Caracterização da variabilidade anual de índices de conforto térmico humano e comparação entre estes, para o Estado de São Paulo Rafael Jonas Righi Batista 1 , Gláuber Camponogara 2 , Fábio L. T. Gonçalves 3 1 Autor. Mestrando Meteorologia Instituto de Astronomia e Geofísica – USP – Rua do Matão, 1226 – Sala 104 – Cidade Universitária – São Paulo – SP – Brasil, e-mail: [email protected] 2 Colaborador. Mestrando Meteorologia IAG – USP e-mail: [email protected] 3 Orientador. Professor MS-3 IAG – USP e-mail: [email protected] RESUMO: Este trabalho tem como intuito fazer uma análise a cerca da distribuição média anual de alguns índices de conforto térmico humano para o Estado de São Paulo e realizar uma comparação entre eles dadas as diferentes variáveis meteorológicas específicas adotadas. Os dados com médias mensais de longo termo das variáveis em questão foram obtidos do NCEP/NCAR compreendendo um período de 28 anos, de 1968 à 1996. Foram utilizados os Índices de Desconforto (ID), Temperatura Efetiva (TE) e Temperatura Efetiva em função do Vento (TEv). Os resultados evidenciam uma distribuição sazonal destes valores ao longo do ano e indicam que as regiões oeste e litorânea do Estado apresentam uma sensação térmica mais amena em comparação com a faixa central. Também verifica-se uma significativa diferença entre os índices pelo fato de um levar em consideração o vento, que constitui um fator importante relacionado ao processo de convecção. ABSTRACT: This work aims to analyze the distribution around the average of some human thermal comfort index for the State of São Paulo and make a comparison between them due to different meteorological variables specific adopted. Data with long-term monthly averages of the variables in question were obtained from the NCEP / NCAR including a period of 28 years, from 1968 to 1996. We used the Discomfort Index (DI), Effective Temperature (ET) and Effective Temperature taking the wind speed into account (TEv). The results show a seasonal distribution of these values throughout the year and indicate that the western and coastal regions of the state have a milder thermal sensation compared to the central belt. Also there is a significant difference between these indexes due to the fact that some of them consider the wind which is an important factor related to the convection process. Palavras-Chave: Índices de Conforto Térmico, Sazonalidade, Biometeorologia. 1. INTRODUÇÃO A Biometeorologia Humana comporta os estudos relativos à relação atmosfera/homem, incluindo àqueles relacionados ao conforto térmico, que segundo Fanger (1972) pode ser definido como a condição da mente que expressa satisfação com o ambiente ou a sensação de neutralidade térmica experimentada pelo ser humano, em determinado ambiente. A quantificação da interação entre as variáveis meteorológicas e sua conseqüente influência nos seres humanos se dá através da utilização de determinados índices de conforto térmico. Com base nestas equações podemos relacionar determinados valores à respostas fisiológicas específicas levando-se em consideração o alvo de estudo (que pode ser caracterizado por exemplo, como um grupo de diferentes faixas etárias e localidades, ou com alguma patologia em particular etc). Desta forma, Thom (1959) propôs o Índice de Desconforto (ID), mais tarde adaptado por Giles et al. (1990), Missenard (1937) a Temperatura Efetiva (TE) e Suping et al. (1992) a Temperatura Efetiva em função do vento. Assim, o objetivo do presente trabalho é fazer uma análise da variação média mensal destes índices ao longo do ano para o Estado de São Paulo, visando também a comparação entre os mesmos considerando as diferentes variáveis meteorológicas envolvidas em seu cálculo. Desta forma pretende-se construir uma visão mais ampla com relação à distribuição destes índices para que em estudos futuros possamos melhor avaliar apenas uma região específica (como a região metropolitana de São Paulo por exemplo). 2. METODOLOGIA Para a execução deste estudo foram utilizados dados de reanálise obtidos junto ao NCEP/NCAR (National Centers for Environmental Prediction / The National Center for Atmospheric Research). A opção pela série de dados deste centro se deve ao fato do mesmo disponibilizá-la para um período de tempo considerável (a partir de 1948). Apesar de estarmos nos referindo à dados meteorológicos de superfície globais, é possível utilizá-los para uma análise mais detalhada (respeitando sempre as limitações de grade), como neste caso, a região que caracteriza o Estado de São Paulo. Desta forma, foram definidas as latitudes de -30° à -13° e as longitudes de -58° à -37° (suficiente para compreender toda a área de interesse) para uma série de médias mensais de longo termo com alcance temporal de 28 anos, de 1968 à 1996. Os índices de conforto térmico selecionados foram ID, TE e TEv. A opção por estes levou em conta dois critérios: variáveis disponíveis e melhor adaptação ao clima desta região, considerando o trabalho de Maia et al. (2002). Deste modo, das variáveis temperatura do ar (Ta), umidade relativa (UR) e velocidade do vento (v) foram gerados os perfis comportamentais médios dos índices de conforto térmico ao longo do ano para o Estado de São Paulo. 3. RESULTADOS Para analisarmos os campos de ID, TE e TEv nas Figuras 1, 2, 3 e 4 levamos em consideração a Tabela 1, que apresenta as condições de conforto térmico estabelecidas por Fanger (1972) e adaptadas por Maia et al. (2002) para a região metropolitana de São Paulo. De um modo geral, observamos nas figuras que as faixas de conforto variam de acordo com o local e mantém uma característica sazonal. Assim, notamos que enquanto determinadas partes do Estado experimentam uma sensação térmica de “frio moderado”, outras estão “ligeiramente frias” e também “confortáveis” (termicamente neutras). Tabela 1 – Zonas de conforto térmico e respectivas respostas fisiológicas estabelecidas por Fanger (1972) e adaptadas por Maia et al. (2002). ID, TE, Tev (°C) menor que 13 13 a 16 16 a 19 19 a 22 22 a 25 25 a 28 28 a 31 31 a 34 maior que 34 Sensação térmica Muito frio Frio Frio moderado Ligeiramente frio Confortável Ligeiramente quente Quente moderado Quente Muito quente Grau de estresse fisiológico Extremo estresse ao frio Tiritar Ligeiro resfriamento do corpo Vasoconstrição Neutralidade térmica Ligeiro suor, vasodilatação Suando Suor em profusão Falha na termorregulação A Figura 1 apresenta a distribuição dos índices para o mês de Janeiro, de tal forma que 1a é referente à ID, 1b à TE e 1c à TEv. Notamos que ID e TE apresentam resultamos semelhantes pelo fato de levarem em consideração as mesmas variáveis (temperatura do ar e umidade relativa), enquanto que TEv conta com o incremento da variável velocidade do vento. Esta componente tem um efeito considerável nos processos de transferência de energia por convecção assumindo um caráter que pode variar de acordo com as condições do tempo (favorecendo para que as pessoas sintam um frio mais intenso ou para que em altas temperaturas a sensação térmica seja amenizada). De acordo com os índices ID e TE (Figuras 1a e 1b), observamos também que as porções oeste e litorânea do Estado encontram-se na zona termicamente neutra, enquanto que a região central encontra-se ligeiramente fria. Já para o índice TEv (Figura 1c) toda a região paulista está na média ligeiramente “fria” ou “fria moderada”. Figura 1 – Média dos índices para o mês de Janeiro. Em a ID, b TE e c TEv. De maneira semelhante analisamos as Figuras 2(a, b e c), 3(a, b e c) e 4(a, b e c), representativas dos meses de Maio, Julho e Novembro, respectivamente. A escolha destes meses específicos se deveu ao fato de serem representativos das estações do ano, evidenciando o comportamento sazonal destes índices, originado pela distribuição anual média das variáveis meteorológicas envolvidas (este mesmo trabalho constará da análise e exibição de todos os meses do ano em sua versão completa). Na Figura 2a, b e c (Maio) notamos já uma redução nos índices e conseqüente alteração no grau de estresse fisiológico ao qual as pessoas são sujeitas, dada a aproximação do inverno. Entretanto o padrão apresentado na Figura 1 é mantido, com a região central sendo menos amena que a faixa oeste e litorânea (cuja influência do Oceano Atlântico é marcante). Na Figura 3a, b, e c temos o mês de Julho, já inserido no período de inverno. Os índices ID e TE seguem indicando sensação térmica entre 17°C e 19°C, enquanto que TEv varia de 12°C a 16°C, com regiões de “muito frio” a “frio moderado”. Já na Figura 4a, b e c observamos o mês de Novembro com temperaturas médias em elevação (correspondendo à aproximação do Verão) e conseqüente mudança de sensação térmica. Fica evidenciada mais uma vez a diferença significativa entre os índices de conforto térmico. Comparando as Figuras 4a e 4b com 4c vemos que enquanto as duas primeiras apontam para graus de estresse fisiológicos médios mais amenos a terceira indica que em certas regiões de São Paulo (como na Região Administrativa de São José dos Campos) a sensação térmica média é de 15°C, “frio”. Figura 2 – Média dos índices para o mês de Maio. Em a ID, b TE e c TEv. Figura 3 – Média dos índices para o mês de Julho. Em a ID, b TE e c TEv. Figura 4 – Média dos índices para o mês de Novembro. Em a ID, b TE e c TEv. 4. CONCLUSÕES Como pode ser visto o comportamento destes índices segue um caráter sazonal ao longo do ano, variando também de acordo com a região. Áreas litorâneas apresentam uma menor variação destas medidas pois estão sendo influenciadas pela proximidade do Oceano Atlântico, indicando que pessoas que vivem nesta área tendem a experimentar sensações térmicas em média mais amenas do que as de outros lugares, como por exemplo as da região central. Determinadas faixas etárias da população, tais como aquela acima de 65 anos de idade, são mais suscetíveis às condições e variações no tempo, respondendo de maneira mais direta ao grau de estresse fisiológico ao qual estão sujeitas. Entretanto, antes de partirmos para uma maior utilização destas ferramentas, um estudo mais apurado relacionado às diferenças entre os índices de conforto térmico (especificamente humanos) precisa ser feito. Na verdade, devemos levar em consideração o fato de que estes são feitos em outros países para populações com características diferentes, pois sabemos que os limiares de conforto variam de acordo com a adaptação que uma determinada população tem com relação ao clima da região onde habita. Além disto, fica evidenciada a significativa mudança gerada pela consideração da variável velocidade do vento. No caso destes índices específicos, notamos um comportamento semelhante entre ID e TE pois estes levam em conta a umidade relativa e a temperatura do ar, embora tenham formulações diferentes. Já analisando TEv, considerando o vento e sua velocidade, vemos uma redução significativa destes índices, representando de forma mais real a sensação térmica e a influência da transferência de energia através da convecção. Assim, um estudo mais aprofundado se faz necessário para que seja possível determinar com maior exatidão a contribuição de cada variável meteorológica específica e sua posterior atuação em conjunto. AGRADECIMENTOS: O autor gostaria de agradecer à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que proporciona o auxílio necessário para que estudantes tenham a possibilidade de desenvolver suas pesquisas científicas, bem como ao pessoal do IAG-USP, pelo companheirismo e ajuda. 5. REFERÊNCIAS FANGER, P. O. Thermal Comfort. McGraw-Hill, New York, 1972. GILES, D. B.; BALAFOUTS, C.; MAHERAS, P. Too Hot For Comfort: The Heatwaves in Greece in 1987 and 1988. International Journal of Biometeorology. Vol. 34, Nº XX, pp. 98104, 1990. MAIA, J. A.; GONÇALVES, F. L. T. Uma análise do conforto térmico e suas relações meteorotrópicas na cidade de São Paulo – Parte 1. XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz do Iguaçu, Paraná, 2002. MISSNARD, A. L’home et lê climat. Paris, 1937. NCEP/NCAR http://www.esrl.noaa.gov/psd/data/gridded/data.ncep.reanalysis.html, último acesso em 09/06/2010. SUPING, Z.; GUANGLIN, M.; YANWEN, W.; JI, L. Study of the relationships between weather conditions and the Maraton Race, and of meteorotropic effects on distance runners. Internacional Journal of Biometeorology. Vol. 36, N° XX, pp. 63-68, 1992. THOM, E. C. The discomfort index. Weatherwise. Vol. 12, pp. 57-60, 1959.