FONTES LINGUÍSTICAS E EXTRA-LINGUÍSTICAS DA VARIAÇÃO DOS SISTEMAS VOCÁLICOS: ABORDAGENS FONÉTICAS DOS EFEITOS DOS ESTILOS DE FALA NAS VOGAIS ORAIS EM PORTUGUÊS EUROPEU DOUTORAMENTO EM LINGUÍSTICA ROMÂNICA Véronique Delplancq Provas concluídas em 13 de Março de 1996 RESUMO O estudo da fala pressupõe a descrição de um processo de produção extremamente complexo, quer pela quantidade de informação veiculada, quer pela grande variabilidade dos parâmetros em jogo, quer pela dificuldade das medições. O som é transmitido graças às variações de pressão no meio envolvente. Mas o sinal da fala não é somente uma entidade física, ao contrário do que pensaram muitos investigadores (nomeadamente o famoso Fant) que consideravam a vogal como um fenómeno periódico sem outras características. Os fenómenos ligados à produção das vogais e os parâmetros que influenciam a estrutura vocálica foram objectos de uma quantidade importante de estudos. A interacção entre a acústica, a dinâmica dos fluidos e a electrónica permitiu a elaboração de modelos do tracto vocal e de métodos que pretendiam medir as frequências dos formantes. As etapas primordiais desta evolução são apresentadas num primeiro tempo no trabalho. As limitações das teorias assim elaboradas surgiram quando os foneticistas se interessaram pelos problemas de síntese e de reconhecimento da fala. Considerar também as variáveis humanas ligadas aos aspectos comunicativos permitiu elaborar novos modelos, sempre afinados, revistos mas raramente aplicáveis na prática. Em particular, a interacção com a sócio e a psicolinguística que está na base da introdução do conceito de “estilos de fala”. Os interesses de prosseguir as investigações sobre a influência dos estilos de fala são múltiplos. Por um lado, demonstram o carácter inevitável da importância dos comportamentos humanos na descrição fiel da estrutura vocálica e da sua evolução. Por outro lado, permitem repensar uma definição da estrutura vocálica, fonte de progresso no tratamento do sinal da fala. O objectivo da investigação é observar os efeitos dos estilos de fala sobre a estrutura vocálica e evidenciar uma lógica na dinâmica dos movimentos dos elementos da estrutura vocálica. A outra finalidade é propor uma nova modelização. Algumas línguas românicas já tinham sido analisadas deste ponto de vista. Dois estilos são opostos: a fala espontânea (tipo discurso seguido produzido sem constrangimento) e a fala de laboratório (pouco natural). Nesta investigação, o português europeu é a língua escolhida para ser estudada. Um capítulo desta tese é consagrado à evolução dos trabalhos de fonética portuguesa desde 1883 e à descrição do fenómeno de redução vocálica ligado à acentuação, acentuação que tem um valor fonológico em português e que dá origem aos três sistemas vocálicos portugueses. Com a participação de dez lusófonos, um vivendo na Bélgica e os outros residentes em Viseu (Beira Alta, Portugal), os resultados experimentais acompanhados de um tratamento estatístico mostram modificações significativas na organização das zonas de dispersão vocálica e, por consequência, no grau de risco de confusão das produções das vogais. O sistema constituído pelas produções vocálicas está em mutação perpétua. A variação da estrutura vocálica, a sua plasticidade, testemunham a sua dependência em relação à comunicação oral humana. No caso da fala espontânea, as áreas de dispersão têm uma tendência a alargar-se e afastar-se da periferia das estruturas vocálicas. O locutor hipoarticula. Daí a conclusão que a redução vocálica é um fenómeno muito complexo que não se pode resumir a uma centralização simples das produções no seio dos planos formânticos: implica um equilíbrio entre dois aspectos aparentemente antagónicos inerentes ao locutor: o desejo do esforço minimizado conjugado às intenções de interagir com o mundo exterior. O conceito de centralização é discutido no seguimento das observações dos resultados e a expressão “afastamento da periferia” das realizações vocálicas espontâneas é apreciada como a mais pertinente. Este movimento está quantificado via um cálculo de ângulo nas estruturas vocálicas. Deste modo, o modelo inicial está melhorado de forma significativa. Este afastamento efectua-se numa direcção que depende quer do locutor quer da categoria vocálica e está acompanhado de uma variação de superfície. Ao nível temporal, as vogais obtidas na fala espontânea têm uma duração reduzida comparandoas às vogais observadas em fala de laboratório. Os resultados obtidos e as suas explorações diversas conduzem a uma reflexão sobre a co-articulação. A influência dos sons vizinhos, definição elementar da co-articulação, parece mais marcada em fala de laboratório. A relação estabelecida entre esta investigação e os fenómenos de fonética combinatória constitui a base de estudos futuros que terão de ter em conta a variação de estilo de fala através de uma interacção de forma complexa.