VIII EPEA - Encontro Pesquisa em Educação Ambiental Rio de Janeiro, 19 a 22 de Julho de 2015 UM OLHAR CRÍTICO SOBRE AS TENDÊNCIAS EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL FRENTE À CRISE DO CAPITAL Jeniffer de Souza Faria - UFJF Elaine Coelho Cristóvão - UFJF Resumo O objetivo do trabalho é apresentar e refletir sobre as diferentes concepções de Educação Ambiental, as quais são fortemente influenciadas, principalmente, por perspectivas política e econômica para enfrentar a crise do capital. Ao considerar a questão ambiental como um tema caro na sociedade contemporânea, acreditamos ser pertinente o conhecimento sobre as tendências em EA de forma crítica para compreender até que ponto estão voltadas para a sustentabilidade. Para isso, realizamos um estudo comparativo entre as principais tendências e as perspectivas políticas levando em consideração o contexto histórico. Frente ao exposto, percebemos que é preciso ficar atento sobre qual Educação Ambiental estamos falando e para que, se verdadeiramente quisermos avençar em prol da sustentabilidade. Palavras-chave: Educação Ambiental. Capitalismo. Sustentabilidade. Abstract The objective is to present and reflect on the different conceptions of environmental education, which are strongly influenced mainly by political and economic perspectives to face the crisis of capital. When considering the environmental issue as a central theme in contemporary society, we believe to be relevant knowledge on trends in EA critically to understand to what extent are focused on sustainability. For this, we conducted a comparative study of the main trends and policy perspectives taking into account the historical context. Based on these, we realize that we must be careful about what we are talking about environmental education and that, if we truly want advancer for sustainability. Keywords: Environmental Education. Capitalism. Sustainability. 1 Realização: Unirio, UFRRJ e UFRJ Introdução A questão ambiental é um tema caro na sociedade contemporânea frente ao modelo econômico desenvolvimentista insustentável adotado, baseado na primazia do mercado, exploração do trabalho, consumo exacerbado, produção de mercadorias obsoletas, individualismo, e apropriação ilimitada dos recursos naturais, o qual tem provocado problemas ambientais que colocam em risco o futuro do planeta e da própria humanidade. Imersos em um cenário de crise (do capital) deflagrada nos anos 60, a Educação Ambiental emerge com diferentes perspectivas teóricas e com o objetivo de apontar caminhos para minimizar os impactos ambientais. Todavia, percebe-se que tais perspectivas são fortemente influenciadas por aspectos econômicos criando e implementando ações educativas em Educação Ambiental ditas sustentáveis. Frente a isso, de acordo com uma concepção crítica de Educação Ambiental, este texto tem por objetivo apresentar e refletir sobre como perspectivas políticas vem influenciando as ações em Educação Ambiental, demonstrando que não é possível ter sustentabilidade a partir do atual modelo econômico. A partir deste trabalho reafirmamos que muitas vezes as práticas educativas são maquiadas com concepções participativas, eficiente, justa, etc. e que “o fracasso da promessa desenvolvimentista na solução de problemas globais fez emergir, portanto, a discussão sobre a crise ambiental e os modelos de desenvolvimento”. (PINTO, 2002, p.22). Para apresentar as discussões propostas, este texto se divide em três partes, além desta introdução. A seguir buscamos apresentar algumas características das perspectivas em Educação Ambiental que corroboraram com os pressupostos das teorias políticas e econômicas para amenizar e/ou solucionar os problemas ambientais em um contexto de crise. Posteriormente, enfatizamos o que vem acontecendo na última década, no que diz respeito às influencias de uma tendência política que tende a humanizar o capital na tentativa de buscar por soluções e/ou superação da crise socioambiental, mas na verdade alicerça-se numa “ideologia” voltada para os interesses do desenvolvimento capitalista imbricados em ações e conceitos no âmbito da Educação Ambiental. Finalmente tecemos algumas considerações sobre o todo. Caminhos da Educação Ambiental em um contexto de crise Carvalho (2011) brevemente discorre sobre os caminhos da Educação Ambiental no Brasil, apontando que ela surgiu, a partir de um movimento social ecológico, frente a preocupação “com o futuro da vida e com a qualidade da existência das presentes e futuras gerações”. (p.51) Concebida como uma prática capaz de conscientizar e chamar a atenção para a crise que estava emergindo, o atributo ambiental constitui um traço identitário da Educação, que propõe discutir os problemas ambientais por meio de práticas educativas/formação dos indivíduos. A consolidação do termo Educação Ambiental correu em 1972, durante a Conferência de Estocolmo, marcando sua origem num 2 contexto histórico determinado, de efervescência dos movimentos ambientalistas em prol de uma educação para o ambiente.1 Portanto, com suas raízes no movimento ambientalista, que pauta suas ações em diferentes concepções, a EA foi ganhando espaço nas discussões de políticas públicas, bem como no campo educacional, sendo pensada e praticada de diferentes formas. Alguns autores consideram apenas duas grandes tendências em Educação Ambiental, outros demarcam mais, no entanto, neste trabalho consideramos pertinente abordar as que Layrargues e Lima (2011) apresentam, pois entendemos que tais concepções incitam três momentos históricos, influenciados pelas mudanças no campo econômico. Assim, a seguir, apresentamos as vertentes conservadora2, pragmática e a crítica. Diante do importante fato de a EA ter se deflagrado em um contexto de crise 3, nas décadas finais do século XX (anos 60/90), - entendida aqui como uma crise do capital, também chamada por Guimarães (2004) de crise civilizatória4 - as ações em prol dessa temática, primeiramente, foram respaldadas na vertente conservadora, as quais impulsionaram mudanças no comportamento humano, de forma individual, que fossem capazes de minimizar os impactos ambientais e buscar resolver os problemas. Nesse contexto, esta vertente concebia a Educação Ambiental como um saber e uma prática fundamentalmente conservacionistas, ou seja, uma prática educativa que tinha como horizonte o despertar de uma nova sensibilidade humana para com a natureza, desenvolvendo-se a lógica do “conhecer para amar, amar para preservar”, orientada pela conscientização “ecológica” e tendo por base a ciência ecológica. (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.5) Apesar de esta vertente ter imperado até o início dos anos 90, de acordo com Layrargues e Lima (2011), ela possuía um potencial limitado, pois não considerava as “dinâmicas sociais e políticas e seus respectivos conflitos de interesses e poder” (idem p. 8). Foi então que, a partir da insatisfação com os rumos que essa perspectiva de Educação Ambiental vinha tomando e, também, com a tomada de consciência sobre o seu papel diante da crise pelos educadores ambientais, surgiram outras correntes na tentativa de enfrentar os problemas. Dessa forma, há um desvio que institui uma “derivação da vertente conservadora, à medida que é sua adaptação ao novo contexto social, econômico e tecnológico” (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p. 10-11), e outra que rompe. A nova roupagem da vertente conservadora institui-se na vertente pragmática. Esta se limita a práticas educativas conteudistas, ahistóricas, apolíticas, instrumentais e normativas, “reduzindo os humanos à condição de causadores e vítimas da crise 1 Nesse ínterim vale ressaltar que há autores que consideram dispensável o adjetivo ambiental do substantivo educação, visto que toda educação é ambiental, pois não é possível uma educação fora do ambiente. 2 As correntes filosóficas que expressavam essa vertente eram representadas pela conservacionista, comportamentalista, Alfabetização Ecológica e do autoconhecimento. (LAYRARGUES; LIMA, 2011). 3 Para alguns autores, a constatação dessa crise foi apenas no âmbito ambiental, frente ao modelo desenvolvimentista insustentável adotado que se apropria de forma ilimitada dos recursos naturais, passando a provocar problemas ambientais. 4 A concepção de crise civilizatória articula-se à concepção de crise socioambiental citada por Guimarães (2004), à medida que defende a necessidade de compreender que as questões ambientais (capacidade de se relacionar do um com o mundo) e sociais (capacidade de relacionar-se do um com o outro) estão entrelaçadas no interior da crise. 3 ambiental, desconsiderando qualquer recorte social” (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.7) Noutras palavras, essa perspectiva percebe o meio ambiente destituído de componentes humanos, como uma mera coleção de recursos naturais em processo de esgotamento, aludindo-se, então, ao combate ao desperdício e à revisão do paradigma do lixo que passa a ser concebido como resíduo, ou seja, que pode ser reinserido no metabolismo industrial. Nesse sentido, essa vertente representa uma forma romântica de ajustamento ao contexto neoliberal que “apela ao bom-senso dos indivíduos para que sacrifiquem um pouco do seu padrão de conforto e convoca a responsabilidade das empresas para que renunciem a uma fração de seus benefícios em nome da governabilidade geral.” (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.10). Assim, o principal foco da vertente pragmática pauta-se no uso racional ou sustentável dos recursos naturais. Contra essa concepção, estrutura-se a outra tendência, alternativa, denominada crítica, a qual rompe com os pressupostos apresentados anteriormente pelas duas vertentes. Sobretudo antes de avançarmos vale ressaltar e reiterar, de acordo com Layrargues e Lima (2011), que as tendências pragmática e crítica foram obrigadas a se atualizar e refinar premida pelas transformações e desafios do mundo contemporâneo tais como o processo de globalização multidimencional, a revolução tecnológica, a falência do socialismo real, a redução do papel regulador do Estado e o avanço de ideologias e políticas pragmáticas identificadas com a lógica do mercado e com a filosofia do neoliberalismo. (p. 12) No entanto, Guimarães (2004) diz que essa adaptação, no que tange à concepção de Educação Ambiental Crítica, não significa a ressignificação de algo anterior ou aperfeiçoamento metodológico, mas sim a contraposição de algo já existente, como forma de superação ou solução para problemas ambientais que se colocam diante da grave crise socioambiental. Portanto, a Educação Ambiental Crítica vem contrapor-se à concepção conservadora e pragmática, tentando superar a “visão social de mundo” (LÖWY, 1994, apud GUIMARÃES, 2004, p. 26) desintegrada, fragmentada, reduzida, individualista, comportamentalista, simplista, unilateral, ou seja, que desconsidera a diversidade existente na relação entre homem e natureza e a complexidade do cotidiano. Nesse contexto, a perspectiva Crítica, a partir de um novo referencial teórico embasado principalmente nas premissas de Paulo Freire, passa a subsidiar uma leitura problematizadora e contextualizada do real, “mais complexa e instrumentalizada para uma intervenção que contribua no processo de transformação da realidade socioambiental” (GUIMARÃES, 2004, p.27). Eis a essência dessa linha, negada pelas demais. Desvelar os embates (conflitos e problemas ambientais) presentes nas relações de poder para que, numa compreensão complexa do real, instrumentalize os atores sociais para intervir na realidade, permitindo ir além e, a partir da reflexão, construir uma nova compreensão de mundo. Para isso, esta vertente apoia-se “na revisão crítica dos fundamentos que proporcionam a dominação do ser humano e dos mecanismos de acumulação do Capital, buscando o enfrentamento político das desigualdades e da injustiça socioambiental” (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.11). Dessa forma, procura contextualizar e politizar o debate ambiental, incorporando questões culturais, individuais, identitárias e subjetivas que emergem com as transformações das sociedades contemporâneas, a ressignificação da noção de política, a politização da vida 4 cotidiana e da esfera privada, expressas nos novos movimentos sociais e na gênese do próprio ambientalismo. Seus objetivos, portanto, são: “promover ambientes educativos de mobilização destes processos de intervenção sobre a realidade e seus problemas socioambientais, para que seja possível, nestes ambientes, superar as armadilhas paradigmáticas e propiciar um processo educativo” (GUIMARÃES, 2004, p. 30). Com isso, é possível perceber que esta concepção luta por uma nova forma de organização da sociedade, no sentido de ela se relacionar com o meio numa perspectiva crítica, emancipatória, transformadora, popular, frente à necessidade de conceber os problemas ambientais associados aos conflitos sociais. Afinal, de acordo com Layrargues e Lima (2011, p. 8) “as causas constituintes dos problemas ambientais [têm] origem nas relações sociais, nos modelos de sociedade e de desenvolvimento prevalecentes”. A partir da exposição sobre as diferentes concepções em EA o objetivo passa a ser pela tentativa de estabelecer uma ampliação sobre as práticas pautadas em tais perspectivas de forma crítica, para que possamos perceber em que medida elas realmente se voltam para o enfrentamento da crise do capital. O cenário da última década: a influência do capital humano Entrelaçada aos movimentos apresentados anteriormente podemos dizer que diferentes perspectivas teóricas políticas buscaram incessantemente empregar uma sustentabilidade na lógica desenvolvimentista, ou seja, implementar um processo mais efetivo de “humanização do capital”. Este movimento, por sua vez, refletiu seus ideais no âmbito da Educação Ambiental, a qual, conforme já vimos também possui diferentes correntes, sendo a Crítica apontada como algo novo, que contrapõe todas as relações existentes até o momento. De acordo com Silva e Lenardão (s/d) a Teoria do Capital Humano se constitui numa ferramenta para a adaptação e dominação dos cidadãos, que tem por objetivos servir aos interesses do capital, “formando a mão de obra útil e necessária com os valores e atitudes que fomentam e ajudam o capitalismo em sua perpetuação” mantendo a estrutura existente e aumentando as mazelas sociais. (p.515) Nas palavras de Frigotto (s/d) trata-se de uma noção que os intelectuais da burguesia mundial produziram para explicar o fenômeno da desigualdade entre as nações e entre indivíduos ou grupos sociais, sem desvendar os fundamentos reais que produzem esta desigualdade: a propriedade privada dos meios e instrumentos de produção pela burguesia ou classe capitalista e a compra, numa relação desigual, da única mercadoria que os trabalhadores possuem para proverem os meios de vida seus e de seus filhos – a venda de sua força de trabalho. (FRIGOTTO, s/d. grifo no original) O significado de “humanização do capitalismo”, portanto, se insere no contexto contemporâneo, por meio de medidas que maquiam a perversidade da economia de mercado, incorporando a ela sentidos de justiça social. As contradições inerentes dessa concepção política refletem, por exemplo, na elaboração/implementação de Políticas 5 Públicas, as quais não instigam a cultura participativa, mas sim ações individuais e hierarquizadas, voltadas para um público com demandas específicas – políticas focalizadas de alívio à pobreza – e ainda responsabilizando-os pela sua condição social. A Educação Ambiental nesse ideário passa então a ter também seu papel e função deturpados. Nela é depositada a função de implementar práticas educativas que corroborem com a lógica capitalista. Conforme vimos anteriormente, essas ações estão imbricadas em mudanças comportamentais superficiais e individuais, como formas eficazes e únicas de superar a crise. A máxima predominante diz que “se cada um fizer a sua parte, conseguiremos...”. A questão que fica é compreender onde exatamente se chega, pois a produção não diminui, por conseguinte, o uso, e muito menos o descarte. Nesse contexto a Educação Ambiental, muitas vezes se resume a prática dos três Rs – Reutilizar, Reaproveitar e Reciclar – apesar de importante e necessária, cabe ressaltar que exige dos cidadãos uma postura crítica sobre como esta via de ação educativa nos é colocada. Tais ações são apenas uma forma de colaborar e não são o suficiente frente ao que efetivamente precisa ser feito para superar uma crise. Corroborando com esse entrave prega-se o consumo consciente.5 As reflexões anteriores e a seguir exprimem que os objetivos do Capital Humano estão imbricados de forma mascarada no cotidiano. No âmbito social, por exemplo, podemos refletir sobre as "entre linhas" da parceria entre público/privado, público/Organizações não governamentais e voluntariado. Os movimentos empreendidos nas parcerias tem por finalidade a busca pela eficácia na prestação de serviços, ou seja, trata-se da diminuição de gastos e do aumento de resultados, este princípio aparentemente inocente, ou até mesmo positivo faz parte da lógica mercadológica a qual incentiva a reforma da aparelhagem Estatal e novas organizações capazes de resolver os problemas sociais. Isto pode ser traduzido pelo desejo de desresponsabilização do Estado com as questões sociais, incentivando o compartilhamento do poder, fazendo da configuração do Estado como algo necessário, ou seja, em regime de colaboração. No entanto, defendemos que cabe ao Estado assumir seu papel regulador. É para este fim que deve se estabelecer numa sociedade em que busca soluções para uma crise. No âmbito da EA podemos citar sobre as influencias políticas no conceito de Desenvolvimento Sustentável. De acordo com Pinto (2002) o conceito de desenvolvimento sustentável foi aplicado nos anos 90, depois da conferência Rio+20, como resultado de um debate técnico-científico e ideológico, o qual em sua essência exige uma revisão do modelo desenvolvimentista baseado no uso ilimitado dos recursos naturais para a manutenção das necessidades colocadas pela sociedade industrial de consumo: crescimento econômico mantido a qualquer custo, criação constante de falsas necessidades para o aumento da produção e do consumo.” (PINTO, 2002, p.23). Na perspectiva neoliberal o conceito de desenvolvimento sustentável assume um falso discurso, utilizando a noção de sustentabilidade para implementar ações insustentáveis, sendo muitas vezes atrelado “como um rótulo empresarial, como uma 5 Sobre este tema vale a pena assistir ao documentário disponível no site do You Tube, “A história das coisas”, que vai direto ao ponto: como colaboramos diariamente pra destruir o planeta. O vídeo mostra passo a passo a cadeia de eventos que vai da exploração dos recursos naturais, passando pelo produto manufaturado, a compra e o descarte. 6 estratégia de marketing, como uma panaceia que legitima desmandos e atrocidades” (PINTO, 2002, p. 23) do mercado no mundo capitalista e globalizado. Sendo assim, é necessário um olhar crítico que ultrapasse a aparência, e busque a essência do discurso que se implementa no âmbito da educação ambiental “para desvendar para quais interesses se voltam” (idem). Por conta disso, “há de se analisar o famigerado conceito de sustentabilidade que prega um desenvolvimento economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente correto” (BOFF, 2012, p.43), mas que na essência é contraditório, pois sustentabilidade e desenvolvimento, na conjuntura capitalista, apresentam lógicas distintas e que auto se negam, ou seja, coletividade x individualismo, cooperação x competição, entre outros. Leff (2010) vai mais a fundo nesta questão ao entrar no mérito da economia, que não reviu seus paradigmas, ou seja, o crescimento econômico ainda se assenta no consumo destrutivo da natureza, na criação de riqueza e do bem comum, a partir do egoísmo individual e da iniciativa privada. Numa conjuntura neoliberal, de enfraquecimento do papel do Estado, o mercado tem o papel de regular a economia, a crise ambiental e ativar o processo de crescimento sustentado, porém o resultado de mais de duas décadas de inserção dos governos neoliberais na América Latina na globalização econômica não foi um maior equilíbrio ecológico e equidade social. Ao contrário, incrementou-se a pobreza, ampliou-se a desigualdade social e aprofundou-se a insustentabilidade. (LEFF, 2012, p. 27) Nesse sentido, o mercado, que transforma a natureza e o homem e dita falsos equilíbrios, não é capaz de assimilar e promover a verdadeira sustentabilidade, que está limitada a um discurso falacioso que não se estabelece na prática. Cabe reiterarmos que frente a falta de homogeneização do conceito de sustentabilidade, todas as teorias políticas citadas anteriormente reconhecem a contribuição da educação em direção à sustentabilidade, no entanto, cada uma delas implica em diferentes projetos de educação ambiental. De acordo com Zacarias (2002) apesar da leitura de sustentabilidade ligada a primeira [e segunda] corrente [conservadora e pragmática], a educação ambiental se limita a internalizar valores de conservação da natureza, ou seja, vai ser reduzida a um processo geral de conscientização, à incorporação de conceitos ecológicos, não ultrapassando as fronteiras da educação conservacionista, tendo como compromisso principal apenas uma mudança de comportamento. (ZACARIAS, 2002, p. 93-94). A ideia apresentada pela autora corrobora com o que citamos acima sobre consumo consciente empregado como responsabilidade individual, forçando a acreditar que a sociedade é a única culpada pela crise, e, na medida em que não cumprimos nossa parte ou assumimos nossas responsabilidades para com o meio ambiente permaneceremos imersos nesse contexto. A verdadeira intencionalidade do discurso com base no capital humano é mascarada, e a crise por sua vez perpetua concomitantemente ao crescimento econômico. 7 Nesse ínterim, Filho (2010) coloca que tal “crise ambiental vem questionar a racionalidade desse modelo”, e alerta para necessária “reflexão crítica sobre a forma como a sociedade se relaciona com a natureza”, procurando outra forma radical de “racionalidade, que considere as complexas interações que envolvem a dinâmica sensível da natureza, [e] que, ao mesmo tempo, também contemple as necessidades materiais indispensáveis à sociedade.” (p.84). Noutras palavras, é preciso impedir que a exploração dos recursos naturais continue sendo desenvolvida na lógica exploracionista, a qual não se preocupa com o esgotamento, nem mesmo com a qualidade do meio ambiente, tendo como princípio máximo o progresso e a modernização. A corrida, portanto, vai além do combate ao desperdício, a poluição, a obsolescência dos produtos, ao incentivo do consumo, escassez dos recursos naturais, dentre outros, é preciso buscar por uma essência de sustentabilidade que rompa com a lógica desenvolvimentista, a qual de acordo com Filho (2010), pelo menos ainda, não se sabe ser possível conciliar preservação e crescimento no contexto capitalista. Algumas considerações O conhecimento sobre as perspectivas teóricas de Educação Ambiental e política, a partir de uma perspectiva crítica, nos permite compreender que a crise socioambiental é reflexo de um modelo de desenvolvimento econômico adotado pela sociedade na qual é diretamente, e principalmente, influenciada pelos interesses do mercado voltado para incentivar o consumo, o individualismo, a apropriação ilimitada dos recursos naturais, acumulação de capital, maximização do lucro, alta produtividade em curto prazo, dentre outros. Tudo isso está imbricado no projeto de humanização do capital, ou seja, em um projeto capitalista de desenvolvimento que precisa conviver com as pressões sociais, e assim o faz mascarando suas ações para manter um modelo insustentável que coloca em risco o planeta e a humanidade. A partir dessas considerações, torna-se imprescindível ter clareza sobre o que se entende e faz em termos de Educação Ambiental, pois ao tomar conhecimento das especificidades de cada vertente torna-se possível, num primeiro plano, desmistificar o conceito de Educação Ambiental por trás de determinadas ações, práticas pedagógicas e sociais, estratégias de marketing e, até mesmo de visão de mundo. Além disso, é útil e necessário para (re)pensarmos e/ou nos posicionarmos de outra maneira, frente ao que nos é posto em diferentes práticas, contextos, a fim de corroborarmos a essência plural da Educação Ambiental. Por fim, ao considerarmos como papel oficial da Educação Ambiental a busca pela sustentabilidade, a teoria política neoliberal coloca vários impedimentos no seu avanço. Nesse processo, a conclusão que podemos chegar é a de que nossa postura deve ser de criticidade para com as ações educativas, principalmente no âmbito ambiental, para que ela não se torne um instrumento a serviço da burguesia para perpetuação do modelo político e econômico que vigora. 8 Referências BOFF, L. Sustentabilidade. O que é – o que não é. Petrópolis-RJ: Editoria Vozes, 2012. CARVALHO, Isabel C. de M. Educação ambiental: a formação do sujeito ecológico. 5ª ed. São Paulo: Cortez, 2011. FILHO, Gerson Romero de O. A crise ambiental sob a ótica do modelo de desenvolvimento capitalista brasileiro. CES Revista, v. 24, p.121-132, 2010. FRIGOTTO, Gaudêncio. Capital Humano. Dicionário da Educação Profissional em Saúde. Disponível em: <http://www.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/caphum.html>. Acesso em 25 out. 2012. GUIMARÃES, Mauro. Educação Ambiental Crítica. In: Identidades da Educação Ambiental Brasileira. Philippe Pomier Layrargues (coord.). Brasília: MMA, 2004. 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