137 DESENVOLVIMENTO REGIONAL: implicações da exportação na geração de trabalho e renda na Cidade de Franca/SP André RUWERi - UNIFACEF Melissa Franchini Cavalcanti BANDOS ii- UNIFACEF 1. INTRODUÇÃO A constatação de que o atual modelo de crescimento econômico gerou desequilíbrios nas esferas ambiental e social global, originando um processo constante de debates entre os políticos e a comunidade científica de todo o mundo sobre alternativas de desenvolvimento. Concretiza-se assim a busca da equidade e justiça social por meio da materialização de uma nova forma de desenvolvimento que assegure a permanência e a continuidade das conquistas e avanços na qualidade de vida e na estrutura econômica atual e que evite, ou minimize as agressões às condições ambientais que tendem a provocar, no futuro, o estrangulamento das possibilidades de desenvolvimento e comprometimento da qualidade de vida da população. Neste contexto, o desenvolvimento aparece como um fenômeno complexo, com inferências econômicas, sociais, políticas e culturais (TOLOSA,1978), mas, embora dependa do crescimento econômico, o desenvolvimento não pode ser considerado simplesmente como sinônimo de crescimento econômico (MARTINELLI, 2004), avaliado apenas como um processo de expansão quantitativa do produto e da renda, e sim como uma transformação qualitativa da sociedade, na mudança de suas características. Sachs (1986, p.110) resume: o Desenvolvimento Sustentável é “[...] socialmente desejável, economicamente viável e ecologicamente prudente”. Historicamente, o desenvolvimento resulta de transformações estruturais que, por sua vez, são conseqüência de movimentos cumulativos de recursos 138 técnicos, materiais e humanos de uma sociedade (BUARQUE, 1994). Da mesma forma, também na era da globalização, “(...) o espaço geográfico ganha novos contornos, novas características, novas definições” (SANTOS, 2000, p. 79), deixando de ser considerado apenas o suporte físico das atividades e dos processos econômicos para representar a valorização dos “(...) territórios e as relações entre os atores sociais, suas organizações concretas, as técnicas produtivas, o meioambiente e a mobilização social e cultural” (MARTINELLI, 2004, p.7). Assim, as exigidas mudanças de orientação e novas formas de produção realizam-se pela fragmentação territorial, onde “(...) renascem as identidades culturais e políticas nos níveis local e regional” (COELHO apud MARTINELLI, 2004, p. 1) impulsionando a atenção para estratégias de desenvolvimento no próprio nível local e regional (MARTINELLI, 2004, p. 1). Perspectiva em que Albuquerque (1996) salienta que a identidade própria de cada território se converte em sustentação de seu desenvolvimento produtivo: A proximidade dos problemas, necessidades, recursos e atores sociais locais permite, [...] formular políticas mais realistas e, sobretudo, baseadas no consenso com tais atores. Igualmente, se abre a possibilidade de promover a criação negociada de instituições de fomento produtivo empresarial em nível local, de gerar um clima de confiança e cooperação entre entidades públicas e o setor privado empresarial e de estimular assim uma cultura local de desenvolvimento (ALBUQUERQUE, 1996, p.3-4). Deve-se então buscar complementar o esforço das políticas macroeconômicas com políticas dirigidas aos níveis micro e mesoeconômicos, alcançando, por essas medidas, uma mudança de atitude frente a um enfoque onde antes se privilegiava a atração de recursos externos; ou centrada basicamente em grandes grupos, voltando-se às possibilidades e iniciativas de desenvolvimento econômico endógeno, onde “(...) é possível aproximar-se das circunstâncias e características concretas dos diversos territórios ou regiões e formular políticas e instrumentos de fomento produtivo e modernização tecnológica e empresarial, mais ajustados ao perfil específico de cada zona” (ALBUQUERQUE, 1996, p.5). Dessa forma, surgem as propostas de Desenvolvimento Regional (DR), como resultado da ação articulada dos diversos agentes sociais, políticos e econômicos, públicos ou privados, do município ou região, voltada ao alcance de um objetivo 139 comum, pela construção de um projeto estratégico orientador de suas ações em longo prazo (MAGALHÃES e BITTENCOURT, 1997). Com relação à presença do Estado, com suas “Políticas Públicas”, a fim de tornar suas ações e participação efetiva, surge um novo conceito no estudo das políticas públicas, que é a ciência regional. Segundo Martinelli e Joyal (2004), a ciência regional destaca princípios fundamentais que justificam o uso do planejamento regional, e que permitem avaliar as reformas governamentais, que foram tomadas no intuito de melhorar o cotidiano dos usuários dos serviços: - princípio da democracia: respeito pelos gostos e preferências da população e participação desta nas tomadas de decisão; - princípio da justiça social: correção de disparidades regionais e respeito pelas identidades culturais; - princípio da eficácia econômica: melhor conhecimento dos recursos a serem explorados a serem renovados, e adaptação das políticas nacionais a realidade da região; - princípio de coerência administrativa: visão global da região a ser desenvolvida e melhor integração do setor privado nas orientações estratégicas e nas ações do setor público (MARTINELLI E JOYAL, 2004). Dentro do principio de coerência administrativa, se faz necessária à intervenção do estado sobre as ações das empresas privadas, no intuito de preservar o bem-estar social, procurando direcionar ações de longo prazo, para o beneficio da comunidade. Deve-se atentar às mudanças de cenário, e em tempos atuais, essa mudança esta produzindo efeitos que nunca ocorrem antes. Em primeiro lugar, vive-se em uma era de descontinuidade. No passado, a experiência representava uma base aceitável para se prescrever como seria o futuro. O amanhã era uma projeção e extrapolação das tendências de ontem. Bastava conhecer os dados históricos passados para se prever o comportamento futuro. Essa continuidade nas relações de causa e efeito, que caracterizou a era industrial, já não acontece mais na era da informação. Desde o inicio da década de 1970, quando o mercado financeiro viu quadruplicar o preço do petróleo, os choques econômicos passaram a impor contínuos impactos e mudanças nas organizações. 140 O mercado vive a era da ruptura. As empresas precisam se defender de seus concorrentes tradicionais e dos novos concorrentes, que surgem com ideais novas e com organograma mais enxuto. As empresas precisam reorganizar e replanejar o trabalho de seus empregados, para continuarem viáveis e competitivas, na qual surge um repertório de mudanças, entre elas: mudança no propósito da organização, nos produtos/serviços, nas tecnologias utilizadas, na estratégia, na estrutura, na cultura, nas tarefas ou processos internos e nas pessoas. Segundo DUPAS (1999) o impacto das novas cadeias de produção sobre os empregos globais varia conforme uma série de fatores: a acomodação de cada país dentro da cadeia produtiva; a forma de entrada do investimento direto estrangeiro; tipo de cadeia; substituição ou não de produção local; e complementação de investimentos domésticos, contribuindo para o crescimento da produção ao desfazer gargalos financeiros, tecnológicos e administrativos locais. A maioria das nações optou então, pela filosofia do mercantilismo, onde uma nação para se rica e poderosa necessitava exportar mais do importava. Dentro do conceito de liberalismo que da ao comerciante a opção de escolher sua base econômica e efetuar transações comerciais com quem bem entender, surgem os consumidores estrangeiros que buscam complementar suas necessidades internas com produtos e serviços de qualquer região do planeta, sem a intervenção do Estado, principalmente no que diz respeito a barreiras alfandegárias. Segundo RIFKIN (2004) vive-se em um mundo de contrastes cada vez maiores. Agiganta-se o espectro da cintilante sociedade “High-tech”, com computadores e robôs canalizando esforço para um fluxo de sofisticados e novos produtos e serviços. Na era da informação, máquinas que dão a sensação de controle sobre o ambiente, nada lembram das fábricas mal iluminadas da revolução industrial inglesa. Neste contexto, de reorganização e replanejamento, surge o fantasma o desemprego, que pode ocorrer devido à recessão econômica, ao crescimento econômico menor que o crescimento demográfico, novas tecnologias que dispensam mão-de-obra e a políticas econômicas governamentais ou do setor 141 privado inadequadas, sendo que dependendo da formação profissional, será mais fácil ou difícil a sua volta ao trabalho, e que de acordo com CALDAS (1999), acaba trazendo reflexos negativos das mais diversas ordens, e que tem forte tendência a serem nocivas às pessoas, praticamente em qualquer dimensão que se escolha estudar. A troca de mercadorias entre os homens é uma atividade que vem desde os primórdios da humanidade, e que naturalmente deixou de ser artesanal e se tornou uma atividade econômica complexa, e que trouxe grandes benefícios sociais e econômicos dentre os quais: ampliação dos mercados consumidores, acesso a maior diversidade de fornecedores, mercadorias, novas tecnologias e contato entre povos e etnias. Por outro lado, aqueles que crêem que o excesso de desenvolvimento do comércio internacional pode gerar dependência entre os países, afetando até mesmo sua soberania, trazendo malefícios tais como: desenvolvimento assimétrico entre os países, concentração em atividades que apresente maior retorno financeiro em termos de produtividade ou tecnologia, destinando aos paises em desenvolvimento produtos de menor valor agregado ou ainda, o desenvolvimento em apenas alguns setores da economia, em detrimento a outros. Segundo DIAS (2007) o conceito de liberalismo tem-se expressado através da liberdade oferecida ao comerciante de escolher a base da sua atividade econômica e executá-la com quer que seja, sendo que o grande elemento do liberalismo reside na iniciativa individual, em que cada indivíduo em uma sociedade pode buscar desenvolver a atividade que mais lhe interessar, obtendo com isso os meios para seu sustento. Neste cenário, como um paradigma do desenvolvimento regional e, ao mesmo tempo contribuindo de forma decisiva para acelerar o seu crescimento, termos como clusters1, arranjos produtivos locais, aglomerados de empresas, redes de empresas, consórcios de empresas, parques tecnológicos, distritos industriais, 1 Porter (1998, p. 209-213), um dos teóricos sobre Cluster, aponta que os mesmos "(...) são concentrações geográficas de companhias e instituições num setor específico. Os Clusters englobam uma gama de empresas e outras entidades importantes para a competição, incluindo, por exemplo, fornecedores de matéria-prima, componentes, maquinários, serviços e instituições voltadas para o setor. Podem se estender verticalmente e horizontalmente na cadeia produtiva”. 142 são utilizados mais largamente, merecendo destaque em estudos e estratégias de desenvolvimento e políticas de atuação microrregional. Estes termos têm lugar na cidade de Franca, no Centro Oeste do Estado de São Paulo, onde se instalou, desde o final do século XIX, cluster voltado para o setor calçadista, com a aglomeração das atividades econômicas de forma que a industrialização influenciou e ainda influencia as condições sociais e econômicas da população – por definição, os clusters fornecem condições de ambiente tecnológico e mercadológico que faz com que as empresas sobrevivam mais tempo quando estão unidas dentro desses pólos do que individualmente. Segundo Tironi (2001) a importância dos Clusters industriais tem sido enfatizada por análises que se encontram na fronteira entre a literatura de Organização Industrial e os estudos de Economia Regional. A cadeia produtiva de calçados se compõe de uma ampla especificidade de indústrias, que se completam no produto final, que é o calçado. Para esta realização, são utilizados sistemas produtivos diferentes, mas que representam parte de um todo maior. É a importância dessas partes que faz surgir à sinergia entre elas (indústrias, instituições e prestadoras de serviços), uma vez que a competitividade atual do mercado pressiona as indústrias a proporcionar algo mais, por meio do desenvolvimento de melhores níveis de desempenho pelos integrantes do setor. 2. FORMAÇÃO ECONÔMICA A história econômica brasileira foi marcada pelas etapas cíclicas da exploração de recursos naturais até praticamente, meados do século XX com o fim da II grande guerra. Esses ciclos, iniciados com o próprio descobrimento sucederam-se no início da colonização: pau-brasil, o açúcar e o ouro. A ausência de riquezas de metais preciosos ou especiarias, nos três primeiros séculos, logo deixaram a colônia brasileira em visível desvantagem com o império da Índia. As limitações econômicas iriam afetar o próprio fluxo humano da colonização, uma vez que a cobiça favorecia as terras do Oriente, abertas ao saqueio e à expropriação 143 pela violência, ou pelos termos vantajosos de comércio de mercadorias cobiçadas pela Europa. Os produtos agrícolas brasileiros, em sua maioria, transitavam por Portugal que se limitava aos benefícios da reexportação, sem recursos para manufaturá-los. O destino final era a Inglaterra e Holanda, nações que já rumavam à revolução industrial, com os ganhos advindos da expressão colonial. A intenção deste artigo é demonstrar a situação das cidades de Franca (SP) e Igrejinha (RS), situadas em regiões geográficas diferentes, com populações distintas, porém ambas com cluster voltados à indústria de calçados e analisar a luz do direito ao desenvolvimento, que foi concebido no âmbito dos direitos dos povos e consagrado pela Carta Africana do Direitos Humanos e dos Direitos dos Povos, aprovada na 18ª Conferência de Chefes de Estado e Governo, reunida no Quênia em 1981, onde consta em seu artigo 22 que: “1. Todos os povos têm direito ao desenvolvimento econômico, social e cultural, no devido respeito à sua liberdade e identidade, e na igual fruição da herança comum da humanidade. 2. Os Estados têm o dever de assegurar, individual ou coletivamente, o exercício do direito ao desenvolvimento”. O artigo apresenta no seu quadro 01, somente para situar o leitor, dados dos municípios analisados, tais como população, Indice de desenvolvimento humano e quantidade de indústrias de calçados. Cabe salientar que no IDH estão equacionados três sub-índices direcionados às análises educacionais, renda e de longevidade de uma população. O resultado das análises educacionais é medida por uma combinação da taxa de alfabetização de adultos e a taxa combinada nos três níveis de ensino (fundamental, médio e superior). Já o resultado do sub-índice renda é medido pelo poder de compra da população, baseado pelo PIB per capita ajustado ao custo de vida local para torná-lo comparável entre países e regiões, através da metodologia conhecida como paridade do poder de compra (PPC). E por último, o sub-índice longevidade tenta refletir as contribuições da saúde da população medida pela esperança de vida ao nascer. Quadro 01 – Características de Franca (SP) e Igrejinha (RS). 144 Franca (SP) Igrejinha (RS) População (2000) 287.400 26.767 IDH (2000) 0,820 0,822 Industrias de Calçados 1000 760 Fonte: dados da pesquisa Em Franca, a fabricação de calçados remonta os anos 1850. Naquela época, o local servia de descanso para os viajantes (tropeiros) que aproveitavam a estadia para fazer reparos em arreios, botinas, polainas e sapatos, todos de couro. Ao longo das décadas, o desenvolvimento foi tão acentuado que Franca passou a ser conhecida mundialmente como Capital do Calçado Masculino. Produz anualmente em torno de 26 milhões de pares, sendo que 85% são para o público masculino. Das 760 indústrias de calçados, estima-se que em torno de 550 são microempresas, 130 são de pequeno porte, 65 são de tamanho médio e 13 são grandes fabricantes. São empregados 27,5 mil trabalhadores, que atuam de modo artesanal para colocar nos mercados nacional e internacional sapatos de alto valor agregado. A cidade transformou-se em um dos principais pólos calçadistas do país e o maior núcleo exportador de calçados masculinos. A presença da indústria de calçados atraiu curtumes, indústrias de borracha, de processamento de couros e de colas, formando um cluster de calçados, em Franca e municípios vizinhos. A indústria calçadista de modo geral, vem passando por transformações significativas no seu padrão de concorrência, com destaque para a perda relativa da importância do baixo custo salarial como determinante da competitividade do setor, em favor de fatores como qualidade, design e prazos de entrega (Garcia, 1996) – isto também se aplica ao Cluster de Franca. O setor calçadista de Franca está inserido no mercado internacional, sendo este um dos indicadores da competitividade do setor. Contudo, existe um comportamento bastante irregular das exportações dos produtores locais, seja porque em momentos de retração de demanda doméstica as empresas locais procuram compensar elevando as vendas ao mercado externo; seja pelas variações 145 da política cambial com relação às exportações. E, mais recentemente, cenário também foi bastante atingido por reflexos da crise imobiliária americana (2008). Do outro lado, temos a cidade de Igrejinha que teve como primeiros habitantes os Índios Caingangues. Em 1824 desembarcou, às margens do Rio dos Sinos, o primeiro grupo de imigrantes alemães, fixando-se em São Leopoldo. No ano de 1847, Tristão José Monteiro (que fundara em 1846, Taquara do Mundo Novo), chegou a esta altura do vale para proceder à demarcação dos lotes de terra que venderia, a seguir, a colonos e imigrantes. Fundou vários grupos, dentre eles o núcleo da “Casa de Pedra”. Esta denominação vem do fato de Tristão Monteiro ter ali construído uma grande casa de alvenaria, a primeira e única do vale, a qual, em alemão, se chamava “Stein Haus”, onde foram instalados a capatazia e o armazém de abastecimento dos primeiros colonos e do pessoal que procedia a mediação das terras dessa região. Todo o vale fazia parte da fazenda que Tristão Monteiro adquiria. Ele nutria grandes planos de colonização, procurando atrair sempre um maior número de colonos, concedendo, por isso, facilidades para a venda dos lotes de terra em várias parcelas de pagamentos. As terras eram excelentes, todas cobertas de mato espesso, embora bastante montanhosas, pois, se estendiam até a encosta da serra. Eram ricas em madeira de lei e fauna. Posteriormente, colonos alemães vindos de São Leopoldo e diretamente da Alemanha, em sua maioria da região de Hunsrück (ao sul da Alemanha, divisa com França e Suíça), fixaram-se nessa colônia, espalhando-se aos poucos pelas margens do rio, rumo ao norte. 3. NECESSIDADE DE POLÍTICAS DE GERAÇÃO DE TRABALHO E RENDA Os recentes acontecimentos econômicos, em especial a crise do setor imobiliário americano, lançaram dúvidas sobre o modelo e seguir, já que evidenciou 146 a necessidade de uma presença maior do Estado na sociedade e que não existe um modelo único nem preestabelecido de desenvolvimento a ser seguido. No entanto, a agenda social brasileira tem abordado expressivamente a questão do desemprego, principalmente a partir da década de 1990, quando as orientações governamentais de política econômica estiveram centradas na busca da estabilidade financeira e no ajuste estrutural do Estado, e originaram uma abertura comercial indiscriminada, na manutenção artificial até meados de 1999 de taxas de câmbio sobrevalorizadas, e na desregulamentação crescente do mercado de trabalho (Demeter, 2001). Ao mesmo tempo, observou-se a retirada progressiva do Estado, enquanto agente ativo na promoção de políticas públicas sociais, e à abdicação, por parte deste mesmo Estado, do exercício da regulação de mercados setoriais. Resultando num conjunto de mudanças estruturais que, conforme Singer (1988, p.7): “tem sido a elevação do desemprego e do subemprego em todas as suas formas e o agravamento da exclusão social”. O agravamento dos níveis de desemprego faz proliferar na atualidade nacional e internacional, os debates em torno do pensar e fazer político, econômico e social. Da mesma forma, são impostas revisões nesta concepção de que o Estado pouco ou nada tem a fazer em termos de promoção ativa do emprego (DEMETER, 2001). Um item que notadamente permeou as recentes formulações governamentais e da sociedade civil, sobre políticas públicas de geração de trabalho e renda no Brasil, foi a constituição de prioridades como o combate à pobreza e à desigualdade social, aliado à busca de alternativas e melhorias na distribuição de renda. Com o avanço dos processos de descentralização política e a transferência de funções, recursos e faculdades aos governos locais e regionais, incorporam-se a estes as funções de formulação e execução de políticas de fomento produtivo e geração de emprego, e também o fomento e a instituição de novas formas de regulação com o setor privado empresarial e o restante da sociedade local, para assim, responder, mais eficientemente aos atuais desafios do ajuste produtivo e concretizar uma posição capaz de atingir uma mais ampla difusão do crescimento econômico em todas as regiões, além do comprometimento, de forma consistente e não só assistencial, com os objetivos de equidade e superação da pobreza (ALBUQUERQUE, 1996). 147 Contribuindo ao debate sobre o que deve ser feito para combater a desigualdade, a pobreza e a exclusão social, que se revelam como os principais problemas ligados ao Desenvolvimento Sustentável, Singer (1998, p. 62-63) afirma considerar: [...] como dever do Estado a promoção de um processo público de inclusão social, sustentando e treinando os desempregados, financiando e assistindo de diversas maneiras a pequenas empresas ou comunidades de trabalho, redistribuindo terras subutilizadas entre os camponeses, etc.. Azeredo (1998) analisou experiências de políticas públicas de emprego em vários países ao longo dos anos 90, e constatou como tendência em todo o mundo desenvolvido e nos países periféricos, a necessidade de uma política governamental que atue diretamente sobre o mercado de trabalho, no sentido de maximizar a oferta de emprego, dada a restrição macroeconômica e o contexto institucional (salário mínimo, relações capital-trabalho, entre outros). Sua conclusão expressa que as políticas públicas: [...] têm um importante papel a cumprir em termos de socialização e integração dos excluídos do mercado de trabalho, de preservação da qualificação da força de trabalho desocupada, de geração de atividades á margem do setor moderno da economia, mas capazes de garantir a sobrevivência de indivíduos e comunidades, e em alguns casos de elevação dos padrões de organização e consciência social e, portanto, de cidadania (AZEREDO, 1998, p.43). A dependência dos municípios citados, na indústria calçadista, submetendose ao mercado externo e assim sujeitando-se às variações desse mercado, conforme o quadro 02 (apresentado na seqüência), cria em determinado momento uma massa de desempregados destinada à marginalização. Verifica-se nas linhas que representam os municípios, grandes variações na sua produção industrial, a qual é concentrada em um único setor, que é calçadista, em comparação com a “média Brasil”. 148 Quadro 02: Variações da industria 70 60 50 40 Franca 30 Brasil Igrejinha 20 10 0 1999 -10 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 Fonte: dados da pesquisa. Buscando uma comparação com a realidade brasileira, se faz urgente medidas que zelem por uma existência de uma fonte de recursos sólida, inteiramente destinada a uma política de emprego, que tenha condições de acolher a massa de desempregados oriunda do setor calçadista, com a criação de políticas ativas a fim de migrar a mão de obra desse setor para outros, diversificando a produção local e colocando o país em igual ou melhor posição que muitas economias desenvolvidas, no que diz respeito ao emprego sazonal. Analisando a literatura internacional sobre o tema Políticas de Emprego, Ramos (2003, p.15-18) apresenta dois tipos de instrumentos ou medidas: as passivas e as ativas, caracterizadas no quadro 03: Quadro 03 – Caracterização das Políticas de Emprego CARACTERIZAÇÃO DAS POLÍTICAS DE EMPREGO POLÍTICAS PASSIVAS POLÍTICAS ATIVAS Ações que tendem a tornar mais tolerável Ações que visam exercer um efeito a condição de desempregado, o objetivo positivo sobre a demanda de trabalho, é assistir financeiramente o trabalhador geralmente atuando sobre o contingente desempregado ou reduzir o excesso de de trabalhadores. oferta de trabalho. EXEMPLOS EXEMPLOS 149 Seguro-desemprego Extensão dos ciclos escolares Aposentadoria precoce Formação e reciclagem profissional Intermediação de mão-de-obra Apoio à micro e pequenos empreendimentos Expulsão de imigrantes Subsídios à contratação de uma determinada população-alvo Criação de empregos pelo setor público Fonte: elaborado pela pesquisa, a partir de Ramos (2003). O autor defende a necessidade de um diagnóstico que fundamente as políticas públicas de emprego, uma vez que elas surgem como uma resposta a um determinado problema. No caso do Brasil, pela heterogeneidade, não se pode falar em “mercado de trabalho”, mas sim em “mercados de trabalho” e, desta forma, os diagnósticos devem ser locais e as políticas, baseadas nestes diagnósticos, deverão conseqüentemente ter um caráter local: “[...] cada estado ou região deveria ter um diagnóstico sobre seu mercado de trabalho identificando seus problemas e, a partir dele, desenhar a estratégia de intervenção pública” (RAMOS, 2003, p.24). Num contexto de elevados índices de desemprego, destacam-se alternativas e emergem algumas experiências de políticas comprometidas com a promoção do desenvolvimento econômico e social, orientadas para a geração de trabalho e renda, e; principalmente aquelas voltadas para setores sociais de baixa renda; marginalizados no núcleo central do processo produtivo da economia regional. Uma dessas propostas concretizou-se em 1994, com o acordo que criou o Programa de Apoio à Geração de Emprego e Renda em Áreas de Pobreza – PRONAGER Nacional. Dentre as alternativas pode-se citar o exemplo dos Programas de Geração de Emprego e Renda como o de Quixadá (70 mil habitantes), no sertão central do Ceará, selecionado em 1996 pelo Programa Gestão Pública e Cidadania (FGV – Fundação Ford). Os resultados do programa apontaram para mudanças na cultura política e modificação na relação dos cidadãos com os órgãos públicos. Segundo o programa, ao oferecer orientação, capacitação e pequenos financiamentos foi possível a promoção da dignidade dos cidadãos enquanto trabalhadores e produtores de riqueza, numa demosntração de que é possível a atuação efetiva dos 150 governos municipais na geração de trabalho e renda. Os passos fundamentais foram: o apoio à organização e capacitação profissional, o acesso ao crédito e a conquista de parcerias, a organização dos produtores e sua qualificação para atuação no mercado, a organização de cooperativas e a participação de associações e da comunidade ativamente (VAZ e BARGIERI, 1996). 4. REFERÊNCIAS ACCARINI, José H.; COSTA, Otávio G. P. da. Desenvolvimento Local Integrado Sustentável no Brasil (DLIS): Reflexões. Bahia Análise & Dados, Salvador, v. 12, n.2, p. 57-70, set. 2002. ALBUQUERQUE, Francisco. Desenvolvimento e fomento produtivo local para superar a pobreza.Tradução do trabalho “Desenvolvimento e fomento produtivo local para a superação da pobreza no Chile”, apresentado pelo autor no seminário de mesmo nome organizado pelo Fundo de Solidariedade e Investimento Social e pelo Ministério de Planejamento e Cooperação (FOSIS/MIDEPLAN), conjuntamente com o ILPES, realizado na sede da CEPAL em 12 e 13 de ago.1996. Disponível em: <http://www.rededlis.org.br/textos_download.asp?action=lista&ordena=titulo>. Acesso em: 18 jan. 2009. BENKO, Georges. Economia, espaço e globalização na aurora do século XXI. 2.ed. São Paulo: Hucitec, 1999. BUARQUE, Sérgio C. Metodologia de planejamento do Desenvolvimento Sustentável. Recife, IICA: 1994. CAVALCANTI, Clóvis(org.). Meio ambiente, desenvolvimento sustentável e políticas públicas. 3. ed. São Paulo: Cortez: Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2001. CALDAS, Miguel P. Transformação e realidade organizacional: uma perspectiva brasileira. São Paulo. Atlas, 1999. DIAS, Reinaldo; Rodrigues, Waldemar [org]. Comércio exterior: teoria e gestão. São Paulo. Atlas. 2007 DEL CASTILLO, J. Manuel de desarrollo local. Departamento de Economía y Hacienda, Gobierno Vasco: Victoria-Gasteiz, 1994. DUPAS, Gilberto. Economia Global e exclusão social: pobreza, emprego, estado e o futuro do capitalismo. São Paulo. Paz e Terra. 1999. FRANCO, Augusto de. Porque precisamos de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável. 2000. Disponível em <http://dlis.undp.org.br/pnud.nsf>. Acesso em 20 fev. 2009. 151 FURTADO, Celso. Breve introducción al desarrollo: un enfoque interdisciplinario. México: Fondo de Cultura Económica, 1980. GARCIA, Renato de Castro. "AGLOMERAÇÕES SETORIAIS OU DISTRITOS INDUSTRIAIS: UM ESTUDO DAS INDÚSTRIAS TÊXTIL E DE CALÇADOS NO BRASIL", Campinas 1996. GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa. 3 ed. São Paulo: Atlas, 1996 ________. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999. HADDAD, Paulo Roberto(org.). Economia regional: teorias e métodos de análise. Fortaleza: BNB, 1989. Série Estudos Econômicos e Sociais, v.36. LIVRO DE INSTRUÇÕES CODIFICADAS – LIC. Banco do Brasil, 2006. MAGALHÃES, R.; BITTENCOURT, G.. Projeto alternatido de desenvolvimento rural. In: CONTAG; Programa de formação de dirigentes e técnicos em desenvolvimetno local sustentável com base na agricultura familiar. Brasília:Mtb/Sefor/Codefat/Contag, set. 1997. MARTINELLI, Dante Pinheiro; JOYAL, André. Desenvolvimento local e o papel das pequenas e médias empresas. Barurei, SP : Manole, 2004. RUDIO, Franz V. Fundamentos da metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2003. OLIVEIRA, S.L.O. Tratado de Metodologia Científica: projetos de pesquisa, TGI; TCC, monografia, dissertações e teses. 2. ed. São Paulo: Pioneira, 1997. PARENTE, Silvana. A Construção Social dos Mercados: Desenvolvimento Local e microfinanças como mecanismos de mercado para combater a pobreza. 1997. Disponível em <http://www.projetobndespnud.org.br/artigo5.htm>. Acesso em 10 jan. 2009. RICHARDSON, R.J. Pesquisa Social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1989. RICHARDSON, R. J. et al. Pesquisa social: métodos e técnicas. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1989. RIFKIN, Jeremy. O fim dos empregos: O continuo crescimento do desemprego em todo o mundo. São Paulo. M.Books do Brasil, 2004. SACHS, I. Ecodesenvolvimento: crescer sem destruir. São Paulo: Vértice, 1986. SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 3. ed. Rio de Janeiro - São Paulo: Record. 2000. 152 SINGER, Paul. Dinâmica populacional e desenvolvimento: o papel do crescimento populacional no desenvolvimento econômico. 4. ed. São Paulo: Hucitec. 1988. SOUZA, Celina. Políticas Públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, 2006. TIRONI, Luis Fernando(dir.). Industrialização descentralizada: sistemas industriais locais. Brasília: IPEA, 2001. TOLOSA, Hamilton C. Política urbana e distribuição de renda. In: TOLEDO, Ana Helena Pompeu de; CAVALCANTI, Marly (org.) - Planejamento Urbano em Debate. São Paulo: Cortez e Moraes, 1978. p.19-46. TRIVIÑOS, Augusto N. S. Metodologia da pesquisa em ciências sociais. São Paulo: Atlas, 1990. TUR, Joan Noguera; GARRIDO, M.D. Pitarch; PÉREZ, Javier Esparcia(coords.). Gestión y promoción del desarrollo local. Valencia:. Univ.Valencia.2006. VIEIRA, R.O.C. Os programas de desenvolvimento integrado e sustentável das mesorregiões diferenciadas: a materialização de um novo paradigma no desenvolvimento regional brasileiro. VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8-11 Oct. Disponível em: http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/CLAD/clad0044406.pdf. Acesso: 20 jan. 2009. YIN, R. K. Case study research: design and methods. London: Sage, 1984. i Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da UNI-FACEF- Centro Universitário de Franca – Franca/SP - Brasil, sob a supervisão da Profa. Dra. Melissa F. C. Bandos CEP 14.401-135. e.mail: [email protected] ii Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da UNI-FACEF Centro Universitário de Franca – Franca/SP.