Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul
UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná
Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751
CYBERPRAGMATICS: A PRAGMÁTICA NA COMUNICACAÇÃO VIRTUAL
Aline Vieira VARGAS 1
RESUMO: Com este trabalho pretendemos examinar de que maneira podemos aplicar
conceitos da pragmática, mais especificamente da Teoria da Relevância de Sperber&Wilson
(1986, 1995), na análise da comunicação virtual. Nos últimos anos, diversos programas que
possibilitam novas formas de comunicação surgiram na internet (como o Facebook, o Twitter
e o Messenger) e com eles novas formas de se comunicar. Nossas vidas sociais hoje se
dividem em diálogos reais e virtuais. Assim, essa nova forma de comunicação deve ser
estudada. Com esse objetivo, Francisco Yus (2001, 2011) cunha o termo "Cyberpragmatics"
e com ele propõe uma nova área de estudo dentro da pragmática: o estudo da comunicação
virtual. Para tanto, parte da Teoria da Relevância, acreditando que ela ofereça meios para
uma descrição adequada destas comunicações tão peculiares. No nosso trabalho
analisaremos esta proposta e procuraremos discutir se a Teoria da Relevância se mostra
adequada para entender este novo tipo de comunicação.
PALAVRAS-CHAVE: Teoria da Relevância; Cyberpragmatics; Comunicação Virtual.
RIASSUNTO: Questo lavoro ha lo scopo di esaminare in che modo si potrebbero applicare
concetti di pragmatica, soprattutto quelli della Teoria della Pertinenza di Sperber&Wilson
(1986, 1995), all’analisi della comunicazione virtuale. Negli ultimi anni, diversi programmi
che hanno favorito nuove forme di comunicazione sono apparsi in internet (Facebook,
Twitter, Messenger, per farne alcuni esempi) e con essi nuove forme per comunicare. Ormai
la nostra vita sociale si divide tra dialoghi reali e virtuali. Perciò, questo nuovo modo di
comunicare ha bisogno di essere studiato. Avendo in mente questo obiettivo, Francisco Yus
(2001a, 2011) conia il termine “Cyberpragmatics" e ci propone una nuova area di studio
dentro quella più grande della pragmatica: lo studio della comunicazione virtuale. L’autore,
come riferito sopra, parte dalla Teoria della Pertinenza, perché crede che essa possa fornire
gli strumenti per una descrizione adeguata di questo tipo di comunicazione così particolare.
In questo lavoro viene quindi analizzata questa proposta, valutando se la Teoria della
Pertinenza possa o meno aiutarci a capire questo fenomeno.
PALAVRAS-CHAVE: Teoria della Pertinenza; Ciberpragmatica; Comunicazione Virtuale.
1 Introdução
A habilidade humana de se comunicar está certamente entre as propriedades mais
importantes que permitiram a nossa evolução e que nos distinguem dos outros animais.
Comunicar-se é parte do que nos torna humanos e do que nos torna nós mesmos, permitindo
uma constante (re)construção da nossa identidade a partir das relações que estabelecemos com
as outras pessoas. No entanto, embora possamos supor que os mecanismos inferenciais
utilizados na comunicação tenham se mantido praticamente os mesmos ao longo do tempo,
contamos hoje com muito mais meios de comunicação do que contávamos no passado. A cada
nova invenção as distâncias foram ficando menores, permitindo a comunicação entre pessoas
1
Mestranda em Linguística,
[email protected]
Pontifícia
Universidade
1
Católica
do
Rio
Grande
do
Sul,
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que fisicamente se encontravam em lugares distantes. Se no início havia somente a
possibilidade de obtermos informações em conversas face a face, hoje dispomos dos mais
diversos meios para isso (mídia impressa, rádio, televisão, telefone, etc).
A invenção da internet foi revolucionária por ter possibilitado interações entre pessoas
fisicamente distantes em tempo real. Excetuando-se o telefone, todas as outras formas de
comunicação existentes antes da internet eram unidirecionais, com um
apresentador/locutor/escritor comunicando para um público vasto e essencialmente
desconhecido, para os quais aquela informação poderia ser relevante. Hoje, os jornais online
têm espaço para comentários e discussões, possibilitando o diálogo entre os jornalistas e seus
leitores. A internet, portanto, possibilita interações não só em programas como Messenger,
chats ou redes sociais, mas também em blogs, jornais e webpages. Como aponta Yus (2011),
o leitor não é mais uma entidade passiva.
No entanto, conforme Crystal (2011), a interação entre os interlocutores na internet é
diferente daquela que acontece na conversa tradicional em muitos aspectos. A linguagem
escrita não se comporta da mesma maneira em páginas tradicionais e em páginas da internet,
por exemplo. Por isso, Crystal (2001), assim como Yus (2001), propôs uma nova área de
estudos, a Linguística na Internet (Internet Linguistics, em inglês). No entanto, embora as
duas áreas possam ser complementares, a proposta de Crystal é mais ampla e se refere à
linguística como um todo.
A ciberpragmática, que se ancora na Teoria da Relevância (SPERBER & WILSON
1986, 1995), postula que a comunicação virtual e a comunicação real partilham os mesmos
princípios comunicativos. Segundo Yus (2011), a comunicação é basicamente uma tentativa
de tornar certas informações mutuamente manifestas para os dois interlocutores. Este
princípio se aplicaria a qualquer tipo de comunicação, incluindo aquela que ocorre através da
internet. No entanto, há diferenças importantes a serem consideradas. Conforme Yus (2011),
o maior interesse da Ciberpragmática é analisar como a informação é produzida e interpretada
na internet, investigando como os usuários acessam a informação contextual para que sejam
capazes de preencher as lacunas entre o que os usuários digitam e o que eles realmente
pretendem comunicar (as explicaturas e as implicaturas nos termos da Teoria da Relevância).
Além disso, o autor também investiga de que modo o tipo de programa ou site utilizado na
internet – ou até mesmo a internet em si -, pode afetar a relevância do seu conteúdo, exigindo
maior ou menor esforço por parte do usuário.
Os termos “comunicação real” e “comunicação virtual” serão utilizados neste trabalho
por comodidade. No entanto, concordamos com Yus (2011) quando afirma que a diferença
entre estas duas formas de interação tem se tornado cada vez mais tênue. Há vários motivos
para isso. O primeiro deles é que hoje existe a possibilidade de estarmos o tempo todo
conectados, o que ficou cada vez mais forte com a invenção dos smartphones e da tecnologia
3G (mas também com o grande aumento de locais que disponibilizam Wi-Fi gratuito). As
Redes Sociais também contribuíram muito, possibilitando interações entre amigos, ou grupo
de amigos, mesmo à distância. Diferentemente de outros programas, como Messenger ou sites
de chat, nas Redes Sociais cada um tem o seu perfil, e pode se comunicar publicamente com
outros usuários. A interface destes sites permite muito mais interação, assemelhando-se mais
às nossas interações em grupos. Diálogos que começam no bar da faculdade podem vir a
terminar no Facebook (o site mais conhecido do gênero), por exemplo. Desta forma,
comunicação real e virtual acabam se tornando um contínuo. Além disso, com as novas
tecnologias como Webcam e chamadas de voz, a sensação de proximidade física se torna cada
vez maior. Portanto, embora ainda existam muitas diferenças, casa vez mais o “virtual” e o
“real” se confundem em uma coisa só.
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2 Teoria da Relevância
A Ciberpragmática, como vimos, é uma proposta de análise da comunicação e
interação na internet através da Teoria da Relevância. Por esta razão, nos próximos parágrafos
retomamos alguns preceitos desta teoria, principalmente aqueles relevantes para a abordagem
em questão.
A Teoria da Relevância é um modelo inferencial que se opõe à visão tradicional da
comunicação como um simples processo de codificação e decodificação. Para Sperber &
Wilson, além da simples decodificação, comunicar envolve intencionalidade, e é importante
identificar a intenção do falante para que um enunciado possa ser interpretado corretamente.
Segundo estes autores, há dois tipos de intenções em jogo no processo comunicativo: a
intenção informativa e a intenção comunicativa. A primeira diz respeito à intenção do
interlocutor em informar algo, e a segunda informa o interlocutor sobre esta intenção de
informar. Desta forma, a intenção de informar algo não é somente manifesta, mas
mutualmente manifesta para ambos os interlocutores, caracterizando o estímulo ostensivo.
Como consequência, as únicas interações que interessam para o estudo da pragmática são
aquelas que atendem a esses dois princípios, excluindo qualquer tipo de interação em que não
haja a intenção de comunicar.
O grau de relevância de um estímulo é variável e dependente do contexto. Estímulos
ostensivos, porém, carregam consigo uma presunção ou expectativa de relevância (a que os
autores chamam de princípio comunicativo de relevância). O princípio cognitivo de
relevância, por sua vez, estabelece que a cognição humana é dirigida para a maximização da
relevância. Um input relevante é aquele que produz um efeito cognitivo positivo, modificando
ou aperfeiçoando a representação do mundo de um indivíduo. Quanto maior o efeito, maior a
relevância. Por outro lado, quanto maior for o esforço de processamento, menor será a
relevância. A caracterização da relevância, portanto, dá-se em termos de efeito cognitivo e
esforço de processamento, buscando sempre o maior efeito pelo menor esforço. Sperber &
Wilson afirmam que é esta tendência universal para maximizar a relevância que nos permite
predizer e manipular estados mentais dos outros, produzindo, por exemplo, um estímulo que
provavelmente atraia a atenção do interlocutor. Além disso, é de interesse do comunicador ser
compreendido, por isso tende a produzir o estímulo ostensivo mais simples possível (de
acordo com as suas capacidades e preferências) e fornece evidências para os efeitos
cognitivos que busca alcançar.
O processo de compreensão, segundo a Teoria da Relevância, envolve subtarefas (que
não acontecem necessariamente uma após a outra, mas podem ocorrer concomitantemente): a
decodificação da forma lógica, a construção do conteúdo explícito através de inferências
(explicatura), a seleção do contexto, e a derivação de um conjunto de conclusões implicadas
(implicaturas).
O contexto, neste quadro teórico, é definido como um conjunto de suposições que um
indivíduo possui sobre o mundo e que é utilizado na interpretação dos estímulos. Este
contexto não é dado, mas selecionado de modo a maximizar a relevância da suposição a ser
interpretada. Desta forma, a Teoria da Relevância se opõe a teorias que veem o contexto como
predeterminado. O contexto pode ser formado pelos enunciados anteriores (armazenados na
memória de curto prazo), pelo contexto físico, pelo conhecimento enciclopédico, etc. O
objetivo de alcançar a máxima relevância é que irá, como vimos, determinar a escolha de um
determinado contexto, já que este pode aumentar ou diminuir a relevância de uma proposição.
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3 Ciberpragmática
A ciberpragmática procura entender como as informações são produzidas e
interpretadas na internet. Também está interessada em analisar como os usuários acessam a
informação contextual – frequentemente limitada se comparada a outras situações como a
comunicação face a face – para preencherem as lacunas entre o que os outros usuários
escrevem e o que eles querem comunicar. A acessibilidade do contexto, como se poderia
esperar, tem consequências pragmáticas que diferenciam as formas de comunicação na
internet e determinam a qualidade da informação comunicada, além da sua relevância. Desta
forma, pode-se falar em uma escala de contextualização (YUS, 2011) que vai desde os meios
saturados de contexto (como chamadas com vídeo) até aqueles em que há menos pistas
(“chats” tradicionais). Segundo Yus, esta falta de informação vocal e visual pode gerar um
número maior de lacunas a serem preenchidas inferencialmente. Assim, além da identificação
das intenções comunicativas do emissor, em algumas situações é necessário incluir mais uma
etapa, qual seja, a identificação do que o emissor poderia ter dito em uma interação face a face
mas que não pode dizer por limitações do meio utilizado.
Na base da ciberpragmática está a hipótese de que, assim como na comunicação face a
face, interlocutores têm intenções comunicativas e constroem seus enunciados esperando que
estes sejam relevantes para outros usuários e que sejam interpretados corretamente. Para que
isto aconteça, os interlocutores devem acessar informação contextual, e então preencher as
lacunas do enunciado. As estratégias inferenciais utilizadas para preencher estas lacunas
também são as mesmas utilizadas no dia a dia, já que a tendência à maximização da
relevância é biologicamente determinada.
Para Yus, há uma ligação muito próxima entre a estimativa de relevância e o uso das
tecnologias e das interfaces na comunicação via internet. Usuários experientes, por
conseguirem fazer melhor uso da tecnologia à sua disposição, têm o seu esforço mental
diminuído. Usuários inexperientes, por exemplo, tendem a escrever muito ao utilizarem chats,
enquanto usuários experientes deixam implícito o conteúdo que acreditam poder ser
recuperado pelos outros usuários. Para compensar a falta de contextualização típica
comunicação face a face, além disso, muitos usuários fazem uso de uma linguagem escrita
com traços típicos da linguagem oral. Também é muito comum o uso de “emoticons”,
desenhos que expressam alguns sentimentos como irritação, tédio, alegria, etc. Embora estes
recursos sejam limitados, em certa medida ajudam os usuários a identificar as intenções por
trás dos enunciados, facilitando o processo inferencial e aumentando a relevância.
Outro fator que pode afetar a relevância dos conteúdos disponíveis na internet
(principalmente em relação a sites de pesquisa, como o Google) é a inexistência de uma
filtragem das informações, com o próprio usuário tendo que assumir o risco de fazê-lo,
aumentando o seu esforço mental. De fato, é o próprio usuário que deve construir o seu
caminho de leitura, não existindo uma ordem pré-estabelecida. Tampouco há garantias de que
a fonte escolhida de informações seja confiável. Nestes casos, a presunção de relevância deve
ser complementada por uma presunção de honestidade. Todos estes fatores, assim como usos
ilegais da internet, como spams, nicknames falsos e pop-ups, podem diminuir a relevância de
um conteúdo. Além disso, há uma tendência dos usuários em fazerem diversas coisas ao
mesmo tempo, o que pode, também, afetar as estimativas de relevância.
O fato de pertencermos a uma comunidade de fala específica permite a criação de
suposições arquetípicas que aceitamos como normais na nossa comunidade. Zegarac (2007)
dá a estas suposições o nome de “representações culturais centrais”, as quais seriam válidas
em diferentes contextos da nossa vida diária diminuindo o risco de mal-entendidos. A
existência destes ambientes cognivos mútuos é, certamente, um elemento importante na
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formação do contexto e, consequentemente, na interpretação de enunciados. Na internet há
uma menor mutualidade dos ambientes cognitivos e uma redução das convenções sociais
arquetípicas, o que pode aumentar o esforço de processamento. De qualquer forma, há
diferenças dependendo do meio de comunicação utilizado. Em comunidades virtuais esta
mutualidade tende a ser maior, por exemplo.
Segundo Yus, a navegação na internet também é guiada pela relevância, com o
conteúdo da página sendo uma evidência codificada de intenções subjacentes. Como em
trabalhos literários – também muito estudados no quadro da teoria da relevância – é de
responsabilidade do autor da página predizer quais suposições são manifestas para seus
leitores, sem garantia, porém, de que essas suposições realmente fazem parte dos seus
ambientes cognitivos. No entanto, há um crescente número de páginas na internet que oferece
opções de interatividade, possibilitando mais opções de contextualização. De qualquer forma,
o padrão de busca via relevância se aplica, e o usuário deverá seguir os passos inferenciais
para que o conteúdo da página seja totalmente contextualizado – o que poderá ou não
coincidir com a intenção do autor. Além disso, a crescente convencionalização dos diversos
gêneros de páginas da internet pode auxiliar os usuários a identificarem as intenções
comunicativas dos autores, influenciando a qualidade das suas interpretações.
Costa (2005) aponta para o fato de que em alguns contextos a relevância poderia ser
atingida por um “efeito emocional” e não contextual, como em conversas entre namorados. O
que estaria em jogo, nestes casos, seria um benefício emocional pelo menor custo possível (e
de acordo com as preferências pessoais do interlocutor). Yus também admite este tipo de
efeito (sob o título de “recompensas cognitivas”), o qual é muito recorrente na internet. Nestes
casos a relevância é obtida com pouco esforço e apesar de produzir poucos efeitos cognitivos.
O autor cita dois exemplos: um site em que se pode ver um queijo Cheddar rodando e outro
em que se podem ver galinhas se movendo em uma fazenda. Para Yus, porém, devemos
considerar a diferença existente entre as pessoas que estão na internet por um objetivo
específico e as pessoas que estão conectadas sem nenhum motivo específico (para “matar
tempo”).
Flavián-Blanco et al. (2011 apud YUS, 2011, p. 53), por outro lado, afirmam que o
esforço empregado em uma pesquisa, por exemplo, pode ter efeitos positivos mesmo que não
se obtenha o resultado desejado, pois o usuário poderá aumentar o seu nível de experiência, o
que certamente será útil em pesquisas ulteriores. No entanto, é possível que a repetição
sistemática de efeitos cognitivos em troca de pouco esforço mental possa levar a uma
relutância dos usuários em processar discursos que requeiram um processamento mais
elaborado em termos de fontes cognitivas. A todos estes aspectos não proposicionais da
comunicação via internet que podem eventualmente afetar a relevância Yus dá o nome de
“Restrições do ambiente”. Entre estas restrições encontra-se o tipo de navegação, o tipo de
interface (e a familiaridade do usuário com esta), a frequência do uso, a disponibilidade do
usuário para a tarefa, etc. Desta forma, para obter a relevância na internet, os efeitos
cognitivos/recompensas cognitivas e as restrições positivas do ambiente devem ser maiores do
que o esforço requerido para a obtenção destes efeitos cognitivos/recompensas cognitivas e as
restrições do ambiente negativas. É este equilíbrio deve ser buscado pelos autores de páginas
na internet e designers.
Embora Sperber & Wilson insistam no caráter comparativo (e não quantitativo) da
relevância, Yus propõe que, especificamente na situação em que um usuário está fazendo uma
pesquisa, a relevância será obtida quando o efeito conseguido for maior que o número de
cliques necessários para obtê-lo. Neste sentido, Pirolli & Card (1999 apud YUS, 2011, p. 70)
comparam o usuário que está explorando uma página da internet a um animal procurando por
comida. O número de calorias gastas na procura deve ser menor do que as calorias fornecidas
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pela comida, assim como o tempo gasto procurando uma informação deve ser menor do que o
efeito conseguido.
A efetividade das publicidades feitas pela internet também é medida em número de
cliques. Tais publicidades são tipicamente esquemáticas, pois devem dividir o espaço da tela
com outros discursos. O usuário deve, com a ajuda do contexto, preencher as lacunas do
significado para obter interpretações relevantes. No entanto, é difícil determinar como um link
publicitário comunica a presunção de sua própria relevância, já que normalmente são
intrusivos. Para Yus, porém, a Teoria da Relevância pode explicar esta reação negativa que a
maioria dos usuários demonstra em relação a este tipo de publicidade. Uma vez que a nossa
cognição tende a focar naquilo que é potencialmente relevante, a publicidade não consegue
lutar contra outras áreas da webpage pela atenção do usuário. Uma estratégia para a
contextualização de publicidades na internet - e que tem obtido mais sucesso - é ligá-las a
ferramentas de busca ou colocá-las em páginas com conteúdo relacionado ao que a
publicidade oferece.
A aparição e a popularização das redes sociais influenciou a crescente hibridização das
interações em cenários virtuais e reais. A maior parte dos usuários, de fato, utiliza estes sites
para a manutenção de relações interpessoais já existentes em ambientes offline. Além disso,
estes sites disponibilizam diferentes opções de interatividade (fotos, vídeos, comentários,
mensagens instantâneas), favorecendo certo nível de mutualidade entre os usuários. Desta
forma, talvez este seja o meio mais saturado de contexto da internet, quer pelas opções de
interatividade, quer pelo fato de já conhecermos as pessoas com quem estamos interagindo.
Estas informações mutuamente manifestas são essenciais para uma comunicação efetiva, visto
que permitem aos usuários deixar informações implícitas, não codificadas, que devem ser
reconhecidas e recuperadas pelos ouvintes/leitores. Para Yus, alguns enunciados utilizados
nas nossas interações têm o único objetivo de revelar áreas comuns entre os ambientes
cognitivos dos interlocutores. A consciência da existência destas áreas comuns é muito útil,
podendo servir como contexto preliminar para outras interações. A delimitação destes
ambientes cognitivos comuns, aliás, talvez seja a melhor explicação para algumas publicações
encontradas principalmente no microblog Twitter. Este microblog foi muito criticado pela
irrelevância das mensagens publicadas pelos seus usuários, principalmente nos seus primeiros
anos de funcionamento. O Twitter tem um limite de 140 caracteres para cada publicação, o
que de certa forma limita o esforço de processamento. No entanto, o efeito cognitivo também
é, muitas vezes, mínimo. Outra explicação possível é dizer que no Twitter também há uma
substituição/complementação do efeito cognitivo com um efeito emocional (um sentimento de
proximidade com os amigos, a vontade de interagir, etc).
A respeito da aplicabilidade de modelos pragmáticos para o estudo da comunicação
pela internet, Crystal (2011) argumenta que as condições de felicidade de Austin, que
supostamente governariam as interações linguísticas eficazes, não explicam os tipos de
linguagem encontrados em algumas interações na internet. Além disso, muitas máximas
griceanas são desrespeitadas na internet sem que disso resulte uma inferência. O autor cita
exemplos como a prática conhecida como “trolagem”, em que se viola a máxima de
qualidade, mandando uma mensagem não para comunicar, mas simplesmente para irritar os
outros. Também haveria violação da máxima de quantidade no envio de spams e da máxima
da relevância no excesso de publicidade que se pode encontrar em um mesmo site. Para
Crystal, uma perspectiva pragmática de estudo é necessária para que se possam analisar as
intenções dos donos de sites e para que se avaliem os efeitos das suas decisões linguísticas,
mesmo que seja difícil determinar quais intenções estão por trás de uma webpage particular
ou de qualquer outro tipo de atividade executada na internet. Há, além disso, textos que são
simplesmente transferidos do “mundo off-line” para o mundo on-line em formato pdf, por
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exemplo. Por outro lado, existem textos na internet sem correspondência no “mundo off-line”,
como textos produzidos com o propósito de não serem bloqueados por filtros de spams ou,
ainda, textos que procuram garantir maiores rankings em pesquisas (assegurando que
determinados sites apareçam nos primeiros lugares nas pesquisas dos usuários). Crystal
argumenta, além disso, que “qualquer explicação de por que a linguagem da Internet é como é
deve tomar o conceito de relevância como um princípio chave.” (CRYSTAL, 2011, p.140,
grifo de autor, tradução nossa)2. Na sequência do texto esclarece que a noção de relevância a
que se refere é aquela definida no quadro da Teoria da Relevância.
Procuramos resumir nesta subseção alguns dos pontos centrais da ciberpragmática.
Devido ao caráter deste trabalho, não aprofundamos algumas questões; no entanto,
acreditamos ter oferecido um panorama bastante contundente do que se propõe a teoria.
4 Ilustrando a teoria
Nesta parte do trabalho procuraremos mostrar através da discussão – não exaustiva de alguns tópicos como a ciberpragmática poderia contribuir para a compreensão de alguns
fenômenos da internet.
RELEVÂNCIA E POPULARIDADE
Tweet de @exilado em 20/08/2012
“Brasil é aquele país onde o sujeito precisa estar trancafiado num presídio pra
conseguir sinal de celular.”
O Twitter, como vimos, tem um limite de publicação de 140 caracteres. Assim
como acontece nas mensagens SMS, o usuário precisa ser engenhoso para conseguir ser
relevante e comunicar o que quer em tão pouco espaço. No exemplo acima, vemos um tweet
potencialmente relevante, pois faz duas críticas ao mesmo tempo (crítica à desorganização do
sistema penitenciário brasileiro e ao mau funcionamento das operadoras de celular) e também
parece informar que seu celular está ou estava sem sinal. Se o definimos como potencialmente
relevante, isto se deve ao fato da Teoria da Relevância não trabalhar com valores absolutos
e/ou quantitativos de relevância, mas com valores comparativos. Além disso, a relevância
pode variar de acordo com cada indivíduo, uma vez que o contexto não é visto como externo
a ele, mas como o conjunto de suposições que o próprio indivíduo escolhe para interpretar um
enunciado.
Pode-se, contudo, prever que o tweet acima seja relevante para muitos leitores, já que
pode potencialmente ser combinado a diversos contextos, podendo até mesmo ser lido de uma
maneira metafórica, no sentido de que no Brasil as coisas só funcionam se quebrarmos as leis.
Podemos, ainda, identificar duas implicaturas fortes nesta mensagem, quais sejam, que
o nosso sistema penitenciário é ineficiente e que as operadoras de celular tem sinal ruim.
Além disso, há pelo menos uma implicatura fraca, qual seja, de que o usuário está/estava sem
sinal no seu celular. Como vimos, o fato desta mensagem codificada poder gerar diversos
efeitos cognitivos diferentes - ao menos potencialmente - aumenta a probabilidade de que
venha a ser relevante para um usuário. Deste modo, a Teoria da Relevância poderia explicar
por que alguns tweets são mais “retweetados” (compartilhados/reenviados) do que outros.
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“Any explanation of why Internet language is the way it is must make relevance a key principle.”
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IRRELEVÂNCIA
Tweet de @SueSouza em 20/08/2012
“acabo de fazer um macarrão com molho de tomates frescos, manjericão recém
colhido, bacon, presunto, queijo e champinhon”
Diferentemente do tweet anterior, este seria um exemplo de enunciado irrelevante para
a Teoria da Relevância (COSTA, 2005). A falta de efeitos cognitivos, no entanto, poderia ser
substituída por um efeito emocional. Como vimos, Yus admite este tipo de efeito, chamandoos de “recompensas cognitivas”. Contudo, não há um tratamento claro de como efeitos
emocionais poderiam substituir/incrementar efeitos cognitivos dentro da Teoria da
Relevância. No nosso ponto de vista, esta é uma falha da proposta de Yus, pois propõe que
possam existir “recompensas cognitivas” sem que haja uma explicação de como isto poderia
ser incluído no quadro da Teoria da Relevância. Mesmo sem uma definição adequada, o autor
utiliza este conceito para explicar diversos fenômenos, tornando algumas explicações
inconsistentes.
Por outro lado, além - ou no lugar - do efeito emocional, o tweet acima poderia ter
efeitos cognitivos para alguns leitores, como, por exemplo, uma amiga da dona do perfil que
fica sabendo que esta gosta de tomate, ou, ainda, o seu namorado ciumento que descobre que
ela está em casa e não saiu com as amigas. Além disso, o esforço necessário para processar
esta informação é tão pequeno que até mesmo uma pequena implicação contextual poderia
fazer o seu processamento valer a pena.
LINHA DO TEMPO DO FACEBOOK
Recentemente o maior site de Rede Social do mundo, o Facebook, lançou uma
mudança de layout chamada “linha do tempo”. Esta mudança organiza os dados pessoais e as
publicações dos usuários por ano, começando pela data mais recente. Muitos usuários não
gostaram da mudança, reclamando que o novo layout era confuso. A mudança inclusive gerou
fóruns na internet com discussões sobre como voltar à forma antiga 3. Este exemplo é
interessante porque corrobora a tese de Yus de que o tipo de interface utilizada por um
programa ou site pode afetar as estimativas de relevância. Segundo o autor, os usuários se
acostumam com o layout dos sites, o que diminui o esforço empreendido para localizar uma
informação e aumenta, consequentemente, a relevância. Este estabelecimento de padrões
também poderia explicar por que as publicidades nos sites são comumente ignoradas pelos
usuários, pois estes identificariam os padrões de localização das propagandas e simplesmente
as ignorariam (já que as publicidades raramente produzem efeitos cognitivos para os
usuários).
A Teoria da Relevância também poderia, pelo menos em parte, explicar a que se deve
o sucesso das redes sociais como o Facebook. Nestes sites interagimos principalmente com
pessoas que já conhecemos, sobre, na maior parte das vezes, tópicos de conversa que dizem
respeito à nossa comunidade ou país. Deste modo, a interface destes sites nos permite
compensar a menor quantidade de convenções sociais arquetípicas encontradas na internet.
Ora, quanto maior a mutualidade de ambientes cognitivos entre os interlocutores, mais
provável será de que um estímulo seja relevante. Além disso, diferentemente de programas
3
Um exemplo pode ser encontrado em http://tecnologia.uol.com.br/noticias/redacao/2012/07/10/saiba-comoremover-a-linha-do-tempo-de-seu-perfil-no-facebook.htm#comentarios
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como o Messenger, nas redes sociais cada usuário pode tornar informações manifestas a um
número muito maior de pessoas.
Há que se comentar, ainda, outra possibilidade muito interessante e muito presente nas
redes sociais, qual seja, o compartilhamento de montagens/figuras prontas. Esta prática
diminui consideravelmente o esforço cognitivo do usuário, já que o esforço de escrever algo é
substituído por um simples clique no botão “compartilhar”, permitindo interação a um custo
muito baixo. Provavelmente é por este motivo que o compartilhamento está entre as
atividades mais comuns nas redes sociais.
O CONTEXTO NA INTERNET
Yus, como vimos, acredita que não há diferença entre a comunicação face a face e a
comunicação pela internet no que se refere ao processo comunicativo. As únicas diferenças
que podem ser encontradas se referem ao balanço entre esforço e efeito cognitivo, o qual pode
ser afetado pelo meio utilizado. Realmente seria estranho postular a existência de um processo
comunicativo diferente que ocorresse somente na comunicação virtual. Deste modo, parece
bastante coerente utilizar a mesma teoria para descrever processos comunicativos nos dois
ambientes. No entanto, alguns conceitos teóricos poderiam não se adaptar a esta ampliação de
escopo. Este poderia ser o caso de teorias para as quais o contexto já está definido antes do ato
comunicativo. Na internet, como vimos, há meios pouco saturados de contexto, como chats,
por exemplo. Nestas situações o interlocutor é, muitas vezes, um desconhecido, sobre quem
não temos nenhuma informação. De que contexto irá se partir? Seguindo a Teoria da
Relevância, poderíamos postular que o usuário irá, primeiramente, utilizar o seu
conhecimento enciclopédico e a sua experiência no uso daquele tipo de site. Aos poucos, irá
agregando informações e modificando o contexto. A Teoria da Relevância, de fato, não
acredita em uma visão estática do contexto, mas defende uma visão mais dinâmica, em que,
na realidade, não há um só contexto, mas várias informações que vão sendo recuperadas da
memória – guiadas pela busca da relevância ótima - para serem, então, combinadas aos
enunciados produzindo significados.
Esta definição de contexto facilita, portanto, a descrição das interações comunicativas
que ocorrem na internet, uma vez que, diferentemente do que acontece na comunicação face a
face, na internet o contexto compartilhado é radicalmente diminuído, subtraindo informações
como o espaço físico, características físicas dos interlocutores, expressões faciais, etc (com a
exceção de alguns ambientes como as redes sociais). Esta diminuição cria uma lacuna maior
entre o que o interlocutor entende comunicar e o que é efetivamente comunicado. A este
fenômeno Yus (2002) dá o nome de “Filtro Comunicativo Duplo”, referindo-se à necessidade
que o interlocutor tem, muitas vezes, de não somente identificar a intenção comunicativa por
trás do que é dito, mas também identificar o que o interlocutor poderia ter dito não fossem as
limitações do meio de comunicação utilizado.
5 Conclusão
A ciberpragmática, assim como a Linguística na Internet de Crystal, tenta suprir uma
carência de trabalhos que relacionem linguística e internet. Conforme aponta Crystal (2011), a
internet é o maior banco de dados linguístico que o mundo jamais teve; no entanto, ainda é
pouco explorado. Neste sentido, as propostas dos dois autores significam um passo importante
na direção de explorar este grande corpus.
A proposta de Yus é consistente e, como ficou demonstrado, consegue nos ajudar a
entender melhor como as pessoas se comunicam e interagem pela internet. No entanto,
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Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul
UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná
Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751
embora descreva e argumente com muita propriedade, ressentimos a falta de exemplos de
análise nos seus livros e artigos sobre o assunto. Entendemos, contudo, que a sua proposta é,
antes de mais nada, abrir terreno para que outros pesquisadores o sigam.
Referências
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(Dis)curso - Tubarão, v. 5, n. esp., p. 161-169, 2005.
CRYSTAL, D. Internet Linguistics: A Student Guide. 1. ed. New York: Routledge, 2011.
SPERBER, D.; WILSON, D. Relevance: communication & cognition. 2. ed. Cambridge:
Blackwell, 1995.
YUS, F. Ciberpragmática. El Uso del Lenguaje en Internet. 1. ed. Barcelona: Ariel, 2001.
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_____. The Linguistic-cognitive essence of virtual community. Ibérica 9, p. 79-102, 2005.
_____. Alterations of relevance in cyber-media. Universitas Psychologica 7(3), p.623-636
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Philadelphia: John Benjamins Publishing Company, 2011.
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KOTTHOFF, H.; SPENCER-OATEY, H. (Orgs.). Handbooks of Applied Linguistics. Vol.7:
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