CYBERBULLYING RELATIVO À DIVERSIDADE SEXUAL: UM OLHAR
OMNILÉTICO
Mônica Pereira dos Santos1
Mylene Cristina Santiago2
Gabriel de Andrade Quirino3
Resumo:
Este artigo objetiva discutir omnileticamente o ciberbullyingreferente aos
aspectos vinculados às sexualidades humanas. Partimos do princípio omnilético de que
este comportamento social aponta para vários significados, visíveis e potenciais, cada
um deles indicando variadas matrizes culturais, políticas e práticas, e articulados de
forma complexa e dialética. Iniciaremos o artigo explicando o referencial omnilético.
Em seguida, teceremos uma relação entre este referencial e o tema central do texto, o
ciberbullyingrelativo às diversidades sexuais. Por fim, analisaremos, à luz da
omnilética, de que forma estas ocorrências apontam para uma intrincada e
interdependente relação entre as três dimensões em suas características dialéticas e
complexas.
Palavras-chave: omnilética, ciberbullying, diversidade sexual
1
Professora Associada da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Pesquisadora e Coordenadora do LaPEADE/UFRJ. E-mail: [email protected]
2
Professora adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense.
Pesquisadora e Coordenadora do LaPEADE/UFRJ. E-mail: [email protected]
3
Graduando de Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense de Niterói. Pesquisador de
Gênero e Sexualidade na Escola. E-mail: [email protected]
Introdução
A discussão das diversidades sexuais está associada à formação de identidades e
diferenças na contemporaneidade. A vivência das diferentes identidades sexuais está
presente em todos os espaços sociais como também nos chamados espaços virtuais ou
ciberespaços.
Assumindo a existência de situações de preconceito e discriminação em relação
a identidades, e em nosso caso, particularmente orientações sexuais que se manifestam
de forma diferenciada das normas culturalmente aceitas e socialmente impostas, nosso
trabalho busca problematizar as relações homofóbicas que têm sido transpostas para os
espaços virtuais, constituindo o chamado ciberbullying.
Com os avanços tecnológicos, novas realidades territoriais têm sido criadas e é
perceptível que ações de discriminação e de reconhecimento sejam deslocadas para os
ciberespaços, território flutuante e mutável, que permite relações fluidas e com
inúmeras possibilidades de configurações.
As identidades produzidas no ciberespaço são dialeticamente complexas, nos
permitindo um olhar omnilético, que se trata de umaperspectiva em construção que
abrange as relações, contextualizações e configurações que envolvem a diversidade
humana em suas possíveis e infinitas formas de manifestações.
Na trama da complexidade das interações sociais, as redes virtuais têm se
estruturado como um importante espaço na sociabilidade de pessoas com diferentes
orientações homossexuais. Desse modo, julgamos relevante conhecer e pesquisar esse
espaço buscando compreender os processos de inclusão e exclusão circunscritos nas
relações virtuais (práticas) a partir de dimensões culturais e políticas articuladas com
características dialéticas e complexas que estruturam uma perspectiva omnilética de
análise.
O Olhar Omnilético
A perspectiva omnilética foi cunhada por Santos em 2012 (SANTOS, 2012)
após alguns anos de pesquisas sobre processos de inclusão e exclusão em educação com
o uso do Index para a Inclusão (BOOTH e AINSCOW, 2000; 2002; 2011). O Index é
um material de natureza práxica (PEREIRA, 2009), que tem por objetivo desencadear e
sustentar processos de reflexão-ação nas escolas a partir de uma série de questões
encontradas em conjuntos de indicadores pertencentes a eixos de análise. Estes, por sua
vez, organizam-se dentro de três grandes dimensões: culturas, políticas e práticas de
promoção de inclusão/exclusão nas instituições escolares.
Culturas remetem a
reflexões, valores, representações e justificativas; políticas, às organizações que se
podem mobilizar tendo em vista dar apoio e suporte aos processos de inclusão; e
práticas remetem às práticas sociais propriamente ditas. O contato prolongado com o
Index fez com que a autora (SANTOS, 2012) percebesse o mundo a partir destas três
dimensões, assumindo que os fatos da vida humana e social poderiam ser
compreendidos como culturais, políticos e práticos.
Entretanto, o trabalho com o Index também lhe fez ver que para considerar estas
dimensões como tão basilares à compreensão da vida humana e social, um passo
diferenciado a respeito das mesmas precisaria ser dado em relação aos autores do Index.
É que para Booth e Ainscow (2000, 2002 e 2011), uma das dimensões, a das culturas,
constitui-se como base para as outras, precisando ser refletida e alterada primeiro para
que políticas e práticas fossem transformadas. Na percepção de Santos (2012),
entretanto, esta ‘hierarquização’ das dimensões, além de parecer um olhar de certo
modo linearizado sobre os acontecimentos da vida, não permitia que aspectos mais
complexos destes fatos pudessem ser revelados. Por exemplo: se culturas vêm antes de
políticas e práticas, como explicar os frequentes casos em que movimentos sociais
engendram mudanças de valores sociais ao longo da história? Ou ainda, como explicar
as
ocasiões
em
que,
na
história
da
humanidade,
políticas
influenciaram
comportamentos, que ao se mobilizarem transformaram valores? A autora chegou à
conclusão de que esta hierarquia não fazia sentido. E mais: havia um movimento entre
elas, que poderia dar a impressão de que, temporariamente, uma se sobressaísse em
relação às outras, mas tal situação seria sempre provisória, dados os movimentos
dialéticos e complexos que alimentam e movimentam as três dimensões.
Um outro ponto acerca das dimensões em que houve um certo distanciamento
entre Santos e Booth diz respeito à dimensão das políticas. Santos adota a definição de
Booth, mas a amplia para considerar também como intenções expressas cujos objetivos
são orientar ações. Assim, para além das políticas públicas e dos aspectos
administrativos necessários à sua implementação, políticas também dizem respeito ao
plano institucional (no caso da escola, o Projeto Político Pedagógico, o currículo, as
circulares internas, os planejamentos de aula, etc., são exemplos) e pessoal (decisões
tomadas, por exemplo).
Assim, e ao considerar as relações entre as dimensões como dinâmicas,
complexas e dialéticas, a autora se deu conta de que seria necessário um outro nome,
que abarcasse a tridimensionalidade cultural, política e prática da vida neste movimento
e interrelacionamento constante e simultaneamente dialético e complexo. Isto requereria
uma atenção totalizante, integradora dos aspectos mencionados. Para caracterizar esta
perspectiva integralizadora e totalizante, a autora chegou ao prefixo omni, que em latim
quer dizer tudo, todo. Tendo em vista, ainda, a preocupação da autora em demarcar a
importância de se considerar que dentro deste todo estãoas diversos possibilidades de
leitura e combinações dos elementos culturais, políticos, práticos, dialéticos e
complexos, o radical latino lektos foi selecionado. O sufixo grego ikos foi adicionado
para significar o interrelacionamento das partes em sua totalidade.
Deste modo, omnilética significa, nas palavras de Santos (2012),
Por Omnilética quero dizer, portanto, uma percepção relacional da
diversidade, do que é variado, variação esta que pode encontrar-se
tanto presente quanto oculta, ao mesmo e um só tempo ou em tempos
e espaços diferenciados. Trata-se de um modo complexo de se
perceber os fenômenos sociais, os quais compõem, em si mesmos,
possibilidades de variações infinitas e nem sempre imediatamente
perceptíveis, visíveis ou imagináveis, mas nem por isso ausentes ou
impossíveis, pois seu caráter relacional, referencial e participativo (no
sentido de ser parte) torna aquilo que se percebe do fenômeno tanto
sua parte instituída quanto é, esta mesma, sua instituinte. Ou seja, os
fenômenos que percebemos e como os percebemos são tão instituídos
quanto instituintes (pág. 1225).
Ao adotarmos esta perspectiva para discutir os dados aqui trabalhados,
quisemos, portanto, abrir a possibilidade de analisarmos aspectos de inclusão e exclusão
tanto manifestamente visíveis quanto ainda potenciais; tanto os modos imediatamente
perceptíveis de como culturas, políticas e práticas acontecem e se relacionam complexa
e dialeticamente, quanto as maneiras possíveis, ou seja, aquelas que, embora ainda não
perceptíveis, estão presentes potencialmente. É o que faremos a seguir.
Ciberbullying: tecnologizaçãodo bullying?
As novas tecnologias da informação e da comunicação têm contribuído de forma
substancial com novos arranjos socioculturais, inaugurando modelos descentralizados
de circulação de informações que permitem mudanças estruturais nos padrões de
produção e distribuição das informações, possibilitando, simultaneamente, o consumo, a
produção, a recepção e a distribuição de conteúdos. De acordo com Lima (2009, p. 5)
Ociberespaço não é uma realidade à parte, ou um não-lugar
desconectado da realidade, mas uma expansão e um complexificador
do real, e se constitui como uma tecnologia produtora e mediadora de
informação, discursos e representações que dialoga com as outras
mídias e é influenciada do mesmo modo que influencia seus
conteúdos.
A autora destaca o ciberespaço como umterritório simbólico de vínculos sociais,
um ambiente de trocas de informações, textos,imagens, experiências de vida e um meio
de contato e relacionamento social. O caráter agregador assumido no ciberespaço está
vinculado à autonomia dosusuários, navegadores, em busca de seus interesses pessoais e
com liberdade de escolha para definir seuscaminhos para a informação e
entretenimento, se agrupando a outros usuários na rede,principalmente pelas afinidades.
As comunidades virtuais configuram-se como espaçosde agregação social de
múltiplos interesses e também como redes de comunicação coletivas,por meio de listas
e fóruns de discussão, que remetem seus usuários à noção de um espaço simbólico de
partilha e a um sentimento de inclusão e participação social.
Entretanto, se por um lado o ciberespaço pode promover um espaço democrático
de participação e associações identitárias, compondo grupos conforme afinidades de
interesses, por outro lado, pode produzir tambémrepresentações dominantes e
estereotipadas, apresentando imagenspreconcebidas e simplificadas dos acontecimentos
sociais em diferentes esferas da vidacotidiana, assim como das identidades diversas.
Lima (2009) acrescenta queas representações construídas apartir de discursos
hegemônicos que circulam nos espaços ditos oficiais, podem ser reproduzidas em
diferentes esferas, inclusive nos espaços virtuais, produzindo discursos e versõesde
realidades arbitrárias na medida em que disciplinam e homogeneízamcomportamentos e
desejos, sob aameaça da rejeição social, enfraquecendo a legitimidade da
multiplicidade.
O espaço virtual pode se converter também em espaço de prática de bullying
(palavra do inglês que pode ser traduzida como "intimidar" ou "amedrontar"). O uso da
tecnologia tem dado nova face ao problema, que batizado de ciberbullying, se converte
em e-mails ameaçadores, mensagens negativas em sites de relacionamento e torpedos
com fotos e textos constrangedores para a vítima. O ciberbullying pode ser uma faceta
mais cruel que o bullying tradicional, pois as provocações e a exposição da vítima4
tomam dimensões maiores e a identificação dos agressores5 é mais dificultada.
A pressão da exposição em massa e o sentimento de humilhação podem resultar
em suicídio, como casos divulgados na mídia envolvendo adolescentes que tiveram
vídeos e/ou fotos íntimas divulgadas na internet. Percebemos nos casos de ciberbullying
direcionados às adolescentes e mulheres uma tendência ao constrangimento moral,
através da difamação e da calúnia, o que está diretamente relacionado às relações de
gênero culturalmente construídas. E o ciberbullyinghomofóbico?
No Brasil, o enfrentamento ao preconceito,discriminação e exclusão que atingem
transexuais, travestis, lésbicas, bissexuais e gays no país, tem sido tratado pela
Secretaria de Direitos Humanos (SDH), que almejagerar mudanças legislativas como
pressupostos fundamentais para assegurar que as políticas públicas para apopulação
LGBT sejam instrumentos eficazes de promoção da igualdade entre todas as pessoas,
independentemente, de orientação sexual e identidade de gênero (BRASIL, 2012).
Embora o Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil(BRASIL,
2012)retrate que no ano de 2012, houve denúncia de 9.982 violações relacionadas
àpopulação LGBT, esse documento não especifica a incidência de crimes virtuais. Em
pesquisa à internet, identificamos sites que buscam orientar sobre denúncias de crimes
de ódio e crime homofóbico nas redes sociais virtuais.
A discussão sobre o enquadramento penal da violência virtual avança no Brasil,
de acordo com Casado (2015)
[...] não há como negar a possibilidade de aplicação do Código Penal
às práticas delituosas apenas porque inexiste uma legislação específica
até porque conforme percebemos todas as condutas são passíveis de
adequação aos tipos já existentes.[...] até 2008 foram mais de 17 mil
sentenças coibindo diversas práticas criminosas tais como crime de
estelionato, injúria, calúnia, difamação, furtos, extorsão, ameaças,
fraudes com cartão de crédito, dentre outros. [...] o Poder Judiciário
está (atento) aos crimes praticados por meios eletrônicos
salvaguardando os direitos dos cidadãos.
4
A mensagem maliciosa pode ser encaminhada por e-mail para várias pessoas ao mesmo tempo
e uma foto publicada na internet acaba sendo vista por centenas de pessoas, que podem tecer comentários
pejorativos sem ao menos conhecer a vítima.
5
O grande problema para a responsabilização criminal, em se tratando de cyber bullying é a
prova processual das agressões virtuais, isto porque, embora cada computador possa ser identificado pelo
IP (Internet Protocol), ou seja, o agressor deixa rastros do crime na rede mundial de computadores, muitas
vezes se esconde atrás de nicknames (apelidos) utilizados no mundo virtual que podem dificultar a
identificação exata do agressor, principalmente se o agressor utiliza várias máquinas (computadores) em
lugares diversos como as lanhouses.(CASADO, 2015)
Para além das implicações jurídicas e virtuais do ciberbullying atentamo-nos às
questões referentes às diversidades sexuais e ciberespaço no sentido de articular os
novos processos de interações virtuais/sociais com os processos de inclusão/exclusão
em educação.
Diversidades sexuais e ciberespaço: fronteiras de inclusão e exclusão
No ciberespaço há possibilidade de produzir e manipular identidades de acordo
com as possibilidades de reconhecimento e com bases nas estruturas sociais e relações
de poder existentes. Nesse contexto, a célebre frase de Boaventura de Souza Santos, se
torna bem inteligível: “temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos
inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos
descaracteriza.”(1999, p. 6)
À medida que o sujeito cria diferentes formas de representação sobre si mesmo é
provável que (re)crie formas de compreender situações e experiências de vida, pois a
possibilidade do anonimato permite compartilhar e coletivizar acontecimentos e
sentimentos íntimos sem serem alvos de rejeição, perseguição ou outras formas de
exclusão veladas ou declaradas. Por outro lado, tal anonimato permite que o indivíduo
se torne o perseguidor ou criminoso, pelas mesmas vias anteriormente mencionadas.
Em caráter de ilustração apresentamos trechos de manifestações resultantes de
uma longa postagemrealizada pelo Deputado Federal Jean Wyllys em seu facebook, que
traduzem nossa discussão no presente trabalho. Como já é de conhecimento público, o
referido deputado assume-se como homossexual, e apresenta a defesa desta causa (e
outras causas de grupos de minorias) em sua plataforma política.
Em 21 de abril de 2015, o deputado postou a seguinte mensagem, acompanhada
de um vídeo (o link encontra-se ao final da mensagem postada):
A personagem Teresa, vivida por Fernanda Montenegro na novela
Babilônia, foi ao programa da Fátima Bernardes falar sobre sua união
de 35 anos com Estela (Natália Timberg), que celebrarão em breve na
trama oficializando-a através do casamento civil. Diversas vezes
Teresa repetiu em alto e bom tom que a família dela existe, é real e
deve ter os mesmos direitos que qualquer outra família. Assim como a
delas, centenas de outras famílias homoafetivas também existem. São
Martas, Lauras, Leticias, Anas, Lucas, Joãos, Marcos, Wallaces, e
muitos outros e outras que formam os casais que compõem esse lindo
vídeo
da
campanha
pelo
casamento
civil
Igualitário
(http://on.fb.me/1yQjvzS).#Babilonia#NossaFamíliaExiste.
Este post teve, até a noite do dia 24 de abril, 476.879 visualizações, mais de 13
mil curtidas e 6.751 compartilhamentos, o que mostra um impacto bem razoável.
Interessa-nos aqui, em particular, as “curtidas”. As aspas na palavra referem-se aos
comentários maliciosos que constituem o ciberbullyinghomofóbico, os quais nos fazem
refletir sobre o sentido atual de ‘curtição’, que até recentemente significava algo de que
se gostava e, portanto, se ‘curtia’. Vejamos alguns exemplos destes comentários, assim
como algumas respostas aos mesmos. Esclarecemos que transcrevemos ipsis literis o
conteúdo do site, portanto, erros de digitação e de português cometidos pelos próprios
‘debatedores’ foram mantidos. Trocamos apenas os nomes, por questões éticas.
Maria pergunta: Jean, pq VC não compareceu ao debate com o
Malafaia sobre família?
A Assessoria de Comunicação do Deputado responde: (...) o deputado
esteve em missão oficial, representando o parlamento brasileiro, em
uma convenção de parlamentares do G7/G20 a convite da ONU, em
prosseguimento ao trabalho iniciado no ano passado, em Estocolmo.
A gravação do programa seria realizada no dia 11, porém foi adiada
para o dia 18 a pedido do próprio Malafaia, exatamente o período da
viagem do deputado. A missão oficial já estava acertada desde o ano
passado, muito antes do convite do programa. (ASCOM).
A este comentário, seguem-se uma série de outros, defendendo a não ida ao
debate por parte do Deputado, com argumentos de ser “perca de tempo” (sic). Até que
Mário e Joana perguntam:
Mário: Por que você não aceitou debater com o menino Kim
Kataguiri, já que ele te chamou para debater sobre política pública?
(...)
Joana: Já que ele [referindo-se ao deputado Jean Wyllys] é a favor da
família,pq apoia o aborto?
A partir de então, seguem-se uma série de comentários agressivos, humilhantes e
violentos, tanto em defesa quanto contra o Deputado Jean Wyllys. Vejamos alguns.
Alice: Ele não aceitou o debate com o menino Kim pq o menino deve
ser do povão e como sempre o povo p eles é o q menos importa...
(...)
João: Debate... Palhaçada, tempo perdido com debate podia ser
aproveitado ajudando o povo e não ludibriando. Parlamentar legal não
aceita ganhar o que esses nossos ganham e ainda roubam. Puxar saco
do Jean pq ele e gay não vai melhorar e nem piorar o Brasil. Jean
Wyllys deputado neutro, só faz críticas e reclamações, ajudar que eh
bom necas.
(...)
Samuel: A favor da Família e a favor do Aborto? Já nasceu ne Jean
dai é Fácil ser A Favor! O que te faz pensar que Fugirá da uIra de
Deus?
(...)
José: [referindo-se ao depoimento de Samuel] Ira de Deus? Kkkkkk.
Meu querido.. Ira, raiva, ódio... São sentimentos humanos. Por mais
que a bíblia atribua esses sentimentos a Deus, mas tratam-se de
sentimentos humanos. Nós humanos somos pobres e imperfeitos,
ainda estamos e temos muitos sentimento...
(...)
Paulo: Por que esse infeliz malafaia n sabe o que é família.
(...)
Amaro: Por que ele [Jean Wyllys] não ter argumentos contra o Silas
Regina: Porque ele é covarde! Agressivo, revoltado! E viado!
Simone:Pq ele nao tem bala na agulha pra encarar Malafaia
O que se percebe pelos comentáriosé uma série de acusações que, fundadas ou
não, são desrespeitosas e intencionalmente procuram desqualificaros deputados.Em uma
análise omnilética, percebemos culturas (crenças e valores) em gritante conflito, tanto
entre si quanto quando são utilizadas para julgar (práticas) posicionamentos políticos
(políticas), seja dos deputados envolvidos, seja dos próprios participantes. Por exemplo,
as perguntas (políticas) feitas (práticas) por Maria e Mário, ao mesmo tempo em que
sugerem uma possível discordância (culturas) do deputado, também abrem
possibilidades de diálogo, na medida em que, aqui, ainda não se emitiu julgamentos.
Continuando nossa análise omnilética, ao trazermos os pensamentos dialético e
complexo para compreender as relações entre as manifestações culturais, políticas e
práticas, podemos perceber que o próprio jogo de contrariedades (dialética) instiga a
continuidade do debate, o qual, apesar de ser agressivo, apresenta ‘brechas’ de incerteza
(complexidade) que nos leva a possibilidades de caminhos ainda não visíveis, mas
potencialmente viáveis, como por exemplo, uma “feitura de pazes” entre os
participantes, ou a assunção definitiva de uma postura de “guerra”. O depoimento de
José, por exemplo, abre a possibilidade para as duas coisas. Ele começa escarnecendo
de Samuel, mas em seguida atribui à humanidade os sentimentos negativos evocados
por Samuel em nome de Deus. Ao fazer isto, ele abre a possibilidade de que os outros
enxerguem em si, e não (apenas) em Deus, o controle sobre sentimentos negativos,
atitudes (práticas) que poderiam levar a conversa para um rumo mais pacífico,
respeitoso, menos excludente.
Ademais,
nada
impediria,
ainda,
que
alguém
aparecesse
propondo,
conscientemente ou não, uma “terceira via” de curso para estas interações. Quando
adotamos o olhar omnilético, sempre é possível enxergar possibilidades de caminhos de
diálogo e posturas menos excludentes, mesmo que não conciliatórias.
Em outra postagem do deputado Wyllysno mesmo dia, desta vez com bem
menos “curtidas”, lia-se:
Jean Wyllys: Pessoal, vocês já conhecem a página da campanha do
casamento civil igualitário, criada para apoiar o projeto de emenda
constitucional (PEC) do deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ)
pelo direito ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo no
Brasil?...Ver mais. Casamento Civil Igualitário / Site oficial da
campanha no Brasil! Site oficial da campanha do Casamento Civil...
CASAMENTOCIVILIGUALITARIO.COM.BR
A este post seguiram-se vários comentários elogiosos, até que Alessandro postou
um vídeo(https://youtu.be/HFhXB_mP5gc) em que um suposto ex-agente da KGB
discute formas estratégicas usadas pelo regime comunista para tomar o poder. O vídeo
dá a entender que isto é o que está acontecendo no Brasil de 2015. Abaixo do mesmo,
há
a
mensagem
“Curta
nossa
Página
no
Facebook: https://www.facebook.com/gotropaa”. Fomos à página para ver de que se
tratava, e vimos que são grupos de seguidores do Deputado Jairo Bolsonaro6.
Novamente, observamos uma grande quantidade de troca de ofensas:
Amarildo: oa crentes sem argumento com historias de pederastia,
povo sem evolucaoespiritual
Gerusa: Essa união so gera escremento, nunca uma família.
Maíra: Em q igreja q se ensina a agredir o semelhante? Viva a
hipocrisia cristã brasileira...
Renato: Os filhos vão nascer de onde?
Carla: Os filhos nascem do amor, só o amor transforma e existe uma
familia, pode nao ser do ventre mas o amor pode transformar e um
filho de muitos que por muitos motivos nao podem ou nao querem
entao existe essas pessoas com amor puro no coraçao que criam
Gerson: Alessandro, vcsvao ter que engolir gays se casando sim seu
otario!
Welington: Não concordo com o casamento gay religioso, como
alguns tentam propor. Mas direitos civis devem ser mantidos sim.
(...)
Rafael: O Welington se vc fala ai que não concorda vc é Omofobico
em não pode falar não kkkkk? Também não concordo e o fato de vc
não concorda é um direito seu meu amigo , vai ser uma guerra muito
difícil para o senhor Jean Wyllys ,acho que cada um é cada um mas
acho que as opiniões vir-se e versa tem que ser respeitada , e isto é
uma coisa que ninguém respeita !
6
No contexto brasileiro, este deputado tem sido vastamente reconhecido por sua postura
homofóbica. Dialeticamente e complexamente, nas eleições de 2014, este deputado foi o mais votado,
seguido muito de perto pelo deputado Jean Willys, denotando culturas, políticas e práticas em relações de
contrariedade (dialética) e incertezas (complexidade).
Frederico: Rafael você se deu ao trabalho de ler direito as 9 postagens
antes da sua para entender que Welington e Jean não estão
discordando? É impressionante o nível de desprendimento da
realidade que uma argumentação puramente emotiva causa. Você
repete uma crítica descontextualizada e não segue o fluxo lógico do
que está sendo falado, não enxerga o consenso nem quando ele existe.
Isto é muito perigoso, isso é uma grave manifestação ou de
analfabetismo funcional ou de déficit de atenção induzido por
ideologia.
(...)
Josiane: Analfabeto funcional Frederico?? O cara escreveu
OMOFÓBICO!!! Hahaha Reveja suas ortografia parça! Rafael
Welington: Essa guerra entre vocês e a religião estourou justamente
quando tentaram obrigar pastores a realizar casamentos homossexuais.
Me lembro bem disso...
(...)
Frederico: Welington, , (1) não trate toda uma população com uma
característica dentre tantas outras em comum como "vocês", as
pessoas são diferentes politicamente apesar de afinidades de gênero e
orientação sexual, ninguém aqui está defendendo que religiões sejam
obrigadas a realizar matrimônios que não queiram. Se alguém
defende, discuta com esse alguém. (2) A guerra de que você fala
começou assim que alguém teve a dignidade de abrir seu amor
socialmente e não se esconder porque certas religiões, além de sempre
condenar este amor teimam em interferir na laicidade do Estado, se
esforçam em negar direitos em esferas que não lhe dizem respeito.
Graça: Isso aiiiiii deputado......vão todos juntinhos de bracinhos e
beijinhos p/ o inferno!!!! os pastores e padres não são obrigados a
realizar casamentos contra a vontade de DEUS. Casem na igreja gay
p/ ficar completo. Eu assisti um casamento gay na televisão realizado
por uma apresentadora, q não tem autoridade espiritual,e nem sabe
como abençoar.Esse casamento não tem valor p/ Deus principalmente
quem uniu,sem unção do poder de DEUS!!!! misericórdia p/ todos q
defendem a favor.....continuo orando por vcs q estão cegos,surdos e
mudos q não respeitam a autoridade de DEUS!!!Tudo q está
acontecendo no mundo é devido a desobediência do homem,achando
q é dono de tudo,sendo q DEUS é o dono do ouro e da prata,nada nos
pertence.DEUS diz p/ não juntar tesouro na terra ,p/as traças
comerem.....Lembro- me do Clodovil , foi um deputado q não
escandalizou e desrespeitou a lei de DEUS contra a família.......siga
esse exemplo deputado.....eu tirava o chapéu p/ o Clodovil......para vc
.........
Uma vez mais, percebemos culturas (opiniões e crenças), políticas
(posicionamentos) e práticas (xingamentos ou busca de diálogo) em total oposição
(dialética) e imersas em toda uma teia (complexidade) de justificativas (culturas),
sugestões (políticas) e atitudes (práticas) que podem levar os participantes para vários
lados. Isto acontece a partir da primeira colocação em sentido diferente das que vinham
acontecendo, como é o caso das falas de Carla e de Frederico, que buscam, de certo
modo, contemporizar as discussões, relativizando-as (no caso de Frederico) e
‘afetivizando-as’ (no caso de Carla). A perspectiva omnilética nos permite compreender
esta totalidade de elementos em jogo, compondo um todo cujas partes (culturais,
políticas e práticas) se entretecem, ora se encontrando, ora apenas potencialmente se
afinando, ora se desafinando e desencontrando por completo, mas ainda sendo partes de
um mesmo todo e, por isso mesmo, tanto determinando-o como sendo por ele
determinado. É este jogo que permite enxergar o que não está imediatamente visível,
mas pode estar potencialmente presente: seja a desavença total, seja a conciliação, seja
uma eventual terceira (ou quarta, ou quinta...) via de acontecimentos, que alteraria
novamente este todo, o que, por sua vez, interferiria, uma vez mais, com as partes.
Observamos muitos comentários, na discussão acima, sobre a questão dos
direitos civis tal como os que são e os que não são favoráveis e também a inserção da
questão religiosa no debate.
Apresentamos, para finalizar, uma última colocação; agora debatida dentro de
um grupo gay cuja participação só é permitida por convite de gays que já estejam há
certo tempo no grupo (o grupo possui prioridade Secreta e Moderada – quando um ou
mais membros são quem determinam desde a entrada e sua participação).
A questão que fora posta em debate foi a da não utilização de preservativo
(camisinha) na relação sexual - algo delicado, que não deve ser tratado com leviandade
ao ser debatido - ciente da importância do assunto, atentamo-nos para o desenrolar da
discussão. Por ser um grupo fechado e prezar pela discrição, optamos por reproduzir
alguns poucos comentários, dos mais “brandos” que foram postados. Comentários do
tipo “então morra seu escroto” ou “viado burro, quer pegar AIDS, é?” (sic) ou ainda
“cala essa sua boca de merda, viado escroto” (sic).
Há também quem aprove o não uso da camisinha; estes, porém, pouco se
manifestam ou quando o fazem é através de nova publicação, o que, em nosso ver,
configura um sentimento de repressão da parte de quem concorda (com o não uso –
quando a ‘mentalidade’ predominante é de se usar). Assim, fica-nos patente que, com a
existência dos ciberespaços, pessoas e até mesmo grupos que de algum modo não se
sentiam pertencentes a dado contexto passam a se relacionar e ainda sim, dentro destes
grupos de ‘iguais’ existe muita diferença e segregação.
Analisando o caso omnileticamente, percebemos culturas (a favor e contra o uso
do preservativo), políticas (a decisão de se usar ou não) e práticas (o uso efetivo ou não)
em posições contrárias, configurando a dialeticidade e a complexidade da situação.
Dialeticidade pelos contrários em si; complexidade por conta da busca de outras vias,
como por exemplo, novas postagens sobre o assunto, para não caracterizar
posicionamentos na postagem original e, assim, evitar-se o julgamento (culturas e
políticas) e o sofrimento (práticas).
Parece, portanto, que ocyberbulliyng se instala onde, também, deveria haver
maior conscientização e diálogo – respeitando as diferenças e pontos de vista, porém
buscando incluir, alertar (e não ofender), como no caso exposto. Ainda que exista um
elo que interligue as pessoas e/ou grupos delas, parece difícil e complicado conseguir
conciliar as distinções de pensamento e pontos de vista quando expostos de modo
visceral e tão rapidamente como acontece na internet; onde uma mensagem se torna
mundialmente visualizada em questão de segundos, minutos. Isto nos lembra Geertz
(1926), para quem a cultura enraizada no indivíduo o faz mutável e também
desconhecido até que dado fato se apresente ou configure-se semelhante ou não ao que
se pensa. Diz o autor:
(...) o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele
mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e a sua análise;
portanto, não como uma ciência experimental em busca de leis, mas
como uma ciência interpretativa, à procura do significado. (...) (idem,
pág. 4)
À guisa de discussão – palavras finais
O que pode ser feito para mudar a realidade de discriminação, preconceito e
outras formas de violência sofrida por grupos de pessoas cujas diferenças fogem aos
padrões definidos como desejáveis socialmente? Tais padrões, produzidos cultural,
política e praticamente, podem ser desnaturalizados, mas como? Arriscamos a afirmar
que rompendo com o silêncio e com a censura em torno das homossexualidades nas
escolas e nos demais espaços sociais. Pois ao assim fazermos, trazemos ao jogo das
dimensões (culturas, políticas e práticas) os elementos dialéticos e complexos,
necessários para que novos caminhos (e resultados) possam ser engendrados.
De acordo com Ferrari (2011) as homossexualidades estão presentes nas escolas,
entretanto, mesmo diante dessa presença as atitudes dos professores oscilam entre o
silêncio e o silenciamento, que consolidam um processo de negação da existência de
algo ou alguém, que para além dos muros escolares, permitem a manutenção de
preconceitos e estereótipos em relação às identidades homossexuais na sociedade.
O ambiente virtual possibilita o aumento da interação entre as pessoas, a
ressignificação de saberes e experiências e pode contribuir para a construção e
afirmação de identidades, entretanto seu uso indevido pode torná-lo instrumento rápido
na perpetração de crimes eletrônicos. O ordenamento jurídico brasileiro considera que
as condutas de ciberbullying são todas passíveis de punição penal. O olhar omnilético
contribui tanto para que tracemos os caminhos de construção do bullying quanto de
desconstrução do mesmo.
Diante dessa constatação, finalizamos com as seguintes problematizações: se já
existem regras para punir condutas de ciberbullying, o que tem sido feito no processo
educacional para conscientizar os usuários (nossos estudantes) da internet a adquirir
condutas que viabilizem o reconhecimento das diferenças como possibilidades de ser e
estar no mundo? De que modo a educação pode criar mecanismos que se utilizem das
transformações tecnológicas como aliadas ao processo de inclusão em educação, cujo
maior pressuposto seria favorecer a autonomia (omnilética) de experimentar novas
identidades e novas formas de enxergar o outro e a si próprio?
Esses são alguns desafios que, nós educadores, somos convocados a refletir
(culturas) e sobre os quais precisamos tomar decisões (políticas) e agir (práticas)
àmedida que os avanços tecnológicos e que os espaços virtuais (essencialmente
dialéticos e complexos) se fundam nas relações e nas instituições educacionais.
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CYBERBULLYING RELATIVO À DIVERSIDADE SEXUAL