Edição 1 – setembro/outubro 2005
Lesão do ligamento cruzado anterior do joelho em
pacientes com esqueleto imaturo*
Anterior cruciate ligament lesion of the knee in patients with immature skeleton
Autor:
Gilberto Luis Camanho
São Paulo - SP
Introdução
A atividade esportiva precoce tem trazido muitos benefícios para os pacientes
jovens, porém a incidência de traumas tem aumentado significativamente. A
presença da fise de crescimento tem sido motivo de grande preocupação aos
ortopedistas que se dedicam a tratar as lesões traumáticas dos pacientes com o
esqueleto imaturo, pois a possibilidade de lesão da fise de crescimento limita a
utilização de procedimentos terapêuticos consagrados no tratamento de pacientes
com o esqueleto maduro.
Algumas lesões, consideradas raras no passado, estão aumentando sua freqüência.
As lesões ligamentares do joelho são ainda reportadas como eventos pouco
freqüentes. Clanton et al.(3) relatam que em 1.749 pacientes portadores de lesão
ligamentar em seus joelhos, apenas 9 tinham o esqueleto imaturo.
DeLee et al.(4) relataram 3 casos em 338 estudados. O propósito deste trabalho é
analisar a evolução de 14 pacientes em crescimento, que sofreram lesões na
substância de seus ligamentos cruzados anteriores.
Edição 1 – setembro/outubro 2005
Figura 1
Ressonância nuclear magnética demonstrando lesão do ligamento cruzado anterior
em paciente com a fise de crescimento aberta
Magnetic resonance imaging demonstrating anterior cruciate ligament lesion in
patient with opened growth physis
Figura 02
Ressonância nuclear magnética demonstrando lesão do menisco medial em um
paciente com esqueleto imaturo
Magnetic resonance imaging demonstrating lesion of the medial meniscus in a
patient with immature skeleton
Edição 1 – setembro/outubro 2005
Material e método
Estudamos a evolução de 21 pacientes que sofreram lesão ligamentar grave em
seus joelhos quando tinham o esqueleto imaturo. A presença da fise de crescimento
aberta foi demonstrada em todos os casos por ressonância magnética (RNM).
O paciente mais jovem tinha 8 anos na ocasião da lesão e o mais velho 12 anos; a
idade média foi de 10 anos. Nove crianças eram do sexo masculino. O lado
esquerdo foi o acometido em 8 pacientes.
A causa mais freqüente da lesão foi o trauma esportivo em 17 pacientes; apenas 1
se acidentou no tráfego. Quinze pacientes acidentaram-se jogando futebol.
Consideramos para inclusão no trabalho as lesões na substância do ligamento
cruzado anterior que provocaram instabilidade considerada de ++ ou mais, ou seja,
deslocamentos maiores que 5mm ou maiores. Dois pacientes tiveram associadas
lesões meniscais diagnosticadas pela ressonância nuclear magnética (RNM) .
Orientamos dois tipos de tratamento – conservador e cirúrgico.
O tratamento conservador consistia no uso de um brace de proteção do tipo antirotacional, quando da atividade esportiva, e orientação para exercícios, que
objetivavam fortalecer os músculos flexores nas lesões do LCA.
Tratamos conservadoramente inicialmente 8 pacientes, que permaneceram com a
orientação conservadora pelo menos por um ano.
O tratamento cirúrgico foi instituído inicialmente em 13 pacientes. Nesse grupo de
pacientes com fise aberta fizemos a reconstrução do LCA, utilizando o tendão do
músculo semitendíneo duplo livre. Na tíbia utilizamos túnel ósseo com 6mm de
diâmetro e fixação por amarria a parafuso. No fêmur fixamos over the top por
amarria a parafuso (figura 3).
Figura 3
Esquema demonstrando a passagem do enxerto
no femur em posição over the top
Outline demonstrating the passing of the graft in
the femur in over the top position
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Iniciamos a operação com uma incisão na face medial da perna de 3cm sobre a
“pata de ganso”; localizamos o tendão do semitendíneo e o retiramos inteiro.
Após dobrá-lo, colocamos sutura com fio de Ethibond 5 nas duas extremidades.
Fizemos artroscopia de forma convencional e, após o inventário da articulação e
correção das eventuais lesões intrínsecas, posicionamos o guia para passagem do
fioguia tibial. Através do fio-guia, utilizando broca de 6mm canulada, perfuramos a
tíbia.
Fizemos uma incisão de 5cm na face lateral da coxa, através da qual abordamos a
face póstero-lateral da articulação do joelho.
Com uma pinça curva, introduzida através da abordagem póstero-lateral, pegamos
o fio de aço de dentro da articulação que já havia sido passado através do orifício
de 6mm na tíbia.
Com esse fio introduzimos o enxerto intra-articular e fixamos na face lateral do
fêmur amarrando-o a um parafuso de esponjosa (figura 4).
Figura 4
Radiografia demonstrando reconstrução do LCA com enxerto do tendão do músculo do
semitendíneo duplo fixo por amarria na tíbia e over the top no fêmur, em pacientes com as fises
de crescimento abertas. Pósoperatório de 20 meses.
X-ray demonstrating the ACL reconstruction using graft of the tendon of the double
semitendinosus muscle fixed in the tibia and in the femur over
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Tensionando o enxerto, amarramos sua extremidade distal a um parafuso de esponjosa fixo na
tíbia, estando o joelho em 45 graus de flexão.
Os pacientes foram imobilizados em brace removível, que foi mantido para a
deambulação por 6 semanas. Iniciaram então período de reabilitação, sendo
liberados para atividade esportiva após 6 meses da operação.
Utilizamos essa técnica em 14 pacientes, os 13 tratados cirurgicamente de início e
1 dos tratados inicialmente conservadoramente, pois apresentava ainda a fise de
crescimento aberta, 17 meses após o início do tratamento conservador ineficiente.
Resultados
Tratamento conservador Tivemos 8 pacientes com lesão do LCA, que tratamos
conservadoramente de início; apenas 1, o paciente mais jovem desta série que teve
a lesão com 8 anos de idade, melhorou da instabilidade.
Acompanhamos este paciente por 6 anos e temos verificado que está com
instabilidade anterior de +, sem sinais clínicos de lesões associadas, desenvolvendo
atividade esportiva normal. Foi considerado como B – próximo do normal pelo
IKDC.
Os sete restantes pioraram dos sintomas e foram encaminhados para tratamento
cirúrgico. A análise destes 7 pacientes pelo IKDC demonstrou que 6 casos foram
considerados D – muito anormal e 1 caso C – anormal.
Evolução dos pacientes tratados conservadoramente Dos 7 pacientes tratados
conservadoramente de início, com resultado insatisfatório, realizamos a
reconstrução do ligamento cruzado anterior em 6. Uma paciente procurou outro
colega, que optou por realizar apenas a meniscectomia, sem reconstruir o
ligamento.
A reconstrução tardia do LCA foi feita em 5 pacientes, com a técnica do triplo
semitendíneo fixo por Endobutton descrita por Maeda et al.(9), pois estes 5
pacientes já tinham suas fises fechadas ou em fase final de fechamento. Um dos
pacientes que se submeteram à reconstrução tardia do LCA ainda mantinha a fise
de crescimento aberta; foi submetido à reconstrução pela técnica do duplo
semitendíneo over the top. Encontramos lesões associadas, não descritas na RNM,
feitas por ocasião do trauma, em 4 dos 7 pacientes operados tardiamente. Todas
eram lesões meniscais mediais, sendo uma associada a lesão meniscal lateral.
Os 5 pacientes que tiveram seus LCA reconstruídos pela técnica do triplo
semitendíneo evoluíram bem até o tempo de seguimento, que foi maior que dois
anos em todos os casos. A análise desses pacientes pelo IKDC demonstrou que 3
casos foram considerados A – normal e 2 como B – próximo do normal, por
apresentarem Lachman entre 3 e 5mm.
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A paciente que fez apenas a meniscectomia evoluiu mal, com vários episódios de
falseio. Aos 18 anos havia constância dos sintomas de instabilidade.
Finalmente, analisaremos o paciente com a fise de crescimento aberta, que fez a
reconstrução do LCA com semitendíneo duplo fixo over the top no fêmur.
A avaliação desse paciente ao final do crescimento demonstrou estabilidade do
joelho sem qualquer sinal de epifisiodese precoce. Foi classificado como A pelo
IKDC.
Pacientes submetidos a tratamento cirúrgico imediato Foram 13 casos, todos com
fise aberta no momento da cirurgia, que evoluíram bem até o fechamento de suas
fises de crescimento.
Dois pacientes apresentavam sinais de lesão meniscal à RNM, confirmada pela
artroscopia no ato cirúrgico. Em um caso fizemos a sutura meniscal, no outro
consideramos a área de desinserção muito pequena e não fizemos nada. A análise
desses pacientes até o final do crescimento demonstrou estarem com os joelhos
estáveis, sendo considerados os 9 como A – normal e 4 como B-próximo do normal
pelo IKDC. O estudo radiológico demonstrou estarem sem sinais de epifisiodese
(figura 5).
Figura 5
Ressonância nuclear magnética demonstrando reconstrução do LCA com enxerto do tendão do
músculo semitendíneo duplo após o fechamento das fises de crescimento, com ausência de
sinais de epifisiodese
Magnetic resonance imaging demonstrating the ACL reconstruction using graft of the tendon of
the double semitendinosus muscle after closing the growth physes, without signs of
epiphysiodesis
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Temos feito o seguimento pós fechamento da fise de crescimento destes
pacientes,e dois apresentaram lesão traumática do enxerto de LCA ,em atividades
esportivas. Não podemos ainda analisar o significado destas roturas.Estamos
acompanhando a evolução de todos os pacientes operados.
Conclusão
Nos pacientes com esqueleto imaturo e portadores de lesão do LCA, podemos
concluir que a reconstrução imediata com enxerto do tendão do músculo
semitendíneo duplo é a melhor conduta. O tratamento conservador demonstrou ser
ineficiente na grande maioria dos casos.
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Bibliografia Sugerida
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* Trabalho realizado no Instituto Ortopédico Camanho/Hospital Santa
Catarina.
1. Professor Livre-Docente da Faculdade de Medicina da USP; Médico do Instituto
Ortopédico Camanho.
2. Médico Assistente; Mestre do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do HCFMUSP; Médico do Instituto Ortopédico Camanho.
3. Médico do Instituto Ortopédico Camanho.
4. Médico Estagiário do Instituto Ortopédico Camanho.
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