A universidade como alavanca da mídia cidadão Roseane Pinheiro Falar de cidadania causa arrepios em países com indicadores sociais e econômicos tão parcos como os apresentados pelo Brasil - apesar de pequenos avanços, como a elevação da média de vida e a queda na mortalidade infantil, de acordo com a pesquisa Tábua de Vida-2004/IBGE. Temos à nossa frente imensas parcelas da população desprovidas dos direitos mais elementares, como saúde, saneamento básico e educação. Há muito a fazer na caminhada rumo a uma cidadania de fato. Nesse ponto, os meios de comunicação têm sua contribuição a proporcionar, não como protagonistas principais do processo de mudança, porém trabalhando com os atores centrais – a sociedade civil e o Estado. Nesse mar de excluídos, estamos na 82ª posição no ranking de esperança de vida e na 99ª em relação à mortalidade infantil, a participação da mídia – nas suas mais diferentes vertentes, seja jornais, rádios, cinema, publicidade, televisão, plataformas digitais e outras – é de enorme valia. Não vamos entrar na discussão ideológica, maniqueísta, de colocarmos a mídia alternativa versus a mídia “convencional”, como se fossem campos opostos. Não basta delimitar o lugar de atuação, se em um campo de batalha menos bombardeado ou se em outro, mais desafiador. É necessário formar os profissionais sob o compromisso da promoção da democracia e dos direitos humanos. Por outro lado, negar a mídia hegemônica também é fazer “guerra de guerrilhas”, esquecendo que cada centímetro conquistado pela cidadania é uma pequena vitória, seja qual for o terreno. A discussão em torno de que mídia a ser utilizada, comunitária versus “convencional”, deixa em segundo plano uma questão crucial, o compromisso dos profissionais com a democracia e a prática da cidadania. Universidade, do verbo à ação A revalorização do papel das universidades na construção da mídia cidadã é tema urgente. Os milhões de brasileiros excluídos não podem esperar mais. Os intelectuais, enquanto atores responsáveis pela análise da realidade e pelas propostas de mudança no campo das políticas públicas, precisam arregaçar as mangas e concretizar suas contribuições. Sem elas, os obstáculos se agigantam. A compreensão dos problemas e a indicação de saídas pressupõe a relação universidade-sociedade-excluídos. Quanto aos Cursos de Comunicação Social, é necessário reconstruir: os eixos pedagógicos; uma formação profissional comprometida com a vida da população de suas regiões; uma visão de mundo norteadora do trabalho de cada profissional. Em uma parte dos cursos de Comunicação – são mais de 300, de acordo com dados da FENAJ e do INEP - falta ação, predomina um discurso contrário à mídia hegemônica, porém sem a construção de alternativas aos estudantes, a exemplo de mídias, gêneros e formatos inovadores. Nesse vácuo, perdem os alunos, esvazia-se o debate e compromete-se a formação profissional em meio a matrizes curriculares engessadas e projetos pedagógicos inexistentes. É como se os cursos estivem de costas para a sociedade, quando, na verdade, são amparados e custeados por ela. É urgente que os Cursos de Comunicação Social reformulem suas propostas e suas matrizes curriculares, sujeitando-as a dois eixos fundamentais: a defesa da democracia – e não somente da liberdade de expressão – e a promoção da vida e da dignidade. Esses valores não podem dependem de uma opção individual ou da ação de determinados grupos, é algo que precisa estar embutido nas disciplinas oferecidas, sendo o cerne da formação profissional. Nesse contexto, os ativistas midiáticos parecem estar bem à frente dos pesquisadores na corrida pela Mídia Cidadã. Apresentam uma atuação mais concreta, apesar dos riscos, das dificuldades e do lento resultado das políticas públicas. E há uma novidade nos perfis dessa população engajada socialmente: parte dela é, ao mesmo tempo, pesquisadora e ativista, ou seja, têm uma faceta híbrida, com um pé no meio acadêmico e outro fora. Os professores Adilson Cabral, do Rio de Janeiro, e Luciano Satlher, de São Paulo, são exemplos dessa tendência. São profissionais cujas trajetórias apontam para a necessidade de aliar discurso e prática, pretensão com ação, enfrentando a realidade com todas as suas nuanças. Podemos concluir que a Mídia Cidadã forja-se na postura dos profissionais da comunicação. Há muitos exemplos a seguir e outros a repensar, embora todos tenham como perspectiva cotidiana a promoção da cidadania, a valorização dos excluídos como sujeitos do processo histórico. Porém, não há fórmulas prontas e sim caminhos a serem trilhados, com rotas e planos que podem ser modificados. Sabe-se, por outro lado, quais os seus atores, os cursos de Comunicação, os professores, estudantes e a sociedade. Essa interação precisa ser permanente e posta em prática através de idéias e não de discursos, com responsabilidades e compromissos. É dessa forma que a Mídia Cidadã se fortalecerá, dando sua contribuição para incluir milhões de brasileiros, espalhados em rincões, favelas e palafitas por todo o país. Referências Cursos de Jornalismo são de 300 no país. Fenaj. 10 ago 2005. Disponível em http://www.fenaj.org.br/materia.php?id=765 Acesso em 05 dez 2005. Em 2004, esperança de vida do brasileiro atingiu 71,7 anos. IBGE. Dez 2005. Disponível http://www.ibge.gov.br Acesso em 03 dez 2005. SEMINÁRIO WAAC/UNESCO/UNIVERSIDADE METODISTA. Portal da Mídia Cidadã. São Bernardo do Campo-SP, 28 a 30 de novembro de 2005. Disponível em http://www2.metodista.br/unesco/agora/index.htm. Acesso em 02 dez 2005