Anais do II Congresso Internacional de História da UFG/
Jataí – Realização Cursos de História, Letras, Direito e
Psicologia – ISSN 2178-1281
PERFORMANCE E OS MOVIMENTOS ESTÉTICOS DE VANGUARDA
Ana Erica Reis da SILVA (FL- UFG/ CAPES-REUNI)
[email protected]
Jamesson BUARQUE (FL-UFG)
[email protected]
Resumo: A performance como gênero que flutua por entre fronteiras de outras
linguagens artísticas não se enquadra em limites disciplinantes, vez que valoriza o
processo de liberdade criativo. Ao perpassar por movimentos estéticos como
Futurismo, Dadaísmo, Surrealismo e a escola da Bauhaus, a performance funcionou
como uma “mola” propulsora no que tange ser uma arte desprovida de regras e
conceitos, visto que possibilitou aos artistas de cada estética experimentações das
mais variadas, que iam desde um tipo de música diferenciada feita com ruídos até
espetáculos deslumbrantes que misturavam teatro, circo, pintura e poesia. A partir
dessas afirmações, pretendemos investigar como essas estéticas se relacionavam
com a performance a fim de romper com a arte tradicional e propor novas formas,
firmando-se como artes de vanguarda.
Palavras-chave: performance; arte; estéticas; vanguarda.
Abstract: The performance as a genre that floats among the borders of other artistic
languages do not fit in disciplining limits, since it values the process of creative
freedom. To pass by the esthetic movements such as Futurism, Dadaism, Surrealism
and the Bauhaus school, the performance worked like a propelling "spring" in terms
to being an art unprovided of rules and concepts, as allowed the artists of each one
aesthetics a variety experimentation, that ranged from one type of different music
with noises to stunning shows that mixed theater, circus, painting and poetry. From
these affirmations, we intend to investigate how these aesthetics were related to the
performance to break with traditional art and propose new ways, establishing itself as
the vanguard arts.
Keywords: performance, art, aesthetics, vanguard.
É no sentido de construir uma linguagem diferenciada que a performance
passa a apontar para tendências modernas e futurísticas onde o homem é quem
transforma a sua realidade, e o produto de tudo isso provém da sua arte, agora
intercedida por movimentos de vanguarda para mais tarde ascender na década de
setenta como gênero artístico independente, através exercícios de improvisação
associados a técnicas teatrais de dança, cinema, música e fotografia. Nessa época a
performance se relaciona com movimentos de vanguarda como Futurismo,
Dadaísmo, Surrealismo e a escola da Bauhaus. Algumas dessas manifestações
artísticas, como Futurismo e Dadaísmo, buscavam na performance apenas um meio
de romper com a arte tradicional como aponta Jorge Glusberg1 (2009, p. 12):
1
GLUSBERG, Jorge. A arte da performance. Tradução Renato Cohen. São Paulo: Perspectiva, 2009.
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“Futuristas e dadaístas utilizavam a performance como um meio de provocação e
desafio, na sua ruidosa batalha para romper com a arte tradicional e impor novas
formas de arte”.
A história da performance na modernidade, século XX, começa ainda no
século anterior, por volta de 1896, na noite de 10 de dezembro(GLUSBERG, 2009,
p. 13) , ano em que o poeta italiano Fillippo Tommaso Marinetti 2 retorna a Itália
depois de uma temporada em Paris, e se depara com a peça Ubu Rei, uma criativa
performance de Alfred Jarry3 que estreou no Théâtre de l’Oeuvre e Lugné-Pöe:
Jarry, com a idade de 23 anos, não só escreveu uma peça
fantasmagórica que demoliu os frágeis pressupostos dramáticos de
sua época, atacando as convenções sociais e valendo-se das
palavras para criar um clima onírico e delirante. Mais que isso, sua
peça apresentou soluções novas para a cena, particularmente para a
forma e atuação no que tange à entonação de voz e o uso de
figurinos. Seus figurinos sepultaram a arcaica tradição realista do
teatro. (GLUSBERG, 2009, p. 13).
É com essa encenação que a performance começa a ser de certa forma
“experimentada” nas primeiras noites futuristas também conhecidas como seratas,
uma espécie de laboratório de pensamento em arte, onde alguns artistas que
participam do Futurismo italiano, realizavam leituras de manifestos de poesias, além
de encenações teatrais e apresentações de dança e música, a partir desses
encontros surgiram propostas bastante inovadoras para a época, como a criação de
peças de apenas 30 segundos.
Marinetti se tornou uma figura célebre do Futurismo italiano por propagar a
arte da performance para as mais diversas manifestações artísticas desde saraus
agitados com declamações feitas por performers, com o intuito de dar certa dinâmica
à velha leitura estática de poesia, à música de ruído, como ficaram conhecidas as
performances musicais que eram apresentadas na sua luxuosa mansão, até mesmo
os balés com performers vivos, estabelecendo a ideia de explorar as múltiplas
possibilidades do corpo, e a pintura com obras que demonstravam como poderia lhe
ser aplicado um manifesto teórico, no mais “A performance era o meio o meio mais
seguro de desconcertar um público acomodado.” (GOLDBERG, 2006, p. 4)4.
Os futuristas obtinham com a performance uma expressão diferenciada das
outras linguagens artísticas, pois mesmo se associando a elas, o resultado estético
final era diferenciado, pois pretendia não somente chamar a atenção do público para
o que acontecia, mas fazer com que esse público participasse das ideias, como uma
espécie de “balão de ensaio” citado por Glusberg (2009, p. 13) em Arte da
performance.
Para Roselee Goldberg (2006), os futuristas que a essa altura já haviam se
propagado por outros países, principalmente europeus, utilizaram a performance
como um gênero artístico independente, buscando propostas inovadoras com
relação à arte tradicional:
2
Além de poeta foi também editor, jornalista e ativista político na Itália. Fundador do Futurismo
publicou o manifesto do movimento no jornal Le Figaro de Paris em 20 de fevereiro de 1909.
3
Poeta, romancista e dramaturgo francês. É um dos inspiradores do teatro do absurdo.
4
GOLDBERG, Roselee. Futurismo. In: A arte da performance: do futurismo ao presente. Tradução
Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
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Em meados do século XX, os futuristas haviam estabelecido
solidamente a performance como um meio de expressão artística
independente. Em Moscou e Petrogrado (atual São Petersburgo),
Paris, Zurique, Nova York e Londres, os artistas usavam-na como
meio de transpor os limites dos diferentes gêneros artísticos, pondo
em prática, com maior ou menor rigor, as táticas provocativas e
ilógicas propostas pelos diferentes manifestos futuristas. Ainda que,
em seus anos de formação, o futurismo parecesse consistir
basicamente em tratados teóricos, dez anos depois o número total de
performances nesses diversos centros era considerável.
(GOLDBERG, 2006, p. 19).
O Futurismo foi uma investida em quase todas as formas de expressão
artística, e para isso tomou a performance como meio de disseminar as diversas
propostas artísticas, sob influência de Marinetti, que fez com que a performance
abrangesse os diversos campos de arte, como pontua novamente Goldberg (2006,
p. 20):
As teorias e apresentações futuristas abrangeram quase todas as
áreas da performance. Foi esse o sonho de Marinetti, que clamara
por uma arte que fosse “álcool, não bálsamo”, e foi exatamente essa
embriaguez que caracterizou os crescentes círculos de artistas que
vinham adotando a performance como um meio de difundir suas
propostas artísticas radicais. “Graças a nós”, escreveu Marinetti,
“chegará o tempo em que a vida deixará de ser mera questão de pão
e trabalho ou uma trajetória de puro ócio: será uma obra de arte”.
Essa premissa estaria na base de muitas performances
subsequentes.
Outro movimento que procurou associar a performance as mais variadas
expressões artísticas foi o Dadaísmo, seu principal núcleo foi a cidade de Paris, se
espalhou por toda Europa a partir da abertura do Cabaret Voltaire em Zurique no
ano de 1916 (GOLDBERG, 2006. p. 40.). Este acontecimento é considerado um
marco para o pensamento artístico, pois nele se deparavam artistas de toda Europa
que iam para a Suíça, considerada uma cidade neutra nos tempos da guerra, ao se
reunir esses artistas trocavam suas experiências, o que culminou no movimento
Dadá.
No entanto, o teatro-cabaré já era bem popular nas cidades alemãs, e foi de
Munique que vieram as principais figuras do Cabaret Voltaire, Emmy Hennings5 e
Hugo Ball6, juntos montaram um cabaré que tinha como programação a leitura de
poemas, execução de performances musicais, mostra de pinturas, e por isso atraiu
um grande número de artistas que buscavam na Suíça um lugar imparcial à guerra.
Nessa época surgiram espaços conhecidos como “teatros íntimos” criados pela
5
Escritora, poeta, romancista e performer de nacionalidade alemã, esteve associada ao movimento
Dadá na cidade de Zurique e integrante do grupo original do Cabaret Voltaire.
6
Poeta, escritor e filósofo alemão. Foi um dos principais integrantes do movimento Dadá, escreveu o
manifesto dadaísta, e é considerado como o inventor da poesia fonética.
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figura de Benjamin Wedekind7, mais conhecido como Frank Wedekind, que
encantou Ball com as suas montagens excêntricas, entre elas a mais famosa é Die
Büsche der Pandora (A caixa de pandora), peça que foi censurada na Alemanha por
mostrar uma mulher de carreira emancipada.
As peças de Wedekind apresentavam performances provocativas que
exploram a sexualidade antiburguesa, chegou até a se masturbar no palco. Suas
montagens e performances de caráter mordaz foram de muita importância, já que foi
considerado precursor da body art por suas encenações de cabaré nos anos de
1900-1910. No entanto, Wedekind não foi prestigiado como tal, como aponta
Glusberg (2009, p. 14):
Foi em Munique que Ball tomou contato e encantou-se com as
montagens de Frank Wedekind: Kong Nicolò, Oder So ist das Leben
(Rei Nicolau, ou Tal Qual a Vida) e Die Büsche der Pandora (A Caixa
de Pandora). É importante destacar a importância de Wedekind. O
mesmo foi sensivelmente prejudicado pela rígida censura de seu
tempo, mas afora isso, foi com suas cenas de cabaré nos anos 1900
– 1910 o precursor da body art dos anos sessenta. Infelizmente
Wedekind não tem tido esse reconhecimento.
Dentre os cooperadores de Ball no cabaré Tristan Tzara8, Hans Harp9,
Richard Huelsenbeck10 entre outros artistas e pintores, tinham a função de entreter o
público sob a pressão de fazer algo diferenciado, e para isso, a declamação e a
performance foram importantes para a busca do prazer na arte. Após cinco meses,
desentendimentos com Ball foram inevitáveis para o fechamento do Cabaret
Voltaire. Tzara, Harp e Marcel Janko11 partiram e fundaram o Dadá, sem contar com
a colaboração de Ball que via no movimento uma manifestação artística
problemática, pois a intenção era a de fundar uma “anti-arte” (GLUSBERG, 2009, p.
15), seus resquícios geraram o que mais tarde se configurou no Surrealismo.
As manifestações Dadá são caracterizadas por manifestações tumultuosas e
agressivas. Dois eventos são importantes para marcar esse movimento em Paris,
que trazia a convergência de linguagens variadas com o intuito de causar espanto
no público:
Dois eventos fundamentais aconteciam em Paris: em maio a estreia
de Parade, um balé de Jean Cocteau, com cenários e figurinos de
Pablo Picasso e música de Erik Satie. Um mês depois estreava a
peça Les Mamelles de Tirésias de Guillaume Apollinaire, pela que o
próprio autor denominava, profeticamente de um “drame sur-realiste”.
(GLUSBERG, 2009, p. 15).
7
Ator, dramaturgo e romancista alemão. É um dos precursores do Expressionismo. Sua peça teatral
mais conhecida é “O despertar da primavera” (1891). Acredita-se que suas obras já apontam para o
teatro do absurdo.
8
Pseudônimo de Samuel Rosenstock, foi um poeta romeno, mas viveu na França, tornando-se
escritor, poeta e ensaísta francês. Participou da fundação do movimento dadaísta. Após o declínio
desse, envolveu-se no Surrealismo.
9
Pintor e poeta alemão naturalizado francês. Após sair do movimento Dadá, se junta aos surrealistas.
10
Poeta, escritor de relatos de viagens, baterista, médico e psicanalista alemão, integrante do grupo
que fundou o Dadaísmo, atuou no Cabaret Voltaire onde praticou a poesia simultaneísta.
11
Poeta e pintor israelense. Praticou a poesia "rumorista", criada por Hugo Ball.
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Os últimos anos do movimento Dadá em Zurique estivera sob organização de
Tzara, que na noite de 23 de julho de 1918 (GOLDBERG, 2006, p. 63) organizou a
“noite Tristan Tzara” na Salle zur Meise, onde leu o primeiro manifesto dadaísta.
Mas, a última soirée aconteceu em 9 de abril de 1919 em Zurique, na Saal zur
Kaufleuten. Esse episódio foi paradigma para as noites que se seguiram em Paris,
pelo fato de reunir uma multidão de pessoas, cerca de 1.500, assistindo a
performances que uniam o que o dadaísmo pretendia estabelecer, instaurar o novo
a partir da anarquia e da abstração.
Em 26 de maio de 1920 é realizado o Festival Dadá (GOLDBERG, 2006, p.
74) no teatro Salle Gaveau, uma multidão é atraída pelas performances inusitadas
executadas pelos dadaístas, algumas com táticas do terrorismo, uma delas foi
organizada por André Breton12, Paul Éluard13, Philippe Soupault14 e Theodore
Fraenkel15, como relata Goldberg (2006, p. 74):
Breton aparecia com um revólver preso a cada têmpora, Éluard
usando um tutu de bailarina, Fraenkel de avental, e todos os
dadaístas com “chapéus” afunilados na cabeça. Apesar desses
preparativos, as performances em si não foram ensaiadas, de modo
que muitos dos eventos começaram com atraso e foram
interrompidos por gritos do público enquanto os performers tentavam
pôr suas ideias nos eixos.
Após esta apresentação e de outros episódios como a famosa excursão
dadaísta a abandonada igreja de St. Julien le Pauvre16, as divergências entre Tzara
e Breton se aprofundavam, e a separação é assinalada pelo fato de que Breton,
Éluard, Louis Aragon17 e Benjamin Péret18 queriam uma arte que ultrapasse a
provocação instaurada pelos dadaístas. O marco dessa separação acontece com o
Manifesto Surrealista no ano de 1924 (GLUSBERG, 2009, p. 20), quando Breton
12
Escritor e poeta francês, também teórico do Surrealismo.
Pseudônimo de Eugène Emile Paul Grindel, poeta francês, participou do movimento dadaísta, É
conhecido como O Poeta da Liberdade, é o mais lírico e considerado o mais bem dotado dos poetas
surrealistas franceses.
14
Escritor e político francês, um dos iniciadores do dadaísmo na França. Em 1920, juntamente com
Breton, funda o surrealismo, mas é expulso do grupo seis anos mais tarde por ser contrário à sua
organização.
15
Participou do dadaísmo juntamente com Breton, Éluard e Philippe Soupault.
16
“O grupo convida “seus amigos e seus adversários” para este evento que prometia reproduzir um
típico passeio de turistas ou colegiais. É lógico que a verdadeira finalidade era a mesma sempre, a de
desmistificar atitudes. Umas cinquenta pessoas se juntam para a visita, que transcorreu sob uma
forte chuva. Breton e Tzara provocando o público com discursos, Ribemont-Dessaignes se faz de
guia- diante de cada coluna ou estátua ele lê um trecho, escolhido ao acaso, do Dicionário Larousse.
Depois de uma hora e meia os espectadores começam a se dispersar. Recebem então pacotes
contendo retratos, ingressos, pedaços de quadros, figuras obscenas e até notas de cinco francos com
símbolos eróticos.”. GLUSBERG (2009, p. 19; 20).
17
Poeta e escritor francês, funda juntamente com Soupault a revista Littérature, voltada ao
surrealismo.
18
Poeta surrealista francês, sua influência pode ser percebida em escritores como Octavio Paz e
César Moro. Participou do movimento Dadá. Ao lado de Pierre Naville, foi responsável pelos primeiros
números da revista La Révolution Surréaliste.
13
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lança a base desse novo movimento, conceituando o que viria a ser o Surrealismo,
como pontua Goldberg (2006, p. 79):
O conceito de “automatismo” estava no âmago da definição inicial de
Breton: “Surrealismo: substantivo masculino, puro automatismo
psíquico por meio do qual se tenta expressar oralmente, por escrito
ou de qualquer maneira, o verdadeiro funcionamento do
pensamento.” Além disso, segundo a definição, o surrealismo se
fundamentava na crença na “realidade superior de certas formas de
associação até hoje desprezadas, na onipotência do sonho, no livre
jogo do pensamento”.
Muitas das performances executadas em 1920 já demonstravam estilo
surrealista, embora ainda estivessem amparadas nos ideais dadaístas de
simultaneidade e acaso, adotando o automatismo psíquico como processo criativo.
Um bom exemplo do tipo de espetáculo que apresentava esses princípios, porém
sem aprovação dos surrealistas, foi o balé Relâche, cuja estreia estava prevista para
27 de novembro de 1924 (GOLDBERG, 2006, p. 80), sob organização de Franz
Picabia19 e Erik Satie20 e colaboração de Marcel Duchamp21, Man Ray22 e o francês
René Clair23. O termo Relâche significa a suspensão temporária de apresentações,
pois no dia da estreia o bailarino principal, Jean Borlin, ficou doente daí então um
cartaz escrito “Relâche” foi posto na porta do Théâtre des Champs-Elysées, para o
público soou mais como um trote dadaísta. O espetáculo foi de fato encenado em
três de dezembro como relata Goldberg (2006, p. 80):
Mas um espetáculo deslumbrante aguardava os que voltaram no dia
3 de dezembro. De início assistiram a um breve prólogo
cinematográfico que dava algumas dicas sobre o que viria a seguir.
Depois, viram-se diante de uma enorme cortina de fundo com discos
metálicos, cada um refletindo uma luz fortíssima. O prelúdio de Satie,
adaptação de uma famosa canção estudantil, “O vendedor de
nabos”, logo, levou o público a vociferar diante do coro escandaloso.
A partir daí, gritos e gargalhadas acompanharam a orquestração
afetadamente simples e o desenrolar do “balé” burlesco.
O sucesso do balé Relâche não pode conter o progresso do movimento
surrealista, que tinha como principal proposta criticar o teatro realista. Para tanto,
foram criadas performances que causavam escândalos e provocações, tais como
representar uma multidão numa só pessoa, ou peças sem textos a serem
declamadas. O Surrealismo consegue realizar esse tipo de performance por meio
dos estudos psicológicos desenvolvidos no âmbito da arte, uma vez que os domínios
19
Pintor e poeta francês publicou o primieiro número de sua revista dadaísta "391” contando com
colaboradores como Apollinaire, Tristan Tzara, Man Ray e Arp. Cria com Breton a revista “491” de
forte característica surrealista.
20
Compositor e pianista francês. Foi precursor de movimentos artísticos como minimalismo, música
repetitiva e teatro do absurdo.
21
Pintor, escultor e poeta francês, tornou-se cidadão norte-americano a partir de 1955. É um dos
precursores da arte conceitual e introduziu a idéia de ready made como objeto de arte
22
Fotógrafo, pintor e anarquista norte-americano, responsável por inovações artísticas na fotografia.
23
Nome original de René Lucien Chomette. Ator e diretor de cinema francês.
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da mente, em especial o inconsciente, se tornam obra prima para empreender novas
performances que afetariam o teatro, pois os quesitos que serviram de alicerce para
que isso acontecesse, veio dos ideais do Dadaísmo e Futurismo - acaso,
simultaneidade e surpresa.
Próximo ao Surrealismo que tem atitudes parecidas ao que mais tarde se
configura como happening, a escola da Bauhaus surge na Alemanha onde
desenvolvia inúmeras experiências cênicas, sendo a primeira escola a ministrar
workshops de performance. O artista plástico Oskar Schlemmer24 que lecionou na
escola desenvolveu uma série de danças e criou o Ballet Triádico, no qual
desenvolveu uma relação entre movimento, forma e espaço, fazendo uso de formas
geométricas com elementos dramáticos que representavam a solidão e o infinito,
transformando a imagem do corpo humano em objetos que dialogavam com uma
dimensão abstrata inovadora para a época. Glusberg cita quais eram os objetivos da
escola:
Cumpre ressaltar que os objetivos da Bauhaus eram o de se buscar
uma fusão das artes e dos artesanatos em geral, diminuindo ao
mesmo tempo, o intervalo entre as artes e a evolução industrial. O
objetivo principal dessas buscas era contribuir para uma melhoria na
qualidade de vida do homem. A I Semana da Bauhaus, em 1923,
teve como título: “A Arte e Tecnologia – Uma Nova Unidade”,
antecipando em mais de quarenta anos a consolidação da chamada
arte intermediária e os “Experiments on Art and Tecnology”, EAT, dos
Estados Unidos. (GLUSBERG, 2009, p. 21).
A Bauhaus era uma instituição dedicada ao ensino das artes, foi a primeira
escola a oferecer o primeiro curso de performance, uma oficina de teatro,
considerada essencial para o currículo interdisciplinar. A primeira performance
apresentada no dia 17 de agosto de 1923 (GOLDBERG, 2006. p. 88) foi constituída
por um grupo sob a direção de Schlemmer, cujo título era O gabinete de figuras I
utilizava das técnicas de cabaré que se iniciou no dadaísmo. Mas é a performance
de Gabinete de figuras II que alcançou grande sucesso, sendo uma variação da
primeira, com a projeção de figuras metálicas sobre arames que se intercalavam
sobre planos. Schlemmer, diretor teatral da Bauhaus, tinha a incrível capacidade de
criar performances inovadoras que se tornaram o centro das atividades da escola.
A escola da Bauhaus mantinha-se unida por meio do ideal de que deveria
lecionar todas as artes e se tornar um grande núcleo cultural através dos eventos
sociais que organizava. As “festas da Bauhaus” se tornaram conhecidas e eram
planejadas por Schlemmer e seus alunos, o que dava ao grupo a oportunidade de
experimentar novas performances, algumas delas foram Gabinete de figuras e Meta.
Os roteiros eram simples e definidos por palavras como: “livre de qualquer
acessório”, daí os atores representavam conforme instruções que eram definidas por
placas como: “entrada em cena”, “paixão”, “intervalo”, “clímax”, além disso, eram
postos objetos no palco como poltronas, escadarias, porta, barras paralelas, com os
quais os atores tinham de encenar conforme as ações instruídas pelas placas
(GOLDBERG, 2006, p. 89).
24
Pintor alemão. Começou a lecionar na Bauhaus em 1920, depois assume a direção do teatro da
escola.
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É Schlemmer quem desenvolveu uma teoria mais específica sobre
performance, baseado em seus vários manifestos sobre os objetivos da Oficina de
Teatro e em escritos particulares, ele analisava a problemática existente entre teoria
e prática e expressou esse apontamento na oposição clássica da mitologia grega,
Apolo e Dionísio, aqui recuperado em nosso estudo por retomar o princípio da
história do ritual que culmina no mito da morte Dionísio e o surgimento da tragédia
grega. Apolo representaria, portanto, a teoria, e a prática simbolizada por Dionísio.
O espaço onde seriam representadas as performances da Bauhaus era uma
grande preocupação para Schlemmer e seus alunos, pois deveria priorizar espaços
que desafiassem o comum e que unificassem geometria e corpo, configurando uma
complexa abstração como afirma Goldberg (2006) ao relatar uma aulademonstração de Schlemmer que contemplava a ocupação do espaço de forma
performatizada:
Em uma aula-abstração realizada na Bauhaus em 1927, Schlemmer
e alunos nos ilustram essas teorias abstratas: primeiro, a superfície
quadrada do assoalho foi dividida em eixos e diagonais
bisseccionais, completados por um círculo. Depois, arames esticados
cruzam o palco vazio, definindo o “volume” ou a dimensão cúbica do
espaço. Seguindo essas diretrizes, os bailarinos dançaram dentro da
“teia espacial linear”, com seus movimentos ditados pelo palco já
dividido geometricamente. A segunda fase acrescentou figurinos
enfatizando várias partes do corpo, levando a gestos,
caracterizações e harmonias em cores abstratas, propiciadas pelo
vestuário colorido. Assim, a demonstração levou os espectadores,
através da “dança matemática”, à “dança especial” e à “dança
gestual”, culminando na combinação de elementos do teatro de
variedades e do circo, sugeridos pelas máscaras e objetos de cena
na sequência final. (GOLDBERG, 2006, p. 94).
É durante a turnê de teatro em Dessau na Alemanha, 1926 (GOLDBERG,
2006, p. 107), que a Bauhaus obteve repercussão internacional. O repertório das
performances incluía Dança no espaço, Dança das ripas, Dança das formas, Dança
metálica, Dança de gestos, Dança de arcos, Coro das máscaras, entre outras. A
última performance realizada pela escola aconteceu em Paris em 1932, com a
apresentação do Balé triádico no Congresso Internacional de Dança, quando foi
fechada, o novo diretor , Mies van der Rohe, procurou dirigir a escola como uma
instituição privada. A Bauhaus foi de fundamental importância para difundir a arte da
performance, uma vez que reforçou sua importância como meio de expressão
independente.
É com o surgimento do Nazismo na segunda guerra mundial que a Bauhaus
foi fechada e boa parte de seus professores exilados pela guerra tiveram de buscar
asilo na América do Norte, onde é fundada uma nova escola, a Black Mountain
College, uma espécie de instituição experimental25, e nesta escola que estuda o
25
Baseava-se numa pequena comunidade que aos poucos obteve a reputação de um refúgio
educacional interdisciplinador, por isso atraia os mais diversos artistas, escritores, dramaturgos,
bailarinos e músicos.
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músico John Cage26, que desenvolveu pesquisas que fundem pensamento oriental e
música ocidental, incorporando a estas uma mistura de silêncios, ruídos e preceito
zen fundado na não previsibilidade, juntamente com o bailarino Merce Cunningham 27
que propôs uma dança fora de compasso, e teve sua pesquisa como uma referência
para a dança moderna. Sobre importância dessas personalidades para a divulgação
da performance no estado americano, Glusberg (2009, p. 23) afiança: “Rapidamente
o Black Moutain College se torna o ponto de geração das novas manifestações
artísticas, e foco da vanguarda americana e internacional, mantendo viva, dessa
forma, a corrente precursora da arte da performance.”.
Sempre buscando o imprevisível e a alogicidade como base para o processo
criativo da performance, surge em Nova York, sob forte influencia de Cage, o
movimento que ficou conhecido por happening, que tinha como conceito eventos
teatrais espontâneos que proporcionassem a participação do público, além de ser
uma junção de várias formas de arte como nos afirma Glusberg (2009) numa obra
criada por Cage e que assinala esses propósitos:
Com Untitled Event (Evento sem Título), Cage se propôs uma fusão
original de cinco artes: o teatro, a poesia, a pintura, a dança e a
música. Sua intenção era conservar a individualidade de cada
linguagem e, ao mesmo tempo, formar um todo separado,
funcionando como uma sexta linguagem. Nessa obra Cage aplicava
sua ideia sobre o acaso e a indeterminação, que ele já vinha
testando na música, nas suas tentativas, junto com o bailarino Merce
Cunningham, de buscar uma renovação no balé. (GLUSBERG, 2009,
p. 25).
Entretanto, apesar de criar um espetáculo que teve grande repercussão por
diversas partes do mundo como Japão e Europa, não foi Cage quem criou o termo
happening, mas sim Allan Kaprow28, artista da corrente do Expressionismo Abstrato,
figura central no surgimento dessa modalidade artística. O happening surge paralelo
ao movimento hippie, num período permeado pelas experimentações e divergências
culturais, o próprio nome que significa acontecimento ou evento seria uma nova
maneira de definir uma forma mais livre na relação entre atuante-texto-público, típica
do teatro.
O happening é um dos predecessores diretos da performance, tem o intuito
de buscar a linguagem como representação a partir de experimentações que estão
ligadas tenuamente pela linguagem teatral, no entanto, críticos e performers
acreditam que deve ser conservada uma distinção entre a performance e o
happening.
Contudo, a principal diferença entre esses dois gêneros condiz com a estética
da representação, no happening não há uma preocupação com o resultado estético
final e sim com o processo e a interação, pois busca apoio na anarquia, e é
realizado em situações de caos que não há a ausência de limites, objetiva envolver
26
Compositor, poeta, pintor, teórico musical experimentalista e escritor norte-americano. Compositor
da famosa peça 4'33", pela qual foi reconhecido.
27
Bailarino e coreógrafo norte-americano. Possuía como características marcantes o caráter
experimental e o estilo vanguardista. Foi responsável por mudar os rumos da dança moderna.
28
Pintor estadunidense e um dos pioneiros no estabelecimento dos conceitos de performance. Atuou
no desenvolvimento do happening nos finais da década de 50 e da década de 60.
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completamente o espectador que era agredido e importunado, e isso faz com que
muitos estudiosos não o considerem manifestação artística, mas por acontecer ao
vivo e manter a tríade – atuante, público, texto – é considerado como uma forma de
teatro. Já a performance, se preocupa com o resultado estético final, objetiva dar
ordem ao caos, pois se situa dentro de limites precisos, como não agredir nem
aborrecer o público.
A performance estaria muito mais próxima do happening, no que condiz a
essência, ambos são movimentos de contestação, se apoiam na live art (arte ao
vivo), há uma tonicidade para o signo visual em detrimento da palavra escrita, mas
se pode afirmar que essas duas artes não são a mesma expressão. O que vai
ocorrer na passagem do happening para a performance é um aumento do caráter
estético, como confirma Renato Cohen29 (2004, p. 134)
A partir da classificação em modelo mítico e modelo estético
podemos dizer que a principal característica na passagem do
happening para a performance é o “aumento de esteticidade”: se o
happening marcou a radicalização do que chamamos “teatro mítico”,
a performance vai tender para uma maior aproximação com o “Teatro
Estético”.
Uma divergência existente entre ambos seria com relação ao trabalho, no
happening há um grupo, um trabalho coletivo, enquanto na performance prevalece a
individualidade. Cohen (2004) apresenta um quadro em que podemos notar o
quanto esses dois gêneros artísticos estão próximos, separados apenas
conceitualmente por uma linha muito tênue:
Prancha 6
Período
Sustentação
Fio Condutor
Happening
1960-1970
Ritual
Sketches
(algum
controle)
Forma
de Grupal
Estruturação
Ênfase
Social
Integrativa
Objetivo
Terapêutico
Anárquico
Material
Plástico
Tempo de
Apresentação
29
Performance
1970-1980
RitualConceitual
ColagemSketches
(aumento de
controle)
Individual
(colaboração)
Individual
Utopia Pessoal
Estético
Conceitual
Eletrônico
Evento
(sem
repetição)
COHEN, Renato. Performance como linguagem. 2 ed. São Paulo: Perspectiva, 2004.
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(COHEN, 2004, p. 136).
Conforme a tabela acima fica claro que no happening o que prepondera é o
trabalho em grupo, enquanto que na performance a marca essencial é o individual
que marca o modo como o artista percebe o mundo a partir de seu próprio ego. Esse
individualismo que é fundamental na performance tem motivos sociais, nos quais os
valores cultivados são o niilismo e o individualismo, e pelo fato dos artistas que se
mantinham associados a grupos, decidirem partir para uma experiência individual.
Quanto às encenações, na performance a escolha do tema é livre e pode ser
apresentado diversas vezes, envolve uma produção sofisticada de figurinos,
iluminação etc. e a intervenção do público é menor ou nula, uma vez que prevalece
um jogo entre performer e personagem e não entre performer e público, mas isso
não significa que não poderá haver interação entre ambos, o que ocorre é que a
abertura para o público é menor, o que realmente chama a atenção é a habilidade
do artista.
No happening, não é permitido improviso durante a apresentação que
geralmente só ocorre uma única vez, depende exclusivamente do público, o artista
funciona como um mestre de cerimônias, a ênfase do espetáculo se dá na utilização
de material plástico, influência de artistas como Andy Warhol30, Claes Oldenburg31,
Alan Kaprow entre outros. Há ainda a incorporação de elementos que contribuem
para o processo de anarquia como magia, rituais terapêuticos, luta de classes etc. A
respeito do processo anárquico que é marca essencial do happening, Cohen (2004)
afirma:
No processo de atuação não existe uma limitação estético-qualitativa
para alguém atuar. O processo é anárquico. Cada um pode subir ao
palco e “dar o seu recado”: Andy Warhol faz experiências com
transexuais, Steve Reich pendura microfones sobre alto-falantes
provocando microfonias, John Cage conduz seus concertos
aleatórios, Yves Klein mergulha suas modelos nuas em piscinas de
tintas. Toda experimentação é possível, Bob Wilson trabalha com
pessoas e não com atores-intérpretes – os loucos de suas cenas
iniciais são verdadeiros loucos, suas donas-de-casa são donas-decasa e não atrizes interpretando donas-de-casa e assim por diante.
(COHEN, 2004, p. 133).
Toda essa experimentação ocasionada pela veia anárquica do happening
provoca uma ruptura com o estilo teatral convencional, já que não há uma
preocupação com a apresentação e tão pouco com representação. As situações são
imprevisíveis, de modo que o público não sabe o que vai acontecer e pode ser
requisitado a qualquer instante para representar desde uma situação corriqueira a
algo inusitado, constituindo uma espécie de experimentação da arte.
A partir dos anos setenta, o happening vai incorporar novos elementos a sua
caracterização, pois agora é imprescindível converter o artista na própria obra, o que
mais tarde vai denominar o que ficou conhecido por body art, outra grande
predecessora da performance enquanto instrumento de linguagem, assim surge a
30
Pintor e cineasta estadunidense foi a figura mais representativa do pop art.
Escultor estadunidense de origem sueca. É um dos mais importantes representantes do pop art
americano.
31
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concepção do artista como uma possibilidade de base artística da sua ação,
representando uma mensagem estética que funde em si próprio.
O happening e a body art vão agrupar tendências que vão desde a dança ao
teatro, seguindo sempre o mesmo intuito com relação ao corpo humano, a de que
ele pode ser um instrumento que concebe arte, como afirma Glusberg (2009) ao
tratar da constituição da body art como atividade artística:
O denominador comum de todas essas propostas era o de
desfetichizar o corpo humano – eliminando toda exaltação à beleza a
que ele foi elevado durante séculos pela literatura, pintura e escultura
– para trazê-lo à sua verdadeira função: a de instrumento do homem,
do qual, por sua vez, depende o homem. Em outras palavras, a body
art se constitui numa atividade cujo objeto é aquele que geralmente
usamos como instrumento. (GLUSBERG, 2009, p. 42; 43.)
Na body art o corpo é a matéria-prima e nele está imbricada a essência da
arte, assim o sujeito é o próprio objeto artístico. Essa tendência vai encontrar na
performance sua expressão mais próxima por ser um gênero abrangente e permitir
duas conotações imprescindíveis: a de uma presença física e a de um espetáculo.
Desse modo, podemos perceber que tanto o happening quanto a body art, enquanto
expressões corporais de ordem experimental, aproximam-se em alguns aspectos da
performance, uma vez que ela é multifacetada, híbrida, busca a renovação dos
conceitos tradicionais da arte, e tem como base o corpo que expressa as múltiplas
situações exteriores em forma de arte, assim as tendências que surgiram só vieram
a somar na busca por uma arte que fosse livre do artificialismo e do ilusionismo, ao
propor uma arte espontânea, livre e de grande expressão artística que é a
performance no sentido que conhecemos hoje.
Podemos afirmar que de fato, a performance enquanto gênero que se permite
flutuar por entre as fronteiras de outras linguagens artísticas, funcionou como uma
mola propulsora para que todos os movimentos desde o Futurismo italiano a body
art pudessem ter a eficácia artística que tiveram, já que permitiu aos artistas
envolvidos em cada estética experimentações das mais variadas que iam desde
uma tipo de música diferenciada feita com ruídos, uma apresentação ao vivo com
performances inusitadas até mesmo unir pintura, música e poesia numa única obra.
Tudo isso só foi e é permitido porque a performance é uma arte que não se
enquadra em limites disciplinantes, uma vez que valoriza o processo de liberdade
criativo.
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