A NARRATIVA HISTORIOGRÁFICA EM UMA HISTÓRIA DA POESIA BRASILEIRA, DE ALEXEI BUENO Elizabeth Suarique Gutiérrez (FURG) Conhecer uma versão da história da poesia brasileira por Alexei Bueno pode comparar-se a um passeio pelo museu; um labirinto de longos corredores, cheios de retratos em que aparecem os tesouros de um colecionista. O leitor, guiado por uma voz coletiva, vai subindo e descendo as escadas, olhando as imagens inéditas, cortesia do seu anfitrião. Em cada retrato o guia expressa nos termos mais reveladores a sua paixão ou sua rejeição em relação ao mosaico poético apresentado. O presente trabalho trata-se de uma resenha crítica sobre Uma história da poesia brasileira (UHPB) publicada em 2007, que já faz polêmica nos meios públicos. A repercussão do cânone da UHPB foi desenvolvida na dissertação de mestrado intitulada Alexei Bueno e a escrita de uma história da poesia brasileira (2011), de Bruno Marques Duarte, que tem experiência e conhecimento da poesia brasileira para apontar os principais aspectos sobre a repercussão no cânone literário: A inovação canônica só surge nos dois últimos capítulos de UHPB, o que torna todos os anteriores uma repetição das outras histórias da poesia brasileira. Desprende-se que o historiador tem um posicionamento discursivo de artista, o que é lamentável em alguns momentos, visto que ocorre seguidamente uma explanação suficiente a respeito de suas escolhas teóricas, tornando o texto, em diversas passagens, um diário de leitura de poesia; em outras palavras, o autor afirma, mas não explica. (MARQUES, 2011: 124) Com este antecedente, mesmo que a sua pesquisa seja bem elaborada, Marques deixa uma lacuna em relação à narrativa historiográfica, pois o perfil de poeta, editor e crítico caracteriza a escrita da UHPB de Bueno, tanto no que toca a seus pressupostos estéticos quanto à linguagem de seus comentários e a escolha de seus poetas estrela. Deste modo, é possível fazer uma análise dos juízos de valor que podem gerar outras leituras e apreciação sobre esta história. A escrita da UHPB em análise se caracteriza por um tom afetivo e pessoal, implacável com os poetas que têm presença no corpus da poesia brasileira, mas o autor não enxerga neles qualidade da arte poética. Ao se referir a Sousândrade, afirma o historiador: O que primeiro salta à vista do leitor de Sousândrade, tanto nas Harpas selvagens como na quase totalidade d’O Guesa, assim como nos dispersos, para nos atermos às partes “tradicionais” de sua poesia, é a invariável dança do verso entre a dureza e a frouxidão. O verso de Sousândrade é invariavelmente um instrumento desconfortável, uma roupa geralmente muito apertada ou muito larga para o corpo da ideia que quer conter. Daí, em parte, o verbalismo absolutamente oco de alguns versos, recheados de adjetivos sem função alguma (BUENO, 2007: 105). Por outro lado, ao se referir aos poetas de seus afetos, o desenvolvimento abrange várias páginas e repete trechos para expor sua influência na poesia brasileira1. No trecho a seguir, por exemplo, se descreve o virtuosismo de Augusto dos Anjos e de seu panteão poético: Essa qualidade de adequação vocabular, característica da grande poesia em todos os tempos, percorre a totalidade da obra madura do poeta de “o lamento das coisas” (...) em tudo, nesses momentos de perfeita realização, a marca desse fenômeno da genialidade, especifico do mundo da arte, por ser não um grau superior de uma qualidade intelectual qualquer, mas um estado absolutamente pessoal, involuntário, irrepetível, intransferível e inadquirível de colaboração do inconsciente com o consciente, um milagre que se confunde com um homem e não se repete, chame-se ele Camões, Gil Vicente, Pessanha, Castro Alves, Antônio Nobre, Pessoa, Sá Carneiro, Cruz e Sousa, Cesário Verde, Augusto dos Anjos, Cecilia Meireles, etc. Daí a importância secundaria, humanamente falando, das correntes genealógicas e fecundantes na historiografia de uma literatura. (BUENO, 2007: 251) Dos autores citados, Alexei Bueno organizou como editor a Obra completa de Augusto dos Anjos (1994), edição comentada de Os lusíadas e dos Sonetos de Luís de Camões (1993) e (1998), Obra completa de Sá Carneiro (1995) e atualização da Obra completa de Cruz e Sousa (1995). Deste modo, UHPB tem como base a longa trajetória do poeta, editor e leitor de poesia que reafirma suas afinidades literárias. Embora faça referência também a autores da poesia portuguesa, da qual também tem feito antologias, é visível, porém, em Bueno a busca de um herói, que neste caso é a arte poética brasileira; a perfeição do poema na obra realizada pelos autores que ele conhece e admira. O conceito de história em Alexei Bueno afasta-se da objetividade positivista e evolucionista. O autor se opõe à ideia de progresso, já que em arte não se pode afirmar que o presente é melhor que o passado. Segundo o prefácio, a sua perspectiva historiográfica se norteia com o seguinte argumento: “o que buscamos neste livro é justamente traçar uma linha histórica de poesia brasileira com o mínimo 1 O poema “cântico do calvário” é citado duas vezes no capitulo a explosão romântica. A primeira citação (p. 100) se usa para comparar o sentimento de morte dos poetas românticos, o mesmo trecho de 21 versos se cita no extenso comentário dedicado a Fagundes Varela (p. 124). de idiossincrasias, e com uma visão aguda de cada autor dentro de sua visão de mundo, sua época e estilo” (BUENO, 2007: 11). Um exemplo disto é o fio condutor do capítulo sobre o romantismo no qual a narração se dedica ao fado e a morte prematura dos poetas apresentados, por isso suas biografias se entrelaçam e suas idades são comparadas; seus destinos são relacionados diretamente com suas temáticas poéticas: Todos sabemos da hecatombe que ocorreu com os nossos maiores poetas românticos, essa geração de uma qualidade poética talvez não igualada, ou apenas no modernismo, em nossa literatura. Dos sete realmente grandes, Alvares de Azevedo morreu com vinte anos, Casimiro de Abreu com 21, Junqueira Freire com 22, Castro Alves com 24, Fagundes Varela com 33, Laurindo Rabelo com 38 e Gonçalves Dias com 41. (BUENO, 2007:101). Ao descrever a causa das mortes desses escritores, Bueno enfatiza suas doenças e a intercala com citação de poemas românticos dedicados à morte. (lugar comum). Para referir-se aos poetas românticos e a vida boêmia, ideia que não tem a ver exatamente com uma análise da estética ou do estilo, mas com a história de biografias e anedotas. Este tipo de explicação dos poemas se afasta do norte estético pretendido por Bueno, conforme se percebe quando o historiador se refere a Casimiro de Abreu: De volta ao Brasil no ano seguinte, fixa-se na corte, trabalhando sem nenhuma vocação nos negócios do pai. Dessa relação difícil nasceu uma basta jeremiada epistolar, na qual Casimiro, que era também excelente e ágil prosador – o que provam suas cartas e uns poucos fragmentos ficcionais- se queixava infinitamente do progenitor, no melhor estilo romântico, sob a mascara do boêmio incompreendido, à la Murger. A verdade e que o pai, além de periodicamente lhe socorrer os apertos financeiros, financiou a publicação d’As primaveras, em 1859. Pela editora de Paula Brito, que reunia, na sua livraria do Largo do Rossio, a nata da literatura de então. Pouco depois no ano seguinte, o seu pai falece, seguido em poucos meses pelo filho tuberculoso, ambos, já finalmente, reconciliados. Os dois repousam, lado a lado, no belíssimo cemitério aos fundos da igreja da barra de São João, num promontório à beira-mar, ao lado da foz do rio. (BUENO, 2007:110). O extenso trecho entra em contradição com a advertência primeira do autor sobre a rejeição de uma explicação sociológica e dos excessos de dados biográficos. Neste caso, a biografia adquire uma importância maior em toda a estrutura do capítulo, de forma que a Petite histoire ocupa maior espaço que a própria análise estilística dos poemas. O trecho se refere à escrita epistolar –não citada-, na verdade, pouco adequada ao tema e ao estilo poético do jovem Casimiro, embora este parágrafo tenha uma bela descrição paisagística, o autor não consegue fugir da descrição arquetípica do poeta romântico, embasado num ideal de herói boêmio e trágico com destino fixo e determinado, que prevê sua própria morte na escrita poética. Deste modo, a ideia de idiossincrasia2 não é muito clara, ao que parece, ele não alcança o objetivo, mesmo que faça uso de tantas frases qualificativas nas quais o gosto pessoal marca a análise para cada autor. O expresso no prefácio não se confirma quando se verifica os demais capítulos da presente UHPB. Ao fazer uma análise do conceito de história presente na obra em estudo, encontra-se uma ambiguidade, pois seu prefacio indica: O ponto de vista com que nele analisamos a poesia brasileira é estético, não sociológico ou outros, ainda que não haja obra independente de sua moldura sócio-temporal. Justamente por isso não nos furtamos a comentar fatos históricos ou biográficos de importância na gênese de poemas ou de poetas. Se há obras nas quais a biografia de autor parece, ao menos externamente, de somenos importância, em outras ela é absolutamente definidora. (BUENO, 2007: 12) A estrutura pela qual organiza a sua narrativa é o movimento pendular entre o apogeu e a decadência. Esta intenção é evidenciada nos capítulos sobre o romantismo, estética onde melhor se desenvolveu a poesia brasileira, conforme o historiador, ao passo que no parnasianismo, considerado como uma estética baixa, a poesia volta a declinar, emergindo outra vez com o simbolismo. Com as vanguardas do século XX, tudo parece dissolver-se num marasmo de tendências e estilos no qual é muito difícil estabelecer os patamares para uma crítica literária. Assim, o plano de organização historiográfica enfraquece, e tende a desaparecer nos capítulos finais, uma vez que o discurso da narrativa se restringe a uma sucessão de autores acompanhados de um comentário crítico. Sendo consistente com esse movimento pendular da evolução da poesia brasileira, Bueno harmoniza a apresentação de duas tendências, este é um êxito visível na sua narração, pois sua UHPB não se mostra como uma história de unidade totalizante nem tem como herói uma poesia de cor nacional. Esse movimento pendular entre o Apogeu e a decadência concorda com a teoria histórica de Yury Tinianov, em que os períodos literários elevam o fato de realização artística da obra de arte e sua consequente decadência na imitação e alienação dos estilos e nas personalidades. No entanto, a rejeição é mais severa que a inclusão, pois o que se inclui sobre o concretismo, por exemplo, é muito pouco. Embora, a distância temporal é de mais de 2 S. f. maneira própria de ver, sentir, reagir, de cada individuo. quatro décadas, nesta história não se considera para análise um só poema do estilo concretista que tenha uma forma na sua tipografia, em comparação ao que se encontra na História concisa da literatura Brasileira de Alfredo Bosi (1994), que pelo menos dedica 15 páginas a este período poético. Alexei Bueno faz uso do termo sincretismo para referir-se à transição do parnasianismo ao modernismo3. Novamente o que prevalece nesta história são as personalidades. O critério estético se espalha em comentários críticos dos poetas, que segundo o autor, pode ser uma mostra da produção poética do século XX. O sentido da história de Alexei Bueno é orgânica, pois cada geração aporta na geração seguinte ou traz ao presente a tradição de seus antecessores. A UHPB segue um sistema poético que não se compara, a bem dizer, com o sistema macro de Antônio Cândido; conserva o respeito pela tradição e não tenta controvertê-lo em sua organicidade. Neste sentido, a sua história é ordenada por gerações poéticas dentro das principais escolas poéticas dos séculos XVI a XX. Assim, o conceito de história é menos explícito, se bem que no prefácio ele se contrapõe ao olhar sociológico e ao positivismo evolucionista, no desenvolvimento dos capítulos, a sua ordem é de autores e obras. As individualidades determinam cada período, estas são encadeadas em séries geracionais, mais pela afinidade estética que em uma cronologia rigorosa. Neste sentido, a UHPB resulta interessante, pois convida o leitor a estabelecer relações entre os poetas, mas não faz uma conceitualização rigorosa dos períodos. O conceito de literatura segue a linha estética que considera a arte literária, neste caso a poesia, como um fenômeno da linguagem. A procura dessa literariedade se julga a partir do uso eficaz das formas estéticas como meio da expressividade, seguindo a trilha estética da história da literatura de José Verissimo, dando continuidade à tradição poética ocidental, contida nas formas clássicas da poesia e da epopeia; privilegiando o respeito aos padrões estabelecidos, indicando que a boa poesia feita no Brasil não precisa ter o “espírito brasileiro”, mas pretender a visões mais universais. As duas definições mencionadas do objeto poético são semelhantes e complementares: faz da poesia um som, um sentido, um estranhamento, uma revelação, necessitando de um leitor extremamente sensível para compreendê-la. A escrita de uma história da poesia é feita porque se considera que ainda não se disse tudo sobre o assunto - existe um desconforto - cada versão de uma história da poesia 3 Alfredo Bosi diz ao respeito: “Creio que se pode chamar pré-modernista (no sentido forte da premonição dos temas vivos em 22) tudo o que, nas primeiras décadas do século problematiza a nossa realidade social e cultural.” (Bosi p. 306). Para Alexei Bueno tal diferenciação não precisa se constituir em um período poético. brasileira é uma resposta na qual o autor tem o privilegio de agregar, omitir ou julgar o que considera como poético na tradição. No entanto, os patamares do cânone tradicional permanecem em Alexei Bueno. A análise que o autor faz dos textos tem um rigor estilístico, isto é, o caráter científico adotado pelo formalismo. Os comentários são construídos a partir da estilística do texto; a versificação, a métrica e a rima tem uma consideração grande nesse sistema, no qual o leitor é importante, mas às vezes o excesso biográfico é encarado como uma distração que afasta a narrativa historiográfica de critério estético como seu principal objetivo. Uma possível hipótese de leitura é que a UHPB é uma ampliação do corpus literário para destacar a frutífera produção poética de Brasil durante cinco séculos, expressão reafirmada na contracapa como a constituição de uma tradição, pelo meio da apresentação de autores e obras. O ponto de início coincide, então, com a história de Afrânio Coutinho que considera a literatura brasileira a partir da chegada dos portugueses ao território americano. Os capítulos derradeiros de sua história da literatura traz uma inovação, pois inclui outros estilos da criação popular e da tradição poética. A novidade, no entanto, apresenta uma distinção, não se integra organicamente à estrutura geral da história, haja vista esses dois capítulos estarem afastados do corpo da narrativa: “os capítulos avulsos” como diz o autor. Este comentário faz pensar que embora haja um reconhecimento de outras formas poéticas, o historiador não tem vontade de articulálas ao sistema já estruturado de uma história geral da poesia brasileira. Também não é de seu interesse construir uma poesia representativa de cada uma das regiões do Brasil, o autor não se detém nos regionalismos; faz destaque da inconfidência mineira, mas não faz uma divisão pela geografia brasileira, embora os autores sejam, na maioria, dos centros urbanos. Há um conceito de arte que abrange o critério estético, tem a ver com a obra de arte como um constructo completamente realizado na linguagem. Deste modo, é possível pensar que o herói de UHPB é a arte poética. A exclusão do concretismo tem justificativa nesta ideia: Pode haver poesia sem versos, o que é obvio, e neste livro nos reportamos a alguns admiráveis poemas em prosa de um Bandeira, de um Jorge de Lima, de um Drummond, entre outros; admitimos que possa haver poesia sem sintaxe, ou sem mais coisas, mas sem palavras, sem letras, não. Exemplos disso encontramos no soi disant poema-processo, ou em muita autodenominada poesia visual. Tudo isso pode pertencer às artes visuais, pode ser brilhante, pode ser qualquer coisa, mas nada tem a ver com literatura. (BUENO, 2007: 14) Porém uma das caraterísticas da sua narrativa é nomear a obra-prima dos poetas; é comum encontrar no percurso desta história afirmações como: “o melhor dos poemas para o público da época”, “um de nossos mais importantes poemas”. Portanto o ideal da poesia como um sentido estético e idealista poderia ter implicitamente uma série estética a partir deste critério. O seu jeito de avaliação da escrita poética se baseia na descrição estilística, embora ele afirma fazer uma análise estética, por isso se torna ambíguo o que ele diz no prefácio sobre ponto de vista estético; às vezes parece que a estética e a estilística, na obra de Bueno, são termos semelhantes para avaliar a qualidade da poesia. A linguagem usada nas descrições das obras dos poetas, as opiniões de Alexei Bueno com relação a suas preferências poéticas em contraste às intenções projetadas no prefácio, possibilita a leitura desta história da poesia como uma historiografia literária afetiva apesar de si mesma, isto é, sem ser parte dos critérios historiográficos explícitos no começo do texto, a história se desenvolve numa retórica de juízos de valor, revelando um conceito muito pessoal de leitor. Neste sentido a observação de Bruno Duarte ao qualificar UHPB como diário de leitura pode ser fornecida a partir das considerações que faz a professora Heidrun Krieger Olinto em seu artigo sobre historiografia afetiva: O papel importante de processos emocionais e a sua articulação com sistemas cognitivos na elaboração de um saber, revela-se, por exemplo, em expressões afetivas tais como surpresa, assombro, estranhamento, frustração, resignação, jubilo, indignação, fascinação, aversão, entusiasmo, volúpia, encantamento, melancolia, resistência, nervosismo, excitação, decepção e medo diante do novo e de seus efeitos motivacionais. (OLINTO, 2009: 41) Além dos trechos citados, acham-se na UHPB, expressões carregadas de cada um destes sentimentos que persuadem ao leitor a acreditar nele, aproveitando sua autoridade como poeta falando de poesia. No entanto, o conceito de historiografia afetiva é mais profundo, pois demanda a elaboração de um saber, “uma maneira de teorizar o fenômeno literário enquanto complexo processo de comunicação estética, cultural e social” (OLINTO, 2009:39). A pergunta que suscita a leitura desta historia é: até que ponto os juízos de valor expressados de jeito emotivo podem ser avaliados como construções criticas? No prefácio, o autor declara sua distância com a crítica sociológica, tanto que “precisou cercar-se de expressões ditas científicas, ou seja, jargão de laboratório para se sentir segura” (BUENO, 2007:12), isto para referir-se a periodização poética das vanguardas, pois segundo ele, há obras e autores que permanecem na cena poética, mas pelo seu protagonismo em eventos emblemáticos (como a semana modernista de São Paulo e os movimentos de contracultura no Brasil e as amizades dos poetas e os meios de difusão)4. Bueno espera que a crítica estilística, isto é, a descrição da métrica, da rima, a procura pela correspondência com os movimentos poéticos da Europa, sejam os alicerces para a sua avaliação da qualidade estética da poesia apresentada. Embora esta estratégia aconteça com sucesso, nem todos os poetas são objetos desta análise, de modo que os poetas por ele escolhidos como o melhor da poesia brasileira abrange páginas de comentários e trechos de poemas. Alexei Bueno não poupa elogios para se referir aos poetas e poemas de seu gosto. No entanto, em relação aos poetas das vanguardas, produto do sincretismo como afirma o historiador, as análises não são sequer desenvolvidas. Se cria deste modo um desequilíbrio no trânsito desta história. se se quer comparar com outras historias da literatura, como já se mencionou, incluem aqueles movimentos da segunda metade do século XX. Um detalhe caraterístico desta história em seu desenho gráfico é a apresentação dos retratos dos autores, porém a semelhança com uma galeria de museu evoca a organização de panteão pessoal, pois a maioria das reproduções fotográficas é propriedade do Alexei Bueno, o que não deixa dúvida sobre quanto fica comprometido o gosto pessoal do autor. Com esta ideia se confirma a UHPB como uma história afetiva, expressada em juízos de valor, na linguagem de caráter qualificativo que alterna os bons e maus poetas num sentido de alto à baixo. Alexei Bueno estabelece uma postura crítica em relação às classificações que esquecem aqueles poetas que não tem uma homogeneidade na sua obra, aqueles autores que não podem se descrever em uma simples concordância com os estilos poéticos já estabelecidos para uma época determinada. Se poderia afirmar que um dos objetivos da UHPB é restituir a uma história da poesia aqueles poetas que pela sua “indeterminação” ficam afastados, neste sentido também se faz compreensível sua rejeição sobre a tarefa academista que só se encarrega dos casos fáceis, em quanto a complexidade da arte poética, não tem quem se importe em reconhecer. Segundo o autor a variedade na escrita de alguns dos poetas pode ser um motivo para ser esquecidos. Esse olhar também opera para reconsiderar a presença de outros autores que não merecem fazer parte da formação da arte poética brasileira como se evidencia no parágrafo sobre Sousândrade. Para elo, o autor conserva muito bem essa estrutura narrativa que vai do ruim ao mediano até o excelente. Um dos aportes de Schmidt para a compreensão da teoria da história da literatura foi precisamente considerar os discursos historiográficos como produções humanas, com: 4 E precisamente sobre este assunto que se gerou uma briga em meios públicos sobre o juízo que Alexei Bueno faz sobre o Tropicalismo. Numa coluna de jornal de 2007 o autor Caetano Veloso se refere ao comentário de Alexei Bueno quem considera o tropicalismo como um aproveitamento de relaciones com cantantes e artistas com sucesso na década dos 60. “dependência do historiador literário, de seus interesses e motivações” (SCHIMDT, 1996: 107), o qual não invalida a historiografia literária como disciplina acadêmica. Neste sentido adquire muito valor, por sinal do titulo, ao distingui-la como UMA história entre outras possíveis. Seguindo esta ideia da escolha pessoal do autor, ele aproveita para inserir aqueles autores que conforme a seu parecer merecem outro reconhecimento ou esquecimento como se advertiu. Isto é então um duplo gesto, por um lado, aclarar que é uma escolha possível, não única e a liberdade de renunciar a uma ordem aparentemente inerente a história narrada da poesia brasileira. Resta por pensar que a escrita não atinge a crítica de caráter estético, e fica a meio caminho como discurso histórico, a história não oferece conceitualizações sobre os movimentos, sobre as estéticas. A UHPB pode ser considerada como um conjunto de resenhas biográficas e comentários literários com novidade na apresentação daqueles autores que por seu estilo não podem ser classificados nas periodizações estabelecidas para a poesia brasileira, Embora a história siga a ordem convencional, faz algumas mudanças na periodização. UHPB é coerente enquanto se considerar UMA versão da história, nesse sentido como não é totalizadora, tem a liberdade de estabelecer redes e pontos de encontro, isto é, um panorama de autores prestes a se relacionar inclusive ultrapassando as tendências poéticas. Um dos propósitos melhor cumpridos é sugerir ao leitor relações entre as obras - independente da classificação que tenham figurado na periodização convencional da poesia brasileira-. Outro êxito é tentar uma crítica dentro do estilo da época em que o autor citado se desenvolveu. Finalmente, a pergunta que suscita a leitura desta história é: até que ponto os juízos de valor expressados de jeito emotivo podem ser avaliados como construções críticas? Um futuro caminho de aprofundamento para análise desta história da poesia brasileira é de considerá-la como um projeto historiográfico da história afetiva (seguindo a ideia de diário de leitura), pois suas caraterísticas anteriormente descritas propõe a presença de um narrador erudito que tem a missão pessoal de aportar na renovação do corpus poético da história da poesia brasileira. REFERÊNCIAS BOSI, Alfredo. História concisa da literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 1994. BUENO, Alexei. Uma história da poesia brasileira. Rio de Janeiro: G. Ermakoff, 2007. MARQUES, Bruno Duarte. Alexei Bueno e a escrita de Uma história Brasileira (2007). Tese de Mestrado FURG. Rio Grande, 2011. OLINTO, Heindrun Krieger. Uma Historiografia literária afetiva. In: Cadernos do centro de pesquisas Literarias da PUCRS. Porto Alegre, vol. 16 n. 1, octubro de 2009. SCHMIDT, Siegfried J. Sobre a escrita de histórias da literatura. In: OLINTO, Heindrun Krieger (Org.) Histórias de literatura: As novas teorias alemãs. São Paulo: Ática, 1996 p. 100-132. Disponível em: http://rascunho.gazetadopovo.com.br/desagrado-a-concretos-e- baianos/ Acceso em: 1 oct.2013 Disponível em: http://oglobo.globo.com/cultura/polemica-entre-alexei-bueno-caetanoveloso-reacende-discussao-entre-concretos-tropicalistas-3573379. Acceso em: 1 oct 2013