Teixeira MCTV, Furtado RMG, Poça SRS, Rossini AC, Caggiano JO ESTRA TÉGIAS DE ENFRENT AMENTO STRATÉGIAS NFRENTAMENTO A MUDANÇAS DE VIDA EM ALUNOS DE PSICOLOGIA COPING STRA TEGIES CONCERNING L IFE TRATEGIES CHANGES IN PSY CHOLOGY STUDENTS SYCHOLOGY Maria Cristina Triguero Veloz Teixeira* Rosa Maria Galvão Furtado* Sandra Regina da Silva Poça* Ana Carolina Rossini* Julia Ornellas Caggiano* RESUMO: O estudo visou investigar estratégias de enfrentamento a mudanças de vida em dois grupos de sujeitos estudantes de psicologia de 2º e 8º semestres. Os objetivos do trabalho foram identificar as mudanças de vida ocorridas nos últimos 12 meses e as estratégias de enfrentamento às mesmas. O estudo foi realizado no Instituto Presbiteriano Mackenzie, em São Paulo - Brasil, em 2002. Como técnicas de coleta de dados, utilizou-se um questionário sobre o perfil sociopsicológico dos sujeitos, um questionário de eventos vitais baseado na Escala de Avaliação de Reajustamento Social de Holmes e Rahe e um Inventário de Estratégias de Enfrentamento de Folkman e Lazarus. Concluiu-se que os sujeitos do grupo de 8º semestre, diferentemente do grupo de 2º semestre, enfrentam mudanças de vida com maior diversidade de estratégias que vão desde fuga até a auto-observação. As principais estratégias comportamentais exibidas foram fuga e esquiva confirmando a velha máxima comportamental de que o comportamento é selecionado pelas conseqüências que produz, no caso, remover mudanças aversivas. Palavras-chave: Aluno de psicologia; estratégia de enfrentamento; mudança de vida. ABSTRACT ABSTRACT:: This study aims at investigating coping strategies concerning life changes in two groups of 2nd and 8th semester psychology students. The objectives were to identify the life changes that occurred in the last twelve months and the respective coping strategies that were employed. The instruments for data collection were: a questionnaire concerning the subjects’ social-psychological profile; a questionnaire on vital events based on Holmes and Rahe’s Social Readjustment Evaluation Scale; and an inventory of Folkman and Lazarus’s Coping Strategies. The conclusion was that 8th semester group subjects, differently from the 2nd semester group ones, face life changes with a greater diversity of strategies, which go from escape to self-observation. The main behavioral strategies shown were escape and denial, confirming the old behavioral “maxim” that behavior is selected by the consequences it produces, in this case, the removal of aversive changes. Keywords: Psychology students; coping strategies; life changes. I NTRODUÇÃO E xiste um universo de conhecimentos de senso comum pressupondo que mudanças de vida muito intensas, particularmente se as mesmas são desagradáveis e a pessoa não possui recursos para enfrentá-las, se associam à aparição ou ao agravo de doenças preexistentes. Concordamos com Gonzalez1 quando afirma que o stress ainda é um termo muito carregado de polissemia, que tem sido pesquisado em diversas áreas do conhecimento como a endocrinologia, a bioquí- mica, a neurologia e a psicologia, entre outras. São inúmeros os fenômenos que incluem o conceito de stress. Praticamente todos os processos da vida, desde o desenvolvimento do sistema nervoso no feto, a morte neuronal com o processo de envelhecimento, respostas hormonais e imunológicas, até o enfrentamento de muitos problemas da vida cotidiana, podem ser analisados sob o conceito do stress2,3,4,5,6,7. Dentro da ampla abrangência que o termo R Enferm UERJ 2003;11:39-46. • p.39 Enfrentamento a mudança de vida stress inclui, um dos aspectos que mais tem sido pesquisado em termos de variável interveniente diz respeito à percepção do indivíduo sobre situações do ambiente social em que vive. Dentro dessa percepção, os pesquisadores têm chamado a atenção sobre dois moduladores psicossociais muito importantes que interferem no fato de um indivíduo se sentir ou não estressado, são eles: as mudanças súbitas de vida e as estratégias de enfrentamento a essas mudanças. São justamente esses alguns dos conceitos que este estudo pretendeu explorar, embora não tenha sido pesquisado na amostra em estudo se a mesma apresentava algum nível anterior de stress. Para um aprofundamento na história da pesquisa sobre o stress, remetemos o leitor a Gonzalez1, que faz uma exaustiva descrição dos principais pesquisadores que estudaram o tema desde o século XV até os dias de hoje. A definição de mudanças de vida refere-se àquelas demandas ou fatos intensos e, muitas vezes inesperados, que acontecem na vida das pessoas e que demandam deles recursos específicos para poder enfrentá-los e garantir um mínimo de adaptação aos mesmos. Já a definição de estratégia de enfrentamento consiste em esforços que o indivíduo despende para poder lidar com mudanças de vida e estímulos do meio ambiente ou estímulos internos extremos. No estudo dos aspectos anteriormente citados, uma das concepções que melhor as atingiu foi a teoria interacionista e psicossocial de Lazarus e Folkman3,8. Os autores propuseram que, para estudar o stress, era necessário avaliar os processos de enfrentamento do indivíduo (isto, traduzido ao inglês significa coping). Em outras palavras, estudar aqueles esforços cognitivos e comportamentais que mudam constantemente para enfrentar demandas internas e meio-ambientais extremas, assim como os possíveis conflitos que, em determinadas ocasiões, podem exceder ou abrumar os recursos das próprias pessoas. O presente estudo explora as estratégias de enfrentamento que um grupo de sujeitos usou para enfrentar eventos de vida específicos, assim como o grau de dificuldade de adaptação que tais sujeitos apresentaram na interação com esses eventos. Os sujeitos alvo da pesquisa foram alunos de Graduação em Psicologia. Um dos critérios de inclusão desses sujeitos na amostra foi devido a tratar-se de um grupo que, futuramente, encarregar-se-á de executar, entre outras funções, a modificação de estratégias de enfrentamento em pessoas que, situacionalmente, as p.40 • R Enferm UERJ 2003;11:39-46. levem a apresentar comportamentos socialmente desadaptativos. Partiu-se do pressuposto que qualquer processo de enfrentamento se produz em estreita relação com fatores não só ambientais, mas também com fatores comportamentais. Levando-se em consideração as características do Curso, bem como as exigências às quais o futuro profissional da área de Psicologia será submetido, acreditou-se na relevância da pesquisa no sentido de explorar se o aluno de Psicologia que está se formando é capaz de julgar as diversas situações de vida, não só como ameaças ou perdas, mas também como desafios. No caso de julgar a mudança como uma perda, as estratégias de enfrentamento possuem, geralmente, uma função predominantemente emocional, já que a situação é percebida como imutável. No caso de julgar a mudança como desafio ou como situações sobre as quais podem ser feitas mudanças para que, em conseqüência, ele se adapte melhor às mesmas, a função do enfrentamento é centrar-se, de forma fundamental, no problema. Provavelmente o parágrafo anterior desperte no leitor uma velha preocupação e até faça-o relembrar um mito que diz respeito a cursos de ensino superior em Psicologia: costuma-se ouvir que alguns alunos acreditam que o fato de estudar psicologia os ajudará a resolver suas próprias dificuldades ou transtornos emocionais. Salientamos que a pretensão deste estudo é muito diferente dessas crenças errôneas, muito compartilhadas no universo do senso comum de alunos. A falsidade dessa crença associa-se à idéia de muitos estudantes pressuporem que todas as dificuldades psico-emocionais que experimentam podem ser solucionadas estudando Psicologia. É óbvio que qualquer saber que um indivíduo adquire o ajuda a ampliar seu conhecimento, independentemente do curso universitário de que se trate, mas o que não é lícito aceitar é que fazer um curso de Psicologia equivale a fazer terapia. São dois processos muito diferentes. O estudo teve como objetivo geral explorar as estratégias de enfrentamento a situações de mudanças de vida que apresentaram alunos recém ingressados no curso, comparando tais estratégias com as utilizadas por outros alunos que já se encontravam no antepenúltimo ano do curso de Psicologia. Em síntese, os objetivos específicos foram: explorar as mudanças de vida pelas quais esses sujeitos passaram nos últimos 12 meses e identificar e classificar as estratégias de enfrentamento a essas mudanças. Teixeira MCTV, Furtado RMG, Poça SRS, Rossini AC, Caggiano JO Dependendo das habilidades que o indivíduo possui, ocorrerá o sucesso ou o fracasso de sua interação com o ambiente. As habilidades que a pessoa desenvolve têm sido denominadas de estratégias de enfrentamento. Como afirma Savoia9, essas estratégias são aqueles esforços de controle do indivíduo direcionados à redução das qualidades aversivas de uma situação. Em outras palavras, são os comportamentos da pessoa. Estratégia de enfrentamento não é sinônimo de conseqüência do comportamento. Como apontam Savoia9 e Folkman e Lazarus10, embora o coping seja uma resposta com o objetivo de aumentar, criar ou manter a percepção de controle pessoal, o sentido desse controle pode ser ilusório. Conforme Gonzalez1 e Lazarus e Folkman3, entre outros, existem diferentes abordagens que enfocam a avaliação do caráter adaptativo dos processos de enfrentamento. Como exemplos, citam-se aqui a concepção clínica tradicional dos mecanismos de defesa, conforme Freud 11 e a concepção interacionista de Lazarus8. Nesta última concepção está fundamentado este estudo. METODOLOGIA A amostra do estudo foi composta por 70 alunos matriculados, em 2002, no Curso de Psicologia do Instituto Presbiteriano Mackenzie, situado na cidade de São Paulo, divididos em dois grupos, a saber: um grupo de 40 alunos do 20 Semestre e outro de 30 alunos do 80 Semestre. Na coleta de dados foram utilizadas as seguintes técnicas: a) um questionário fechado para a exploração do perfil sociopsicológico dos sujeitos (sexo, renda familiar, escolaridade dos pais, estado civil, religião, problemas de saúde nos últimos 12 meses, amigos íntimos e adaptação a mudanças de vida, entre outras) b) para a exploração das principais mudanças de vida ocorridas nos últimos 12 meses, foi utilizado um questionário de eventos vitais baseado na Escala de Avaliação de Reajustamento Social de Holmes e Rahe12 e, para a exploração das estratégias de enfrentamento, foi utilizado o Inventário de Estratégias de coping de Folkman e Lazarus10. Antes da coleta de dados, o questionário que avaliou o perfil socio-psicológico da amostra foi submetido a uma avaliação de juízes, por professores do curso de Psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie da área comportamental. A partir dessa avaliação, foram feitas algumas mo- dificações no mesmo acrescentando-se outros itens de interesse para os objetivos da pesquisa. Já a escala de eventos vitais sofreu outra modificação no sentido de inserir outros itens que eram típicos da fase da adolescência e idade jovem com a finalidade de ter uma avaliação mais acurada das mudanças vitais que nessa fase do desenvolvimento esses sujeitos costumam enfrentar. Na coleta de dados, pediu-se a cada sujeito que escolhesse da lista de mudanças de vida até no máximo oito mudanças que lhe ocorreram nos últimos 12 meses. Em relação ao Inventário de Estratégias de Enfrentamento, ressalta-se que foi usada a escala que inicialmente os autores criaram a partir de uma amostra de casais de meia idade e não a outra escala que foi feita a partir de uma amostra de estudantes em situação de exame. Embora a amostra deste estudo tenha sido formada por estudantes universitários, optou-se pela primeira por ser mais geral e pelo fato de não nos interessar, em particular, o enfrentamento a mudanças relacionadas com provas acadêmicas e, sim, com situações do dia a dia desse grupo populacional**. Conforme os autores do Inventário de Estratégias de Enfrentamento, os diferentes itens do instrumento foram agrupados em oito fatores. Os fatores de confronto e de resolução do problemas correspondem ao enfrentamento focalizado no problema e os fatores de afastamento, autocontrole, suporte social, aceitação da responsabilidade, fuga, esquiva e reavaliação positiva correspondem ao enfrentamento focalizado na emoção. A escala original de respostas do Inventário de Estratégias de Enfrentamento consta de 4 tipos de resposta (0 – para quando a estratégia não foi usada; 1 - para quando a estratégia foi usada um pouco; 2 - para quando a estratégia foi usada bastante; e 3 - para quando a estratégia foi usada em grande quantidade). Esta escala de respostas foi modificada para dois tipos de resposta: 0 – quando o indivíduo nunca usou a estratégia e 1 – quando o indivíduo usou a estratégia. Os resultados referentes à compreensão dessas modificações também foram avaliados no pré-teste das técnicas de coleta de dados. Dada a dificuldade em processar os 66 itens do questionário associados às 28 mudanças de vida, decidiu-se pela relação entre mudança e estratégia (conforme os oito fatores supracitados). Para isso, assumiu-se que o sujeito tinha apresentado a estratégia conforme a situação se tivesse operado com 50% ou mais dos comportamentos favoráveis à estratégia. R Enferm UERJ 2003;11:39-46. • p.41 Enfrentamento a mudança de vida RESUL TADOS ESULT E DISCUSSÃO Em relação ao perfil sociopsicológico da amostra, encontrou-se que a maioria dos sujeitos de ambos os semestres eram solteiros no momento da coleta de dados (somente três sujeitos do 8º semestre eram casados). A média de idade do 2º semestre foi de 19,5 anos, sendo 77, 5% pertencentes ao sexo feminino e 22,5% ao sexo masculino. Já a média de idade dos sujeitos do 8º semestre foi de 24,4 anos, 22 sujeitos pertenciam ao sexo feminino e oito ao sexo masculino. A renda familiar predominante nos sujeitos do 2º semestre foi entre R$ 900,00 e R$ 3.600,00 (22 sujeitos) e, no 8º semestre, predominou uma renda familiar acima de R$ 4.500,00 (12 sujeitos). A maioria dos pais dos sujeitos de cada um dos grupos haviam cursado o 2º Grau completo ou superior completo. Em relação às afetações da saúde, os sujeitos do 2o semestre referiram no último ano um número alto de afetações físicas e emocionais (59,45% referiu ter tido afetações físicas ? enxaqueca, gastrite, alergias e gripe e 40,54% do tipo emocional – depressão e estresse). Todos os sujeitos disseram ter amigos íntimos com os p.42 • R Enferm UERJ 2003;11:39-46. quais sempre podiam contar em situações vitais (69%) ou só algumas vezes (30,6%). Do total de 40 sujeitos, 87,5% tinham vivos seus pais no momento da coleta de dados e mais da metade dos sujeitos referiu ser católico. No que diz respeito às afetações da saúde do grupo do 8º semestre, constatou-se que, no último ano, 69,29% referiu ter tido afetações físicas (alergias, cirurgias, gripe e gastrite) e 31,71% do tipo emocional (estresse, ansiedade, depressão). Todos os sujeitos disseram ter amigos íntimos com os quais sempre podiam contar em situações vitais (53%) ou só algumas vezes (46,67%). Do total de 30 sujeitos, 93,33% tinham vivos seus pais no momento da coleta de dados e a maioria dos sujeitos referiu ser católico. Observam-se nas Tabelas 1 e 2 as diferentes médias de adaptação que os sujeitos atribuíram a cada mudança numa escala de 0 até 5 (0 significava a maior facilidade de adaptação e 5 a maior dificuldade). As médias mostram que tanto num grupo quanto no outro os principais eventos para os quais houve maior dificuldade de adaptação foram os relacionados com a perda de suporte social e as mudanças de ambiente. As médias de Teixeira MCTV, Furtado RMG, Poça SRS, Rossini AC, Caggiano JO dificuldade de adaptação a partir de 2,5 aparecem grifadas nas tabelas. As perdas de familiares ou de amigos íntimos foram citadas como aqueles eventos de perdas de suporte social perante os quais prevaleceu maior dificuldade de adaptação. Em relação aos eventos de mudanças de ambiente (mudanças de casa ou de cidade), a dificuldade de adaptação em ambos os grupos também foi maior. Como já foi apontado por outros autores13,14, a saída da casa dos pais pode ser vivenciado como evento vital. De um lado, isso lhes pode proporcionar uma maior autonomia na emissão de alguns comportamentos e, de outro, exigir que esses adolescentes tenham que enfrentar diversas dificuldades do dia a dia que, em tempos anteriores, não enfrentavam, uma vez que até então eram tarefas dos pais. Vê-se aqui um conflito entre duas metas atingidas: a autonomia e o enfrentamento de novos problemas derivados do afastamento familiar. Chamou atenção o fato de que também, em ambos os grupos, as dívidas e perdas financeiras foram citadas como eventos de difícil adaptação. Deve ser levado em consideração o fato de que a Universidade de onde provém a amostra é particular e, portanto, o curso de psicologia bem como outros gastos decorrentes do mesmo são custeados pela família ou pelo próprio estudante. Assim, quaisquer perdas desse tipo podem incidir diretamente sobre as expectativas de futuro, uma vez que podem dificultar ou até mesmo inviabilizar a continuidade dos estudos universitários. Outro evento de vida sobre o qual a adaptação foi difícil para ambos os grupos foi o término de relacionamentos significativos (3,7 para o 2º semestre e 4,0 para o 8º semestre) e conforme as médias de dificuldade de adaptação dos dois grupos, pode-se inferir a importância que têm para eles a relação amorosa em geral. Vários pesquisadores da área de desenvolvimento humano referem que, entre as múltiplas relações sociais que o jovem estabelece, uma das mais profundas é a troca de tipo heterossexual ou homossexual, conforme a identidade sexual da pessoa15. Também, observa-se na Tabela 1 que o grupo de sujeitos do 2º semestre apontou uma outra mudança associada com os relacionamentos afetivos, que foi o evento experiência sexual, R Enferm UERJ 2003;11:39-46. • p.43 Enfrentamento a mudança de vida para a qual a média de dificuldade de adaptação foi alta (2,9), o que associa-se com a média de idade deste grupo (19,5 anos). Autores como Sonenstein, Plak e Ku16 e Banaco17 assinalam que entre os 17 e 19 anos o jovem começa a ter suas primeiras experiências sexuais em comparação com outras faixas etárias, fato este que pode ser considerado como muito relevante na vida de qualquer jovem. Não houve uma pesquisa para explorar se os diferentes problemas de saúde coincidiram temporariamente com as mudanças de vida, mas chama a atenção o alto número de afetações à saúde que os sujeitos descreveram nesse mesmo período de tempo. Isso chamou a atenção já que outras pesquisas realizadas mostram como as mudanças de vida podem ser estímulos desencadeantes ou antecedentes de doenças18,19. A análise das estratégias de enfrentamento conforme as principais mudanças de vida (aquelas que aparecem grifadas nas tabelas 1 e 2) mostrou que os sujeitos do 2º semestre apresentaram, perante diversos tipos de mudanças de vida, comportamentos que, no inventário usado, são classificados como estratégias de enfrentamento de fuga ou de esquiva. Isso significa que esses sujeitos desejavam que essas mudanças acabassem ou fantasiavam sobre como os fatos se encaminhariam. Entre as mudanças que foram enfrentadas dessa maneira, se encontram o início de atividade produtiva, as mudanças de escola, o início ou o término de relacionamentos significativos, as experiências sexuais e as perdas financeiras. Numa perspectiva teórica comportamental, poderíamos hipotetizar que o uso freqüente de estratégias de fuga/esquiva, conforme supracitado, justifica-se a partir de comportamentos de evitação bem sucedidos, utilizados no passado. Para Skinner20 tais comportamentos, ao proporcionarem aos sujeitos reforçamentos negativos suficientemente competentes para livrá-los de estímulos aversivos aos quais tenham sido submetidos, podem ter se fixado paulatinamente em seus repertórios comportamentais. A hipótese explicativa desse fenômeno é que esses sujeitos se tornaram aptos a perceber em determinados tipos de mudanças de vida as propriedades aversivas já conhecidas dos mesmos, uma vez que aprenderam a discriminá-las no passado (mudanças de escola, término de relacionamento significativo, perdas financeiras). Tal aprendizagem capacitou-os para reforçar formas alternativas de p.44 • R Enferm UERJ 2003;11:39-46. comportamento de evitação desses fatos que, aliás, nos pareceram ser percebidos como perdas efetivas, no sentido de não se poder fazer muito para mudá-las. Dentro de tal contexto, parece, então, que o sujeito acaba fazendo uma opção por comportamentos mais razoáveis na medida que os mesmos lhe garantem certo reajuste de seu estado emocional interrompendo ou adiando a estimulação aversiva (no caso, a mudança de vida). Somente no caso de mudanças como o início de atividade produtiva pareceram provocar, predominantemente, estratégias centradas no problema do tipo: fazer planos de ação e concentrar-se naquilo que deveria ser feito. Constatou-se que, no caso dos sujeitos do 8º semestre (diferentemente do grupo de 2º semestre), embora também tenham sido usadas estratégias de enfrentamento de fuga e de esquiva, as mesmas apresentaram freqüências mais baixas e outros comportamentos, embora emocionais, também, apareceram. Por exemplo: procura de suporte social em quaisquer de suas formas? amigos, familiares ou profissionais, comportamentos de auto-observação com a finalidade de pensar e avaliar os aspectos positivos e negativos das situações enfrentadas, mesmo que elas tenham sido desagradáveis (exemplo: mudança de residência, separação e término de relacionamentos significativos). Essas estratégias, conforme uma abordagem comportamental, são indicadores tanto de autocontrole 21 como, também, de autoconhecimento. Justificamos tal afirmação fazendo uso do raciocínio do autor. Skinner21 afirma que o autocontrole é resultante da forma como o indivíduo controla seu próprio comportamento após avaliação de conseqüências que lhe provocariam conflitos, pois, ao mesmo tempo que levam a reforços positivos, levam-no também ao contato com situações que implicam em reforços negativos. Nas situações citadas anteriormente, parece-nos que os alunos do 8º semestre, após fazer uso de tal estratégia de avaliação, com maior ou menor grau de desconforto, se encontram mais aptos para decidir que os recém ingressantes. Os delineamentos de planos de ação para tentar resolver algumas mudanças de vida que foram percebidas como passíveis de modificação, também foram freqüentes nos sujeitos de 8º semestre. Citam-se como exemplos as mudanças de casa, resolução dos próprios problemas de saúde. Infere-se desses comportamentos, como apontam Teixeira MCTV, Furtado RMG, Poça SRS, Rossini AC, Caggiano JO Folkman e Lazarus 10, que tais sujeitos estejam tentando modificar alguns aspectos da relação entre eles e as mudanças de vida, seja alterando-as ou tentando controlá-las. C ONCLUSÃO E mbora não tenha sido possível a utilização de outros instrumentos que nos permitissem condições de maior aprofundamento teórico quanto aos resultados obtidos (tal como avaliação do nível de stress), cremos que o propósito de nosso estudo foi atingido. Pudemos identificar com relativa clareza as situações de mudanças de vida bem como as estratégias de enfrentamento mais utilizadas pela amostra. Finalizamos este estudo podendo afirmar que os sujeitos do grupo de 8º semestre enfrentam as mudanças de vida com uma maior diversidade de estratégias comportamentais, o que pode estar influenciado, entre outros fatores, pela maior conscientização que eles têm sobre responsabilidades com as quais logo se defrontarão a partir do momento que passam a ter maiores probabilidades de passar por mudanças de vidas mais significativas e decisivas do que antes. Embora a euforia do momento do ingresso em um curso universitário já tenha sido vencida, passam a existir outras mudanças que, agora, são caracterizadas muitas vezes por decisões sérias e algumas vezes definitivas em suas vidas. Os comportamentos de evitação registrados no estudo prevalecerão sempre que for possível ao sujeito valer-se de tal estratégia, a menos que uma outra saída mais viável seja reconhecida por ele como capaz de lhe trazer maiores probabilidades de reforçamento positivo. Acreditando na antiga e reconhecida máxima comportamental de que o comportamento é selecionado pelas conseqüências, explica-se assim a generalização e predominância dessa estratégia de enfrentamento em ambos os grupos estudados. REFERÊNCIAS 1.GonzálezAMA. Stress.TemasdePsiconeuro-endocrinologia. São Paulo: Editora Robe; 2001. 2. Deffenbacher FL. A inoculação do stress. In: Caballo VE, organizador: Manual de técnicas de terapia e modificação do comportamento. São Paulo: Editora Santos; 1996. p. 557-580. 3. Lazarus RS, Folkman S. Stress appraisal and coping. New York: Springer Publishing Co; 1984. 4. Lipp MN et al. org. Como enfrentar o stress. Campinas (SP): Come; 1990. 5. Lipp MN. Manejo do estresse. In: Range B, organizador. Psicoterapia comportamental e cognitiva. Pesquisa, prática, aplicação e problemas. Campinas (SP): Editorial Psy II; 1995. p. 279-292. 6. Selye H. The stress of life. New York: McGraw-Hill; 1956. 7. Valdés GJJ, Perez, DFZ, Perara MAR. Reflexiones sobre el estrés. 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R Enferm UERJ 2003;11:39-46. • p.45 Enfrentamento a mudança de vida ESTRA TÉGIAS STRATÉGIAS DE ENFRENT AMIENTO NFRENTAMIENTO A CAMBIOS DE VID A IDA EN ALUMNOS DE PSICOLOGIA RESUMEN: El estudio buscó investigar estrategias de enfrentamiento a cambios de vida en dos grupos de sujetos estudiantes de psicología de 2º y 8º semestres. Los objetivos del trabajo fueron identificar los cambios de vida ocurridos en los últimos 12 meses y las estrategias de enfrentamiento a los mismos. El estudio fue realizado en el Instituto Prebiteriano Mackenzie, en São Paulo – Brasil, en 2002. Como técnicas de colecta de datos se utilizó un cuestionario sobre el perfil sociopsicológico de los sujetos, un cuestionario de cambios vitales basado en la Escala de Evaluación de Reajuste Social de Holmes y Rahe y un Inventario de Estrategias Enfrentamiento de Folkman y Lazarus. Se concluyó que los sujetos del grupo de 8º semestre, diferente del grupo de 2º semestre, enfrentan los cambios de vida con mayor diversidad de estrategias que van desde la fuga hasta la autoobservación. Las principales estrategias comportamentales exhibidas fueron fuga y alejamiento confirmando la antiga máxima comportamental de que el comportamiento es seleccionado por las consecuencias que produce que, en este caso, son remover los cambios de aversión. Palabras clave: Alumno de psicología; estrategias de enfrentamiento; cambio de vida. Recebido em: 05.12.2002 Aprovado em: 05.05.2002 Notas * Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo Cumprindo os requisitos de pesquisa com seres humanos, todos os sujeitos entrevistados participaram voluntariamente da pesquisa e para isso assinaram uma carta de Consentimento Livre Esclarecido e de garantia ao sigilo das informações pesquisadas. O projeto de pesquisa recebeu parecer favorável do ** Comitê de Ética da Universidade Presbiteriana Mackenzie conforme Protocolo no 108/01. p.46 • R Enferm UERJ 2003;11:39-46.