UMA NOVA FORMA DE APLICAÇÃO DOS DIREITOS ECONOMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS COMO ESTRATEGIA DE IGUALDADE SOCIAL. Filipe Lins dos Santos1 Introdução A sociedade é composta por diversos mecanismos de transmissão de poder organizadores e gerenciadores das estruturas orgânicas, nesse âmbito os símbolos e o discurso apresentam-se como elementos veiculadores do falar enunciativo das diferenças de classe, raça e gênero. Isso é possível, mediante a elaboração de um mercado linguístico e aferição lucrativa das marcas que compõem os grupos. Nesse contexto insere-se o direito como mecanismo de controle do poder, uma vez que ele é um elemento discursivo e simbólico criado para regular as peças sociais e proporcionar a manutenção do poder das estruturas formadoras do sistema. Diante disso convém se analisar a efetividade de direitos sociais diante as diversas violações que vários indivíduos podem sofrer, pois a normatização de direitos não significa aplicação e respeito ao jus do indivíduo, já que a maneira como os símbolos e o discurso são postos interferem diretamente na aplicabilidade jurídica. Assim o objetivo desse trabalho é demonstrar que a efetividade dos direitos sociais, econômicos e culturais pode proporcionar uma maior inclusão social de diversos setores, assim revelando a necessidade de sua aplicação imediata e não progressiva como pensa o Estado. A metodologia será a vertente jurídico-sociologica com base num levantamento bibliográfico e estatístico, tendo como marco teórico o simbolismo de Pierre de Bourdieu e analise do discurso em Foucault para entender os processos dinâmicos das relações de poder e simbólicas da sociedade. Desenvolvimento Para compreender a forma de utilização da aplicabilidade dos direitos humanos de segunda geração por parte do Estado, convém entender que os de primeira geração são utilizados numa atuação imediata, mas aquele de comissão progressiva2. Essa diferença de comportamento 1 Estudante de Graduação em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba e bolsista da iniciação cientifica sobre corte europeia de direitos humanos. [email protected] 2 {...} (el) concepto de realización progressiva constituye un reconocimiento del hecho de que la plena realización de los derechos económicos, sociales y culturales generalmente no podrá lograrse en un período corto de tempo. En este sentido la obligación difiere significativamente de la contenida en el artículo 2 del PIDCP, que supone una obligación imediata de respetar y assegurar todos los derechos relevantes. ABRAMOVICH; COURTIS (p.39) demonstra a maneira como esses direitos são pensados e reflete uma postura do Estado e da sociedade sobre sua eficácia, pois os direitos econômicos, sociais e culturais (DESC) atingem esferas multiculturais, inter-raciais, quebram barreiras de classe e de gênero, portanto atingem relações de poder3 na sociedade que são criadas discursivamente e simbolicamente dentro de limites das marcas sociais, assim quando esses direitos ganham maior efetividade determinados grupos ou setores da sociedade que não deveriam receber maior assistência passam a ter maior liberdade. Essa realidade é observada na inserção da mulher no mercado de trabalho, em que se percebem diversas características peculiares como: sua maior participação no setor de serviço (serviços coletivos, sociais e pessoais, educação, saúde, e domésticos) do que em outros setores, está menos inserida na categoria de empregadores e trabalho autônomo, numa comparação de sexo e raça as mulheres tem mais tendências a assumirem emprego sem carteira assinada do que os homens, há menos mulheres em cargos de gerência executiva que os homens e entre outros. Tais características compõem o que os estudiosos chamam de teto de vidro4. Esses exemplos refletem desigualdades sexuais construídas sobre o gênero e elucidam diferenças que buscam ser preservadas, pois apesar de varias conquistas ainda há a necessidade de manutenção do discurso e limitar determinados alcances. É nessa discussão que repousa a importância do DESC para esse grupo, pois se tais direitos obtivessem maior eficácia influenciariam numa isonomia maior. Isso nos permite inferir a necessidade de avaliar as mulheres numa perspectiva de grupo social revestido de diversos elementos culturalmente organizados, logo não há como esse grupo ter efetividade de seus direitos se os direitos em DESC não ganharem o status de efetividade imediata e não progressiva, assim urge a importância de maior aplicabilidade desses direitos, a fim de que os direitos individuais inseridos no âmbito civil e político possam ter efetividade plena. Outra compreensão dessa problemática repousa numa estratégia política e social de exclusão dos grupos discursivamente e simbolicamente separados do falar predominante, pois não 3 O poder, acho eu, deve ser analisado como uma coisa que circula, ou melhor, como uma coisa que só funciona em cadeia. Jamais ele está localizado aqui ou ali, jamais está entre as mãos de alguns, jamais é apossado como uma riqueza ou um bem. O poder funciona. O poder se exerce em rede e, nessa rede, não só os indivíduos circulam, mas estão sempre em posição de ser submetidos a esse poder e também de exercê-lo {...} O individuo é um efeito do poder e é, ao mesmo tempo, na mesma medida em que é um efeito seu, seu intermediário: o poder transita pelo individuo que ele constituiu. FOUCAUL (1999, p. 35) 4 Outro aspecto a ser observado dentro das empresas é o fenômeno do “teto de vidro”. Segundo Miranda (2006), o “teto de vidro” é uma barreira sutil e transparente, forte o suficiente para evitar a passagem das mulheres aos níveis hierárquicos mais elevados nas organizações onde trabalham. Como exemplo, na pesquisa das Melhores Empresas para Você Trabalhar, grupo de empresas escolhidas para este estudo, é possível verificar o reduzido percentual de mulheres nos cargos de liderança. Entre os cargos de presidência, vê-se que apenas 4% deles são ocupados por mulheres e, nos demais cargos de liderança das empresas (diretores, gerentes e supervisores), 36% são ocupados por mulheres. Essa informação sugere que há no Brasil um “teto de vidro” que dificulta o crescimento da carreira executiva feminina. Meyerson and Fletcher (2002) afirmam que o preconceito quanto à presença das mulheres no mercado de trabalho também cria essa barreira, que raramente é ultrapassada. PIRES; LUCAS; ANDRADE; AMORIM; FISCHER (2010, p. 83) há como esses grupos alcançarem efetividades de seus direitos sociais com a paulatina aplicação dos diretos de segunda geração, uma vez que os próprios direitos de primeira geração são afetados, porque as estruturas econômicas, sociais e culturais continuam a segregar aquele grupo, logo quebra a efetividade dos direitos civis e políticos também. Essa afirmação encontra plausividade diante o entendimento de que uma politica de direitos humanos é antes de tudo uma política cultural 5, assim a maneira como as gerações desses direitos são aplicadas na sociedade refletem como a comunidade enxerga os destinatários da norma. Isso permite observar o grau de interligação entre os direitos de primeira e segunda geração, já que eles incorporam profundos laços de eficácia, de modo que não há como os direitos civis e políticos dentro de uma esfera capitalista, simbólica e com relações de poder forte obter seu pleno efeito se os direitos em DESC não ganharem uma eficácia real. Portanto infere-se que são os direitos de segunda geração que abrem caminho para a ampliação e democratização dos direitos de primeira geração. Conclusão Dessa forma observa-se como os símbolos e estruturas discursivas transmitem e buscam consolidar mecanismos de organização hegemônicos e de distribuição dos indivíduos na esfera social, pois o mercado linguístico e o capital simbólico presente na propagação do falar permitem uma domesticação. Portanto para se atingir grupos não aceitos ou discriminados pela sociedade é necessário que os direitos sociais alcancem maior efetividade, porque a esfera dos direitos individuais apresenta-se limitada e aparentemente libertadora diante a complexidade das relações simbólicas na sociedade, logo quando os direitos em DESC obtiverem maior aplicabilidade diversos setores alcançaram maior inclusão social. Assim observa-se a importância de que os direitos econômicos, sociais e culturais não devem está limitados a uma aplicabilidade progressiva, mas sim imediata, pois através dessa nova aplicação desses direitos em consonância com os de primeira será possível uma isonomia dentro da sociedade. Referências Bibliográficas ABRAMOVICH, Victor; COURTIS, Christian. Hacia la exigibilidade de los derechos 5 A política dos direitos humanos é basicamente uma política cultural. Tanto assim é que poderemos mesmo pensar os direitos humanos como sinal do regresso do cultural, e até mesmo do religioso, em finais de século. SANTOS (1995, p. 107) económicos, sociales y culturales. Estándares internacionales y critérios de aplicación ante los tribunales locales. Disponível em: http://www.observatoridesc.org/sites/default/files/Exigibilidad_de_los_DESC_-_Abramovich.pdf. Acesso em: 16 out. 2012. FOUCAULT, Michel. Em defesa da Sociedade. São Paulo: Martins fontes, 1999. PIRES, Fernanda Mendes; LUCAS, Angela Christina; ANDRADE, Sandra Mara de Andrade; AMORIM, Wilson Aparecido Costa de; FISCHER, André Luiz Fischer. Gênero e as Práticas de Gestão nas Melhores Empresas para se Trabalhar no Brasil. Gerais: Revista Interinstitucional de Psicologia, São Paulo, n. 1, p.81-94, 2010. SANTOS, Boaventura de Souza. Uma concepção multicultural de direitos humanos. Lua Nova, São Paulo, nº 39, p. 105-124, 1995.