1 Ataques Especulativos e Crises Cambiais – uma literatura à luz da Teoria Marxista da Dependência Autor: Douglas Maria Barbosa (Sicoob Credijustra/DF)1 Resumo Resumo: O trabalho apresenta uma revisão da Teoria Marxista da Dependência a partir dos nomes mais significantes no seu âmbito. São apresentados elementos cruciais para montar a história da teoria e contextualizar os seus conceitos fundamentais, assim como o nascimento destes no ambiente acadêmico e político nacional e da América Latina. Seguindo há uma pesquisa sobre o tema dos ataques especulativos e crises cambiais. Essa prioriza apresentar a dinâmica dos processos e suas diversas formas de mensuração da probabilidade de ocorrência dos eventos em questão e explicá-los. Não foi dado aqui o enfoque de priorizar a localização das crises cambiais ocorridas na história com a respectiva geração (fase de criação) de cada modelo. Abordando resumidamente o tema da sustentabilidade e do uso indiscriminado da especulação nas relações capitalistas superiores, o trabalho relaciona a necessidade levantada pela Teoria da Dependência de se alterar as bases do sistema atual, com interpretações dos modelos de crises cambiais e ataques especulativos a fim de mostrar a convergência para um desenvolvimento sustentável. Abstract: The paper presents a review on the Marxist Dependency Theory bearing in mind the most significant names in its scope. Crucial aspects are presented on the history in order to contextualize its basic concepts, as well as their emerging on the academic community and national politics in Latin America. There is a discuss on the subject of speculative attacks and currency crises. This emphasizes the dynamics of processes and their different ways of measuring the probability of occurrence of those events in question and to explain them. It was not given the focus on the location of the currency crises that occurred in history with its generation (creation phase) of each model. Briefly addressing the issue of sustainability and the indiscriminate use of speculation in capitalism. The work relates the need raised by the Dependency Theory to change the basis of the current system, with interpretations of the models of currency crises and speculative attacks in order to show convergence to a sustainable development. Palavras-chave: Teoria Marxista da Dependência. Ataque especulativo. Crises cambiais. 1 Graduado em Ciências Econômicas pela UPIS – Faculdades Integradas, Brasília – DF, [email protected] 2 A Teoria Marxista da Dependência No estudo da história da teoria da dependência se depara com inúmeras fontes, mostrando assim que a quantidade de referências sobre o assunto é extensa. Diante das referências bibliográficas observadas, a maioria são revisões de publicações de teóricos clássicos do tema. Em função dessa quantidade de fontes já percebida por alguns autores, esses se depararam anteriormente com desafios metodológicos. Por exemplo, o exposto por Prado (2009), que se viu diante do dilema entre selecionar autores e obras para formar um quadro inicial do se que se conhece como estudo da dependência e focar a atenção em alguns dos aspectos do abarcador panorama aberto pela dependência, que são qualitativamente relevantes. Aceitando tal desafio, esta sessão do trabalho ajuda a montar a história do surgimento da teoria Marxista da Dependência, com seu caráter ideológico e contextualizando seus conceitos mais básicos. Em geral, as revisões da Teoria Marxista da Dependência começam no contexto do pós Segunda Guerra Mundial, quando, segundo Prado (2009, p. 22), seus estudos invadiram o debate político e acadêmico em todo o mundo, assim como as concepções desenvolvimentistas conhecidas como Cepalinas, derivadas dos estudos da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL). Marini, autor da teoria, diz, citado por Stédile (2005) e durante uma aula diz “[...] contrariando interpretações correntes, que vêem como sobproduto e alternativa acadêmica à teoria desenvolvimentista da CEPAL, a teoria da dependência tem suas raízes nas concepções que a ‘nova esquerda‘[...]elaborou, para fazer frente à ideologia dos partidos comunistas. (STÉDILE, 2005, p.25). No trabalho do historiador Cristóbal Kay (1989, p.126) há uma classificação dos autores que trataram o tema da dependência. Kay propõe a divisão dos autores em duas correntes: dependencistas reformistas e dependencistas marxistas-revolucionários. Dentre os dependencistas reformistas se incluem autores como Fernando Henrique Cardoso, Osvaldo Sunkel, Celso Furtado, Aldo Ferrer e Anibal Pinto, sendo todos orientados pelos prospectos modernizadores e desenvolvimentistas da CEPAL. Ao contrário, os teóricos marxistas-revolucionários da dependência são inspirados no marxismo e na tradição de lutas revolucionárias da América Latina. Esses faziam oposição aos partidos comunistas oficiais da época e tinham a visão de que o desenvolvimento capitalista não passa de uma ilusão, quando confrontado com a busca de um 3 mundo mais igualitário e, que, somente com transformações radicais das estruturas sociais seria possível superar o problema da dependência e do desenvolvimento. Mais especificamente, segundo Paris e Rebérioux, a corrente marxista da dependência é oposta aos partidos comunistas oficiais no contexto da constituição da teoria. Isso porque tais partidos viam no desenvolvimento capitalista uma alternativa de alcançar uma sociedade igualitária, ou seja, o desenvolvimento do capitalismo seria um ponto em comum entre capitalistas e aqueles que lutam para uma sociedade mais igualitária. No Brasil a oposição, ainda de esquerda, a esses partidos, fundado institucionalmente em 1961, foi chamado de Organização Revolucionária Marxista – Política Operária (ORM-Polop). Paris e Rebérioux sintetizam o caso brasileiro no trecho: [...] a velocidade com que ocorreu a industrialização no Brasil, financiada fortemente por capital americano, agravou a crise agrária, ligada a extensão dos latifúndios e a proletarização das massas rurais, exigindo que o partido definisse uma estratégia. Estratégia adotada durante a década seguinte não era objeto de um debate amplo e democrático, porém expressava oposição ao Estado populista da situação. No V congresso do partido [Comunista Brasileiro] em agosto de 1960, dois fatores influenciaram diretamente a posição final das partes. Podemos enumerar: (1) a possibilidade de um verdadeiro debate, iniciado em 1956-1957, criticando os métodos estalinistas de decisão praticados pelos partidos e a possibilidade de revolução no meio rural, principalmente pelas primeiras ligas organizadas no nordeste brasileiro [...]. A tese adotada no congresso de 1960 demonstra o triunfo da estratégia de aliança com a burguesia ligada aos interesses nacionais com o marco principal de uma frente nacional e democrática. O choque entre a burguesia brasileira e o “capital monopolista estrangeiro” é descrito como inevitável em razão dos interesses de classes da burguesia. Inicialmente, a tarefa dos comunistas deveria se consistir em ajudar a burguesia a fundar um regime democrático e independente. Na América Latina, nunca foram formuladas com tanta nitidez teses favoráveis a aliança com a burguesia nacional. (1986, pp. 289-290). Segundo Kay (1989), entre os autores cujos trabalhos se enquadram na visão marxista da dependência estariam Ruy Mauro Marini, Theotonio dos Santos, André Gunder Frank, Vania Banbirra, Oscar Braum, Aníbal Quijano, Edelberto Torres-Rivas, Tomás Amadeo Vasconi, Alonso García e Antonio Garcia. A idéia de desenvolvimento tem sua origem muito antes da segunda metade do século XX, podendo ser melhor entendida como um conceito que ainda vem se formando. Em nível mundial, algumas instituições como o Banco Mundial, as Nações Unidas e suas agências, fizeram do desenvolvimentismo um fim incontestável, como a ONU em 1946, ao criar a Comissão Econômica para a Europa, nesta base. 4 Em 1948 foi fundada a CEPAL. Nas palavras de Ricardo Bielschowsky A contribuição teórica dessa instituição [CEPAL] foi determinante para desenvolver estudos sistematizados sobre o desenvolvimento, considerando a América Latina a partir de uma análise especifica, e formando o método histórico estruturalista. Segundo Celso Furtado “[...]o enfoque histórico-estruturalista cepalino abriga um método de produção de conhecimento profundamente atento para o comportamento dos agentes sociais e da trajetória das instituições, que tem maior proximidade a um movimento indutivo do que os enfoques abstratos-dedutivos tradicionais”. (BIELSCHOWSKY, 2000, p. 21). A necessidade de questionar duramente as alianças do Partido Comunista Brasileiro (PCB) com a burguesia, achou espaço no contexto criado pela CEPAL e a constituição da Organização Marxista Revolucionária – Política Operária (POLOP), reunindo nomes que seriam referência sobre a Teoria da Dependência, apesar das diferentes tradições de lutas, como Theotonio dos Santos, Moniz Bandeira, Vania Bambirra, Ruy Mauro Marini, Michael Löwy e Eric Sachs. A ORM-Polop criando e aperfeiçoando seus estudos, passou a trabalhar com eixos que nortearam suas ideias com pontos comuns, sendo esses, depois, as bases da Teoria da Dependência. Dentre essas concepções, que balizavam as ações dentro da instituição, vale citar: a compreensão dos militantes para a situação da América Latina, que, contrariando o argumento de que a explicação estaria em seu caráter dual (capitalista e feudal), afirmasse que a situação é resultado do próprio desenvolvimento capitalista no nível mundial; e a ideia de que a dependência da América Latina se deve à intrínseca relação com a burguesia nacional e não somente ao fator externo do imperialismo. No contexto da Revolução Cubana, as concepções da POLOP ganharam mais evidência. Segundo Vania Bambirra (1978, p. 19), “a Revolução Cubana demonstra, na prática, o que teoricamente era óbvio: o socialismo é viável e necessário na América Latina”. Em decorrência do êxito e da crescente visibilidade das teorias socialistas é que os estudos da dependência entraram definitivamente para as práticas políticas e das ciências sociais na América Latina. Bambirra (1978, pp. 15-16) também enumera diversos outros eventos que alimentam o que mais tarde seria o conceito de dependência e os movimentos de esquerda, mesmo aqueles que não podem ser rigorosamente definidos como marxistas na América Latina. Considera, com tamanha significância, os antecedentes teóricos e políticos da análise de Marx e Engel, principalmente no que tange às criticas ao colonialismo, às ideias de Lenin e dos sociais 5 democratas russos contra os narodniki-populista, a teoria do imperialismo de Hilferding, Bukarin, Rosa Luxemburgo e particularmente por Lenin, dentre outras. Um último é a aplicação dos métodos de análise marxista na tentativa da compreensão do fenômeno do subdesenvolvimento, caracterizado nos trabalhos de Paul Baran nos anos cinquenta. Sintetizando o exposto por Vania Bambirra (1978, pp. 21-23), eventos influenciaram diretamente a concepção de dependência e deram condições para que as ideias tomassem forma no meio acadêmico e político. Dentre eles, a reunião de vários intelectuais, na sua maioria exilados dos seus países de origem, no Chile em meados da década de 60, visto o movimento revolucionário ter sofrido derrotas nos respectivos países. O Chile se transformou em um dos mais importantes centros da resistência latino-americana contra as ditaduras e estava, à época, sendo muito afetado por crises econômicas e de dominação imperialista, inclusive com a população mobilizada contra o governo do presidente Frei. Tal contexto foi o estímulo necessário para o desenvolvimento das ciências sociais revolucionárias, nascendo o CESO (Centro de Estudos Sociais e Econômicos. Tal cenário durou até o golpe contra o então presidente Salvador Allende em 1973. Como qualquer conceito ou teoria, a noção de dependência não surgiu no debate marxista do nada. Ela foi amadurecendo historicamente e ganhou forma conceitual em sintonia com forças políticas que caracterizaram o momento e entrelaçada com diversos fatos históricos que sedimentam suas hipóteses, além da credibilidade acadêmica. Assim sendo, e apesar de não ser uma teoria acabada, a Dependência tem seu próprio objeto de estudo bem definido (SOTELO VALENCIA, 2005, p. 213), carregada de impressões da situação histórica, entretanto verificável atualmente. Dependência, no seu conceito, é uma situação histórica causada pelo capitalismo em si mesmo que gerou uma estrutura na economia internacional de submeter os países menos desenvolvidos a promover, a custa de diversos recursos, o desenvolvimento de alguns outros poucos países. Esse processo, de crescimento de alguns, à custa de desiguais mecanismos econômicos, determina as possibilidades de desenvolvimento das nações consideradas subjugadas. 6 Nas referências teóricas pesquisadas é recorrente os autores atribuírem a superexploração, o recurso utilizado pelas nações desenvolvidas para promover a dependência dos demais países com quem tem relações comerciais e políticas estreitas. Com o avanço tecnológico e com o “desenvolvimento do subdesenvolvimento” 2 os meio de exploração tem-se modificado. Um primeiro passo no avanço da complexidade da forma em que se dá a dependência é que a exploração deixou o seu foco na massa trabalhadora e passou para a exploração da força de trabalho em um sentido mais amplo do que o meramente quantitativo, submetendo-a a meios de produção mais eficazes para aumentar a produtividade marginal, causando, por exemplo, aumento da cota de mais-valia3 enquanto a remuneração do trabalho declina, assim como admite a corrente marxista. O FMI apresenta um gráfico bem claro referente aos países mais desenvolvidos (GRÁFICO 1.1), reproduzido em seguida. A exploração também estratifica o consumo, segundo Marini (1991, p. 64), em “alta esfera” - consumo procedente da mais-valia não acumulada e suprida pelo comércio exterior – e, em “baixa esfera” - representada pela demanda dos trabalhadores assalariados e suprida em grande medida pela produção interna das economias dependentes. 2 Termo usado por Frank para se referir ao desenvolvimento relativo das nações latino-americanas em função do crescimento dos seus exploradores. 3 “Para Marx, a mais-valia é a forma de exploração característica do capitalismo. Consiste na diferença entre o valor do produto e o valor do capital despendido no processo de produção.” (Loyola, 2009) 7 Gráfico 1.1 Fonte: IMF, Finance&Development, (jun 2007, p. 21). O ciclo sistêmico de acumulação de Marx pressupõem que o capital se movimenta da expansão material para a expansão financeira. Por isso, a dependência também ocorre no nível reprodução do capital financeiro quando esse ocorre via especulação, denominado por Marx, na sua função fundamental do capitalismo por DD’4. Esse mecanismo de reprodução, causador da dependência, pode ser verificado em ataques especulativos à moeda dos países explorados na concepção da dependência, como o Real, que será tratado mais adiante. A noção de dependência, como visto anteriormente, é um processo histórico, sendo melhorada e revisada por diversas vezes a fim de caber nas concepções ideológicas e de compreensão dos seus estudiosos. Dentre os diversos conceitos localizados dentro da vasta Teoria Marxista da Dependência, a de Theotonio dos Santos, se concentra em uma definição de dependência e sua aplicação à realidade da América Latina, tornando-se a principal referência, publicado no seu livro Imperialismo y Dependencia (1978, p. 305): 4 A função fundamental do capitalismo de Marx é DMD’, onde D é o capital monetário do capitalista que investe em algo material (M) e resulta em um valor maior (D’). Pode se separar em expansão material (DM) e a fase expansão financeira (MD’). “Nas fases de expansão financeira, uma massa crescente de capital monetário ‘liberta-se’ de sua forma mercadoria, e a acumulação prossegue através de acordos financeiros como na fórmula abreviada de Marx, DD’.” (ARRIGHI, 1996, p. 6) 8 A dependência é uma situação onde um certo grupo de países tem suas economias condicionadas pelo desenvolvimento e expansão de outra economia que está submetida. A relação de interdependência de duas ou mais economias, e entre essas e o mercado mundial, assume a forma de dependência quando alguns países (os dominantes) podem expandir e auto fomentar seu crescimento, enquanto outros países (os dependentes) somente podem assim se desenvolver como reflexo do desenvolvimento do anterior. De todo modo, a situação de dependência conduz a uma situação global dos países dependentes que se situam em atraso e sob exploração dos países dominantes. [...] A dependência está, pois, fundada em uma divisão internacional do trabalho que permite o desenvolvimento industrial de alguns países e limita esse mesmo desenvolvimento em outros, os submetendo a condições de crescimento induzido pelos centros de dominação mundial. Theotonio dos Santos (1978) defende que a situação de dependência já está instaurada e que uma atitude radical para reverter o sistema econômico de uma nação, isolando-a do restante do mundo não seria possível. Um procedimento tal como esse, sugerido por Frank, simplesmente provocaria uma dependência interna, pois já é dependente na sua essência. Há diversos pontos de vista sobre como reverter o processo da dependência, sendo que ideias distintas existem dentro da corrente marxista para se alcançar a sociedade igualitária do socialismo. Para Theotonio dos Santos (1978, p. 309), em oposição à concepção de Frank, “a única solução para rompê-la [a dependência] seria, pois, mudar as estruturas internas, o que necessariamente, e ao mesmo tempo, conduziria ao enfrentamento da estrutura internacional [de desenvolvimento capitalista].”. Da obra Dialéctica de laDependencia (1991, p. 18), de Ruy Mauro Marini, o trecho que segue transmite o conceito de dependência para o autor: “uma relação de subordinação entre nações formalmente independentes, onde as relações de produção estão fundamentadas de forma a assegurar que as nações subordinadas serão modificadas ou recriadas a fim de assegurar a reprodução ampliada da dependência.” A revisão do tema da dependência é importante para mostrar que existem oposições aos métodos exploradores da dinâmica capitalista em função das suas consequências econômicas e sociais. A compreensão da dependência abre espaço para o questionamento de diversos mecanismos econômicos em função de um objetivo particular, em detrimento daqueles de natureza coletiva ou nacional. Crises cambiais e ataques especulativos 9 II.1. Introdução O tema das crises cambiais e ataques especulativos ganhou relevância especialmente na década de 80 (LEON, 2002). Desde então a produção cientifica na área é extensa, variando devido à sua complexidade, fundamentos macroeconômicos e evolução das características de diversos episódios ao longo do tempo. Em sua maioria, modelos econométricos são usados para prever a ocorrência de crises cambiais e ataques especulativos à moeda, que tendem a se desdobrar em crises cambiais. Algumas propostas para diminuir a probabilidade de ocorrência de crises são interpretadas dos resultados. Esta revisão bibliográfica mostra alguns exemplos, sem objetivar exaurir as possibilidades existentes de modelos e suas aplicações, dando uma maior compreensão da complexidade das características dos modelos de primeira e segunda geração, e de contágio. Dependendo do autor, a classificação dos modelos econômicos concebidos para explicar as crises cambiais é distinta. A nomenclatura recorrente é a de gerações, que separam os modelos em primeira, segunda e terceira geração. Entretanto, trabalhos científicos sobre o tema costumam trazer citações que demonstram haver outras possibilidades quanto a suas características e quanto a sua denominação. No trabalho de Miranda (2007), por exemplo, Eichengreen (apud MIRANDA, 2007) classifica os modelos de maneira cronológica, atribuindo a eles os rótulos de primeira, segunda e terceira geração. Kaminsky (apud MIRANDA, 2007) já faz esse agrupamento, observando as diferenças dos fatores causais das crises cambiais e nomeando-os em primeira geração, segunda geração, modelos de problemas financeiros, de reversão generalizada, de solvência e liquidez da dívida pública e modelos de profecia auto-realizável. II.2. Modelos de Primeira Geração Os primeiros registros de crises cambiais, segundo a extensa revisão bibliográfica realizada por Miranda (2007), se iniciaram a partir de modelos de ataque especulativo aos estoques de ouro dos governos, sendo apresentado no trabalho de Krugman (KRUGMAN, 1979). Outros autores, contemporâneos de Krugman, também estudaram o comportamento dos estoques de ouro, como, a exemplo, Salant e Henderson (SALANT, HENDERSON, 1978, apud 10 MIRANDA, 2007) que, em linhas gerais, observaram o preço de bens exauríveis, dentre eles o ouro, quando o governo mantém estoques próprios e intervém no mercado. A dinâmica do ataque especulativo ao ouro, observado em Miranda, é semelhante ao da moeda, visto que esse bem lastreava as operações monetárias e, por isso, poderia ocorrer. “Eventualmente o preço de mercado [do ouro] atingiria nível superior ao preço fixado pelo governo. Essa situação cria a oportunidade de lucro para o investidor que adquirisse a totalidade do estoque do governo, limitando o controle de preços e revendendo pelo preço de mercado resultante” (MIRANDA, 2007, p. 5). Assim o ataque especulativo se concretiza a partir da racionalidade dos investidores que disputam entre seus iguais essa oportunidade de lucro e tende ao momento em que o preço de mercado é igual ao preço fixo. A consequência do esgotamento das reservas do governo é a de que o preço do ouro se aprecia a uma taxa equivalente à taxa de juros. Um exemplo que utiliza da mesma dinâmica anterior, agora aplicado ao caso de ataque especulativo à moeda, é o de Krugman (KRUGMAN, 1979, apud MIRANDA, 2007). O modelo foi testado no regime de taxa de câmbio flexível e fixa e tem as seguintes premissas: a inexistência de ativos reais ou financeiros que não as moedas nacional e estrangeira na composição do patrimônio privado, a demanda por moeda nacional é função da inflação esperada e que o governo ajusta seus gastos como uma função constante da oferta real de moeda, que o mercado de moeda nacional esteja em equilíbrio e que haja paridade do poder de compra. Este trabalho corrobora com a ideia de que uma das maneiras de se postergar a consumação do ataque especulativo é a mudança da taxa câmbio de fixa para variável, entretanto, os agentes privados se antecipam à alteração do regime e, para evitar a perda de patrimônio, compram moeda estrangeira, ocorrendo, assim, o ataque especulativo (SALANT, HENDERSON, 1978, apud MIRANDA, 2007). O fim da manutenção do regime de câmbio fixo não se caracteriza pelo esgotamento das reservas internacionais, apesar dos governos tenderem a resistir aos ataques especulativos se desfazendo de suas reservas de maneira paulatina e crescente em valor real, de acordo com as necessidades do momento. A mudança de regime cambial ocorre em função de ataque especulativo, que se concretiza quando os investidores percebem que o regime vigente não é sustentável. Diante dessa insuficiência do Estado, o setor privado então, segundo Salant e 11 Henderson (1978), tem duas opções, retrair seu consumo da reserva de moeda estrangeira para evitar perdas maiores ou seguir com sucessivos ataques especulativos de maneira a forçar gastos maiores das reservas do governo. A opção tende à segunda alternativa, pois quando o estoque das reservas internacionais do governo destinado à sustentação da taxa de câmbio fixa se exaure ou, em outras palavras, atinge seu nível critico, ocorre a crise cambial. Flood e Garber (FLOOD, GARBER 1984, apud MIRANDA, 2007) fizeram uma versão do modelo de Krugman, apresentada pela sigla KFG. Como resultado, esse modelo apresentou a possibilidade de que, quanto maior for o estoque de reservas no instante inicial dos ataques especulativos e quanto menor a taxa de crescimento do crédito doméstico, mais demorada será a data do ataque. Ainda coerente com a dinâmica dos eventos de ataque especulativo, o modelo KFG demonstra que há queda da oferta de moeda doméstica na mesma magnitude do que a das reservas internacionais no instante do ataque. Outros autores estudaram o modelo de Krugman e o adaptaram da maneira que consideraram coerente, aplicando-o a ataques especulativos na situação de câmbio fixo, a exemplo de Calvo (CALVO, 1987, apud MIRANDA, 2007) e Obstfeld (OBSTFELD, 1986, apud MIRANDA, 2007). Todavia, ataques especulativos à moeda também ocorrem em outros contextos, onde há outros diferentes regimes de taxa de câmbio, inclusive com alguns estudos ainda utilizando o modelo acima citado, como por exemplo, no regime crawllin peg por Connoly e Taylor (CONNOLY, TAYLOR, 1984, apud MIRANDA, 2007). Franco (1992) ainda observa que os regimes alternativos de câmbio tiveram maior importância em países pequenos ou periféricos, que têm a característica de não emitirem moedas usadas internacionalmente como reservas. No regime tradicional de taxa flexível, as taxas de câmbio se dão via mercado cambial, já no crawlling peg a taxa é fixada pelo Banco Central. Assim a autoridade monetária tem condições de sustentar mini-desvalorizações no câmbio, objetivando usar o câmbio como âncora progressiva dos preços domésticos. No modelo de ataque especulativo de Krugman, o autor trabalha com a suposição de que, no cenário decorrente de crise cambial, ou pós-crise, o regime cambial a ser adotado seria permanentemente o de taxas flexíveis. Em análise ao modelo Krugman, Miranda (2007) se contrapõem a esta suposição e, por sua vez, trabalha com três possíveis hipóteses: que o governo 12 retoma o regime de taxa fixa de câmbio em um nível mais desvalorizado, que se opte por desvalorização discreta da taxa de câmbio quando o período de transição é nulo ou que o regime de mini-desvalorizações discretas diárias seja adotado. Em um modelo criado para determinação de ataque especulativo, Dornbusch (DORNBUSCH, 1987, apud MIRANDA, 2007), também replica o pressuposto do modelo de Krugman (1979) e supõem que o regime pós-colapso pode ser o flexível ou o de minidesvalorizações diárias. Os resultados do trabalho de Dornbusch podem ser interpretados como evidências de que, quando no pós-crise, se adota o regime de mini-desvalorizações diárias a desvalorização na transição dos regimes é pré-determinada (MIRANDA, 2007, p. 11). A incerteza tende a postergar o momento de acontecimento de ataques especulativos dependendo do seu grau e do seu contexto. Em trabalhos pioneiros sobre o tema de ataques especulativos introduzindo a variável da incerteza em suas análises, Wilman (WILMAN, 1987, 1989, apud MIRANDA, 2007) supõem duas situações onde a diferença delas é o tipo de incerteza no modelo e foi capaz de concluir a afirmativa anterior. Supondo que a expansão monetária póscrise seja desconhecida (1987), em detrimento de outra alternativa, a de que os agentes desconheçam o nível crítico das reservas internacionais somente (1989), o autor demonstrou dois resultados. No primeiro trabalho Willman evidencia que o ataque especulativo ocorre em política monetária desconhecida em momento posterior ao do caso em que a política monetária é previsível. Quanto na situação em que os agentes desconhecem o patamar de reservas internacionais abaixo do qual o governo abandona o controle da taxa de câmbio, o autor supõe que níveis críticos de reservas internacionais sejam determinados aleatoriamente para cada período ou determinado aleatoriamente no primeiro período e mantido constante a partir de então, no regime de câmbio fixo. Miranda (2007, p. 12) interpreta, a partir dos resultados, que, no primeiro caso, os agentes adquirem moeda estrangeira do governo de forma gradual e que no segundo ocorrem ataques especulativos recorrentes, testando sucessivamente o nível crítico das reservas internacionais, que se mantêm constante e, após ataque não convertido em crise cambial, volta ao patamar inicial. 13 A revisão bibliográfica sobre ataque especulativo e crises cambiais sempre remete à ataques à dívida externa, pois estão intrinsecamente correlacionados. Apesar desse não ser o elemento fundamental deste trabalho, é crucial para o entendimento da dinâmica do processo de ataques especulativos à moeda sua relação com a dependência no seu conceito marxista revolucionário. A dívida externa foi fortemente abalada por ataques especulativos, refletindo em sérias consequências para o lado real da economia, principalmente em países da América Latina, onde se deu o nascimento da Teoria Marxista da Dependência. O processo de ocorrência de ataque especulativo à divida externa se fundamenta na necessidade do governo manter reservas em moeda internacional em sua posse a fim de poder responder às tentativas de ataques especulativos ao regime de câmbio usual. Empiricamente se verifica a maior frequência do regime de taxa fixa nesses momentos. A constituição dessas reservas internacionais tende a ser realizada à custa de endividamento público em moeda estrangeira ou em moeda nacional, no processo de esterilização da oferta monetária derivada da aquisição de moeda estrangeira. Pela necessidade de disponibilidade das reservas para momentos indeterminados, os valores são aplicados, entretanto, com taxas de remuneração menores do que aquelas pagas aos detentores de títulos da dívida externa. Os fundamentos para a manutenção do regime de câmbio fixo, aumento das reservas internacionais, objetivando atraso da uma crise cambial, faz com que o governo incorra em déficit público, logo, sem êxito na segurança do seu regime cambial, às vezes postergando a crise cambial. A insustentabilidade desse processo foi revelada em Miranda (BUITER, 1987, apud MIRANDA, 2007): quando o governo, inicialmente em equilíbrio fiscal, utiliza reservas internacionais substancialmente para a manutenção do regime de câmbio fixo, passa então a apresentar déficit, em função da diferença entre juros pagos e juros recebidos. Tal política tem efeito positivo de adiar a ocorrência de crise quando a elevação do déficit público não supera o efeito do amento das reservas internacionais por um período de tempo suficientemente grande. No pós-crise os resultados esperados são endividamento público, reservas internacionais, taxas de desvalorização cambial, taxas de inflação e de juros sempre maiores do que no período onde não havia crise. A saída definitiva para fugir de crises cambiais no regime de câmbio fixo, pode ser entendida como a mudança para o regime de taxas flexíveis, porém essa afirmativa não é 14 verdadeira, uma vez que esse último regime também está propenso a sofrer crise. Partindo de um modelo que apresenta um regime flexível, com estoque positivo de reservas internacionais, déficit fiscal, inflação positiva, desvalorização cambial gradual e um programa de estabilização de preços baseado em câmbio fixo sem o necessário ajuste fiscal, Winjnbergen (1991) demonstrou como que neste contexto há possibilidade de ocorrer crise cambial. Na América Latina, alguns países tiveram que alterar o seu regime de câmbio, de fixo para flexível, em função dos seus programas de estabilização de preços baseados em câmbio fixo, pois a inflação continuava crescente e em velocidade maior. Na ocorrência de crise cambial no regime flexível, ao se manter o regime, o contexto esperado é de que se tenham reservas internacionais nulas, taxa de inflação elevada, assim como a desvalorização cambial e, com a perda da renda proveniente da aplicação das reservas internacionais, o déficit público aumente. A situação do déficit fiscal e das taxas de inflação são catalisadas porque uma das estratégias adotadas pelo governo normalmente é a emissão de títulos públicos ainda antes de se consumar a crise, numa tentativa de atrasá-la (WINJNBERGEN, 1991, apud MIRANDA, 2007, p. 15). II.3. Modelos de Segunda Geração Nos anos de 1992 e 1993 a Europa Ocidental sofreu uma crise cambial, entretanto suas políticas eram condizentes com os modelos até então conhecidos, tendo como grave conseqüência o fim do Mecanismo de Taxa de Câmbio (Exchange Rate Mechanism – ERM). Esse episódio tirou a credibilidade dos modelos de primeira geração, uma vez que esses não o explicavam. Os países prejudicados por essa crise tinham plenas condições de manter as taxas de câmbio pré-fixadas, porém os governos das respectivas nações optaram em priorizar outras metas de políticas econômicas em detrimento da taxa fixa de câmbio, mesmo quando a desvalorização cambial se iniciou (OBSTFELD, ROGOOFF, 1995, apud MIRANDA, 2007). Nos modelos de segunda geração o valor dado às expectativas do setor privado é relativamente significativo. Os modelos demonstram que, mesmo quando os fundamentos macroeconômicos não apresentam sinais de pressão para desvalorização cambial, uma crise cambial pode ocorrer em função das mudanças das expectativas dos agentes privados, pois uma mudança súbita nessa variável afeta a relação custo-benefício de manter a taxa de câmbio fixa (LEON, 2002). Em geral, os modelos de segunda geração trabalham com a hipótese de 15 comportamento ótimo por parte do banco central, freqüentemente associados a equilíbrio múltiplo. As expectativas dos agentes privados, que realmente determinam a ocorrência de crises cambiais, são determinadas por uma variável exógena e cabe ao modelo explicar apenas as circunstâncias. A dinâmica de ataque especulativo remete a uma coordenação do setor privado para participarem conjuntamente contra o governo e assim, com valores suficientemente altos de transações direcionadas, obterem resultados esperados. Porém, os modelos de segunda geração não oferecem esse mecanismo e, Mesquita (2007, p. 30), identifica como sendo uma falha da geração. Quanto aos fundamentos macroeconômicos, esses não podem ser organizados de tal forma a auxiliar na classificação dos modelos de segunda geração, uma vez que diversos modelos dão destaque a diferentes fundamentos de maneira coerente com equilíbrio múltiplo. Qualitativamente, fundamentos macroeconômicos podem ser suficientemente bons ou ruins e no caso intermediário o equilíbrio tende a ser múltiplo, determinado pelas expectativas do setor privado. É verificável que trabalhos que estudam cenários específicos com uso de modelos de segunda geração não são tão comuns quanto os de primeira. Miranda (2007) atribui essa diferença à maior complexidade dos de segunda geração, como o fato de supor funções não lineares e equilíbrio múltiplo. Como uma conseqüência do equilíbrio múltiplo, o governo enfrenta dilemas. II.3. Coordenação, Transparência e Comportamento de Manada Ataques especulativos podem ser observados por duas óticas, a do setor privado, que quer maximizar os ganhos, e a do governo, que objetiva se defender com sucesso de um ataque. Os agentes privados desconhecem o nível de fundamentos em que seus agentes irão participar de um ataque especulativo. A função de ganho do setor privado é dada por e*-f(Ө)-t, onde e* é a taxa de câmbio fixa, f(Ө) é a função de taxa de câmbio livre condicional à ocorrência de uma crise cambial, Ө são os fundamentos econômicos e t o custo. 16 O ganho com a defesa do regime de câmbio fixo por parte do governo pode ser encontrado pela função v-c(ɑ,Ө), onde v é o beneficio de manter o regime cambial, c é o custo de defesa do regime que é uma função de ɑ, proporção dos agentes privados que participam do ataque, e Ө, fundamentos macroeconômicos. O resultado dessa função é positivo se o ataque é defendido com sucesso ou nulo se não for defendido. As duas funções de ganhos apresentadas e suas interpretações posteriores têm como fonte o trabalho de Miranda (2007) Miranda (2007) classificou os fundamentos macroeconômicos em três níveis de acordo com a função de ganho do governo e dos agentes privados. Na região “instável”, o governo abandona o regime fixo em função dos fundamentos. No nível “sujeito a ataque”, o que faz o governo aderir a outros regimes cambiais é a variável ɑ. E na região “estável” o ataque especulativo não ocorre porque o ganho do setor privado é negativo. O governo pode recorrer a mecanismos que dificultem o ganho dos agentes privados, por exemplo, aumentando os custos de participarem do ataque (t), via controle de capitais, ou diminuindo o patrimônio médio do setor privado. Nessa última alternativa faz com que a proporção de participantes do ataque aumente, pois se o nível critico das reservas internacionais se mantém constante e a capacidade de investimento de capital do agente individual diminui. Como nos modelos de segunda geração as expectativas do setor privado são fundamentais, as noticias divulgadas pelos governos sobre os fundamentos macroeconômicos e suas diversas políticas são fundamentais para embasar as ações desse setor. Uma vez que o acesso as informações são democráticas e estas têm transparência e credibilidade, a expectativa dos agentes privados também são racionais e esperadas. Esse processo de formação de opinião à disposição do governo, ao mesmo tempo, aumenta a possibilidade das informações serem tendenciosas, se elas podem ser manipuladas a fim de se alcançar algum ganho. A presença de transparência nas ações do governo pressupõe acesso fácil e de qualidade às informações, porém para os investidores esse acesso tem um custo. Calvo e Mendoza (2000) mostram que, para agentes que transferem capital entre países, quanto maior o número de países, menor é o retorno relativo dos investidores. Quando o número de países é suficientemente grande, os agentes tendem a ficar mais vulneráveis ao comportamento de manada, pois a administração das informações em função do seu volume, torna-se mais difícil. 17 As conseqüências da transparência podem ser alteradas se um grande investidor, por exemplo, um do tipo Soros, começar a participar do mercado, pois esse pode emitir sinais de coordenação para os pequenos investidores e estes tendem a segui-lo em função de sua credibilidade. Além do fato de que, segundo Corsetti (CORSETTI et all, 2004, apud MIRANDA, 2007), a sua presença no mercado apenas já é entendida pelos outros agentes privados como um sinal da situação dos fundamentos macroeconômicos, normalmente favorável para os agentes privados. Aplicando-se o comportamento de manada à corrida bancária, verifica-se que estão estritamente associados à liquidez das instituições financeiras. O grau de alavancagem de suas operações; a incompatibilidade de fluxos de; e o pressuposto de que os investidores/depositantes conhecem o comportamento dos demais são, basicamente, os fundamentos para que a corrida comece. Assim, o evento de retirada de capital do banco pelos investidores/depositantes tende a aumentar à medida que aumenta o número desses que já o fizeram, resultando em um comportamento de manada (MIRANDA, 2007). II.4. Contágio A Teoria Marxista da Dependência trás o conceito de contágio como sendo algo implícito ao sistema, pois haverá algum momento em que os países desenvolvidos irão responder a choques externos com artifícios maléficos para os países que tem alguma relação econômica com eles por determinação da globalização e não tem responsabilidade alguma no evento. Tratando-se de ocorrência de crises cambiais que ocorrem simultaneamente em dois ou mais países, nem para os marxistas-revolucionários, nem para os teóricos da macroeconomia, é suficiente para afirmar que houve contágio. É necessário, nesse caso, que a crise tenha sido causada por choques de mesma natureza e dependentes, caso contrário seria apenas uma coincidência. Mauro Costa Miranda elaborou em seu trabalho, também sobre ataque especulativo e crises cambiais, um conceito de contágio que se encaixa ao tema em estudo: “‘Contágio’ é a elevação da probabilidade de ocorrência de crise cambial em um país condicionado à ocorrência de crise cambial em outro país” (MIRANDA, 2007, p, 41). 18 É possível localizar diversos conceitos para contágio, inclusive com considerações controversas entre eles, principalmente quando se refere a crises cambiais que ocorreram no mesmo momento ou de maneira sequencial em países distintos. Miranda (2007) atribui essa diversidade aos ajustes realizados em determinado país que está em recessão em função de uma crise cambial e tem que equilibrar seu balanço de pagamentos, impactando diretamente em outros países que podem se tornar mais vulneráveis a ataques especulativos e crises cambiais. Da Teoria da Dependência,pode-se interpretar que essas relações são classificadas como contágio maléfico quando servem para manutenção de um sistema bancário insustentável ou programas populistas ou eleitoreiros de governos que preferem maquiar crises internas. Para as crises da década de 80, 90 e 00, Kaminsky e Reinhart (KAMINSKY, REINHART, 2000 apud MIRADA, 2007) concluíram que a maior parte dos episódios de contágio se deram via transmissão financeira. Os vínculos financeiros de um país com outro que esteja em crise cambial aumenta a probabilidade do primeiro também sofrer o mesmo tipo de crise, pois se um ativo do primeiro país sofre um choque negativo haverá retirada de recursos do outro país em função dos arranjos institucionais. Quando os bancos de uma nação estão em crise, as instituições tendem a se capitalizar e repor sua liquidez resgatando os investimentos realizados em outros países que tem vínculos financeiros, deixando esses mais vulneráveis à crises cambiais, uma vez que o capital externo retornou pra o país de origem. Outro exemplo abrangente de contágio via transmissão financeira se dá quando empresas vendem para países em crise ou que competem diretamente com empresas de países que estão imersos em crises, ocorrendo perdas significativas de receita, pois a empresa está disposta a sacrificar suas unidades em países diferentes do seu de origem em auxilio ao país sede. Os investidores de países que sofreram crises cambiais têm sua riqueza total reduzida e tornam-se mais ponderados ao risco em relação a outros países, podendo inclusive retirar o capital do mercado externo e aumentar a probabilidade de crise no outro país (MIRANDA, 2007, p. 44-45). Todavia, quando a realocação de seus investimentos do setor privado internacional, a fim de se protegerem de uma turbulência surgida em alguns mercados financeiros, se dá por informações incompletas, essa decisão tende a ser embasada com maior significância por informações antigas já dissipadas no mercado, gerando comportamento de manada dos investidores. 19 Um estudo de caso realizado por Abreu (ABREU, 2003, apud MIRANDA, 2007) demonstrou como o contágio pode se dar de maneira ainda mais tênue. Analisando ataque especulativo à moeda espanhola pode concluir que houve contágio na moeda de Portugal sem que tivesse qualquer relação entre os fundamentos de um caso com o outro. Na época as moedas eram Peseta e Escudo, respectivamente. Esse contágio se deu apenas em função da possibilidade de imitação do comportamento por parte da autoridade monetária portuguesa, conclui o autor. Ao estudar contágio em títulos da dívida pública e aplicar testes para verificar a direção da causalidade, Sander e Kleimeier (SANDER, KLEIMIER, 2003, apud MIRANDA, 2007) demonstraram que a direção da causalidade é tão significante para explicar crises cambiais quanto a correlação entre ativos financeiros, inclusive podendo haver novos vínculos de causalidade em diferentes escalas geográficas. O conjunto de informações disponíveis aos investidores também resultam em algum grau em transmissão de contágio, como no caso dos países asiáticos, notícias relacionadas à organismos internacionais e agências de classificação de risco, foram as mais influentes, porém o trabalho não explica todos os eventos de elevada volatilidade ou de comportamento de manada. II.5. Crises Cambiais e o Sistema Financeiro Uma crítica fundamental da Teoria da Dependência é que o governo seja garantidor das relações entre credores e devedores no sistema financeiro, normalmente gerido por instituições privadas que manipulam informações para auferir lucros maiores e colocar parcela significativa da população a mercê de crises em função de má administração. Velasco (VELASCO, 1987, apud MIRANDA, 2007) se valeu do pressuposto de que o governo tenha essa atitude e elaborou um modelo em que o governo intervém nas instituições, na ocorrência de problemas na forma de provisão de liquidez por meio de emissão de moeda. Logo, a manutenção do regime de taxa fixa fica insustentável e a crise cambial ocorre. Miranda (2007, p. 49) avalia cada corrente de modelos de ataque especulativo e de crises cambiais quando aplicados para explicar as crises ocorridas em função da fragilidade do sistema financeiro. Os modelos de primeira geração são suficientemente bons para explicar as crises, pois estas se concretizam somente na emissão de moeda. Os modelos de segunda geração são 20 igualmente capazes de confirmar as teorias desse tipo de crise, fundamentalmente porque nela está implícita a função de preferência do governo. Ainda cabe, na hipótese de crises decorrentes do sistema bancário, a atuação de expectativas auto-realizáveis, pois o risco de instabilidade no sistema financeiro é suficiente para desdobrar-se em crise bancária e cambial. As evidências de que crises bancárias estão associadas a crises cambiais são diversas e dispostas na extensa bibliografia sobre o tema, inclusive a de que elas tendem a acontecer conjuntamente, chamadas de crises gêmeas. Essas culminam da expansão econômica, da liberalização financeira, da expansão monetária, do ingresso de capitais estrangeiros e da apreciação da taxa real de câmbio, podendo ser representadas pelas crises cambiais e bancárias ocorridas na Ásia em 1997. Quanto às crises decorrentes de profecias auto-realizáveis, que ocorrem em frequência muito menor que as demais (MIRANDA, 2007, p. 69). Convergência para um desenvolvimento sustentável A Teoria Marxista da Dependência não vê na anarquia ou na ruptura imediata com as relações internacionais ou capitalistas a saída para uma sociedade mais igualitária. No contexto atual de globalização, a dependência já está intrínseca aos países e a adoção de uma das alternativas citadas levaria a condições piores que as atuais. Entretanto a teoria não partilha da proposta de que o modelo atual é o melhor possível e nem que o progresso do capitalismo, nos moldes que ele se apresenta, tende a ser o gerador da sociedade igualitária idealizada pelos marxistas-revolucionários. A teoria propõe uma alteração na estrutura do sistema capitalista. Para isso é necessário compreender seus mecanismos. Os ataques especulativos à moeda e as crises cambiais são exemplos pontuais de fenômenos do sistema que vão ao encontro das idéias dependencistas. Assim embasando ações que possam reverter esses processos ou minimizar suas conseqüências, colaborando com conclusões como a de que o regime de câmbio fixo é um modelo essencialmente transitório. Com tais conhecimentos, pode-se colaborar com o desenvolvimento sustentável das nações mais afetadas, que são as mesmas com maiores dificuldades de abastecerem sua população de alimentos, saúde, educação, segurança e controle de corrupção minimamente adequados. 21 Por serem os temas da crise cambial e dos ataques especulativos relativamente novos na discussão acerca do desenvolvimento das nações, não foi localizado na Teoria Marxista da Dependência citações diretas a eles. Os estudos destes mecanismos se aprofundam na Teoria Política do Sistema Mundo – TPSM, que é um desdobramento da Teoria da Dependência, compartilhando desta seus conceitos e ideologias. A fim de evitar injustiças com mecanismos que, graças à globalização, podem gerar qualidade de vida à uma população, é necessário distinguir, aqui, o termo investimento e aplicação financeira. Tecnicamente, investimento é o acréscimo de estoque físico de capital, ou seja, atividade produtiva que necessite de capital fixo ou de estoque para arcar com seus compromissos. Nesse caso, as movimentações financeiras que ocorrem correspondem a uma atividade produtiva. Já as aplicações financeiras são transações financeiras entre agentes, sem gerar produto ou serviço algum, como por exemplo o mecanismo conhecido como carry trade – prática onde o especulador pega dinheiro emprestado em um país a uma taxa menor de juros para emprestá-lo em outro, onde a taxa seja maior. O avanço tecnológico, as políticas salariais nas empresas e a influência destas nas ações dos governos tem aumentado o nível de dependência através da exploração da força de trabalho, aumentando a cota de mais-valia dos detentores dos meios de produção. Porém, os mecanismos especulativos tem se tornado o maior causador de dependência entre as nações, visto que o contágio das crises cambiais se dá especialmente por transmissão financeira e não comercial, como mostra o trabalho já citado de Kaminsky e Reinhart (2000), que utiliza um modelo econométrico de contágio para estudos de ataques especulativos. Esse processo concentra renda limitando o desenvolvimento em geral e de uma maneira mais aguda que através da mais-valia. Ladislau Dowbor, doutor em economia, consultor da ONU, autor de mais de 40 livros, recorrentemente faz uso da alegoria de um cassino para se referir ao uso indiscriminado de capital para fins especulativos e o qualifica de mais-valia social. O próprio sistema que gera os ataques especulativos e crises cambiais percebe essas ações como deletérias para si mesmo, pois esse processo especulativo tende a ser financiado por capital especulativo e sob frágeis coordenações de administração e de risco, funcionando como verdadeiras apostas e gerando bolhas. Essas bolhas, por sua vez, atingem também os mercados internos e o sistema responde, contraditoriamente, salvando os especuladores, normalmente sob a 22 intervenção dos governos, sem alterar fundamentalmente as regras do jogo, voltando para o momento anterior ao que ocorreu a crise. A Teoria da Dependência entende como correto o caminho para um desenvolvimento econômico aquele que preza não só fatores quantitativos mas, também, a qualidade de vida da população. As ações pós-crise devem aproveitar o contexto para essa reforma das bases do sistema, usando a crise como uma oportunidade para mudanças. De uma maneira sustentável, visando diminuir a vulnerabilidade dos países explorados no conceito da dependência, os governos poderiam, nesses momentos, reverter recursos para a distribuição de renda, crédito produtivo e construção de infraestrutura, atingindo diretamente as demandas internas do país e se traduzindo rapidamente em consumo, produção e emprego, pois “no andar de baixo” da economia não é recorrente o uso de aplicações financeiras para esperar lucro (DOWBOR, 2009). Diante da crise econômica iniciada com o sub-prime em 2007, pode-se verificar, o quão rápido foi levantar recursos para salvar instituições que estavam com a credibilidade em baixa. No dia 15 de setembro de 2008 foi anunciada a quebra do banco americano Lehman Brothers e, no mesmo dia, o FED – Banco Central Americano, injetou US$ 50 bilhões no mercado financeiro e no dia seguinte, o Banco Central Europeu, o japonês e o sueco injetaram recursos de curto prazo no valor somado de US$ 209 bilhões nos mercados monetários. Assim o governo consegue controlar em algum grau as expectativas dos agentes privados e minimizar conseqüências em seu território. Outra conseqüência das crises é que elas deixam os investidores nacionais mais ponderados ao risco. Por esse motivo tendem a retirar o seu capital de países com quem têm relações especulativas, aumentando a possibilidade de crises nos países que perdem este capital, propiciando a condição de contágio. O risco da crise também afetar os demais países se potencializa quando se verifica comportamento de manada. Os problemas econômicos que afetam os países explorados, no conceito marxistarevolucionário, são intrinsecamente ligados e convergentes, gerando uma sinergia que os deixam mais ameaçadores. Um exemplo é a prática de ataques especulativos à dívida externa de uma nação. As causas são recorrentemente atribuídas ao fato dos mecanismos atuais de governança não serem suficientes, especialmente quanto à avaliação dos fundamentos macroeconômicos relevantes. Partindo do pressuposto de que o problema principal da severa dependência entre os países via especulação está na regulação dos mercados, a reformulação dos mecanismos não se 23 fará em pouco tempo. Assim como, para formar o Bretton Woods exigiram-se dois anos de preparação por equipes técnicas (DOWBOR, 2009, p. 24).Ainda sobre esse tema Dowbor propõe: “[...] redistribuição dos votos no Fundo [Monetário Internacional], retirando o poder de veto dos EUA. O BIS deveria também ser administrado de forma mais ampla e receber maiores poderes e assim por diante. Continuamos, no entanto, no quadro destas propostas, com o dilema central: a finança se tornou mundial, mas não há nada que se pareça com um banco central mundial. Fluxos mundiais versus regulação nacional; processos globais versus gestão fragmentada.” (DOWBOR, 2009, p.25). Para que a regulação tenha êxito em seus objetivos, compatíveis com a prioridade do bem-estar das populações sobre o ganho financeiro, Dowbor (2009) enumera seis pontos cruciais. Em linhas gerais podemos descrever: limitar a alavancagem das instituições financeiras, assegurar a transparência nos processos, organizar o acesso às informações, controle da dupla contabilidade – meio utilizado para lavagem de dinheiro – controle dos paraísos fiscais e que as agências de avaliação de risco não sejam financiadas por quem avaliam. Estas propostas não contemplam plenamente o entendido como ideal pela Teoria da Dependência, pois assim o sistema se mantém, melhorando apenas sua governança. Todavia, a teoria afirma que o processo de mudança tem que ocorrer na estrutura do sistema, onde também estão os atos normativos e reguladores. O que se vê nas análises de Dowbor é que essas são oportunidades onde o sistema pode ser criticado desde sua estrutura e, dependendo das ações adotadas naquele momento os rumos serão diferentes dos atuais, caminhando para uma sociedade mais igualitária. Não apoiando o sistema atual como um caminho para o desenvolvimento da implementação do socialismo, como propunha o criticado Partido Comunista Brasileiro, os fatos aqui se desdobram em mudanças estruturais que nos aproximam do ideal, reformando ao menos um dos fundamentos do capitalismo e dando condições dos países menos desenvolvidos serem mais independentes e poderem ter mais margem para novas práticas. Zhou Xiaochuan, o presidente do Banco Central da República Popular da China, como um líder de uma nação socialista que abre gradativamente seu mercado internacional, diz sua opinião sobre a necessidade reformular o sistema financeiro, de modo que diminua a dependência e as ocorrências de ataques especulativos e crises do tipo cambial. A proposta de Xiaochuan, nas palavras dele é: “O objetivo desejável da reforma do sistema monetário internacional, portanto, é de criar uma moeda reserva internacional desvinculada de nações individuais, e que seja capaz de 24 permanecer estável no longo prazo, removendo assim as deficiências inerentes causadas pelo uso de moedas nacionais baseadas em crédito.” (Xiaochuan, Carta ao FMI, in Wall Street Jornal, 24 de março de 2009). Se são viáveis as alternativas expostas neste trabalho, cabe discussões, mas a questão em foco não é somente esta. Medidas têm que ser tomadas, o consumo desenfreado é incompatível com a capacidade de produção do planeta e “é criminoso o desperdício das nossas poupanças e do potencial mundial de financiamento no cassino global, quando temos desafios sociais e ambientais destas dimensões e urgências, e que necessitam vitalmente de recursos.” (DOWBOR, 2009). Bibliografia ARRIGHI, Giovanni. O longo século XX: dinheiro, poder e origens do nosso tempo. UNESP, São Paulo, 1996. BAMBIRRA, Vania.Teoría de la dependencia: una anticrítica. ERA, México D.F.. 1978. BIELSCHOWSKY, Ricardo. Celso Furtado e o pensamento econômico latino-americano. A grande esperança em Celso Furtado. Ed. 34, São Paulo, 2001. BIELSCHOWSKY, Ricardo. Cinquenta anos de pensamento na CEPAL. Ed. Record, Rio de Janeiro, 2000. DOS SANTOS, Theotonio. Imperialismo y dependencia. Ediciones Era, México D.F., 1978. DOWBOR, Ladislau. A Crise Financeira sem Mistérios: Convergência dos dramas econômicos, sociais e ambientais. Brasíia, DF, 2009. 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