ABORDAGEM SOCIO-ECONÓMICA DE UMA ACTIVIDADE
PESQUEIRA
A ARTE DA GANCHORRA, NO ALGARVE E NO CENTRO-NORTE DE PORTUGAL.
Rui J. Lopes1,2*, Agostinho S. Rosa1,2, Luís Coelho2, Manuela Oliveira3, Miguel B.
Gaspar4
1
University of Évora, Departament of Economics, Largo dos Colegiais, 2, 7000-803 Évora,
Portugal
2
CEFAGE-UE, Center for Advanced Studies in Management and Economics, University of
Évora, Largo dos Colegiais, 2, 7000-803 Évora, Portugal.
3
Instituto Nacional de Recursos Biológicos, I.P./ IPIMAR, Av. de Brasília, 1449-006 Lisboa,
Portugal.
4
Instituto Nacional de Recursos Biológicos, I.P./ IPIMAR, Av. 5 de Outubro, 8700-305 Olhão,
Portugal.
*Corresponding author, e-mail: [email protected].
RESUMO
Este trabalho consiste numa análise socio-económica da actividade pesqueira com a arte
da Ganchorra, no Algarve e no Centro-Norte de Portugal.
A comunidade pesqueira está solidamente associada a toda a população, que vive
predominantemente da economia local. A pesca sustenta cada vez mais um sentido
ambiental na medida em que a exploração económica deste recurso natural renovável
surge conjugada também com o turismo, uma das fontes de rendimento das zonas
litorais
A protecção dos recursos piscícolas e de outras espécies marítimas é um imperativo
social e ambiental, constituindo um património natural, social e cultural.
De forma geral observamos, em povoações costeiras, uma integração ancestral das
comunidades pesqueiras no envolvimento das outras comunidades, embora a Política
Comum de Pescas venha a desgastar progressivamente esta ligação.
As constantes inovações técnicas provocam um excesso de pesca com efeitos
prejudiciais na pesca artesanal e no emprego. Neste sector, a oferta de trabalho aparece
superior à procura, com a agravante de existirem poucas ocupações alternativas. Tal
desequilíbrio no mercado de trabalho pode causar sérias consequências sociais.
No sentido de encontrarmos informações mais próximas da realidade, efectuámos
entrevistas e contactos pessoais com pescadores e patrões de embarcações de pesca. A
nossa análise é fundamentada nos resultados práticos desta metodologia.
1
As nossas conclusões poderão servir de ajuda a uma tomada de decisões respeitante à
preservação de ecosistemas litorais e do ambiente. Pretendem também ajudar a uma
tomada de consciência colectiva por parte do sector das pescas costeiras, através
nomeadamente de experiências nacionais e internacionais Procuramos, por fim,
contribuir para o desenvolvimento social e económico dos pescadores e da qualidade de
vida das suas famílias
I – APRESENTAÇÃO
Iniciamos com uma INTRODUÇÃO (Secção II), seguida do conjunto de regras e da
lógica do raciocínio utilizados no estudo, isto é, a METODOLOGIA (Secção III).
Teremos depois ANÁLISES SOCIO-ECONÓMICO-AMBIENTAIS ( Secção IV), e
exporemos, no final, as CONCLUSÕES (Secção V).
II - INTRODUÇÃO
As pescas costeiras e artesanais estão profundamente ligadas à população, à sociedade e
à economia locais, podendo ser o contacto com mestres e pescadores personalizado, de
teor académico, restrito e de certo modo confidencial .
Dos aspectos desenvolvidos podemos destacar;
- distribuição, abundância, biologia e dinâmica dos recursos
- artes, métodos e embarcações de pesca
- análises sócio-económicas, em colaboração com o sector
Estudamos exemplos em Portugal, pretendendo situar-nos mais naquele último tema,
nos campos económicos e sociais., sendo complementada por aspectos biológicos.
Verificaram-se no entanto, na prática, dificuldades e obstáculos tendo como intenção
esta análise sócio-económica. Salientamos dois:
( i ) O acesso a estatísticas, a números, fez-se através dos Sindicatos, das Capitanias, da
Direcção Geral das Pescas e mesmo do Instituto de Emprego e de Formação
Profissional. Posteriormente, tornou-se simples a sua formalização quantificada.
2
Verificam-se porém dificuldades em conseguir informações que se reportem à vida
profissional, familiar e social dos pescadores, dos mestres, dos armadores, etc.
Organismos Oficiais, como o Instituto Nacional de Estatística (INE), não chegam
normalmente a informações satisfatórias ou muito próximas da realidade, embora sejam
válidas como instrumentos de trabalho.
Pela parte dos indivíduos por várias formas ligados à faina pesqueira, trata-se de
“despachar” tão breve quanto possível aqueles funcionários que embora honestos, se
estarão a meter em coisas para as quais não os chamaram. Tal pode mesmo ser agravado
pela ideia que deverão fornecer a resposta que menos os prejudique, ou que mais lhes
convenha, por exemplo no que toca a impostos, a taxas que deverão pagar, à provável
detecção de esquemas de economia paralela ou de outras fugas à lei.
Pretendemos obter informações mais próximas das realidades, a actividade piscatória,
nesta circunstância concreta. Nesse sentido, elaborámos um conjunto de perguntas
agrupadas em diferentes entrevistas adaptáveis. O esquema genérico dessas entrevistas
observa-se dividido no seguinte enquadramento:
Aspectos Genéricos
A) PREPARAÇÃO DA ENTREVISTA
B) DADOS A PREENCHER PELO(A) ENTREVISTADOR(A)
C) DURANTE A(S) ENTREVISTA(S)
Delineamento Específico
D) APRESENTAÇÃO DO(A)
ENTREVISTADOR(A)
E) DADOS POR EMBARCAÇÃO
F) SAÍDAS PARA A PESCA
G) CAPTURAS
H) CUSTOS POR DIA, POR EMBARCAÇÃO
I) CONTABILIDADE
J) CUSTOS COMO O PESSOAL
K) FORMA JURÍDICA
L) CAPITAL FINANCEIRO
M) EMPREGO
N) ELEMENTOS PESSOAIS
O) RENDIMENTOS PESSOAIS OU FAMILIARES
3
P) INVESTIMENTO
Q) CONCORRÊNCIA COM OUTRAS EMBARCAÇÕES
R) VENDA E COMERCIALIZAÇÃO
Ao terminar a entrevista
S) REFERIR OU PERGUNTAR…
Estas entrevistas ou questionários foram efectuados tendo-se percorrido as mais
relevantes zonas piscatórias com a ganchorra. em Portugal.
( ii ) A actual inserção das comunidades piscatórias nas outras comunidades e na
sociedade, tendo em conta por um lado a tradição e os hábitos ancestrais e por outro as
sucessivas restrições impostas pela Política Comum de Pescas, sobretudo no que
respeita as pescas artesanais e locais.
- Em Portugal, a pesca artesanal é uma das actividades comuns e de especial
importância nos aspectos socio-económicos e ambiental.
- Diversas populações costeiras portuguesas mantêm um desequilíbrio estrutural, uma
baixa diversificação económica, com uma alta dependência da actividade pesqueira;
fluxos migratórios geralmente negativos, requerem actuações globais em todo o litoral
conducentes a fortalecer a sua economia, a preservar os seus recursos naturais
renováveis, como os peixes e todas as espécies marítimas, e a actividade pesqueira
como património social, cultural e motor de novas iniciativas.
- Portugal tem um sector pesqueiro artesanal muito importante, não só pelo que
contribui para as economias locais e regionais mas também por representar uma forma
de entender a vida, como capaz de conservar uma cultura baseada na extracção, na
pesca, com obrigatoriedade de conservar os recursos. Isto implica que subjaz às
pescarias artesanais atlânticas um fundo social e cultural, presente no dia a dia destas
regiões costeiras. Esta actividade pesqueira artesanal é levada a cabo em zonas de
estuários próximas da costa, onde se produz a ovulação e o recrutamento em viveiros de
numerosas espécies, que podem ter incidência sobre os stocks de muitas outras espécies,
com influência noutras zonas mais amplas.
A evolução tecnológica, inevitável e desejada, provocou um excesso de pesca
(sobrepesca ) de várias espécies, sendo a pesca artesanal e costeira indubitavelmente
4
afectada. Procede-se ao abatimento de embarcações mais antigas, tornam-se necessários
menos pescadores, o que condiciona de sobremaneira as perspectivas de ocupação da
mão de obra disponível.
Há excesso de oferta de trabalho, há busca de emprego em fainas pesqueiras ou com
elas relacionadas. Este relacionamento poderá ser a montante, a jusante, ou
indirectamente através da restauração, do turismo, da ecologia, do ambientalismo, da
aquacultura, da agricultura, da pequena industria, etc. No entanto, o funcionamento
normal do mercado de trabalho, dado que os salários têm mínimos regulamentados,
provoca o desemprego e as suas consequências nefastas. Na Secção IV aprofundaremos
esta análise.
Da Bretanha francesa, passando pelo norte de Espanha, por Portugal, e até ao estreito
de Gibraltar, temos uma enorme costa atlântica, com mais de 4.000 Km. Nela existem
333 portos de pesca de diferentes dimensões e neles agiam, em 2005, 15.582
embarcações de pesca que empregavam directamente mais de 40.000 pessoas.
Portugal reparte, com a França e a Espanha, problemas que afectam o sector pesqueiro,
no enquadramento da nova Política Comum de Pescas (PCP).
Em Portugal, especialmente no Sul, há povoações com grande dependência da
actividade pesqueira pelo que uma gestão económica dos bancos de pesca da
proximidade tem significativa relevância nas vidas das pessoas. O emprego verifica-se
directamente na pesca ou nas variadas formas ligadas, como o processamento, a
transformação e o comércio. Participam dezenas de pequenas embarcações, que utilizam
artes de pesca como por exemplo as redes de emalhar, a ganchorra, o arrasto de vara ou
a sombreira.
A qualidade, para além da quantidade da informação, é fulcral nesta área, pois não só a
perspectiva estrita da gestão, mas as referências que se reportem à vida familiar e
pessoal, são, por sua natureza volúveis, com pesos psicológicos de comunidades
piscatórias, desenvolvendo mecanismos de auto-defesa, de torneamento assaz difícil.
Pretende-se sustentar um carácter regional comum da faina pesqueira com um forte
pendor social, que passa pela sensibilização, pela formação, pelo intercâmbio de
experiências, a nível nacional e internacional, pela melhoria de funcionamentos “em
rede”, com o aperfeiçoamento dos sistemas de comunicações e de troca de informações.
Outro dos objectivos será avaliar os efeitos sobre as pescarias de medidas restritivas
como a redução dos horários da faina, da quantidade pescada devido a razões
biológicas, ou a regulação de artes.
5
A pesca artesanal portuguesa tem-se vindo a restringir aos bancos de pesca próximos da
costa, dado o poder económico, técnico e político da pesca industrial.
Quanto a resultados positivos que esperamos, um será o actual, ou seja um fruto
imediato do nosso trabalho. O outro só poderá ser apreciado no futuro, se os nossos
contributos, nomeadamente os de índole sócio-económica e ambiental, vierem a
beneficiar, com maior ou menor intensidade, a evolução do sector. Resumindo, é nosso
intuito;
Favorecer o progresso social dos trabalhadores do mar, aumentando o seu nível de
rendimento, assegurando o seu futuro, fornecendo-lhes informações, propostas, e
metodologias condicentes com uma exploração respeitante do meio ambiente.
Favorecer tomadas de decisões conducentes a conservar o meio ambiente das regiões
pesqueiras atlânticas, onde se situam os ecosistemas litorais com papel fundamental
como zonas de viveiros e de criação de espécies de interesse piscatório.
Criar uma consciência colectiva dentro do sector pesqueiro artesanal, que se desenvolva
globalmente, envolvendo primeiro os participantes de cada região na difusão dos
resultados locais, para posteriormente transmitir-lhes as experiências desenvolvidas a
nível transnacional.
III – METODOLOGIA
Os estudos sócio-económicos mas também ambientais, tiveram em atenção a
aplicabilidade prática em áreas costeiras portuguesas da literatura versando estas
matérias, na visita a esses locais por parte de elementos da equipe, e em entrevistas que
nos foram concedidas.
Para além das normais dificuldades materiais nas deslocações e nos contactos com os
entrevistáveis surgiu uma questão precedente: a própria construção de um conjunto de
questões coerentes concretas, amistosas, e que nos pudessem proporcionar respostas
passíveis de serem sistematizadas e substantivas quanto à informação monitorizável..
O rol de respostas devidamente tratado serviram de alicerce à análise sócio-económica
a que procedemos.
Em teoria económica dos recursos naturais ou dos bens ambientais há muitos métodos
de avaliação do valor patrimonial, do valor paisagístico, do valor de recursos naturais
renováveis, como o pescado, mas nestas estimativas previsionais, a inclusão de
6
problemas sociais torna-se muito contingente ou duvidosa. Reparemos que tal poderá
ser tentado atribuindo-lhe uma ou mais variáveis, integráveis em funções, que, como as
outras variáveis em que a quantificação a numeração, objectiva e precisa, é inevitável.
Para 2002 conhecemos os seguintes dados económicos; consumo efectivo em
combustível para as embarcações movidas a gasóleo, subsídios da Administração para
construção e modernização, descontos em lota, outras taxas, obrigações sociais, gastos
com reparação ou aquisição de artes, e vistorias.
Para os anos de 1995 a 2003, e relativamente a cada embarcação, temos:
1. Porto de registo
2. Características da embarcação
Tipo embarcação (Local ou Costeira)
Tipo de combustível (Gasóleo, Gasolina, Mistura, Outros)
Tipo de convés (Boca Aberta, Corrido, Outros, Parcial)
Tipo de casco (Madeira, Metal, Fibra de Vidro, Outros)
Comprimento de fora a fora
Comprimento de sinal
Arqueação embarcação (toneladas) (TAB)
Potência do motor principal em KW e em HP
3.Desembarques
Diário por espécie em quantidade e em valor
Local de desembarque
4.Esforço de pesca (nº. Dias de pesca)
5.Número e tipo de licenças de pesca
6.Número de tripulantes (NOTA: o ficheiro tem falhas)
Quanto à parte sócio-económica das entrevistas, e outras fontes de consulta oficiais,
permitiram-nos analisar e tirar conclusões.
Na secção seguinte ( IV), após breve introdução, analisamos separadamente cada uma
das pescarias para as quais obtivemos dados. Apresentamos os resultados e tecemos
comentários, deduzindo as conclusões que nos parecem oportunas e úteis,
Embora possam existir pequenas diferenças, preferimos especificá-las nas alturas
próprias e considerar uma metodologia-base em termos razoavelmente genéricos.
Metodologicamente, tendo em conta os objectivos acima referidos e as informações de
que pudemos dispor, achámos por bem;
7
Primeiro, designar convenientemente os distintos treze aspectos, e depois ordená-los por
critérios de aproximação relativa.
Nesta conformidade, estabelecemos a seguinte ordenação:
1) Local de nascimento da tripulação
2) Residência da tripulação
3) Tripulantes migrantes e não migrantes
4) Tradição familiar
5) Envolvimento familiar
6) Habilitações literárias
7) Idade de início da actividade
8) Idade dos tripulantes
9) Rendimentos dos tripulantes
10) Percentagem do rendimento dos tripulantes no agregado familiar
11) Tripulantes com ou sem filhos
12) Número de filhos por tripulante
13) Número de filhos a frequentar a escola
IV- ANÁLISE SOCIO-ECONÓMICO-AMBIENTAL
Devido à existência de dados mais fiáveis para o ano 2002, analisamos a pesca com
ganchorra, dirigida a bivalves, no Algarve e no Centro-Norte.
A) PESCA COM GANCHORRA NO ALGARVE
Uma observação da Figura 1 leva-nos a concluir que uma grande maioria dos mestres
(81,3%) e dos pescadores (66,7%), nasceu em Olhão ou na Fuzeta. Mais de metade de
uns e de outros é natural de Olhão, cidade onde há séculos a influência social e
económica da actividade pesqueira é determinante na vida diária.( Fig. 1). Este peso
acresce quando aí residem 73,8% dos mestres e 62,5% dos pescadores.
É notório realçar que as outras povoações do sotavento algarvio repartem
equilibradamente estas origens: 3,1% dos mestres, nasceu em cada um dos seguintes
aglomerados populacionais ou países: São Brás de Alportel, Faro, Tavira, Conceição,
PALOPS.
8
Paralelamente, registamos que apenas 7,5% dos pescadores nasceu em lugares que não
dão directamente para o mar e não dispõe de portos Atlânticos: Loulé (1,5%), Quelfes
(1,5%), Moncarapacho (3%) e Castro Marim (1,5%). Esta constatação não é
sintomática, dada a proximidade da costa.
Mestre
Pescador
1,5 %
3,1 %
4,5 %
3,1 %
Castro Marim
VRSA
Coceição Tavira
Olhão
Luz
Faro
1,5 %
3,1 %
Setúbal Arraiolos
7,5 %
3%
3,1 %
4,5 %
1,5 %
Tavira
1,5 %
Fuzeta
SB Alportel
3%
31, 3 %
3,1 %
Loulé
13, 4 %
1,5 %
1,5 %
Porto
3,1 %
1,5 %
50 %
53, 7 %
Algarve
Moncarapacho
Quelfes
PALOP’s
Figura 1 -Tripulantes por local de nascimento
A importância de Olhão ainda cresce como local de residência, já que isso se passa com
62,5% dos mestres e 73,8% dos pescadores (Gráfico 1 a)) . A Fuzeta permanece em
segundo lugar mas com 21,9% dos mestres e 10,8% dos pescadores. Certamente pelo
seu relevo como cidade, surge Vila Real de S. António, onde moram respectivamente
6,3% e 4,6%. As restantes povoações onde os tripulantes residem são dispersas pelo
sotavento algarvio, com percentagens pouco significativas. Quando somamos, obtemos
9
Tripulantes por local de residência
Mestre (m igrantes vs. não m igrantes)
4,6 %
VRSA
31%
6,3 %
73,8 %
Olhão
62,5 %
M igrant es
Não migrant es
1,5 %
3,1 %
Bias Sul
69%
3,1 %
Luz
1,5 %
3,1 %
Culat ra
Pescador (m igrantes vs. não m igrantes)
10,8 %
Fuzet a
21,9 %
37%
3,1 %
Conceição
M igrant es
Bias Nort e
63%
3,1 %
0
20
M est re
40
60
Não migrant es
80
Pescador
Gráfico 1
a)Tripulantes por local de residência
b)Migrantes e não migrantes
100% dos mestres e 98,4% dos pescadores o que traduz, ou reflecte bem, a magnitude
das nossas informações.
A repartição de mestres e pescadores migrantes ou não migrantes é parecida. De facto,
há 69% de mestres e 63% de pescadores não migrantes complementando-se as
diferenças para os 100% (Gráfico 1 b)).
Como verdadeiramente relevante do ponto de vista social, são os dados que obtivemos
quanto ás tradições familiares e ao envolvimento familiar nas actividades pesqueiras.
A repartição de mestres e pescadores migrantes ou não migrantes é parecida. De facto,
há 69% de mestres e 63% de pescadores não migrantes complementando-se as
diferenças
10
Tradição familiar
14,3 %
100
17,6 %
80
não
60
85,7 %
%
82,4 %
sim
40
20
0
M estre
Pescador
Gráfico 2 - Tradição familiar
Parece impressionante a carga tradicional das comunidades piscatórias quando se
observa que 85,7% dos mestres e 82,4% dos pescadores respondem afirmativamente à
vertente da memória ou dos costumes profissionais no que toca à pesca (Gráfico 2).
Estas impressões surgem reforçadas quando olhamos para as percentagens obtidas no
respeitante a tripulantes com familiares envolvidos nessa profissão (Gráfico 3).
Tripulantes com familiares envolvidos na pesca
58,8 %
Pescador
41,2 %
76,2 %
M estre
23,8 %
C/ familiares
0
20
40 S/ familiares
60
80
100
Gráfico 3 Tripulantes com familiares envolvidos na pesca
Haverá no entanto que diferenciar dois planos:
11
Um deles é o facto de a maior parte serem famílias numerosas e bastará haver um
familiar directa ou indirectamente ligado à pesca, para a resposta ser afirmativa. Assim
acontecendo, haveria esta explicação para uma alta percentagem.
O outro é as pessoas pertencerem a várias gerações, com probabilidade de haver idosos
entre esses familiares. Tal seria outra justificação para tal resposta.
Tendo em conta porém estas atenuantes, verificamos que 76,2% dos mestres e 58,8%
dos pescadores têm familiares envolvidos na pesca.
As habilitações literárias (assim são chamadas…)revelam que 19% dos mestres
obtiveram o ensino secundário, sem que qualquer pescador tenha obtido esse diploma
(Gráfico 4). Entre estes há mesmo assim 58,8% com o preparatório e 41,2% com o
primário.
Serão claramente condições económicas menos apertadas que justificam as diferenças
na distribuição de habilitações entre os pescadores e os mestres apesar de 33,3% destes
terem apenas chegado ao ensino primário.
.
Habilitações literárias
pescador
100
M est re
80
60
58,8 %
41,2 %
40
47,6 %
20
33,3 %
19 %
0
Primaria
Preparat ório
Secundário
Gráfico 4 - Habilitações literárias
No que diz respeito concretamente à educação e à formação no sector pesqueiro, em
Portugal, podemos contar sobretudo com os cursos FORPESCAS, na Escola Portuguesa
de Pescas, e com os Centros Nacionais de Investigação. São um mínimo indispensável
mas representa um investimento estatal reduzidíssimo nesta actividade sócio-económica
tão importante. Na verdade, a grande maioria dos mestres (85,7%) têm o curso
FORPESCAS, significando quase uma condição necessária para desempenhar essa
função. Contudo, nos pescadores, há 35,3%, ou seja quase um terço que não possuem
essa formação. Tal significará, normalmente, que exercem outras actividades e que para
eles “não vale a pena” ter essa formação.
12
Estes laços tradicionais, sociais e culturais reforçam-se ao olharmos as barras
correspondentes às idades de início da actividade (Gráfico 5).
14,3 %
21-25
33,3 %
16-20
11-15
6,7 %
21-25
40 %
16-20
42,9 %
40 %
11-15
M estre
9,5 %
6-10
50
40
30
20
10
13,3 %
6-10
0
10
Pescador
20
%
30
40
50
%
Gráfico 5 - Idade de início de actividade
Não existindo substanciais diferenças entre os mestres e os pescadores, poderemos
forjar um raciocínio similar, que nos leva a concluir ser essa idade assaz reduzida. Com
efeito, 9,5% dos mestres e 13,3% dos pescadores indicam esse começo entre os 6 e os
10 anos, 42,9% dos mestres e 40% dos pescadores entre os 11 e os 15 anos.
Se por oportunismo ou comodidade afastarmos a ideia de exploração do trabalho
infantil, até porque haveria que saber os que trabalham com a família, entendendo-se
assim como certa forma de trabalho doméstico, restarão os que trabalham por conta de
outrem, ou seja para um patrão, um armador, um mestre, etc..
São adolescências e juventudes passadas junto ao Oceano, recebendo dinheiro
proveniente da pesca, com todas as suas vicissitudes. Compete-nos fazer uma análise
reflexiva sobre essas centenas ou milhares de jovens sujeitos a essa duríssima vida, com
as horas da faina a imperarem, a baixa qualidade material de vida, as limitações sociais,
de comunicação, e de reduzidas perspectivas futuras. Voltaremos a falar sobre este
tópico, até porque estas poucas esperanças alargam-se também aos mais velhos.
13
6,5 %
61-70
7,8 %
61-70
M estre
Pescador
51-60
25,8 %
41-5045,2 %
31-40
18,8 %
51-60
28,1 %
41-50
22,6 %
21-30
35,9 %
31-40
9,4 %
21-30
Gráfico
640– Idade
50
30 dos tripulantes
20
10
0
%
10
20
30
40
50
%
Gráfico 6 – Idade dos tripulantes
Quanto à idade dos tripulantes, o envelhecimento destes profissionais é nítido ao
olharmos para as idades dos mestres (Gráfico 6). 77,5% tem mais de 40 anos e apenas
22,6% tem menos. Estas percentagens põem em causa a formação atempada dos jovens,
as políticas para um rejuvenescimento, ou mesmo para a manutenção do sector
pesqueiro.
Os estratos etários dos mestres não apresentam a mesma configuração genérica do que a
dos pescadores . Naqueles predominam, com 45,2%, os arrumados no grupo dos 41 aos
50 anos. Nos conjuntos adjacentes (31-40 e 51-60), há certo equilíbrio, 22,6% e 25,8% ;
são todavia realçáveis dois aspectos: 1º - a quebra negativa dos escalões 41-50 e 31-40
(45,2% para 22,6%).
2º - A inexistência de mestres com idades inferiores a 30 anos.
Estes dados conduzem-nos a antevisões desfavoráveis quanto ao preenchimento futuro
deste cargo, pelo menos em termos quantitativos.
A distribuição por idades dos pescadores apresenta um diminuição natural (35,9%,
28,1%, 18,8%, 7,8%) nos sucessivos estratos, a partir do convencionado entre os 31 e os
40 anos.
Registe-se que, embora haja 9.4% no primeiro escalão, verifica-se uma grande
discrepância para o segundo escalão (31-40), que inclui 35,9%.
Raciocínio idêntico ao que fizemos para com os mestres se poderá agora fazer, ou seja,
serão previsíveis graves carências nos escalões seguintes, de pescadores que utilizem a
arte da ganchorra nesta zona do Algarve.
Estas diferenças reflectem-se também nos rendimentos (Gráfico 7). Nenhum pescador
tem um rendimento superior a 500 euros, e nenhum mestre recebe menos que 350 euros.
Note-se que 40% dos mestres têm rendimento superior a 500 euros, havendo mesmo
14
20% que excedem os 950 euros. Pelo contrário 30,8% dos pescadores não ganham mais
de 350 euros.
Rendim ento
140
120
Pescador
100
69,2 %
M estre
80
60
40
20
60 %
5%
30,8 %
20 %
15 %
0
200-350
350-500
500-650
650-800
800-950
>950
classes d e r end iment o
Gráfico 7 – Classes de rendimento
Estes níveis são claramente insuficientes e os tripulantes têm necessidade que membros
das famílias possuam também fontes de rendimentos, em quaisquer actividades. Como é
normal, haverá aqui forte chamamento, quer tradicional quer pela própria inserção nos
círculos da pesca. Esta carência reflecte-se mais nos pescadores, onde existem mais de
75% que apenas podem contribuir com 46,7% do rendimento do agregado familiar, ou
seja menos de metade (Gráfico 8) .
Tripulantes por percentagem do rendim ento no
agregado fam iliar
140
120
100
80
60
40
20
0
53,3 %
46,7 %
Pescador
68,4 %
M estre
>25%
31,6 %
25-50%
50-75%
>75%
% d e r end iment o
Gráfico 8 – Tripulantes por percentagem do rendimento no agregado familiar
Cabem aqui as indispensáveis ajudas dos filhos, das esposas, de irmãos, etc., o que
reforça as reduzidas idades com que se inicia a actividade.
15
Realce-se que a situação dos mestres não é muito melhor, já que somente 31,6%
também não ganha mais de 75% dos rendimentos das suas famílias.
Este panorama surge um tanto aligeirado quando olhamos as percentagens entre 50%
e75%. Para 53,3% dos pescadores e 68,4% doa mestres os seus ganhos podem variar
entre 50% e 75% do rendimento familiar.
A estas remunerações correspondem diferentes perspectivas de construção e de
sustentação da família (Gráfico 9). Se todos os mestres têm filhos, há praticamente 30%
de pescadores que os não têm. Atendendo a esta última percentagem o número de um ou
de dois filhos por pescador é aproximado, decrescendo logicamente a percentagem com
três filhos (11,8%).
Tripulantes vs. filhos
100
29,4 %
80
60
s/ f ilhos
c/ f ilhos
100 %
40
70,6 %
20
0
M est re
Pescador
Gráfico 9 Tripulantes com ou sem filhos
Curiosamente, segundo os dados de que dispomos (Gráfico 10), nem mestres nem
pescadores têm quatro filhos, mas há quase 6% de pescadores com seis.
16
Núm ero de filhos por tripulante
Pescador
80
70
M estre
29,4 %
60
23,5 %
50
40
30
20
47,6 %
42,9 %
11,8 %
29,4 %
10
5,9 %
9,5 %
0
0
1
2
3
4
6
N úmer o d e f ilho s
Gráfico 10 Número de filhos por tripulante
Maugrado estes 6% serem reduzidos, se compararmos os parcos rendimentos com esta
numerosa prole, decerto deparamos com gente muito pobre onde a degradação social é
mais fértil… Tal pode-se confirmar pela elevada percentagem (62,5%) de filhos de
pescadores que não frequentam a escola (Gráfico 11). Pelas mesmas razões, para os
mestres esta percentagem
28,6% oa escola
que se pode considerar também relativamente
Filhoséa de
frequentar
elevado e cujas consequências aparecem idênticas às tiradas atrás.
37,5 %
Pescador
62,5 %
71,4 %
M estre
0
20
40
28,6 %
60
80
100
sim
não
Gráfico 11. Filhos a frequentar a escola
SOBRE A AMOSTRA RECOLHIDA
PESCA COM GANCHORRA NO ALGARVE
Universo 52 embarcações
Número de mestres entrevistados: 30 (60%)
Número de pescadores entrevistados: 18 (50%)
Número de róis consultados: 47 (90%)
17
B) PESCA COM GANCHORRA NO CENTRO E NORTE
A interpretação do gráfico de barras (Gráfico12), que nos mostra os locais de
nascimento, é elementar.
Tripulantes por local de nascim ento
60%
M estre
48,9%
P escado r
44,4%
40%
m
zi
ar
rto
Po
s
ho
in
os
at
M
V
P.
de
on
C
V.
1,1%
1,1%
lo
te
as
C
V.
1,1%
a
ai
.G
N
V.
3,3%
Gráfico 12 – Tripulantes por local de nascimento
De imediato se repara que 40% dos mestres nasceram em Vila do Conde e 60% na
Póvoa do Varzim, ou seja 100%. Quanto aos pescadores, também nasceram sobretudo
nessas terras (40% e 44,4%). Os restantes 6,7% repartem-se por Matosinhos, 3,3%, e
Porto , Vila Nova de Gaia e Viana do Castelo com 1,1% cada. Todas estas povoações,
excepto o Porto, têm portos atlânticos.
Os tripulantes residem quase inteiramente nas duas cidades apontadas ao princípio, mas
com uma curiosidade; os mestres, habitam 50% em cada uma, o que não se verificava,
como vimos, com os nascimentos (40% e 60%), (Gráfico 13 a)).
Os pescadores também tendem a residir em Vila do Conde, 63,6%, e na Póvoa do
Varzim, com 34,1%.
Mais nitidamente do que acontece no Algarve, a divisão entre mestres e pescadores
migrantes e não migrantes é praticamente igual, isto é como migrantes temos 70% dos
mestres e 69,3% dos pescadores, e como não migrantes 30% e 30,7%. Todavia, ao
contrário do Algarve, não há profissionais provindos de PALOP (Gráfico 13 b)).
18
Migrantes
Tripulantes por local de residência
Mestre
Pescador
Não migrantes
30%
Mestre
2,3%
V. Castelo
70%
Migrantes
34,1%
P. Varzim
Pescador
50%
Não migrantes
30,7%
63,6%
V. Conde
50%
69,3%
0
20
40
60
80
Gráfico 13
a) Tripulantes por local de residência
b) Migrantes e não migrantes
Quanto à tradição familiar os indicadores são muito mais impressionantes do que os
verificados, também com a ganchorra, no Algarve (Gráfico 14 a)).
Tradição Fam iliar
não
Tripulantes com fam iliares envolvidos na pesca
sim
11,5%
100
Pescador
7,7%
92,3%
80
60
100%
88,5%
Mestre
100%
40
20
C/ familiares
S/ familiares
0
Mestre
Gráfico 14
a)Tradição familiar
Pescador
b)Tripulantes com familiares
envolvidos na pesca
100% dos mestres apontam tradições familiares, o mesmo acontecendo com 88,5 % dos
pescadores.
Estas informações conjugam-se e são inteiramente confirmadas ao verificar-se que
100% dos mestres têm familiares envolvidos na pesca, tal como 92,3% dos pescadores
(Gráfico 14 b)). Aqui constata-se, no entanto, uma diferença apreciável com o
19
apercebido no sotavento algarvio. Basta compararmos as respectivas percentagens: a
Sul, cerca de ¾ dos mestres têm pessoas de família relacionadas com a actividade
pesqueira, enquanto que no Centro-Norte são a totalidade. Essa diferença, 23,8% (100%
- 76,2%), entre os mestres, é superada mesmo pela dos pescadores, 33,5% (92,3% 58,8%). No Centro-Norte, apenas 7,7% não possuem familiares nestas circunstâncias.
Observemos agora as habilitações literárias (Gráfico 15).
Quatro quintos (80%) dos pescadores não foram além do ensino primário, o que revela
efeitos de pobreza nesta comunidade. Somente 15% conseguem o ensino preparatório, o
que adicionado aos 3,8% de analfabetos nos leva a concluir que todos os pescadores
desta região, pelo menos os que trabalham com a gandorra na captura de bivalves, têm
uma péssima condição de vida, desde
queLiterárias
nasceram, digamos.
Habilitações
Habilitações Literárias
140
120
140
120
100
80
60
40
20
Pescador
Mestre
100
80,8%
Pescador
80
Mestre
15,4%
60
80,8%
40
40%
20
0
40%
Prim
15,4%
50%
10%
3,8%
50%
10%
Prepa
Secu
3,8%
Analf
0
Prim
Prepa
Secu
Analf
Gráfico 15– Habilitações literárias
A situação dos mestres é, embora ligeiramente, menos má. Não havendo analfabetos,
são 90% os que não passaram do ensino preparatório. Residualmente, apenas 10% têm o
ensino secundário.
Todas estas percentagens são reveladoras da penúria e mesmo da miséria em que vive a
generalidade desta gente.
Apreciando a idade de início da actividade pesqueira (Gráfico 16), enfrentamos alguns
números surpreendentes, como sejam: entre os mestres, 30% começam dos 6 e os 10
anos (no Algarve, apenas 9,5%), entre os pescadores 23,1% principiam nestas idades
(no Algarve eram 13,3%).
20
Mestre
21-25
16-20
30%
11,5%
11-15
40%
30
65,4%
6-10
30%
40
Pescador
20
10
23,1%
0
20
40
60
80
Gráfico 16– Idade de início de actividade
Ao passo que no Algarve 40% dos pescadores estavam entre os 16 e os 20 anos, no
Centro-Norte são apenas 11,5%, verificando-se também divergência no intervalo dos 11
aos 15 anos, com 40% e 65,4%.
Este desequilíbrio etário, o peso avantajado neste último escalão, leva-nos a concluir
que é em plena adolescência que se forma na prática a maioria dos tripulantes que
utilizam a arte da gandorra, na captura de bivalves, no Centro-Norte de Portugal.
Salvaguardamos aqui o facto de não dispormos de qualquer informações quanto ao
escalão dos 21 aos 25 anos, resultado decorrente das respostas obtidas nas entrevistas.
Vale agora o raciocínio que fizemos quanto a este tipo de dados no caso do Algarve,
agravando-se, contudo, porque há ainda maior percentagem de profissionais que
começam a trabalhar na pesca enquanto crianças, dos 6 aos 10 anos.
No que diz respeito à idade dos mestres (Gráfico 17), põe-se-nos uma questão parecida
com a que tínhamos com o Algarve; parece-nos significativa a inexistência de mestre
com mais de 61 anos, mas não pomos em causa esta informação. Não descortinamos
também razões sociais, económicas ou outras justificativas do desequilíbrio verificado
na percentagem que mede as idades entre 31 e 40 anos (10%) e as que medem todos os
outros intervalos e são iguais a 30%.
As percentagens etárias dos pescadores parecem-nos razoáveis e apontando certo
envelhecimento futuro, já que apenas 21,3% e 14,4% têm idades
21
Mestre
61-70
Pescador
11,2%
51-60
30%
24,7%
41-50
30%
30,3%
31-40
10%
21,3%
20-30
30%
30
25
20
15
10
5
12,4%
0
10
20
30
40
50
Gráfico 17 – Idade dos tripulantes
compreendidas entre os 31 e os 40 anos e entre os 20 e os 30.
A repartição de mestres e pescadores por classes de rendimento (Gráfico 18 a)) mostra
um evidente desequilíbrio, Maior ainda do que se verifica no Algarve. De facto, 50%
dos mestres recebe mais de 550 euros e 30% localizam-se entre os 800 e os 950 euros,
ou seja 80% ganham mais de 800 euros, enquanto que 96,2% (15,4% + 46,2% + 30,8%
+ 3,8%) dos pescadores auferem menos que esse montante,
Tripulantes por percentagem do rendimento no agregado
familiar
Rendimento
3,8%
Pescador
Mestre
Pescador
Mestre
57,7%
46,2%
50%
30,8%
80%
30%
15,4%
10%
10%
3,8%
200-350 350-500 500-650 650-800 800-950
Classe de Rendimento (€)
Gráfico 18
a)Classe de rendimento
>950
>25%
19,2%
23,1%
10%
10%
25-50%
50-75%
>75%
Percentagem de Rendimento
b)Tripulante por percentagem de
rendimento no agregado familiar
Perante esta abissal diferença, as outras percentagens (10% dos mestres ganham entre
350 e 500 euros) surgem quase sem relevância. Adiantemos que a causa de 3,8% dos
pescadores ganharem mais de 550 euros, ou poderá ser qualquer engano nesta
classificação de pessoas, ou se trata apenas de uma ou duas.
O valor percentual do rendimento no agregado familiar (Gráfico 18 b)) mostra a sua
importância quando excede os 75%. Para quatro quintos dos mestres, o seu recebimento
pode oscilar entre esta percentagem e os 100%. Depois, muito menos relevantes os
22
10%, quer para a classe de 25-50% quer para a de 50-75% do rendimento do agregado
familiar.
Concluiremos pois que a grande maioria dos mestres ganha uma percentagem elevada
da mensalidade familiar. A perspectiva para os pescadores não difere muito mas a
repartição percentual é, logicamente, mais atenuada. Note-se contudo que 42,3%
(19,2% + 23,1%) deles contribuem com 75% ou menos para o rendimento do agregado,
ao passo que 57,7% contribuem com mais de 75%.
A percentagem de tripulantes com filhos não é relevante(Gráfico 19 a), embora em
comparação com o Algarve haja 33,3% dos mestres que não os tenham, contra os
surpreendentes 0%, e entre os pescadores haja 57,1% que têm, menos pois que os
70,6%
Tripulantes vs filhos
Número de filhos por tripulante
s/ filhos
c/ filhos
Pescador
33,3%
42,9%
80
Mestre
70
60
45%
30%
50
40
66,7%
57,1%
5%
30
20
44,4%
33,3%
22,2%
10
10%
10%
0
Mestre
Pescador
0
1
2
3
4
5
Número de filhos
Gráfico 19
a)Tripulantes com ou sem filhos
b) Número de filhos por tripulante
Quanto ao número de filhos a percentagem de pescadores que não os têm é de 42,9%
(Gráfico 19 a), ainda maior que a registada no Algarve (29,4%). Assinalam-se porém
33,3% de mestres, ao contrário do Algarve, em que foram registados 0%.
Uma percentagem curiosa é a existência de 10% de pescadores com cinco filhos e
nenhum com quatro o que será explicável pela amostra que recolhemos. No Algarve
haviam 5,9% com cinco e nenhum com quatro, o que não sendo muito normal se pode
justificar pela razão atrás apontada.
Pelo menos aparentemente os mestres teriam possibilidades económicas para enviar
todos os filhos à escola, o que é visível no Gráfico 18 a).
Apesar destas diferenças existentes nos rendimentos de mestres e de pescadores, a nossa
amostra indica que há 40,9% de filhos de mestres que não frequentam a escola ao passo
que, para os filhos de pescadores, se observam 33,3% ( Gráfico 20 ).
23
Restará dizer que foram entrevistados todos os mestres (100%) e apenas 79% dos
pescadores o que significa que os atrás apontados 40,9% não sofrerão alterações e os
33,3% poder-se-iam modificar se aumentasse o número de pescadores entrevistados
(26).
Filhos a frequentar a escola
66.7%
Pescador
59.1%
Mestre
0.0
33.3%
20.0
40.9%
40.0
60.0
80.0
100.0
sim
não
Gráfico 20 Filhos de tripulantes a frequentar a escola
SOBRE A AMOSTRA RECOLHIDA
PESCA COM GANCHORRA NO CENTRO E NORTE
Universo 11 embarcações
Número de mestres entrevistados: 11 (100%)
Número de pescadores entrevistados: 26 (79%)
Número de róis consultados: 11 (100%)
V - CONCLUSÕES
A exploração económica de um recurso natural renovável, como a pesca, deve conjugar
e compatibilizar um conjunto de aspectos para além do estritamente contido na teoria
económica e de gestão. Eles serão sociais, ambientais, de conservação das espécies, de
emprego e de bem estar material das pessoas.
Este trabalho, versando eminentemente a sócio-económia aponta também problemas
dinâmicos naturais, como os ambientais. Na União Europeia, cada vez mais o ambiente
aparece ligado e com influência nas actividades pesqueiras.
24
Interessa-nos, no entanto, efectuar comparações com a pesca industrial sobretudo
enquanto pesca costeira e dirigida a espécies igualmente visadas pela pesca artesanal.
Naquela predomina largamente a perspectiva de maximização dos lucros imediatos para
gerar retorno ao investimento e ao capital fixo, instalações e navios de grande porte. Os
objectivos principais são a produtividade e a eficiência, com subestimação dos
contornos sociais.
Verificadas certas condições estruturais e de funcionamento, aquela produtividade pode
ser tomada simplesmente como a quantidade de pescado obtida por um tripulante, em
dado tempo. É um índice quantificado, que depende menos da velocidade ou da
intensidade de trabalhos dos pescadores, do que das instalações, do equipamento, e da
tecnologia existente.
Os armadores da pesca industrial, normalmente com assinalável poder económico,
reduzem tanto quanto possível o número de tripulantes e de pessoal de apoio em terra.
São de facto as pescas artesanais que mobilizam muito mais mão de obra local e que
mais peso têm na sociedade e na economia das regiões litorais.
Os lucros e outras vantagens empresariais fazem parte do próprio sistema económico e
de gestão. O problema coloca-se na combinação do binómio: lucro das
empresas/problemas sociais associados ou decorrentes.
Um destes problemas é concretamente o desemprego. Ele contribui para que milhares
de jovens, familiares de tripulantes, migrem para os arrabaldes das grandes cidades onde
provavelmente virão a ser colhidos pela marginalidade e pela exclusão social. No limite,
poder-se-ia afirmar que a pesca industrial é mais eficiente em termos de gestão e que a
pesca artesanal é mais eficiente em termos sociais.
Em Portugal cremos possível conjugar uma boa rentabilidade do capital, investimentos
relativamente baixos, emprego de mão de obra essencialmente local e elevadas taxas de
valor acrescentado. Esta taxa ronda os 60% na pesca artesanal e os 30% na pesca
industrial. A pesca artesanal rejeita menos de 5% do pescado e a pesca industrial mais
de 40% donde se prova ser a primeira muito mais selectiva.
Na área das pescas, a divisão internacional do trabalho dos pescadores e mestres tende a
situar a pesca artesanal como fornecedora dos países mais ricos, e dependendo do poder
destes.
Os avanços tecnológicos podem ter também em conta escolhas sociais e escolhas
baseadas em critérios de acesso aos bancos de pesca. Nas pescas industriais, a
actividade é subordinada a certo tipo de tecnologia. Pelo contrário, nas pescas
25
artesanais, a tecnologia é geralmente adaptada pelos pescadores segundo as suas
tradições sociais e as suas condições económicas, e não adaptadas forçosamente por
eles.
BIBLIOGAFIA
-Publicações da Direcção Geral das Pescas (DGP)
-Publicações do Instituto Nacional de Estatística (INE)
-Entrevistas efectuadas pelos autores
-Relatório do Projecto OCIPESCA Interreg IIIB – Espaço Atlântico – Comunidade
Europeia, FEDER
26
Download

abordagem socio-económica de uma actividade pesqueira