XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) Há evolução conceitual sobre transformações químicas a partir da discussão de modelos sobre fenômenos? André Nosseis dos Santos* (FM), Ana Luiza de Quadros (PQ). * [email protected] . Departamento de Química – ICEX - UFMG. Palavras Chave: transformações químicas, evolução conceitual. RESUMO: Com objetivo de identificar as concepções prévias de um grupo de estudantes sobre transformações químicas e como essas concepções evoluem (ou não) a partir do trabalho proposto num livro didático de Ensino Médio, que usa uma abordagem considerada contemporânea, desenvolvemos o presente trabalho. Aplicamos, a uma turma de alunos do primeiro ano do Ensino Médio, um instrumento de coleta de dados contendo questões abertas, que procuravam captar as idéias dos alunos sobre alguns fenômenos conhecidos, antes e após o desenvolvimento de uma seqüência de aulas. Percebemos, pela nossa análise dos dados, que esse grupo demonstrou evoluir conceitualmente, e que essa evolução se deve não só à seqüência de aulas e, também, à forma de trabalho do professor na sala de aula, desenvolvendo aulas dialógicas e incentivando a participação dos alunos. INTRODUÇÃO A escola é concebida como uma instituição que desenvolve tipos específicos de conhecimentos na qual a ação docente se configura como uma atividade humana transformadora. Essa atividade não se resume apenas na exigência de memorizações de conceitos e modelos, mas num compromisso com a formação integral do aluno, tornando-o mais capaz de refletir sobre problemas variados. Entretanto, sabe-se que esta função exige muita dedicação e persistência, uma vez que a apropriação do conhecimento é um processo complexo e único para cada um dos sujeitos que aprende. Para que esta apropriação do conhecimento aconteça, é indicada a adoção de um ensino mais voltado ao contexto que estes alunos estão inseridos. (LOPES, 2005) No final da década de 70 começou a aparecer, na literatura, um grande número de estudos preocupados, especificamente, com as idéias dos estudantes em relação aos diversos conceitos científicos trabalhados na escola. Os estudos realizados sob essa perspectiva revelaram que as idéias alternativas de crianças e adolescentes são pessoais, fortemente influenciadas pelo contexto, bastante estáveis e resistentes à mudança, de modo que é possível encontrá- las mesmo entre estudantes universitários (Viennot, 1996, apud MORTIMER, 1996). Realizadas em diferentes partes do mundo, as pesquisas mostraram o mesmo padrão de idéias em relação a cada conceito investigado. MORTIMER (1996) afirma que, apesar da grande variedade de diferentes abordagens e visões construtivistas que aparecem na literatura há, pelo menos, duas características principais que parecem ser compartilhadas: 1) a aprendizagem se dá através do ativo envolvimento do aprendiz na construção do conhecimento; 2) as idéias prévias dos estudantes desempenham um XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) papel importante no processo de aprendizagem. O modelo de ensino usado para lidar com as concepções dos estudantes e transformá-las em conceitos científicos foi chamado de modelo de mudança conceitual. Apesar de mudança conceitual ser tratada como sinônimo de aprender ciência, não há um consenso sobre seu significado. Mortimer (1992), ao adaptar uma proposta de perfil epistemológico já usada por Bachelard, às particularidades do conhecimento químico, propôs a noção de perfil conceitual, como um modelo para estudar a evolução conceitual. Para este autor, o estudante não substitui as idéias que possui em detrimento de outras trabalhadas na escola, mas pode conviver com diferentes idéias a cerca de um mesmo fenômeno. Vigotski (1993) considera como possibilidade de aprendizagem, a Zona de Desenvolvimento Proximal – ZDP – na qual descreve um nível de desenvolvimento real (NDR) que se refere às etapas já alcançadas pelo individuo, ou seja, aquilo que o aluno tem capacidade para realizar sozinho e um outro nível que se refere ao potencial do aluno, ou seja, aquilo que ele pode fazer se for devidamente auxiliado. Ele chama a isso de nível de desenvolvimento potencial (NDP). A ZDP seria, então, a distância entre o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial e é nessa zona que reside o trabalho do professor e da escola. De acordo com Vigotski cabe, então, ao professor, dirigir o ensino não para etapas intelectuais já alcançadas ou para etapas nas quais o aluno não possui ainda os “esquemas” necessários para lidar com a situação proposta, mas sim para estágios de desenvolvimento que já se iniciaram, funcionando como um incentivo ao desenvolvimento psicológico. Também nesse caso, conhecer as idéias prévias dos alunos é essencial. Este autor também enfatiza a interação social no processo de construção das funções psicológicas. Desta forma, a evolução conceitual torna-se sinônimo de aprendizagem, apesar de seu significado não ser unânime. A aprendizagem, enquanto evolução conceitual, construída na interação social envolve os alunos, o professor, o meio, etc. e é mediada pela linguagem. Assim sendo, consideramos como indispensável reconhecer as idéias dos alunos ou a forma de pensar sobre um determinado fato/fenômeno e fazer com que eles evoluam na maneira de explicar, ou seja, promover evolução conceitual. EVOLUÇÃO CONCEITUAL A PARTIR DA TRÍADE “FENÔMENO/M ODELO OU TEORIA /R EPRESENTAÇÃO” Um movimento de “inovação curricular” iniciado em Minas Gerais, retomou, de forma mais sistemática, a discussão sobre conteúdo ministrado nas escolas estaduais. Para a Química UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) do Ensino Médio, o início da seleção de conteúdos contou com a participação de consultores, de 187 professores de Química provenientes das diversas regiões do estado e de escolas caracterizadas como Escolas-Referência. A partir daí, foi elaborado um documento chamado CBC – Conteúdos Básicos Comuns. Nesse documento, os autores (consultores) propõem, baseados em parâmetros estabelecidos no documento PROMEDIO (1997) e na tradição estabelecida para o ensino de química no Brasil, critérios para orientar a escolha de conteúdos a serem ministrados em aulas de primeiro ano do ensino médio. Um destes critérios é fazer com que o aluno compreenda a fundamental articulação que ocorre entre os objetos de estudo da ciência química: propriedades dos materiais, constituição da matéria e transformações da matéria (Figura 1). Sob esta perspectiva, os autores do CBC argumentam que a abordagem deve centrar-se em 3 eixos: Fenômeno, Teoria ou Modelo e Representação (Figura 2). Figura 1 – Focos conceituais propostos no CBC. Para o eixo Figura 2 – Forma de abordagem propostos no CBC. fenomenológico destacam-se os fenômenos de interesse da química, sejam aqueles concretos e visíveis ou aqueles a que temos acesso apenas indiretamente. Segundo os autores do documento PROMEDIO (1997), a ausência dos fenômenos nas salas de aula pode fazer com que os alunos tomem por reais as fórmulas das substâncias, as equações químicas e os modelos para a matéria. Ainda que o aluno não conheça a teoria científica necessária para interpretar determinado fenômeno ou resultado experimental, ele o fará com suas próprias teorias implícitas, suas idéias de senso comum. O eixo teórico (ou modelo) relaciona-se a informações de natureza atômico- molecular, ou seja, quando se trata de propor explicações dos fenômenos baseadas em modelos abstratos que envolvem entidades não diretamente perceptíveis ou hipotéticas, como átomos, moléculas, UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) íons, elétrons, etc. O professor estará focalizando o aspecto teórico do conhecimento. (CBC, 2007). O eixo representacional compreende informações inerentes à linguagem química, tais como as fórmulas das substâncias, equações químicas, representações dos modelos, gráficos e equações matemáticas. (CBC, 2007). AS TRANSFORMAÇÕES Q UÍMICAS E A EVOLUÇÃO CONCEITUAL Como o mundo físico é formado por materiais que vão se transformando naturalmente ao longo do tempo ou por nossa interferência direta, as transformações químicas tornam-se um tema central na química. Para a disciplina de química do Ensino Médio, ensinar a partir de fenômenos criados em sala de aula (experimento, por exemplo) ou trazidos pelos alunos, ressalta a importância de que alunos entendam as transformações químicas e, assim, o que ocorre no mundo físico. Segundo Rosa e Schnetzler (1998), o estudo das transformações químicas contribui para o entendimento do impacto causado pelo avanço tecnológico tanto no meio ambiente, quanto na forma de vida de cada um de nós. Segundo Maldaner (1995) há um razoável consenso, entre os educadores químicos, de que o cerne da ciência química é perceber, saber falar sobre e interpretar as transformações químicas da matéria (ou das substâncias) causadas pelo favorecimento de novas interações entre suas partículas, nas mais diversas situações. Também o CBC, já destacado anteriormente, considera que o estudo dos materiais é baseado em propriedades, constituição e transformações. Portanto, a proposta deste trabalho é identificar o conhecimento prévio dos alunos de 1º ano do ensino médio sobre transformações químicas e investigar a evolução dessas concepções a partir da proposta contida num dos livros de química do Ensino Médio 1 , o qual faz parte da lista aprovada no PNLD – Plano Nacional do Livro didático de 2007, e que foi construído a partir da ação de um grupo de pesquisa em ensino e de um programa de formação continuada. UM O LHAR PARA AS PESQUISAS JÁ REALIZADAS SOBRE CONCEPÇÕES DE TRANSFORMAÇÃO Q UÍMICA 1 Mortimer e Horta. Química para o Ensino Médio. São Paulo: Editora Scipione, 2002. UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) Na revista Química Nova na Escola, editada pela Sociedade Brasileira de Química, há dois artigos com relatos de resultados de pesquisa sobre concepções de alunos a cerca das transformações químicas. Em um deles, Rosa e Schnetzler (1998) argumentam que compreender a ocorrência e os mecanismos das transformações químicas permite o entendimento de muitos processos que ocorrem diariamente em nossas vidas, como o metabolismo, a ação de medicamentos, o cozimento de alimentos, entre tantos outros exemplos. Aliado ao ponto de vista da formação do cidadão, podemos ainda apontar que, epistemologicamente, para que o sujeito conheça a química, entender esse conceito se torna uma necessidade central. Estes autores usam uma citação que afirma: a atividade central do químico é compreender as transformações (reações) químicas e delas tirar proveito. Às vezes, seu interesse está em produzir uma transformação, outras vezes, em evitá-la. Em todos os casos, ele deseja compreender e controlar as transformações químicas que podem ocorrer. (Edart, 1967 apud Rosa & Schnetzler, 1998). Nas pesquisas visitadas pelas autoras, as mesmas encontraram concepções classificadas nas seguintes categorias: (a) desaparecimento (durante uma transformação química ocorre o mero “desaparecimento” de alguma(s) substância(s)), (b) deslocamento (durante uma transformação química pode ocorrer mudança de espaço físico da substância, isto é, ela pode desaparecer de um dado lugar simplesmente porque se deslocou), (c) modificação (conotação de mudança de estado físico ou de forma durante a transformação), (d) transmutação (representa uma série de transformações ‘proibidas’ na química, como por exemplo: energia se transformando em matéria ou vice- versa, ou mesmo matéria se transformando em outro tipo de matéria, o que é permitido nas leis químicas), (e) interação química (do ponto de vista do processo de ensino-aprendizagem, é a mais desejável, indicando uma concepção dinâmica e corpuscular da matéria). No outro artigo, Mortimer & Miranda (1995) também mencionam algumas dessas categorias, exemplificando cada uma delas: a) generalização, aquela em que os estudantes tendem a relacionar transformações químicas com mudança de estado físico da substância; b) transmutação, como sendo aquela categoria em que os estudantes concebem a transformação química como uma propriedade inata daquele material, não como produto da interação com outros materiais sendo comum a explicação que o material “virou” outro; c) a categoria que classifica as respostas dos alunos como animista, atribui capacidades dos seres vivos as substâncias como “gostar” de outro material ou ser “apático” a um terceiro material. UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) INVESTIGANDO EVOLUÇÃO CONCEITUAL SOBRE TRANSFORMAÇÕES Q UÍMICAS A uma turma da primeira série do Ensino Médio, que freqüenta uma escola pública considerada de excelência e localizada dentro da região metropolitana de Belo Horizonte, aplicamos um instrumento de coleta de dados a 18 alunos, com questões referentes ao assunto “transformações químicas”. As questões foram elaboradas com situações do cotidiano e com exemplos de transformações químicas para as quais solicitamos que os alunos explicassem quimicamente as mudanças percebidas. Após a aplicação do primeiro instrumento de coleta de dados, desenvolvemos, com esses alunos, uma seqüência de aulas que tratavam do assunto transformações químicas, baseadas na discussão do fenômeno, da teoria/modelo e da representação. A seqüência baseouse no livro “Química para o ensino médio” (Mortimer e Machado 2003), o qual trata de transformações químicas no capítulo 6 “Introdução às Transformações Químicas”. Ministramos cerca de 10 aulas de uma hora e quarenta minutos cada. Iniciamos o assunto com um pequeno texto introdutório, exemplificando alguns fenômenos químicos no contexto histórico e discutindo-o com os estudantes. As aulas seguintes foram desenvolvidas usando experimentos simples que evidenciavam transformações químicas. Para cada experimento fazíamos questionamentos aos alunos, procurando envolvê- los na discussão de modelos para as evidências percebidas. Assim, os resultados observados pelos alunos eram amplamente discutidos no grande grupo. Também aproveitamos um experimento para questionar a legitimidade da evidência quanto à natureza física ou química do fenômeno observado. Na seqüência, introduzimos e discutimos um segundo texto, que enuncia “O Princípio de Lavoisier“, já que um dos experimentos anteriores incluía a conservação de massas. A etapa seguinte foi caracterizada pela representação de uma reação química de maneira formal, uma vez que eram representadas, até aquele momento, sem ênfase na estequiometria. Procuramos fazer com que todas as aulas fossem o mais dialógicas possível, de forma a envolver os alunos o máximo que conseguimos e criar um ambiente para exporem as suas idéias e discutirem, sob o foco dos fenômenos, modelos e representação. Após 2 semanas do término do desenvolvimento das aulas, aplicamos outro instrumento de coleta de dados aos mesmos alunos, com o intuito de verificar se as idéias usadas pelos estudantes para explicar as situações propostas haviam evoluído. As questões usadas nesse segundo instrumento foram semelhantes às do primeiro. Analisamos os resultados baseados nas categorias descritas no artigo de Rosa e Schnetzler (1998), propostas em outras pesquisas visitadas pelas mesmas. Usaremos os termos UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) pré-teste para o primeiro instrumento, aplicado antes do desenvolvimento das aulas e pós-teste para o segundo instrumento, aplicado posteriormente às aulas. DISCUTINDO OS RESULTADOS Numa primeira questão, os alunos foram chamados a citarem fenômenos do cotidiano que representassem transformações químicas. Pela forma com que o livro didático adotado vinha tratando do conteúdo, já sabíamos que isso não representaria dificuldade para aqueles alunos. Para tentar identificar o motivo que levou os alunos a escolherem os fenômenos citados, foi solicitado que os mesmos justificassem cada uma das escolhas, explicando-as. O intuito foi avaliar o grau de percepção dos mesmos de que, numa transformação química, ocorre algum tipo de interação entre substâncias ou materiais. Algumas respostas dos alunos não foram consideras por não se tratarem de explicações do fenômeno e outras foram tabuladas em mais de uma categoria. A Tabela 1, abaixo, mostra a classificação das categorias e o número de vezes em que as respostas apareceram. Tabela 1: Categorias usadas pelos estudantes para justificar os fenômenos Categorias Número de respostas Número de respostas no Pré-teste no Pós-teste Interação 10 29 Desaparecimento 13 04 Deslocamento 02 02 Modificação 05 07 Transmutação 15 08 Animismo 02 00 Observando apenas a categoria “interação” já é possível observar uma evolução conceitual dos estudantes. A interação das substâncias chamadas reagentes, originando outras substâncias chamadas produtos, é usada para justificar uma transformação química na maior parte dos materiais didáticos de ensino médio. Pode ser considerado como um conceito cientificamente aceitável. Na categoria seguinte, do desaparecimento, está a concepção de que as espécies normalmente chamadas de reagentes “desaparecem”, ou seja, são totalmente consumidas, para dar origem a outras substâncias. No pré-teste, 13 alunos justificaram as transformações químicas sob esta categoria. Já no pós-teste apenas quatro alunos mantiveram esta concepção. UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) O deslocamento é uma categoria de concepção alternativa que julga o aparecimento de uma nova substância apenas pelo seu deslocamento no espaço físico. Podemos ver que os alunos – apesar de serem apenas dois – mantiveram a concepção de deslocamento. A modificação refere-se à categoria que trata da transformação química apenas como uma mudança de estado físico dos reagentes. O exemplo típico de uma justificativa para o consumo de um combustível foi “ele passou do estado líquido para o estado gasoso, em forma de fumaça.” Percebemos que este tipo de concepção aumentou no segundo teste. Talvez, por se tratar de uma explicação um pouco mais elaborada, apesar de inadequada. Transmutação, segundo Mortimer & Miranda (1995), é uma concepção prévia usada para justificar uma transformação química sob o aspecto de que o reagente “virou” o produto. Assim, para justificar combustão, por exemplo, temos respostas como “o combustível virou gás carbônico e água”. Percebemos que não há referência a todos os reagentes e suas interações. Para essa categoria, o pós-teste mostrou uma grande diminuição (de 15 para 8 respostas) deste tipo de concepção, mesmo 8 alunos mantendo suas concepções. A última categoria refere-se ao animismo, que considera comportamento para as substâncias como seres vivos, a fim de justificar a transformação química. Nos exemplos mais comuns aparecem palavras como “o oxigênio gosta de carbono” ou “o fogo puxa o combustível”. No pré-teste detectamos duas justificativas sob esta concepção, mas nenhuma apareceu no pósteste. Na segunda questão “Quando um carro se movimenta, o combustível vai sendo consumido. O que, em sua opinião, aconteceu com este combustível à medida que ele ‘desaparece’?”, buscamos a idéia dos alunos referente ao consumo do combustível em um veículo. Por ser a combustão um fenômeno bastante conhecido, nessa questão esperávamos que a interação com o gás oxigênio fosse mais usada do que na questão anterior. As respostas foram tabeladas quantitativamente na Tabela 3 abaixo, de acordo com os critérios anteriores. Tabela 2 - Classificação das justificativas para o “desaparecimento” do combustível Categorias Número de respostas Número de respostas no Pré-teste no Pós-teste Interação 02 11 Deslocamento 02 01 Modificação 02 01 Transmutação 09 05 Não Respondeu 03 00 UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) Destaca-se, novamente, o aumento da percepção dos estudantes de que as interações dão origem às transformações químicas e a ausência de perguntas sem respostas no segundo instrumento de coleta de dados. Novamente a categoria “interação” mostra a evolução conceitual ocorrida. Abaixo temos um exemplo de um aluno que, no pré-teste, classificamos sua resposta como transmutação. Já no pós-teste houve uma evolução conceitual para interação química, como justificativa de transformações químicas, apesar de não ser completa. Figura 3 – Resposta da segunda questão obtida a partir do pré-teste Figura 4 - Resposta da segunda questão obtida a partir do pós-teste Esse aluno não abandonou a idéia de transformar matéria em energia, mas complementa a justificativa falando que houve novas substâncias a partir de um processo de combustão e que estas substância serão lançadas na atmosfera. A última questão foi: “Num frasco estava um líquido azul identificado como solução de sulfato de cobre. Nele foi colocado um prego em bom estado e previamente lixado. No outro dia o prego foi retirado e estava com uma camada de substância sólida escura ao seu redor enquanto o líquido ficou incolor. UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Sulfato de cobre => Líquido Incolor a) Ocorreu reação química? b) Em caso afirmativo, use suas palavras para explicar quimicamente essa transformação. Apresentamos evidências claras de transfo rmações químicas representadas pela formação de precipitado e mudança de cor. Esperávamos que os alunos reconhecessem a ocorrência da transformação química usando estas evidências e tentassem explicar a transformação. Como tratamos em sala de aula, nem todas as evidências justificam a classificação de um fenômeno como uma reação química, mas aliado à formação de novas substâncias e a mudanças de propriedades físicas, evidências ajudam a identificar uma reação química. As respostas foram tabeladas quantitativamente na Tabela 5, abaixo. Algumas não foram consideras por não se tratarem de explicações do fenômeno. Tabela 3 - Classificação das justificativas dos fenômenos Resultados no Pré -teste Resultados no Pós-teste Resposta Total Justificativa Total Total Justificativa Total SIM 13 1 evidência 03 18 1 evidência 08 2 evidências 01 2 evidências 06 Não usou as evidências 09 Não usou as evidências 04 NÃO 01 00 Não Respondeu 04 00 Vemos, no pós-teste, uma grande evolução no que diz respeito ao surgimento de evidências para justificar uma transformação química. Também não ocorreu ausência de respostas ou respostas erradas, apesar de 4 justificativas continuarem equivocadas. As Figuras 9 e 10 abaixo ilustram o exemplo de resposta de um aluno, obtidas a partir dos dois testes aplicados. UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) Figura 5 – Resposta a quarta questão obtida de um pré-teste. Figura 6 – Resposta à quarta questão obtida de um pós-teste. A evolução conceitual é tratada por diversos autores e a forma de identificá-la pode se diferenciada. Nesse caso, usamos um instrumento de coleta de dados escrito e, com ele, podemos perceber que os alunos usaram diferentes formas de explicar um fenômeno no pré e no pós teste. Alguns alunos responderam os pós-testes baseados no que havíamos tratado em sala, porém sem abrir mão de algumas concepções anteriores. Mas muitos deles usaram as novas ferramentas - conceitos científicos - nas justificativas, modificando o que pensavam ou mesmo diminuindo o status da concepção prévia e usaram uma explicação “mais” científica. O QUE ENTENDEMOS A PARTIR DESSA INVESTIGAÇÃO? Teorias e pesquisas no campo do ensino e as estratégias didáticas que subjazem estas teorias podem dar uma noção melhor da aprendizagem dos alunos. Apesar de reconhecermos que mudanças na prática pedagógica do professor são trabalhosas e de que, muitas vezes, a formação do professor não incluiu a pesquisa em educação como parte do processo, elas são necessárias se quisermos melhorar a qualidade do ens ino. Para orientar e facilitar as práticas pedagógicas, os governos vêm elaborando documentos que buscam otimizar conteúdos sem deixar de lado os aspectos regionais que julgam-se importantes. Embora muitos desses documentos tenham proliferado nos últimos anos, não são eles que irão provocar a mudança no ensino. É o professor, em sala de aula, que irá aderir, ou não, a essas inovações curriculares. Portanto, é no professor que deveria centrar a preocupação e os investimento do governo. UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho (CA, EA, HC, EF, EX, FP, LC, MD, TIC, EC) O ensino baseado em concepções prévias e evolução conceitual, proposto a partir de estudos teóricos sobre aprendizagem, principalmente advindos da área de psicologia, é uma ferramenta importante e que deve ser usada em sala de aula. As aulas mais dialógicas permitirão ao professor identificar concepções de seus alunos a todo o momento e não só quando realiza atividades exclusivamente avaliativas. A experimentação, muito usada nas aulas desenvolvidas nesse estudo, irá criar fenômenos em sala de aula que permitirão ou exigirão que os estudantes busquem explicações, usando modelos ou teorias. Ao final, a representação do fenômeno pode funcionar como um fechamento do assunto. Deve-se levar em consideração que o sucesso de aplicação de um material didático, considerado de qualidade, depende também da forma de abordagem adotada pelo professor. A abordagem usada nesse trabalho foi baseada em fenômenos, modelos e representações, conforme já descrito. Com os dados obtidos podemos argumentar com muita veemência de que a evolução conceitual aconteceu para a maioria dos alunos e, noutras vezes em que esse conteúdo for retomado, de forma recursiva, novas evoluções tendem a acontecer. REFERÊNCIAS LOPES, R. P. Estudo das concepções iniciais do processo de dissolução dos compostos iônicos em água. - Monografia de Licenciatura – UFMG, 2005. MALDANER, O. A. Repensando a química. Química Nova na Escola, n. 1, mai. 1995. MORTIMER, E. F. Construtivismo, Mudança conceitual e ensino de ciências: para onde vamos?. Investigação em Ensino de Ciências. Vol.1, N·1, abril de 1996. MORTIMER, E.F. e MACHADO. A.H. Química para o Ensino Médio. São Paulo: Editora Scipione, 2002. ROMANELLI, L. I. R.; DAVID, M. A.;LIMA, M. E. C. C.; SILVA, P. S. ; MACHADO, A. H. CBC – Uma proposta Curricular de Química – Ensino Médio. SEE-MG, 2007. ROSA, M. I. F. 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