Credibilidade do Sistema de Metas para a Inflação no Brasil Svensson (1993) aponta duas definições de credibilidade que podem ser associadas ao sistema de metas para a inflação: absoluta e das expectativas. A credibilidade absoluta ocorre quando os agentes acreditam, com probabilidade 1, que a inflação futura ficará dentro do intervalo de tolerância para a meta. Por sua vez, a credibilidade das expectativas se verifica quando os agentes acreditam que as expectativas de inflação estarão posicionadas dentro do intervalo de tolerância para a meta, com probabilidade inferior a 1. Grosso modo, essas medidas de credibilidade podem ser entendidas como indicadores da confiança que os agentes depositam na política monetária e, por conseguinte, dos custos associados à redução da inflação e/ou de sua manutenção em níveis compatíveis com o conceito de estabilidade de preços. Haja vista a relevância do assunto, neste Boxe se procura aferir o grau de credibilidade, absoluta e das expectativas, do regime de metas para a inflação no Brasil. O exercício contempla a realização de alguns testes simples sugeridos por Svensson (1993) para avaliar a credibilidade de um regime de metas para a inflação1 . O período amostral vai de janeiro de 2003 a outubro de 2007. A fim de testar a credibilidade absoluta, bem como a credibilidade das expectativas, Svensson (1993) constrói limites superiores e inferiores para as taxas de juros reais ex-ante que seriam compatíveis com o intervalo de tolerância preestabelecido. Os limites desse intervalo são obtidos da seguinte forma: para o superior, diminui-se da taxa de juros nominal associada a títulos pré-fixados, o limite inferior do intervalo de tolerância para a meta de inflação; para 1/ Trata-se de testes no sentido amplo da palavra, ou seja, não são testes estatísticos. Dezembro 2007 | Relatório de Inflação | 117 o limite inferior, subtrai-se das taxas de juros nominais associadas aos títulos prefixados, o limite superior do intervalo de tolerância para a meta de inflação. Seguindo a nomenclatura adotada por Svensson (1993), denomina-se o intervalo definido por esses limites por “metas consistentes de taxas de juros reais ex-ante”2 . Para se testar a credibilidade absoluta, podem ser consideradas duas alternativas quanto à medida de expectativa de inflação. A opção pela primeira está condicionada à existência de pesquisas sobre expectativas de inflação junto a participantes de mercado. Nesse caso, basta verificar se a mediana das expectativas está contida no intervalo de tolerância para as metas de inflação, contexto em que não se pode rejeitar a credibilidade absoluta. No caso da segunda alternativa, o teste da credibilidade absoluta está associado à existência de um mercado de títulos públicos onde se negociam taxas de juros reais ex-ante. Deve-se, então, apenas verificar se as taxas de juros reais ex-ante dos leilões primários desses títulos estão contidas no conjunto das “metas consistentes de taxas de juros reais exante”, situação em que não se pode rejeitar a credibilidade absoluta. Gráfico 1 – Credibilidade das Expectativas: LTN 25% 20% 15% 10% 5% 0% jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set 2003 2004 2005 2006 2007 Lim Inf Lim Sup LTN - IPCA realizado No que se refere à credibilidade das expectativas, a aferição é realizada via comparação entre as taxas de juros reais ex-post associadas a títulos prefixados e as “metas consistentes de taxas de juros reais ex-ante”. Se existirem evidências de que as taxas de juros reais ex-post estão posicionadas dentro dessas metas, então a credibilidade das expectativas não pode ser rejeitada. Um teste similar poderia ser feito, por exemplo, substituindo-se as taxas associadas aos títulos prefixados pelas taxas implícitas nos contratos de futuro de taxa de juros (se forem disponíveis) com prazos semelhantes aos das metas de inflação preestabelecidas. O Gráfico 1 apresenta a evolução das “metas consistentes de taxa de juros reais ex-ante ”, calculadas com base nas taxas médias dos leilões primários de Letras do Tesouro Nacional (LTN)3 . Além disso, mostra a evolução das séries de taxa de juros reais ex-post associadas a esses títulos. A média 2/ Os prazos dos títulos pré-fixados devem ser semelhantes aos prazos das metas para a inflação. 118 | Relatório de Inflação | Dezembro 2007 Gráfico 2 – Credibilidade das Expectativas: Futuro de DI 25% 20% 15% 10% 5% 0% dessa série em 2003 foi 11,18% a.a. (desvio-padrão de 2,85% a.a.); de 2003 a 2004, 10,67% a.a. (desviopadrão de 2,37% a.a.); de 2003 a 2005, 12,26% a.a. (desvio-padrão de 2,18% a.a.); e, finalmente, de 2003 a novembro de 2006, foi de 12,12% a.a. (desviopadrão de 1,88% a.a.). Comparando-se essas taxas com as “metas consistentes de taxa de juros real exante”, infere-se que a credibilidade de expectativas não pode ser rejeitada no período 2003-2007. jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set 2003 2004 2005 DI - IPCA realizado 2006 Lim Inf 2007 Lim Sup Gráfico 3 – Credibilidade das Expectativas: Swap DI x Pre 25% 20% 15% 10% 5% 0% jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set 2003 2004 2005 2006 2007 Swap - IPCA realizado Lim Inf Lim Sup Gráfico 4 – Credibilidade Absoluta: Mediana das Expectativas de Inflação 14% 12% 10% 8% 6% 4% 2% 0% jan mai 2003 set jan mai set 2004 Expectativa IPCA jan mai 2005 set jan mai set jan mai set 2006 2007 Lim Sup No Gráfico 2, substituem-se as taxas de juros prefixadas associadas às LTN por taxas implícitas em derivativos financeiros. No caso dos contratos de futuro de Depósitos Interfinanceiros (DI), com vencimento em um ano4 , mais uma vez prevalece a não rejeição da credibilidade das expectativas para o período 2003-2007. Para verificar a robustez desse resultado, utilizam-se as taxas de juros implícitas nos contratos de swap de taxa de juros pré e pós-fixada, calculadas segundo o método flat-forward (taxa a termo constante)5 . A análise do Gráfico 3 indica que não se pode rejeitar a credibilidade das expectativas. Com base no Gráfico 4, avalia-se a credibilidade absoluta do regime de metas para a inflação no Brasil, para tanto recorrendo às expectativas de inflação6 . Considerando que a mediana das expectativas se posicionou dentro dos intervalos de tolerância, exceto em janeiro e fevereiro de 2003, não se pode rejeitar a credibilidade absoluta no período de 2003-2007. Já no Gráfico 5, a credibilidade absoluta é avaliada por intermédio da média das taxas reais registradas nos leilões primário de Notas do Tesouro Nacional – Série B (NTN-B), Lim Inf 3/ Inicialmente, obtêm-se as taxas médias anuais de todos os leilões de LTN com prazo superior a 1 ano. A seguir, utilizam-se os limites superiores e inferiores do intervalo de tolerância para a meta de inflação de todos os anos e encontram-se os valores correspondentes a cada mês. Para o prazo a decorrer de cada título, calculam-se os limites superiores e inferiores acumulados. Depois se subtraem esses limites das taxas dos leilões de LTN. 4/ Construímos as séries de taxa para o futuro de DI utilizando o Modelo de Diebold & Li (2006). Definimos a curva de juros como uma soma dos três movimentos básicos (nível, inclinação, e curvatura). Cada movimento é representado por uma função exponencial. As variáveis que modelam variação da curva ao longo do tempo são os coeficientes que multiplicam os movimentos exponenciais. 5/ As taxa de swap Pré-Pós são as divulgadas pela BM&F para os prazos de 6, 12 e 24 meses. Com duas dessas informações calcula-se a taxa pré para o prazo de 252 dias úteis, pela metodologia flat forward (taxa a termo constante). Os prazos em dias dos swaps de 6, 12, e 24 meses variam. O swap de 12 meses varia de 243 a 253 dias úteis, por exemplo. Quando o prazo de 1 ano considerado (252 dias úteis) se situa entre os prazos dos swaps de 6 e 12 meses, esses são os instrumentos utilizados para se encontrar a taxa de 1 ano. Quando o prazo de 1 ano (252 dias úteis) se situa entre os prazos de swaps de 12 e 24 meses, esses são os instrumentos considerados para se encontrar a taxa de 1 ano. 6/ Obtivemos os limites superiores e inferiores das metas de inflação anuais e calculamos seus valores mensais. A cada mês acumulamos o valor mensal dos doze meses seguintes. Dezembro 2007 | Relatório de Inflação | 119 Gráfico 5 – Credibilidade Absoluta: NTN-B 25% 20% 15% ocorridos a partir de setembro de 20047 . Visto que, desde 2005, as taxas reais das NTN-B encontramse dentro do intervalo de “metas consistentes de taxas de juros reais ex-ante”, não se pode rejeitar a credibilidade absoluta no passado recente. 10% 5% 0% jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set jan mai set 2003 2004 2005 2006 2007 Lim Sup Lim Inf NTN-B Em resumo, este Boxe apresenta alguns exercícios com vistas à análise da credibilidade do regime de metas para a inflação no Brasil, segundo a metodologia proposta em Svensson (1993). De modo geral, são fortes as evidências no sentido de que o regime de metas para a inflação no Brasil desfruta de credibilidade. Ao menos em parte, essa credibilidade resulta do fato de a política monetária haver sido bem sucedida no sentido de atingir a meta para a inflação nos últimos três anos. Note-se, ainda, que, a se confirmarem as expectativas dos participantes de mercado, isso deverá acontecer novamente em 2007. Referências Diebold, X. Francis e Li, Canlin. “Forecasting the Term Structure of Government Bond Yields”. Journal of Econometrics Vol 130, Issue 2. Fevereiro de 2006, 337-364. Svensson, E.Lars. “The Simplest Test of Inflation Target Credibility”. NBER 4604. Dezembro de 1993. 7/ Temos as taxas de negociação média dos leilões primários de NTN-B, a partir de 13/09/2004. Selecionamos somente as NTN-B que no leilão tinham um prazo a decorrer entre 1 e 3 anos. 120 | Relatório de Inflação | Dezembro 2007