Nº 6 – 09 de Julho de 2015 10 anos TMJB Por Pedro Calapez* N ão me apercebi que já tinham passado dez anos ou que só passaram dez anos e muitos mais se esperam. O TMJB agarrou-se a mim desde os primeiros desenhos dos seus arquitetos. Posso dizer que nele participei ativamente já que, através do convite de Joaquim Benite, Manuel Graça Dias e Egas José Vieira, tive a felicidade de poder realizar a sua cortina de cena, assim como um conjunto de pinturas para a sala de entrada. A cortina de cena é o maior desenho que realizei, um trabalho totalmente projetado em computador. Trata-se de um denso bosque em que múltiplas transparências se revelam pelo emaranhar de ramos e folhas. É verdadeiro e falso ao mesmo tempo, engana-nos pelo espaço difuso, deslumbra-nos pela materialidade do desenho que o atravessa. Espero que questione a realidade como as peças de teatro que acontecem no palco que se abre depois da sua subida. A adesão aos meus desenhos e pinturas foi entusiasta, manifestada nas reações das gentes do teatro, de atores a técnicos, passando pelos espetadores. Sinto-me orgulhoso por ter contribuído para um dispositivo cultural que se tem revelado exemplarmente dinâmico e referência fundamental para um público que o acarinha com a sua regular presença. * Pedro Calapez é artista plástico. Foi o autor da cortina de cena do TMJB, cujo título é O bosque, bem como do conjunto de obras Nove cenas para um teatro, expostas no foyer. O presente do verbo ‘devorar’ Devoração estreou em Paris, no passado mês de Junho. Subirá amanhã ao Palco Grande para convidar o público português a reflectir sobre os impulsos destrutivos e consumistas do nosso tempo. Maxime Franzetti dirige um jovem elenco de actores e performers. O Théâtre du Balèti é uma companhia jovem e ousada. Dirige-a Maxime Franzetti, um actor e encenador estreitamente ligado ao teatro físico, que prefere trabalhar sem orientação dramatúrgica pré-estabelecida. “Quando me lanço para um projecto, tenho na cabeça imensas imagens, imensos fragmentos de cenas ou de quadros, mas é a matéria criada pelos actores durante os ensaios que dá forma ao espectáculo”. Assim, se por um lado aposta na pesquisa levada a cabo por cada um dos seus colaboradores, por outro, gosta de tirar partido de todas as possibilidades espaciais e técnicas do palco. No caso de Devoração, o colectivo partiu de uma temática. Procurava desmontar o termo que dá título ao espec- tária, aborda-se, por exemplo, o fenómeno das manifestações eróticas por webcam; numa longa enumeração, apresentam-se os conflitos armados em que, desde o início dos tempos, os homens têm vindo a envolver-se; aborda-se a educação católica de uma criança a quem a hóstia dá vómitos e as histórias da Bíblia… vontade de rir. Uma frase do poeta italiano Cesare Pavese serve simultaneamente de mote e chave de leitura do espectáculo: “Com amor ou ódio, mas sempre com violência”. “A linguagem a que tentamos dar forma é uma linguagem da brutalidade, áspera e reivindicativa”, conclui Maxime Franzetti. “Não é nem contemplativa, nem decorativa, mas sim necessária para trazer à luz do dia a tragédia que nos ocupa”. Devoração nasce de improvisações. táculo, decliná-lo em todas as suas acepções e trabalhá-lo em todos os seus contextos: como apetite sexual ou bélico, como superprotecção maternal ou símbolo religioso. Neste espectáculo, de estrutura fragmen- Três dias, três textos P eter Stein é um fiel acólito do teatro da palavra. Foi nessa condição que falou ontem sobre o texto dramático, na Casa da Cerca, diante de uma plateia ansiosa por colocar as perguntas para as quais não tinha sobrado tempo no dia anterior. Ainda assim, o ex-director artístico da Schaubühne insistiu em guardá-las para o fim. Preferiu chamar a atenção para o facto de, no teatro, o trabalho ocupar todas as horas e todos os dias da semana, exigindo que o actor esteja atento, na vida real, à “musicalidade dos enunciados, aos registos de língua, às formas de evitar a monotonia”. Para si, “primeiro vem o entendimento do © Rui Carlos Mateus No ano em que o TMJB comemora dez anos, publicamos 15 textos de artistas, dirigentes e amigos ligados ao percurso deste teatro. Hoje termina o curso ministrado por Stein. texto”. “Há textos que levam o seu tempo” (a ser compreendidos, a ser ditos) – e é preciso respeitar o seu tempo para que a prestação em palco seja credível. Depois há que enriquecê-los, com todas as pausas e ruídos que lhes dão vida. Stein frisou ainda um outro ponto, que já no ano passado Luis Miguel Cintra frisara: a importância de desenvolver uma “personalidade artística”, dinâmica e inquieta. Depois, vieram as perguntas. Os episódios da sua vida pessoal que explicam por que não suporta o ballet. As declarações polémicas: “Brecht é um desastre para o teatro europeu”. As suas preferências: “Interessa-me um teatro político, mas desligado dos noticiários”. A sua definição da catarse grega: “Aceitar que a morte está em nós e, fazendo-o, ir mais além, como um herói”. Uma outra versão da História AGENDA de amanhã Entrevista com Joana Craveiro Teatro do Vestido 16h00 Um museu vivo... © Luana Santos Joana Craveiro assina a direcção e a interpretação de Um museu vivo de memórias pequenas e esquecidas, o espectáculo que percorre os últimos 88 anos da História de Portugal e que se apresenta esta Sexta, Sábado e Domingo no Teatro-Estúdio António Assunção. A autora do projecto esteve à conversa com a Folha Informativa e destaca o modo como a sua peça questiona a “história de protagonistas” que dá forma às versões oficiais sobre o 25 de Abril. A Escola D. António da Costa dramafest Teatro Municipal Joaquim Benite Artistas unidos 19h00 Os acontecimentos Teatro da Politécnica Espectáculos de rua 20h00 Mr. Ping Pong Rua Cândido dos Reis 20h00 Residual Gurus Praça da Portela 20h30 Guents dy Rincon Escola D. António da Costa sos em torno do 25 de Abril. A génese desta democracia traz problemáticas do ponto de vista das lutas pela memória que ainda hoje estão muito vivas na sociedade portuguesa. Sei que recolheu vários testemunhos durante a sua investigação. O que é que sentiu ao provocar essa memória? Acho que, mesmo quando as pessoas não tinham uma relação especialmente emotiva com as memórias, de alguma forma, durante o processo da entrevista e depois especialmente ao verem o espectáculo, acontece sempre qualquer coisa muito especial… O que eu sinto é que as pessoas acham que não têm um espaço onde possam partilhar aquilo que viveram e que a sua memória fica obliterada no meio de outras que são aparentemente hegemónicas e que às vezes não coincidem exactamente com aquilo que a pessoa viveu. Esperava que este espectáculo viesse a ter consequências? Pretendia recuperar uma espécie de activismo inerente ao 25 de Abril ou apenas reflectir sobre os modos de apreensão e transmissão da História? Eu não tinha essa ideia, não queria cumprir nenhuma função didáctica com este espectáculo. Queria um objecto artístico sobre este assunto; queria, aliás, apresentar performaticamente a minha investigação – porque está aqui uma grande investigação por detrás, não só na recolha de testemunhos, mas também de documentos. O espectáculo tinha como objectivo contribuir ele próprio para uma transmissão da memória, que está ausente das narrativas oficiais e dos livros de História. Sobre recuperar o espírito do 25 de Abril, acho que ele também faz isso, mas sem que tivesse sido essa a minha determinação inicial. ‘Quatro santos em três actos’ na Esplanada manhã a Esplanada da Escola D. António da Costa vai receber mais um colóquio ao final do dia, desta vez sobre o espectáculo Quatro santos em três actos, construído a partir da ópera de Virgil Thomson com libreto de colóquio 18h00 Quatro santos... 19h00 Iluminação Joana Craveiro pertence a uma geração “pós-memória”, nascida depois do 25 de Abril. De que forma assistiu às comemorações do 40º aniversário do 25 de Abril? Acho que os 40 anos nos apanharam a todos um pouco de surpresa. Pareceu-me bastante interessante a discussão sobre a quem é que a memória pertence. Acho que a memória do 25 de Abril levanta a ideia de que essa memória pertence a um determinado grupo. Há vários problemas com os discursos do 25 de Abril: a ausência da referência à guerra colonial, da referência ao PREC como algo positivo… Porque é sempre, de certa forma, “exoticizado” ou “demonizado”, como algo muito negativo que nos aconteceu. Pessoalmente, acho que o lado oficial das comemorações tem algo que não capta a essência daquilo que foi este movimento para as pessoas comuns. O espectáculo questiona evidentemente as grandes narrativas e também os consen- Teatro-Estúdio António Assunção Gertrude Stein. António Pires, encenador, e Luísa Costa Gomes, que assina a tradução e a versão cénica, vão estar à conversa com o jornalista e crítico João Carneiro sobre esta nova produção do Teatro do Bairro. Falar-se-á certamente dos de- safios de traduzir um texto tão livre e complexo (“sou ‘autora’ da tradução”, explica Luísa Costa Gomes), do diálogo cénico com a música de Thomson ou da experiência de juntar a um elenco profissional alguns alunos da escola ACT. serviço educativo 21h15 Gesto como tradução Átrio da Esc. D. António da Costa mala voadora 21h30 Your Best Guess Culturgest Teatro do BAirro 21h30 Quatro santos... Teatro do Bairro performance 21h45 e 24h10 Povera.Cena.Cenoura Átrio da Esc. D. António da Costa Théâtre du Balèti 22h00 Devoração Escola D. António da Costa Música na esplanada 24h00 Cais Sodré Funk Connection Escola D. António da Costa Restaurante da Esplanada Hoje - Carapaus fritos c/ arroz de grelos - Pernas de frango no forno Amanhã - Massa c/ legumes e camarão - Coq au vin A loucura dos grandes não pode caminhar sem vigilância. Cláudio, III, 1