Dez Mandamentos Para Professores 1. Tenha interesse pela sua matéria. 2. Conheça a sua matéria. 3. Procure ler as expressões faciais dos seus alunos; procure descobrir as suas expectativas e as suas dificuldades; ponha-se no lugar deles. 4. Compreenda que a melhor maneira de aprender alguma coisa é descobri-la você mesmo. 5. Dê aos seus alunos não apenas informação, mas atitudes mentais e o hábito de trabalho metódico. 6. Faça-os aprender a dar palpites. 7. Faça-os aprender a demonstrar. 8. Procure encontrar, no problema que está abordando, aspectos que poderão ser úteis nos problemas que virão - procure descobrir o modelo geral que está por trás da presente situação concreta. 9. Não desvende o segredo de uma vez - deixe os alunos darem palpites antes deixe-os descobrir por si próprios, na medida do possível. 10. Sugira, não os faça engolir à força. George Polya in "Jornal da Matemática Elementar" nº 119 PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 1 Texto – Todos os minutos contam TODOS OS MINUTOS CONTAM COMO FAZER FUNCIONAR A AULA DE MATEMATICA* DAVID R. JOHNSON * Tradução de Conceição Mesquita de Making Your Math Class Work, Dale Seymour Publications, 1982 1. Não façam como eu fazia No começo Toca para a entrada. Faz-se a chamada. Discute-se o trabalho de casa. Resolvem-se alguns exemplos no quadro. Passa-se o trabalho para casa. Os alunos começam a resolvê-lo. Toca para a saída. Isto lembra-vos alguma coisa? Era assim no começo do meu primeiro ano como professor de Matemática numa escola secundária. No entanto, descobri rapidamente que esta rotina de aula levantava problemas: • Frequentemente, perdia demasiado tempo no começo da aula com a correcção do trabalho de casa e acabava por verificar que não tinha tempo suficiente para introduzir matéria nova. • Passava trabalho para casa demasiado difícil para a maioria dos alunos; consequentemente, eles não vinham preparados para a aula no dia seguinte. • Muitas vezes, tinha que ensinar de novo a mesma matéria no dia seguinte. • Sabia muito pouco acerca do rendimento ou do progresso individual de cada um dos alunos até ao teste de avaliação. • Falava demasiado e assumia que os alunos tinham aprendido só por terem ouvido. • Para mim, pelo menos, o tempo da aula nunca era suficientemente longo. Nalguns dias sentia que um eventual visitante poderia ter perguntado a um dos meus alunos:”O que é que um miúdo simpático como tu está a fazer numa aula de matemática com esta?” Eu tinha criado uma aula que era inteiramente centrada no professor, divorciada dos alunos e dos seus problemas de aprendizagem, demasiado rotineira, sem métodos de diagnóstico, e completamente falha de eficiência. Os meus novos objectivos Finalmente, compreendi que precisava de fazer alterações para melhorar o meu ensino. Precisava de uma nova orientação, de um novo estímulo, e de um desafio. Os alunos também. Por isso, comecei a formular objectivos que me ajudassem a criar um melhor PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 2 Texto – Todos os minutos contam ambiente de aprendizagem e a usar processos mais adequados a essa aprendizagem. Os meus objectivos para a aula agora são os seguintes: 1. No fim da aula deverei ser capaz de identificar quais os alunos que atingiram os objectivos. 2. Não darei a possibilidade aos alunos de não participarem. 3. Permitirei que os alunos cometam erros sem receio de falharem ou de ficarem embaraçados. 4. Encorajarei a interacção entre os alunos durante uma parte de cada aula. 5. Explicarei a relação entre cada nova actividade proposta aos alunos e a anterior. 6. Darei tempo para que os alunos pratiquem cada conceito novo antes do fim da aula. 7. Tentarei que os alunos adquiram confiança e motivação para completarem o trabalho para casa e fora da aula. 8. Desenvolverei técnicas que me dêem diariamente informação sobre o êxito na aprendizagem de cada conceito. Estes objectivos têm sido difíceis de alcançar. Não me lembro de um só dia em que possa dizer honestamente que os alcancei a todos de maneira completamente satisfatória. Mas eles impedem-me de me instalar, de me tornar complacente, de me aborrecer com o ensino ou de me consumir. Fornecendo-me um desafio e um estímulo diários, estes objectivos ajudam-me a ser um professor mais dinâmico. Por isso eu precisei deles e ainda hoje preciso. Uma mudança na disposição da sala de aula Rearranjei a disposição tradicional da sala de aula, em filas, para um formato em U, como se mostra na fig. 1. Isto trouxe várias vantagens. O formato em U permite-me observar rápida e eficientemente o trabalho escrito dos alunos. Também elimina a fila de trás ou as posições de canto, de modo que cada aluno se torna parte do grupo. Num U, o isolamento é difícil senão impossível. Uma mudança na maneira de fazer perguntas No início da minha actividade como professor, usava um estilo um-para-um de perguntaresposta. Esta rotina não só ignorava um grande número de alunos a maior parte do tempo, mas também me dizia muito pouco sobre o grau de compreensão dos alunos. Agora faço perguntas de uma maneira que envolva todos os alunos na aula e que me dê uma ideia imediata sobre se os alunos estão ou não a compreender. Elaborar perguntas com estas características não é fácil. Tem-me obrigado a estudar, a experimentar e a reajustar. Explicarei melhor esta mudança crucial no estilo de aula no próximo capitulo, “A Arte de perguntar”. PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 3 Texto – Todos os minutos contam Arranjo tradicional Arranjo em U O formato em U elimina a última fila e as posições de canto de modo que todos os alunos se tornam uma parte do grupo Figura 1 – Uma mudança na disposição da sala de aula Uma mudança de procedimento À medida que trabalhava para os meus objectivos, fui descobrindo que era necessário introduzir algumas modificações no meu procedimento dentro da sala de aula. Com a eliminação da antiga rotina, surgia uma nova organização das actividades na aula. As mudanças essenciais foram as seguintes: 1. Porque compreendi que os primeiros cinco minutos podiam marcar decisivamente uma aula, decidi envolver os alunos em alguma actividade significativa logo que tocava para a entrada. 2. Simplifiquei a correcção do trabalho de casa que era uma das actividades que mais tempo da aula fazia perder. 3. Preparei-me para ocupar a maior parte do tempo da aula com o ensino de matéria nova. 4. Estabeleci algumas regras para mim próprio sobre o trabalho para casa. Agora, procuro certificar-me de que esse trabalho tem interesse em si mesmo e não se destina apenas a manter os alunos ocupados; dou bastante tempo para ter a certeza que o enunciado é claro; e procuro assegurar-me, antes do toque para a saída, que os alunos podem completar sozinhos o trabalho. 5. Os últimos cinco minutos da aula, como os primeiros cinco, são válidos embora sejam muitas vezes completamente desperdiçados. Quando chego ao fim de um plano e faltam ainda alguns minutos para o fim da aula, eu aproveito esses minutos. Os pormenores acerca destas mudanças no procedimento são explicados no capítulo 3, “A nova rotina da aula”. PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 4 Texto – Todos os minutos contam 2. A Arte de Perguntar As desvantagens do estilo um-para-um Como é que podemos dizer se os nossos alunos estão de facto a prestar atenção? E como é que podemos saber se eles compreendem a matéria que estamos a ensinar? Evidentemente fazendo perguntas. Mas será assim tão simples? Eis a maneira como isso funcionava quando comecei a dar aulas e usava um método tradicional de fazer perguntas do tipo um-para-um. Chamava um aluno para responder a uma pergunta. Se esse aluno dava a resposta correcta eu continuava a explicar a matéria e fazia mais algumas perguntas. Se o aluno dava uma resposta errada, eu chamava outro aluno, e outro, até ouvir a resposta correcta. Se não conseguia obtê-la rapidamente, muitas vezes ficava impaciente e dava eu próprio a resposta. Ou talvez perguntasse ironicamente “A resposta é ½, não é verdade turma?”. Nessa altura alguns alunos diriam que sim e acenariam com a cabeça. Afinal, que alunos se atreveriam a discordar de mim, especialmente não tendo compreendido porquê ou como eu tinha chegado àquela resposta? Que pobre feedback eu obtinha deste modo! Tudo o que realmente ficava a saber era se um aluno, aquele que geralmente era voluntário, sabia a resposta. Não ficava a saber nada sobre até que ponto a maioria dos alunos tinha de facto compreendido. Quando finalmente tomei consciência deste facto, concluí que tinha de mudar o meu método de fazer perguntas. Agora procuro envolver todos os alunos com as minhas perguntas, e não apenas um de cada vez. Também procuro formular o tipo de pergunta que me diga, bem como aos próprios alunos, até que ponto eles compreenderam de facto aquilo que está a ser ensinado. Faço um esforço para ser encorajador com as minhas perguntas. Ninguém gosta de se sentir estúpido, e infelizmente esse não é um sentimento invulgar quando se tenta aprender alguma coisa nova. Faço ainda tudo o que posso para promover um ambiente, quer de atenção ao que os outros dizem, quer de discussão. Nada disto é fácil. Aprender a arte de fazer perguntas requer pratica. Por mim, evito algumas dificuldades preparando com tempo perguntas para cada objectivo que planeio ensinar, e depois guardando essas perguntas para a próxima ocasião em que tenha de ensinar o mesmo objectivo. Uma lista de “coisas a tentar” Para me ajudar a manter-me atento à importância das minhas perguntas, desenvolvi uma lista de “coisas a tentar” a respeito do que devia não esquecer durante a aula. 1. Tento fazer uma pausa depois de uma pergunta. Um inquérito recente indicava que muitos professores, ao formularem uma pergunta, fazem uma pausa de apenas um segundo antes de chamarem um aluno para responder. Este hábito limita o tipo de aluno que pode PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 5 Texto – Todos os minutos contam responder. Uma pausa de três a cinco segundos, ou mesmo mais, dará resultados surpreendentes. Assim um aluno que seja lento a pensar, poderá participar. A pausa deixa claro que a pergunta é dirigida a todos, e não apenas a um ou dois dos mais rápidos e dos que levantam a mão. Muitos alunos nem sequer tentam responder a uma pergunta a não ser que se sintam seguros da resposta. Uma pausa maior dá-lhes tempo para pensar e para ganhar confiança antes de responderem. 2. Tento evitar um excesso de perguntas que requeiram apenas uma resposta tipo sim ou não. Mesmo nos casos em que o aluno dá a resposta correcta. Não há nada que diga, nem a mim nem aos outros alunos, como é que ele chegou à resposta. Pode ter sido por sorte. Aliás, as possibilidades de acertar ao acaso não são más! 3. Tento evitar responder às minhas próprias perguntas. Muitas vezes, costumava responder às minhas próprias perguntas quando não havia um voluntário para fazê-lo ou quando estava com pressa. Isto levava os alunos a pensar que eles eram obrigados a responder. Eles apercebiam-se de que se não se oferecessem voluntariamente para fazê-lo eu dar-lhes-ia a resposta. As minhas perguntas e respostas tornavam-se parte de um monólogo. 4. Tento fazer, a seguir às respostas dos alunos, a pergunta “porquê?”. Isto ajudará os alunos que não sabiam responder à pergunta inicial a compreender como é que se chegou à resposta. Encorajará igualmente a discussão entre os alunos e eliminará as respostas ao acaso. Ouvir uma resposta curta raramente se torna útil. “Porquê?” deveria ser uma das perguntas mais frequentes usadas na sala de aula. 5. Tento limitar o uso de perguntas que se baseiam quase exclusivamente na memória. Os alunos podem ser perfeitamente capazes de recitar, por exemplo, a propriedade associativa, mas isso não significa que eles reconheçam a propriedade ou que a apliquem numa situação nova. 6. Tento evitar dirigir perguntas a um aluno por razões disciplinares. Disparar uma pergunta para um aluno desatento resulta usualmente numa resposta do tipo “o quê?” Isso pouco adianta e provavelmente apenas fará com que o aluno se sinta ainda mais fora da aula. 7. Tento evitar repetir as respostas, de contrário, os alunos são levados a ouvir apenas o “discurso do professor” e não o “discurso do aluno”. Eles podem aprender imenso ouvindose uns aos outros. Em algumas ocasiões, eu poderia dar uma resposta mais directa mas ela não seria necessariamente mais eficiente. 8. Tento que a seguir à resposta de um aluno haja uma reacção por parte da turma ou de um outro aluno. Esta é uma outra forma de encorajar os alunos a ouvirem-se uns aos outros. PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 6 Texto – Todos os minutos contam 9. Tento insistir na atenção durante as discussões. Pretendo que todos os alunos aprendam a ouvir—a ouvir-me a mim, a ouvirem-se uns aos outros, a ouvirem toda a gente. 10. Tento evitar expressões faciais perante as respostas dos alunos. Tento não me mostrar desapontado quando um aluno dá uma resposta errada à frente dos colegas: Se o aluno agiu voluntariamente, pelo menos ele tentou. Teve a coragem de partilhar uma resposta com o resto da turma. As minhas reacções não deverão nunca desencorajar os alunos de contribuir para as discussões da turma. 11. Tento que seja fácil aos alunos fazerem perguntas em qualquer momento. Quando estou a tentar fazer uma síntese na aula, a ultima coisa que desejo são interrupções – e é o que as perguntas dos alunos frequentemente provocam. Tento ser paciente quando isso acontece. Mesmo que essas perguntas surjam quando eu menos desejaria, elas podem significar que os alunos estão confundidos e precisam de mais alguns esclarecimentos sobre algo que supunha que eles haviam compreendido. 12. Tento evitar fazer perguntas que contenham a resposta. Eis alguns exemplos de perguntas que, na realidade, não o são. Talvez as reconheçam. - Isto é um triângulo rectângulo, não é? (Poucos alunos irão desafiar a minha noção de triângulo rectângulo.) - Agora, tens primeiro que determinar o mínimo múltiplo comum, não tens? 13. Tento não nomear um determinado aluno antes de fazer a pergunta. Suponhamos que eu digo, por exemplo:” Cristina, qual é a altura deste triângulo?” Todos os alunos com excepção da Cristina deixarão de se preocupar com a pergunta e esperarão até que eu faça outra. Eu pretendo que todos os alunos ouçam as minhas perguntas e estejam preparados para lhes responder. 14. Tento também não nomear um determinado aluno imediatamente depois de ter feito uma pergunta. Não é boa ideia perguntar “Qual é a altura do triângulo, Cristina?”. Isto dá o mesmo resultado do que nomear o aluno antes de fazer a pergunta. Os restantes alunos deixarão de se preocupar com a pergunta assim que ouvirem o nome da Cristina. Como referi atrás, tento fazer uma pausa depois de cada pergunta. 15. Tento fazer perguntas abertas. Poderia perguntar, por exemplo, “qual é a maior, (b) ou (-b)?” Os alunos que tentarem responder a isto, rapidamente descobrirão que não há uma resposta única e directa. Uma pergunta como esta pode provocar uma discussão viva, levando os alunos a uma compreensão mais profunda de variáveis e números negativos. 16. Tento não catalogar o grau de dificuldade de uma pergunta. Quantas vezes terei dito, por exemplo, “agora vou fazer uma pergunta fácil!” Reflictam um pouco nesta frase e no efeito que ela tem sobre o aluno. Um aluno que responda correctamente não se sentirá muito satisfeito, pensando “E então? Era fácil”. Um aluno que não saiba responder sentir-seá ainda pior: “Para quê tentar? Nem sequer consigo responder a uma pergunta fácil!” PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 7 Texto – Todos os minutos contam 17. Tento deixar uma pergunta ocasional sem resposta no fim da aula. Ao fazer isto, desafio os alunos a procurarem uma solução possível. É importante que a pergunta seja adequada aos alunos e à turma. É também imperioso, evidentemente, que a resposta seja discutida e explicada na aula seguinte 18. Tento substituir exposições por um conjunto de perguntas apropriadas. Com alguma orientação, os alunos podem descobrir as mesmas ideias que eu tinha planeado transmitirlhes de um modo expositivo. Formular as perguntas adequadas para usar este método constitui um verdadeiro desafio. Isso requer experimentação e prática. Verão que vale a pena quando virem a satisfação dos alunos ao responderem a estas perguntas de descoberta guiada. 19. Tento evitar que as perguntas façam apelo a respostas orais em grupo. O interesse da informação que obtenho desse tipo de respostas é duvidoso. Poderia perguntar, por exemplo, “a que é igual a soma de 7x e 5x, turma?”. Ouviria a turma inteira a responder numa entoação de rotina: ”12x”. Mas significa isso que todos compreendem? Quando prestamos atenção a uma resposta colectiva como esta descobrimos que alguns alunos respondem depressa. Outros juntam-se-lhes logo a seguir, e aqueles que estão muito inseguros da resposta juntam-se-lhes no fim. É-me difícil dizer quantos alunos sabem, de facto, que a resposta é 12x só por ouvir uma resposta em coro. 20. Tento manter os alunos envolvidos activamente no processo de aprendizagem. Se os alunos aprendessem verdadeiramente Matemática apenas por ouvirem, eu teria sido substituído por um gravador há bastante tempo. Uma das melhores orientações sobre a maneira de fazer perguntas recebi-a de Pedro, um antigo aluno meu. O Pedro veio ter comigo no fim da primeira aula. Tivemos uma breve troca de impressões sobre os objectivos do curso, e ele encerrou a conversa com um comentário que tenho tentado recordar em todas as aulas desde então. Esse comentário constitui um verdadeiro desafio para mim. Desafio que vos faço também: “Na sua aula de matemática, espero que nunca me diga nada que, com a sua orientação e as suas perguntas, eu pudesse ter-lhe dito a si.” PFC – Matemática 2º ciclo 2007_ 2008 8 Texto – Todos os minutos contam