Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.8, n.2, p.111-118, 2006
ISSN:
111
ELABORAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DE UMA BEBIDA LÁCTEA
FERMENTADA COM POLPA DE UMBU (Spondias tuberosa sp.)
Calila Teixeira Santos1, Gutto Monzelle Rios Marques1, Gabrielle Cardoso Reis Fontan1,
Rafael da Costa Ilhéu Fontan2, Renata Cristina Ferreira Bonomo3, Paulo Bonomo4
RESUMO
Nesta pesquisa teve-se como objetivo o desenvolvimento de uma bebida láctea fermentada à
base de soro de queijo mussarela e polpa de umbu. Foram avaliadas as características físicoquímicas e físicas a aceitação sensorial, além do efeito da temperatura e da concentração de
soro sobre a massa específica das bebidas que foram formuladas variando-se, somente, a
concentração de soro (20%, 40%, 60% e 80%). A partir dos resultados obtidos e das análises
estatísticas verificou-se que os valores para as características físico-químicas e aceitação
sensorial não apresentaram diferença significativa entre os tratamentos 20%, 40% e 60%
(P > 0,05). A partir dos resultados obtidos das análises físico-químicas e sensorial pode-se
concluir que a melhor bebida foi aquela que apresentou concentração de soro de 60%, devido a
utilização de maior quantidade de soro. Para a análise da influência da concentração de soro e
temperatura sobre a massa específica foi ajustado um modelo linear múltiplo sem interação dos
parâmetros, com coeficiente de determinação satisfatório.
Palavras-chave: densidade, calor específico, resíduo, aceitação sensorial.
ELABORATION AND CHARACTERIZATION OF A DAIRY FERMENTED
DRINK PRODUCED WITH UMBU (Spondias tuberosa sp.) PULP
ABSTRACT
This paper had as objective the development of a dairy fermented drink produced with
mozzarella cheese whey and umbu pulp. Were studied physical-chemistries characteristics and
sensorial acceptance, besides the effect of temperature and whey concentration (20%, 40%, 60%
e 80%) on specific mass on the different drink formulations. With obtained results and statistical
analysis it was verified that physical-chemistries characteristics and sensorial acceptance values
didn't present significant difference among the treatments 20%, 40% e 60% of whey
concentrations (P > 0,05). From obtained results of physical-chemistries and sensorial analysis
it can be concluded that the best drink was these who presented whey concentration of 60%, due
the larger whey quantity used. To influence of whey concentration and temperature on specific
mass, a multiple linear model without interaction of the parameters was fitted, presenting a
satisfactory determination coefficient.
Keywords: Specific mass, specific heat, residue, sensorial acceptance.
Protocolo 868 de 30/04/2006
1
Mestrandos em Engenharia de Alimentos–UESB [email protected]; [email protected], [email protected]
Laboratório de Engenharia de Processos da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Praça Primavera, 40, Campus de
Itapetinga, Itapetinga – BA. CEP 45700-000. Tel: (77)3261-8600.
2
Professor Assistente – Departamento de Tecnologia Rural e Animal – UESB. [email protected] Universidade
Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Praça Primavera, 40, Campus de Itapetinga, Itapetinga – BA. CEP 45700-000.
3
4
Professora Adjunto – Departamento de Tecnologia Rural e Animal – UESB. [email protected]
Professora Adjunto – Departamento de Estudos Básicos e Instrumentais – UESB. [email protected]
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Elaboração e caracterização de uma bebida láctea fermentada com polpa de umbu ......... Santos et al.
INTRODUÇÃO
A conservação de frutas na forma de sucos,
polpas e outros produtos surgiu para aumentar o
oferecimento das mesmas e para utilização dos
excedentes de produção. A polpa de fruta
congelada é o produto obtido da parte
comestível da fruta, após trituração e/ou
despolpamento e preservação por congelamento
(Brunini et al., 2002).
Alguns trabalhos científicos têm apresentado
dados que apontam uma ingestão insuficiente
de vários nutrientes por parte da população
mundial como um todo (Carvalho, 1996).
Para tentar amenizar esse quadro e atender
as recomendações em relação aos teores de
compostos responsáveis pela manutenção da
saúde, que devem estar presentes em produtos
novos lançados no mercado, além de atender a
padrões de identidade e regulamentos referentes
a alimentos já existentes, é que tem sido feito o
enriquecimento de produtos alimentícios.
Produtos lácteos, farinhas, cereais, biscoitos,
enfim, produtos com expressivo consumo pela
população em geral têm sido os mais utilizados
para esse fim (Carvalho, 1996).
A utilização de soro de queijo na elaboração
de bebidas lácteas constitui-se numa forma
racional de aproveitamento deste produto
secundário que apresenta excelente valor
nutritivo. Como destacam Tamime (1997) e
Tamime & Robinson (1991), tem aumentado de
maneira notável o consumo dessas bebidas
fermentadas que se caracterizam por apresentar
baixa viscosidade. O Regulamento Técnico de
Identidade e Qualidade de Bebidas Lácteas
especifica que bebida láctea é o produto obtido,
a partir de leite ou leite reconstituído e/ou
derivados de leite, fermentado ou não, com ou
sem adição de outros ingredientes, onde a base
láctea representa pelo menos 51% (m/m) do
total de ingredientes do produto (Brasil, 1999).
O soro representa de 85-90% do volume de
leite utilizado na fabricação de queijos, retendo
ao redor de 55% dos nutrientes do leite. Alguns
autores salientam que 50% da produção
mundial de soro é tratada e transformada em
vários produtos alimentares, sendo que deste
total quase a metade é usada diretamente na
forma líquida (Almeida et al., 2001).
Buscando-se evitar essa perda de nutrientes,
reduzir gastos com tratamentos de resíduos e
aumento da receita, desenvolveu-se mais uma
opção de sabor para as bebidas Lácteas
Fermentadas, que além de aproveitarem o soro
irão usar outra matéria prima pouco aproveitada
que é o umbu.
O umbuzeiro (Spondias tuberosa A.
Camara) é uma anarcadiácea que se destaca
entre as fruteiras nativas do trópico semi-árido
brasileiro. Seus frutos são consumidos pela
população tanto “in natura” como na forma de
doces, sorvetes ou polpa industrializada.
Plantios comerciais são inexistentes e os frutos
comercializados são resultantes do extrativismo
(Santos & Nascimento, 1998).
Os frutos possuem excelente sabor e aroma,
boa aparência e qualidade nutritiva, muito
consumidos na forma “in natura”, apresentando
rendimento médio de 55 a 65% em polpa, com
potencial para a sua utilização na forma
processada como polpa congelada, sucos,
néctares e sorvetes (Lima et al., 2002)
O objetivo deste trabalho foi verificar a
aceitação sensorial e determinar as características físico-químicas e físicas de bebidas lácteas
fermentadas adicionadas de polpa de umbu em
diferentes concentrações de soro de queijo.
MATERIAL E MÉTODOS
Elaboração das bebidas fermentadas
Foi utilizado leite pasteurizado com teor de
gordura padronizado a 3% e soro derivado do
processamento de queijo mussarela. Na
elaboração do produto foram testadas quatro
diferentes concentrações (%v/v) de soro, no que
chamaremos de “base láctea”. Essa base láctea
foi fermentada com cultura termofílica para
iogurte a 43ºC até que a acidez atingisse 70ºD
(0,7% em acido lático, com cerca de 4,5 horas
de fermentação). Em todas as formulações foi
utilizado leite em pó integral em quantidade
suficiente para se ter um mínimo de proteínas
lácteas igual a 1,5%, em massa, seguindo a
legislação vigente (Brasil, 1999). Às diferentes
misturas foram adicionados 12% (m/v) de polpa
de umbu e 12% (m/v) de açúcar, em relação à
base láctea.
Os experimentos foram realizados em dias
diferentes, totalizando três repetições. Todas as
análises físico-químicas e de massa específica
foram feitas em triplicata.
Análises físico-químicas
Foram realizadas em todas as amostras
análises de pH, acidez (% m/v de ácido lático),
gordura (% m/v), umidade (% m/v), extrato
seco total (EST,
%) e extrato seco
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desengordurado (ESD, % m/v) de acordo com
as Normas do Instituto Adolfo Lutz (1985).
Cpa = Cpw.Mw.(Te-Tw)+Ccal.(Te-Ti)
Ma.(Ti-Te)
113
(2)
Massa específica
A densidade ou massa específica das
bebidas fermentadas, determinada através do
método picnométrico, foi analisada em um
esquema fatorial 4 x 5,com quatro níveis para o
teor de soro (20%, 40%, 60% e 80%) e cinco
níveis para a temperatura (5ºC, 20ºC, 35ºC,
50ºC e 65ºC), com três repetições. O valor da
massa específica para a amostra foi obtido a
partir da Equação 1:
 A   H 2O 
 mA  mV 
 mH 2O  mV 
(1)
em que:
Cpa= calor específico da amostra (kJ/kg.K),
Cpw= calor específico da água (kJ/kg.K),
Mw= massa de água adicionada (kg),
Te= temperatura de equilíbrio (K),
Tw= temperatura inicial da água (K),
Ccal= capacidade calorífica do calorímetro
(kJ/K),
Mc= massa do calorímetro (kg),
Ti= temperatura inicial da amostra e do
calorímetro (K),
Ma = massa da amostra (kg).
em que,
Análise sensorial
ρA é a massa específica da amostra (kg/m3) a
uma dada temperatura,
ρH2O é a massa específica da água (kg/m3) na
mesma temperatura,
mA é a massa (kg) do picnômetro com a
amostra,
mH2O é a massa do picnômetro (kg) com a água
mV é a massa do picnômetro (kg) vazio.
Para a avaliação sensorial dos tratamentos,
foi realizado um teste de aceitação com uma
escala hedônica de nove pontos (variando de
“gostei
extremamente”
a
“desgostei
extremamente”), com 60 provadores nãotreinados de ambos os sexos, com as amostras
apresentadas codificadas e aleatorizadas em
cabines individuais.
Calor específico
Análise estatística
O calor específico foi determinado com a
utilização de um calorímetro de mistura,
construído com uma ampola de garrafa térmica
comercial, com capacidade para 1000 mL,
envolvida por uma camada de 0,05 m de
isolante térmico constituído de lã de vidro e
tendo como invólucro um cilindro de PVC de
0,15 m de diâmetro. O fechamento da ampola
foi feito com uma rolha de borracha, por meio
da qual foi introduzida a haste de um termopar
com precisão de 0,1ºC. Para as determinações
do calor específico, os materiais foram
embalados em sacos de polietileno de baixa
densidade, termosselados e imersos em um
banho termostático a uma temperatura de 30ºC,
por um período de aproximadamente 30 min. O
calor específico foi calculado com o uso da
Equação 2:
Os resultados obtidos para as análises físicoquímicas e aceitação sensorial foram
submetidos à Análise de Variância (ANOVA,
com P<0,05) e teste de Tukey (P<0,05). Os
resultados obtidos para densidade foram
submetidos à análise de regressão linear
múltipla com o teste t de Student a 5% de
probabilidade. As análises foram realizadas no
programa SAEG (Ribeiro Júnior, 2001).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir dos resultados obtidos, verificou-se
que os valores para pH, cinzas, gordura, Extrato
seco desengordurado e CP, não apresentaram
diferença significativa entre os tratamentos (P >
0,05). Na Tabela 1 estão apresentados os
valores médios dos resultados obtidos das
análises para estes parâmetros.
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Elaboração e caracterização de uma bebida láctea fermentada com polpa de umbu ......... Santos et al.
Tabela 1 - Valores médios obtidos para o pH, cinzas, gordura, CP e ESD para as quatro formulações
de bebida láctea fermentada
ANÁLISE FÍSICO-QUÍMICA
MÉDIA
pH
3.67 ± 0.35
CINZA (%)
0,37 ± 0,14
GORDURA (%)
0,78 ± 0,39
ESD (%)
21,97 ± 0,97
3,88±1,48
CP (kJ/kg.K)
Os resultados para o Extrato seco Total EST, acidez e para o teor umidade apresentaram
diferença significativa entre os tratamentos
(P<0,05), sendo suas médias submetidas ao
teste Tukey (P<0,05). Na Tabela 2 são
apresentados os valores médios dos resultados
obtidos das análises para estes parâmetros e o
resultado do teste de Tukey
Para o EST verificou-se que os
tratamentos com 20%, 40% e 60% de soro
não diferiram entre si apresentando médias
superiores aos tratamentos com 80% de
soro, que não diferindo do tratamento com
60% de soro. Essa diferença se deve ao fato
da utilização de diferentes teores de soro
nas misturas, pois o teor de extrato seco do
leite é, em geral, duas vezes maior que o do
soro de queijo. No entanto, o acréscimo de
leite em pó para que cada formulação se
adequasse à legislação vigente faz com que
as formulações com 20%, 40% e 60% não
apresentasse diferença entre si.
Para os teores de umidade, verificou-se
que o tratamento com 20% de soro foi
inferior aos tratamentos com 40%, 60% e
80% de soro. Não diferindo dos tratamentos
com 40% e 60% de soro.
Para a acidez verificou-se que o tratamento
com 80% de soro diferiu do tratamento com
20% sendo inferior a este. Isto pode ser
explicado devido as diferentes proporções soroleite utilizado para elaboração das bebidas. O
mesmo foi observado por Almeida et al. (2001)
ao estudar bebidas lácteas fermentadas e
preparadas com soro de queijo minas frescal.
A partir dos resultados obtidos da massa
específica ajustou-se um modelo linear
múltiplo, onde se verificou maior influência do
teor de soro na massa específica, quando
comparado à variação de temperatura. O melhor
modelo foi selecionado com base na
simplicidade para descrição do fenômeno. O
valor de probabilidade para o erro tipo I foi
inferior a 0,1% (P<0,001), sendo, portanto, a
regressão significativa com pequena margem de
erro, de forma que o modelo ajustado é
adequado para estudar o fenômeno e com
coeficiente de determinação satisfatório (R2=
0,822).
A partir do modelo ajustado, Equação 3, é
possível gerar uma superfície que representa a
influência das variáveis concentração de soro e
temperatura no valor da variável resposta massa
específica, o que pode se observado na Figura
1.
  1079,27  0,14T  0,17C S
(3)
em que,  é a massa específica em kg/m3, T é a
temperatura em ºC e Cs é a concentração do
soro em %.
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1,090
1,088
1,084
80
1,078
Temp
30
30
eratu
20
ra (ºC
)
10
20
o(
çã
en
40
40
nc
50
Co
60
tra
1,076
%
60
50
de
70
ro
1,080
)
1,082
so
3
(Kg/m )
)
1,086
Figura 1 - Efeito da Temperatura (ºC) e Concentração de soro(%) na massa específica da bebida
láctea
A partir dos resultados obtidos na avaliação
sensorial foi realizada a análise de variância
(ANOVA) e em seguida o teste de Tukey,
verificando-se que não existe diferença
significativa (P <0,05) entre três das quatros
formulações de bebida láctea fermentada.
Observando a Tabela 3, verifica-se que as
formulações A, B e C situam-se entre os termos
hedônicos “gostei ligeiramente” e “gostei
moderadamente, enquanto a formulação D se
situa entre os termos “indiferente” e “gostei
ligeiramente”. A partir dos resultados obtidos
pode-se concluir que as diferentes formulações
apresentaram características físico-químicas e
sensorial semelhantes, com exceção da
formulação com 80% de soro que diferiu
sensorialmente das demais. Assim sendo a
formulação C (60% de soro) foi escolhida como
a melhor, por apresentar aceitação sensorial
igual ás melhores formulações e aproveitar uma
grande quantidade de soro em sua elaboração
sem perda de qualidade. na densidade da bebida
fermentada.
Tabela 3 – Notas médias obtidas da análise sensorial para as quatro formulações de bebida láctea
FORMULAÇÃO
B
MÉDIA*
6,93 a
A
6,54 a
C
6,22 a
D
5,29 b
Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey (P>0,05).
CONCLUSÕES
Pode-se verificar que as bebidas lácteas não
apresentam diferença estatística para pH, teor
de
cinzas, gordura e
extrato seco
desengordurado -ESD.
Em relação ao calor especifico, não se
constatou diferenças significativas entre os
tratamentos.
Em relação à concentração de soro e
temperatura observou-se a influência das
mesmas na massa específica das bebidas
lácteas. Verificou-se também, que com a
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elevação da concentração de soro ocorre um
aumento no valor da massa específica,
ocorrendo o inverso para a temperatura.
Para o teste de aceitação observou-se que as
formulações com 20%, 40% e 60% de soro não
diferiram significamente entre si.
Entre as bebidas a que continha 60% de soro
pode ser selecionada como a melhor, por
apresentar a maior média e aproveitar uma
grande quantidade de soro em sua elaboração
sem perda de qualidade.
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