FRATURAS DA CABEÇA DO RÁDIO Antônio Lourenço Severo1, Raimundo de Araujo Filho2, Marcelo Barreto Lemos3, Rulby Puente Fajardo4, Osvandré Lech5 INTRODUÇÃO A fratura da cabeça do rádio esta entre as mais dos colaterais medial e lateral ou da membrana in- frequentes do cotovelo, ocorrendo em adultos entre teróssea. Em lesões mais severas podem estar asso- 20 e 60 anos, sendo 2 vezes mais comum no sexo ciada ainda a luxações e instabilidades do cotovelo feminino. Correspondem mais de 5% de todas as e antebraço.(1) fraturas do esqueleto e 1/3 das fraturas que acometem o cotovelo.(1) Biomecanicamente a cabeça do rádio é um estabilizador secundário ao stress em valgo. O ligamento Normalmente são fraturas sem deslocamento e colateral medial é o estabilizador primário, junta- aparecem como lesões isoladas. Nos casos associa- mente, com o ligamento colateral ulnar e o coronoi- dos a lesões mais complexas e que envolvem maior de, assim, a cabeça do rádio forma um importante energia estão relacionadas com lesões ligamentares complexo de estabilização rotacional posterolateral.(2) 1 Ortopedista e Cirurgião de Mão, Preceptor do Serviço de Cirurgia da Mão do IOT de Passo Fundo/RS - Brasil, [email protected] 2 Ortopedista e Cirurgião de Mão, Santa Casa de Misericórdia de Maceió/AL - Brasil, Centro Hospitalar Manoel André – Arapiraca/AL - Brasil, [email protected] 3 Ortopedista e Cirurgião de Mão, Preceptor do Serviço de Cirurgia da Mão do IOT de Passo Fundo/RS - Brasil, [email protected] 4 Estagiária (R5) do Serviço de Cirurgia da Mão do IOT, Passo Fundo, RS – Brasil, [email protected] 5 Ortopedista e Cirurgião de Mão, Chefe da Residência Médica e do Serviço de Cirurgia da Mão do IOT de Passo Fundo/RS - Brasil, [email protected] 1 ETIOLOGIA( MECANISMO DO TRAUMA) As fraturas da cabeça do rádio normalmen- tal (lesão de Essex-Lopresti) esta presente em apenas 0,3% dos casos.(3) te ocorrem após queda com a mão espalmada com o antebraço em pronação, com força axial sendo transmitida através da cabeça do radio sobre o capítulo. A posição em pronação leva mais frequentemente a localização do fragmento fraturado no lado anterolateral da cabeça.(3) Menos frequentemente o trauma direto contra o cotovelo pode ocasionar fraturas da cabeça do radio.(1) DIAGNÓSTICO Clinicamente os pacientes podem apresentar equimose ao longo do antebraço e no aspecto medial do cotovelo. A palpação dolorosa é encontrada sobre a cabeça do rádio mais comumente anteriormente. Quando há dor sobre o epicôndilo lateral pode representar uma lesão associada do ligamento colateral lateral, Lesões de alta energia estão relacionadas igualmente, suspeita-se da lesão do ligamento com acidentes automobilísticos, tipicamente, colateral medial com dor a palpação do epi- apresentando maior cominução e maior inci- côndilo medial. Aumento de sensibilidade dência de lesões associadas.(1) dolorosa a palpação e a mobilização da arti- Geralmente, aproximadamente, um terço culação radioulnar distal (ARUD) pode estar dos casos têm uma ou mais lesões concomi- associada a lesão da membrana interóssea e da tantes a fratura da cabeça do rádio. Clinica- própria articulação ARUD.(1) mente, lesões ligamentares estão presentes em Imagens radiográficas em AP, perfil e obli- quase 25% dos casos, sendo que 10% dessas quas do cotovelo normalmente são suficientes vão necessitar de reparo cirúrgico.(3) Fraturas para o diagnóstico e programação de tratamen- do coronóide estão presentes em 10% dos ca- to das fraturas da cabeça do rádio (Fig. 1 e Fig. sos e 15-20% das fraturas da cabeça do rádio 2). A tomografia computadorizada é de valia estão associadas com a luxação do cotovelo(3,4) na programação cirúrgica em casos em que se Dissociação da articulação rádio-ulnar dis- necessite de quantificar o tamanho, localiza2 ção, deslocamento e cominuição das fraturas, A ressonância nuclear magnética pode ser bem como da escolha de material de osteosin- considerada para avaliação da presença de le- tese mais adequado.(1) sões ligamentares associadas, bem como da membrana interóssea.(5) CLASSIFICAÇÃO A classificação clássica de Mason divide as fraturas da cabeça de rádio em três tipos: tipo I, fraturas marginais ou fissuras sem deslocamento; tipo II fraturas marginais deslocadas; Fig.1 - Radiografias em AP e perfil evidenciando fratura da cabeça do raio sem aparente desvio. tipo III, fraturas cominutivas envolvendo toda a cabeça6. Morgan et al em seu estudo, mostraram uma pobre reprodutibilidade intraobservadores e interobservadores baseados em radiografias simples(7) (Fig. 1). Fig.2 - Radiografia em obliqua da mesma fratura evidenciando desvio maior que 2 mm. Fig.3 - Classificação de MASON em três tipos. Mais recentemente Hotchkiss(8) descreveu 3 uma classificação baseada em 3 tipos: são quanto ao tratamento incluem: tamanho »»Tipo I: fraturas sem desvio ou com desvio da fratura, deslocamento do fragmento, loca- mínimo (<2mm), fraturas marginais da cabeça lização dos fragmentos e a presença ou não de radial ou do colo. Sem bloqueio mecânico de bloqueio de rotação do antebraço(1). rotação. Fraturas da borda marginal da cabeça do rádio. »»Tipo II: fraturas desviadas (usualmente > 2mm) da cabeça ou do colo (angulado); com, ou sem bloqueio mecânico a mobilidade ou incongruência; sem cominuição severa que impossibilite o reparo por redução aberta e fixação interna. Fraturas marginais além da borda da cabeça radial. »»Tipo III: fraturas cominutivas da cabeça ou do colo, não passíveis de reconstrução e usualmente requerem ressecção da para mobilidade. Tratamento conservador São de indicação de tratamento conservador as fraturas não desviadas ou minimamente desviadas da cabeça ou do colo do rádio e pequenas fraturas marginais que não causam bloqueios de rotação do antebraço, assim como as fraturas que envolvem menos que 1/3 da cabeça do rádio com desvios menores que 2mm.(1) Mobilização ativa pode ser iniciada após 1 semana para evitar-se contraturas por imobilizações prolongadas. Uma tipoia pode ser utilizada por 4 semanas para conforto nos períodos entre as mobilizações ativas(1). OPÇÕES DE TRATAMENTO Nos casos bem indicados tem prognósti- As fraturas da cabeça do rádio devem ser co favorável com retorno a função com 6-12 conduzidas baseando-se em fatores ligados ao semanas. Desvio e dor tardios são incomuns, paciente como idade, qualidade óssea, lesões sendo uma contratura em flexo de 10-15 graus associadas e nível de atividade.(9) Os fatores re- a sequela mais frequente(6). lacionados a fratura que influenciam na deci4 Redução aberta e fixação interna (RAFI) Ressecção de fragmentos da cabeça do rádio Merecem fixação interna, fraturas desviadas Deve-se ressecar pedaços de cartilagem e pe- de 2mm ou mais, não cominutivas e que en- quenos fragmentos deslocados que podem cau- volvem mais que 1/3 do diâmetro da cabeça sar bloqueio de rotação do antebraço quando do rádio, com ou sem mecanismo de bloqueio não se consegue realizar a fixação dos mesmos.(1) rotacional.(1) A fixação pode ser conseguida através de parafusos sem cabeça; parafusos com placas ou parafusos canulados dependente da configuração do fragmento.(1) (Fig. 4) A falha em se conseguir uma redução anatômica e estável pode levar a decisão intraoperatoria de ressecção da cabeça do rádio ou artroplastia1. Ressecção da cabeça do rádio A ressecção da cabeça do rádio em fraturas simples ou cominutivas desviadas era um método muito utilizado antes do desenvolvimento de métodos de fixação.(6) Hoje sua indicação é preferível em casos de reduções abertas com fixações internas instáveis ou incongruentes, sendo contra-indicada nos casos com lesões ligamentares e deslocamentos do cotovelo(10). Artroplastia da cabeça do rádio A artroplastia cabeça do rádio esta indicada nas fraturas deslocadas e cominutivas da cabeça e colo do rádio onde uma redução aberta e Fig.4 – Tratamento cirúrgico com parafuso sem cabeça fixação externa anatômica estável seja impossível de ser estabelecida.(1) Implantes de silicone foram empregados no 5 passado com resultados inferiores as próteses rádio com distensão excessiva dos tecidos12. de metal, por serem biomecanicamente infe- Faz-se a prevenção mantendo-se o antebraço rior com altos índices de sinovite pelo silicone. pronado durante o acesso e com o afastamento (11) cuidadoso ao redor do colo do rádio em uma única direção, bem como através da dissecção e isolamento do nervo.(13) Necrose Avascular É uma complicação comum em decorrênFig.5 – Rx obliquas evidenciando fratura polifragmentar cia do deslocamento dos fragmentos levando a diminuição do suprimento sanguíneo. A fixação e estabilização do fragmento normalmente salva o fragmento deslocado e colapsos posteriores são incomuns. A necrose completa da cabeça do rádio associada a fraturas ao nível do Fig.6 – Tratamento com prótese de cabeça de rádio colo podem necessitar de excisões da cabeça ou artroplastias reconstrutivas.(14) COMPLICAÇÕES Lesões nervosas A lesão do nervo interósso posterior é incomum, mas pode ocorrer. Fatores de risco incluem: dissecção distal a tuberosidade do rádio e afastamento anterior ao redor da cabeça do Pseudoartrose Geralmente associadas com necrose avascular em fraturas deslocadas. Nos casos assintomáticos podem não necessitar de tratamento cirúrgico, já nos casos assintomáticos pode ser necessirios: redução aberta e fixação interna 6 com uso de enxerto ósseo, ressecção de cabeça que a articulação umero-ulnar não esteja aco- radial ou artroplastias, que na maioria dos ca- metida e, que, não haja instabilidade residual. sos é preferível pelo alto risco de necrose devi- A artrospastia total estará indicada nas artroses do ao baixo suprimento sanguíneo.(15) generalizadas.(17) Consolidação viciosa Normalmente associada a um tratamento inicial mal conduzido, fixação instável das fraturas ou colapso por osteonecrose. Clinicamente cursa com dor, crepitação e restrição de arco de movimento. O tratamento vai variar com o perfil do paciente: pacientes ativos e jovens com grande demanda podem ser tratados com osteotomias corretivas; já os pacien- Contraturas A contratura é uma complicação comum nas fraturas da cabeça radial podendo ocorrer em decorrência de contratura capsular, ossificação heterotopica, fragmentos intra-articulares cartilaginosos ou ósseos, sendo a perda da extensão final a mais frequente. A instabilidade em valgo e axial são outras complicações passíveis de ocorrer. tes com idade avançada, como também dos de baixa demanda podem ser tratados com ressecções ou artroplastias de cabeça radial.(16) Artrose Decorrente de lesão condral, incongruência articular ou instabilidade persistente. Artroplastia esta indicada nos casos inciais quando o capitulo não está acometido. Ressecção da cabeça do rádio estará indicada nos casos em 7 BIBLIOGRAFIA 1. Wolfe SW et al. Green’s operative hand surgery. 6th ed. 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