentes como portadores de uma “personalidade infratora” ou como
sendo a ação destes caracterizada desvio de conduta.
A fase do processo judicial de execução da medida socioeducativa é o
momento em que efetivamente se deveria realizar o caráter socioeducativo da
execução da lei. Porém, o que a autora constatou nessa fase foi a não realização do
processo socioeducativo, dada a falta de sistematização no atendimento, a falta de
atenção as necessidades sociais dos adolescentes e das famílias e a consequente
ausência de inserção dos adolescentes em programas de inclusão social, implicando
assim a forte presença do caráter sancionatório e punitiva
Os processos judiciais foram finalizados sem que os adolescentes fossem
ouvidos, demonstrando que o processo era mais importante que os adolescentes.
Deste modo, os adolescentes que são sujeitos de direito e protagonistas juvenis,
31
OLIVEIRA, M. M. Como fazer pesquisa qualitativa. Petrópolis, Vozes, 2007.
.
16
conforme as legislações, sequer aparecem no processo socioeducativo e,
permanecendo o adolescente como objeto de intervenção jurídico-social.
A autora conclui que a questão jurídica prevaleceu nos discursos dos
operadores jurídico-sociais e as expressões da questão social acabaram sendo
abafadas. O discurso da legalidade, da burocracia institucional, da tramitação e dos
prazos se sobrepôs ao que estava tão evidente: a ausência do Estado na
consolidação dos direitos, deixando claro o papel do sistema de justiça que acaba
atuando na culpabilização do indivíduo, e na articulação da questão do direito ao
papel das políticas públicas.
Ainda neste artigo as autoras não deram ênfase na atuação do assistente
social, abrangendo a sua análise na atuação dos operadores jurídicos como o juiz e
promotor. Apontaram o que no Setor de Serviço Social do Juizado do programa de
Liberdade Assistida Comunitária – LAC realizou-se mediações de conflito entre
adolescentes e genitores, bem como acionou alguns recursos sociais da rede de
proteção social à criança e ao adolescente. Desta forma, a análise da atuação é
meramente exemplificativa sem aprofundamento sobre o Serviço Social.
Artigo 02: Entre monstros e vítimas: a coerção e a socialização no Sistema
Socioeducativo de Minas Gerais. (MENICUCCI e CARNEIRO, 2011).
Este artigo analisou as formas de implementação do ECA e do SINASE em
dois centros socioeducativos de Minas Gerais, para conhecer como eles lidam com
a presença de duas lógicas coexistentes na política: a coerção e a socialização.
De acordo com as autoras o atendimento ao adolescente em privação de
liberdade experimenta a ambiguidade e a tensão decorrente de um modelo que
combina as duas situações. De um lado, o atendimento em unidades de internação
tem que lidar com o problema da coerção e manutenção da ordem, que aponta para
uma intervenção com maior programabilidade e interação pouco intensa com o
usuário, procurando garantir rotinas, uniformidade e disciplina. De outro lado,
principalmente a partir do ECA, colocam-se os objetivos e estratégias de
socialização e reconstrução de valores, atitudes e identidade.
Outro aspecto capaz de influenciar a política de atendimento ao adolescente
em privação de liberdade é o perfil dos beneficiários. Este ponto é relevante em dois
sentidos. O primeiro está ligado ao fato de que essa política objetiva ressocializar os
adolescentes, o que obviamente não poderá ser feito se o próprio adolescente,
enquanto sujeito de direitos, não estiver envolvido com a construção de um novo
projeto de vida. O outro sentido refere-se às possibilidades de reinserção social que
cada menino - dependendo de sua procedência, inserção no crime, idade,
escolaridade e família - poderá obter com a medida socioeducativa.
Para Menicucci (2011) não há um entendimento uniforme sobre o ECA e o
SINASE e nem mesmo um compartilhamento de seus princípios entre as equipes, o
que traz consequências para a implementação da política
As autoras apontam que a equipe técnica, de um modo geral, está inserida
das unidades socioeducativas pesquisadas:
Uma dinâmica institucional que garanta a horizontalidade na socialização
das informações e dos saberes em uma equipe multiprofissional faz parte
dos parâmetros norteadores do atendimento socioeducativo do Sinase, o
que demonstra que, ainda que esse aspecto não seja percebido por todos
17
os implementadores, ele é parte da política e deve ser trabalhado a partir da
32
equipe de profissionais de cada unidade .
A conclusão que elas chegam é que há possibilidade de se articular saberes
para operacionalizar a complementaridade entre as duas lógicas, representando um
grande salto na qualidade do atendimento ao adolescente em conflito com a lei em
privação de liberdade. Podendo assim, contribuir para que estratégias e práticas
profissionais sejam estabelecidas, levando em consideração a dualidade intrínseca à
política. Assim, práticas pedagógicas devem ser pensadas no sentido de impor
limites à atuação dos adolescentes e sem perder de vista que há um conflito com a
lei. Da mesma forma, as práticas punitivas são necessárias, porém devem ser
pensadas a partir da possibilidade de aprendizado e não apenas como algo ligado a
exame e ao sofrimento.
O importante não é a eliminação de uma das lógicas em detrimento da outra,
mas sim, a construção de um modelo capaz de articulá-las para que o atendimento
ao adolescente seja de fato coerente com seus direitos e possa oferecer chances
reais de, a partir de sua responsabilização pelo ato infracional, reinseri-lo na
sociedade com outro projeto de vida.
Deste modo, o artigo se atenta em estudar as formas de organização, a
estrutura, o perfil dos adolescentes das unidades de internação e a dualidade entre
as lógicas de coerção e da socialização, porém deixa a desejar por não tratar das
atribuições dos assistentes sociais desenvolvidas no centro socioeducativos
pesquisados.
Artigo 03: Serviço Social e medidas socioeducativas: o trabalho na perspectiva
da garantia de direitos. (FREITAS, 2011).
O terceiro artigo apresentou informações que possibilitam a reflexão a
cercado trabalho do assistente social na medida socioeducativa de internação, a
partir da análise das legislações.
A autora destaca o reconhecimento da liberdade como valor ético central,
também princípio fundamental do Código de Ética profissional do assistente social,
que deve estar na base do atendimento ao adolescente, entendendo que, a
aplicação da medida de internação está relacionada principalmente à privação da
liberdade de ir e vir e jamais privar o adolescente do direito de escolha, de
comunicação, entre outros. Sendo possível ao profissional de Serviço Social
desenvolver um trabalho pautado no entendimento de que o adolescente e sua
família são sujeitos de direitos. O trabalho profissional pode e deve ser
socioeducativo desde esse momento da entrada do adolescente na instituição.
De acordo com Freitas (2011) o Serviço Social encontra-se inserido nas
unidades de internação da Fundação Casa, e é denominação para a função do
assistente social na Fundação como analista técnico/assistente social, sendo parte
da equipe técnica de cada unidade composta por assistentes sociais e psicólogos. O
profissional de Serviço Social nas unidades de internação precisa comprometer-se
com a efetividade do atendimento realmente socioeducativo, situando seu trabalho
na perspectiva da garantia de direitos. Assim, o assistente social acompanhará o
32
MENICUCCI, Clarissa Gonçalves; LADEIRA Carla Bronzo. Entre monstros e vítimas: a coerção e a
socialização no Sistema Socioeducativo de Minas Gerais. Serviço Social e Sociedade: n.107. São
Paulo, 2011, p. 8.
18
adolescente durante toda a medida de internação, na perspectiva do atendimento
integral.
Para a autora o trabalho do assistente social deve ser orientado pelo
atendimento integral e, portanto, esse profissional pode e deve verificar se o
adolescente está recebendo esse atendimento. Buscar assegurar que o adolescente
receba alimentação, atendimento médico, odontológico, oportunidades de
profissionalização, além de verificar, registrar e notificar aos seus superiores
quaisquer violações aos direitos dos adolescentes, tanto por servidores da
instituição quanto por outros adolescentes. O profissional poderá acompanhar as
atividades elaboradas pelo setor pedagógico; as saídas dos adolescentes da
unidade para a realização de atividades externas (campeonatos esportivos, eventos
culturais), além de sempre buscar orientá-los e informá-los acerca de sua situação
processual, bem como seus direitos no que diz respeito à execução da medida
socioeducativa.
A autora conclui que a práxis do Serviço Social está orientada para a
possibilidade de ressocialização, reinserção social saudável, não compreendida
apenas na dimensão produtivo-consumidora, mas como emancipatória, na medida
em que o indivíduo tem condições de tornar-se sujeito da própria história. Para que
isso aconteça os profissionais inseridos nesses espaços de privação de liberdade
tem a missão, a partir do cotidiano, desenvolver práticas que possibilitam o resgate
dessa condição peculiar de humanidade.
A partir das perspectivas alegadas pela autora, pode-se acrescentar na
discussão sobre o trabalho do assistente social a necessidade desse profissional ser
um estudioso social, ou seja, é de suma importância a continuidade dos estudos em
estabelecimentos acadêmicos, mas, aqui, damos ênfase à prática sistematizada dos
estudos da vida social no decorrer de toda sua prática profissional. O que implica na
necessidade de que o assistente social seja leitor dos conhecimentos que emergem
das múltiplas expressões da vida cotidiana. É importante ressaltar que o estudo não
garante a efetivação de uma prática qualificada, mas, possibilita o domínio e o
embasamento do (da) profissional para lidar com a realidade, e também, para
construir estratégias que possibilitem a instrumentalidade de suas ações33.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A principal defesa do projeto profissional do Serviço Social é pela liberdade e
autonomia dos usuários, e a concretização destes valores é pela modificação dos
paradigmas de mercantilização dos direitos. Assim a importância do Serviço Social
nas medidas socioeducativas aplicadas à adolescentes é pela garantia dos direitos
sociais, composto por variáveis como a garantia intransigente dos direitos humanos
através da construção de sujeitos protagonistas de sua história.
Uma das funções do Serviço Social é utilizar as intervenções profissionais e
pesquisas acadêmicas a fim de articular ações que universalizem e tornem mais
qualificados os processos de trabalho. É a construção de políticas públicas sociais
que visam à gradativa ampliação dos direitos para, consequentemente,
transformarem bases societárias As pesquisas e materiais sobre a temática estão
aumentando a cada ano, por isso a necessidade da formação continuada para
33
GUERRA, Yolanda. A instrumentalidade no trabalho do assistente social. 2000.
19
pensar estratégias viáveis e pertinentes às demandas colocadas no cotidiano dos
profissionais de Serviço Social.
A partir da análise feita pelos dados coletados observou-se que os artigos não
identificam as estratégias que são adotadas na atuação nem levantaram as
dificuldades enfrentadas pelos assistentes sociais, em relação à garantia da
proteção integral dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, visto
que a uma escassez de material produzido.
Analisando os três artigos foi possível perceber que apenas uma autora
aprofunda na discussão da prática profissional. Esse fato gera preocupação, pois
percebe-se que há pouca pesquisa sobre a atuação do assistente social nas
medidas socioeducativas, o que é uma triste realidade, pois como foi dito
anteriormente no levantamento nacional de 2011 da Secretaria de direitos humanos
(SDH), houve aumento de 10,69% de 2010 para 2011 de adolescentes em restrição
e privação de liberdade no Brasil. Esse é um sinal de alerta que merece uma
discussão aprofundada que deve levar em conta os diferentes contextos e um
esforço de entendimento das razões desta manifestação.
Foi observado durante o processo de análise crítica que há uma escassez de
artigos científicos sobre o assunto e os dados SDH que demonstram o aumento de
adolescentes em restrição e privação de liberdade foram os pontos que mais me
chamaram a atenção durante o processo de produção do artigo, mesmo porque, foi
frustrante realizar uma pesquisa sobre determinado assunto e não encontrar
material que abordem de maneira profunda o tema.
Dessa maneira os assistentes sociais têm a importante tarefa de produzirem
pesquisas sobre o tema e sistematizarem sua prática profissional dentro das
unidades socioeducativas, com o propósito de criarem estratégias que garantam os
direitos de adolescentes em conflito com a lei e que consiga mudar a realidade
vivenciada no Brasil, com relação ao aumento do número de adolescente cumprindo
medida socioeducativa de internação.
THE SOCIAL SERVICE AND THE ADOLESCENTS IN CONFLICT WITH
THE LAW: A CONTRIBUTION TO THE DEBATE.
Abstract:
This study aims to contribute to the systematization of the debate about the work of
the professional Social worker with adolescents in fulfillment of socio-educational
measure, from the articles published in the magazine "service and society during the
period from 2010 to 2013. This is a qualitative and exploratory research which will be
accomplished through bibliographic analysis. The discussion featured talks by the
theoretical-methodological
field,
ethical-political
and
technical-operational
professional action with views to the multiple challenges related to the guarantee of
rights and the execution of duties of their teenagers. At the same time social issues
involving adolescents in conflict with the law, instigate the debate on legislation and
the importance of Social worker working in the institutions of socio-educational
measures. It is intended, therefore, through this research highlight the strategies
adopted in the performance of these professionals in relation to the guarantee of full
protection of teenagers in fulfillment of socio-educational measure and raise the
difficulties faced by them. Thus, this reveals the possibilities of Social service front of
adolescents in conflict with the law. The results obtained show that there is a lack of
bibliographical production on the question of professional performance of Social
20
Services regarding socio-educational measures, being this one of the challenges to
the role of the social worker.
Keywords: Social Service. Professional work. Teenagers. Socio-educational
measure.
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Edna. Lúcia da Silva, Estera Muszkat Menezes. – 4. ed. rev. atual. – Florianópolis:
UFSC, 2005. 138p.
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Nayara Zacarias Gonçalves - Universidade Católica de Brasília