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DESENVOLVIMENTO REGIONAL: implicações da exportação na
geração de trabalho e renda na Cidade de Franca/SP
André RUWERi - UNIFACEF
Melissa Franchini Cavalcanti BANDOS ii- UNIFACEF
1. INTRODUÇÃO
A constatação de que o atual modelo de crescimento econômico gerou
desequilíbrios nas esferas ambiental e social global, originando um processo
constante de debates entre os políticos e a comunidade científica de todo o mundo
sobre alternativas de desenvolvimento. Concretiza-se assim a busca da equidade e
justiça social por meio da materialização de uma nova forma de desenvolvimento
que assegure a permanência e a continuidade das conquistas e avanços na
qualidade de vida e na estrutura econômica atual e que evite, ou minimize as
agressões às condições ambientais que tendem a provocar, no futuro, o
estrangulamento das possibilidades de desenvolvimento e comprometimento da
qualidade de vida da população.
Neste contexto, o desenvolvimento aparece como um fenômeno complexo,
com inferências econômicas, sociais, políticas e culturais (TOLOSA,1978), mas,
embora dependa do crescimento econômico, o desenvolvimento não pode ser
considerado
simplesmente
como
sinônimo
de
crescimento
econômico
(MARTINELLI, 2004), avaliado apenas como um processo de expansão quantitativa
do produto e da renda, e sim como uma transformação qualitativa da sociedade, na
mudança de suas características. Sachs (1986, p.110) resume: o Desenvolvimento
Sustentável é “[...] socialmente desejável, economicamente viável e ecologicamente
prudente”.
Historicamente, o desenvolvimento resulta de transformações estruturais
que, por sua vez, são conseqüência de movimentos cumulativos de recursos
138
técnicos, materiais e humanos de uma sociedade (BUARQUE, 1994). Da mesma
forma, também na era da globalização, “(...) o espaço geográfico ganha novos
contornos, novas características, novas definições” (SANTOS, 2000, p. 79),
deixando de ser considerado apenas o suporte físico das atividades e dos processos
econômicos para representar a valorização dos “(...) territórios e as relações entre os
atores sociais, suas organizações concretas, as técnicas produtivas, o meioambiente e a mobilização social e cultural” (MARTINELLI, 2004, p.7).
Assim, as exigidas mudanças de orientação e novas formas de produção
realizam-se pela fragmentação territorial, onde “(...) renascem as identidades
culturais e políticas nos níveis local e regional” (COELHO apud MARTINELLI, 2004,
p. 1) impulsionando a atenção para estratégias de desenvolvimento no próprio nível
local e regional (MARTINELLI, 2004, p. 1). Perspectiva em que Albuquerque (1996)
salienta que a identidade própria de cada território se converte em sustentação de
seu desenvolvimento produtivo:
A proximidade dos problemas, necessidades, recursos e atores sociais
locais permite, [...] formular políticas mais realistas e, sobretudo, baseadas
no consenso com tais atores. Igualmente, se abre a possibilidade de
promover a criação negociada de instituições de fomento produtivo
empresarial em nível local, de gerar um clima de confiança e cooperação
entre entidades públicas e o setor privado empresarial e de estimular assim
uma cultura local de desenvolvimento (ALBUQUERQUE, 1996, p.3-4).
Deve-se
então
buscar
complementar
o
esforço
das
políticas
macroeconômicas com políticas dirigidas aos níveis micro e mesoeconômicos,
alcançando, por essas medidas, uma mudança de atitude frente a um enfoque onde
antes se privilegiava a atração de recursos externos; ou centrada basicamente em
grandes grupos, voltando-se às possibilidades e iniciativas de desenvolvimento
econômico endógeno, onde “(...) é possível aproximar-se das circunstâncias e
características concretas dos diversos territórios ou regiões e formular políticas e
instrumentos de fomento produtivo e modernização tecnológica e empresarial, mais
ajustados ao perfil específico de cada zona” (ALBUQUERQUE, 1996, p.5).
Dessa forma, surgem as propostas de Desenvolvimento Regional (DR), como
resultado da ação articulada dos diversos agentes sociais, políticos e econômicos,
públicos ou privados, do município ou região, voltada ao alcance de um objetivo
139
comum, pela construção de um projeto estratégico orientador de suas ações em
longo prazo (MAGALHÃES e BITTENCOURT, 1997).
Com relação à presença do Estado, com suas “Políticas Públicas”, a fim de
tornar suas ações e participação efetiva, surge um novo conceito no estudo das
políticas públicas, que é a ciência regional.
Segundo Martinelli e Joyal (2004), a ciência regional destaca princípios
fundamentais que justificam o uso do planejamento regional, e que permitem avaliar
as reformas governamentais, que foram tomadas no intuito de melhorar o cotidiano
dos usuários dos serviços:
- princípio da democracia: respeito pelos gostos e preferências da
população e participação desta nas tomadas de decisão;
- princípio da justiça social: correção de disparidades regionais e respeito
pelas identidades culturais;
- princípio da eficácia econômica: melhor conhecimento dos recursos a
serem explorados a serem renovados, e adaptação das políticas nacionais
a realidade da região;
- princípio de coerência administrativa: visão global da região a ser
desenvolvida e melhor integração do setor privado nas orientações
estratégicas e nas ações do setor público (MARTINELLI E JOYAL,
2004).
Dentro do principio de coerência administrativa, se faz necessária à
intervenção do estado sobre as ações das empresas privadas, no intuito de
preservar o bem-estar social, procurando direcionar ações de longo prazo, para o
beneficio da comunidade.
Deve-se atentar às mudanças de cenário, e em tempos atuais, essa mudança
esta produzindo efeitos que nunca ocorrem antes. Em primeiro lugar, vive-se em
uma era de descontinuidade. No passado, a experiência representava uma base
aceitável para se prescrever como seria o futuro. O amanhã era uma projeção e
extrapolação das tendências de ontem. Bastava conhecer os dados históricos
passados para se prever o comportamento futuro. Essa continuidade nas relações
de causa e efeito, que caracterizou a era industrial, já não acontece mais na era da
informação. Desde o inicio da década de 1970, quando o mercado financeiro viu
quadruplicar o preço do petróleo, os choques econômicos passaram a impor
contínuos impactos e mudanças nas organizações.
140
O mercado vive a era da ruptura. As empresas precisam se defender de seus
concorrentes tradicionais e dos novos concorrentes, que surgem com ideais novas e
com organograma mais enxuto. As empresas precisam reorganizar e replanejar o
trabalho de seus empregados, para continuarem viáveis e competitivas, na qual
surge um repertório de mudanças, entre elas: mudança no propósito da
organização, nos produtos/serviços, nas tecnologias utilizadas, na estratégia, na
estrutura, na cultura, nas tarefas ou processos internos e nas pessoas.
Segundo DUPAS (1999) o impacto das novas cadeias de produção sobre os
empregos globais varia conforme uma série de fatores: a acomodação de cada país
dentro da cadeia produtiva; a forma de entrada do investimento direto estrangeiro;
tipo de cadeia; substituição ou não de produção local; e complementação de
investimentos domésticos, contribuindo para o crescimento da produção ao desfazer
gargalos financeiros, tecnológicos e administrativos locais. A maioria das nações
optou então, pela filosofia do mercantilismo, onde uma nação para se rica e
poderosa necessitava exportar mais do importava.
Dentro do conceito de liberalismo que da ao comerciante a opção de escolher
sua base econômica e efetuar transações comerciais com quem bem entender,
surgem
os
consumidores
estrangeiros
que
buscam
complementar
suas
necessidades internas com produtos e serviços de qualquer região do planeta, sem
a intervenção do Estado, principalmente no que diz respeito a barreiras
alfandegárias.
Segundo RIFKIN (2004) vive-se em um mundo de contrastes cada vez
maiores. Agiganta-se o espectro da cintilante sociedade “High-tech”, com
computadores e robôs canalizando esforço para um fluxo de sofisticados e novos
produtos e serviços.
Na era da informação, máquinas que dão a sensação de
controle sobre o ambiente, nada lembram das fábricas mal iluminadas da revolução
industrial inglesa.
Neste contexto, de reorganização e replanejamento, surge o fantasma o
desemprego, que pode ocorrer devido à recessão econômica, ao crescimento
econômico menor que o crescimento demográfico, novas tecnologias que
dispensam mão-de-obra e a políticas econômicas governamentais ou do setor
141
privado inadequadas, sendo que dependendo da formação profissional, será mais
fácil ou difícil a sua volta ao trabalho, e que de acordo com CALDAS (1999), acaba
trazendo reflexos negativos das mais diversas ordens, e que tem forte tendência a
serem nocivas às pessoas, praticamente em qualquer dimensão que se escolha
estudar.
A troca de mercadorias entre os homens é uma atividade que vem desde os
primórdios da humanidade, e que naturalmente deixou de ser artesanal e se tornou
uma atividade econômica complexa, e que trouxe grandes benefícios sociais e
econômicos dentre os quais: ampliação dos mercados consumidores, acesso a
maior diversidade de fornecedores, mercadorias, novas tecnologias e contato entre
povos e etnias.
Por outro lado, aqueles que crêem que o excesso de desenvolvimento do
comércio internacional pode gerar dependência entre os países, afetando até
mesmo sua soberania, trazendo malefícios tais como: desenvolvimento assimétrico
entre os países, concentração em atividades que apresente maior retorno financeiro
em
termos
de
produtividade
ou
tecnologia,
destinando
aos
paises
em
desenvolvimento produtos de menor valor agregado ou ainda, o desenvolvimento
em apenas alguns setores da economia, em detrimento a outros.
Segundo DIAS (2007) o conceito de liberalismo tem-se expressado através da
liberdade oferecida ao comerciante de escolher a base da sua atividade econômica
e executá-la com quer que seja, sendo que o grande elemento do liberalismo reside
na iniciativa individual, em que cada indivíduo em uma sociedade pode buscar
desenvolver a atividade que mais lhe interessar, obtendo com isso os meios para
seu sustento.
Neste cenário, como um paradigma do desenvolvimento regional e, ao
mesmo tempo contribuindo de forma decisiva para acelerar o seu crescimento,
termos como clusters1, arranjos produtivos locais, aglomerados de empresas, redes
de empresas, consórcios de empresas, parques tecnológicos, distritos industriais,
1
Porter (1998, p. 209-213), um dos teóricos sobre Cluster, aponta que os mesmos "(...) são concentrações geográficas de
companhias e instituições num setor específico. Os Clusters englobam uma gama de empresas e outras entidades importantes
para a competição, incluindo, por exemplo, fornecedores de matéria-prima, componentes, maquinários, serviços e instituições
voltadas para o setor. Podem se estender verticalmente e horizontalmente na cadeia produtiva”.
142
são utilizados mais largamente, merecendo destaque em estudos e estratégias de
desenvolvimento e políticas de atuação microrregional.
Estes termos têm lugar na cidade de Franca, no Centro Oeste do Estado de
São Paulo, onde se instalou, desde o final do século XIX, cluster voltado para o setor
calçadista, com a aglomeração das atividades econômicas de forma que a
industrialização influenciou e ainda influencia as condições sociais e econômicas da
população – por definição, os clusters fornecem condições de ambiente tecnológico
e mercadológico que faz com que as empresas sobrevivam mais tempo quando
estão unidas dentro desses pólos do que individualmente.
Segundo Tironi (2001) a importância dos Clusters industriais tem sido
enfatizada por análises que se encontram na fronteira entre a literatura de
Organização Industrial e os estudos de Economia Regional.
A cadeia produtiva de calçados se compõe de uma ampla especificidade de
indústrias, que se completam no produto final, que é o calçado. Para esta realização,
são utilizados sistemas produtivos diferentes, mas que representam parte de um
todo maior. É a importância dessas partes que faz surgir à sinergia entre elas
(indústrias, instituições e prestadoras de serviços), uma vez que a competitividade
atual do mercado pressiona as indústrias a proporcionar algo mais, por meio do
desenvolvimento de melhores níveis de desempenho pelos integrantes do setor.
2. FORMAÇÃO ECONÔMICA
A história econômica brasileira foi marcada pelas etapas cíclicas da
exploração de recursos naturais até praticamente, meados do século XX com o fim
da II grande guerra. Esses ciclos, iniciados com o próprio descobrimento
sucederam-se no início da colonização: pau-brasil, o açúcar e o ouro. A ausência de
riquezas de metais preciosos ou especiarias, nos três primeiros séculos, logo
deixaram a colônia brasileira em visível desvantagem com o império da Índia. As
limitações econômicas iriam afetar o próprio fluxo humano da colonização, uma vez
que a cobiça favorecia as terras do Oriente, abertas ao saqueio e à expropriação
143
pela violência, ou pelos termos vantajosos de comércio de mercadorias cobiçadas
pela Europa. Os produtos agrícolas brasileiros, em sua maioria, transitavam por
Portugal que se limitava aos benefícios da reexportação, sem recursos para
manufaturá-los. O destino final era a Inglaterra e Holanda, nações que já rumavam à
revolução industrial, com os ganhos advindos da expressão colonial.
A intenção deste artigo é demonstrar a situação das cidades de Franca (SP) e
Igrejinha (RS), situadas em regiões geográficas diferentes, com populações
distintas, porém ambas com cluster voltados à indústria de calçados e analisar a luz
do direito ao desenvolvimento, que foi concebido no âmbito dos direitos dos povos e
consagrado pela Carta Africana do Direitos Humanos e dos Direitos dos Povos,
aprovada na 18ª Conferência de Chefes de Estado e Governo, reunida no Quênia
em 1981, onde consta em seu artigo 22 que:
“1. Todos os povos têm direito ao desenvolvimento econômico,
social e cultural, no devido respeito à sua liberdade e
identidade, e na igual fruição da herança comum da
humanidade.
2. Os Estados têm o dever de assegurar, individual ou
coletivamente, o exercício do direito ao desenvolvimento”.
O artigo apresenta no seu quadro 01, somente para situar o leitor, dados dos
municípios analisados, tais como população, Indice de desenvolvimento humano e
quantidade de indústrias de calçados. Cabe salientar que no IDH estão
equacionados três sub-índices direcionados às análises educacionais, renda e de
longevidade de uma população. O resultado das análises educacionais é medida por
uma combinação da taxa de alfabetização de adultos e a taxa combinada nos três
níveis de ensino (fundamental, médio e superior). Já o resultado do sub-índice renda
é medido pelo poder de compra da população, baseado pelo PIB per capita ajustado
ao custo de vida local para torná-lo comparável entre países e regiões, através da
metodologia conhecida como paridade do poder de compra (PPC). E por último, o
sub-índice longevidade tenta refletir as contribuições da saúde da população medida
pela esperança de vida ao nascer.
Quadro 01 – Características de Franca (SP) e Igrejinha (RS).
144
Franca (SP)
Igrejinha (RS)
População (2000)
287.400
26.767
IDH (2000)
0,820
0,822
Industrias de Calçados
1000
760
Fonte: dados da pesquisa
Em Franca, a fabricação de calçados remonta os anos 1850. Naquela época,
o local servia de descanso para os viajantes (tropeiros) que aproveitavam a estadia
para fazer reparos em arreios, botinas, polainas e sapatos, todos de couro. Ao longo
das décadas, o desenvolvimento foi tão acentuado que Franca passou a ser
conhecida mundialmente como Capital do Calçado Masculino. Produz anualmente
em torno de 26 milhões de pares, sendo que 85% são para o público masculino. Das
760 indústrias de calçados, estima-se que em torno de 550 são microempresas, 130
são de pequeno porte, 65 são de tamanho médio e 13 são grandes fabricantes. São
empregados 27,5 mil trabalhadores, que atuam de modo artesanal para colocar nos
mercados nacional e internacional sapatos de alto valor agregado.
A cidade transformou-se em um dos principais pólos calçadistas do país e o
maior núcleo exportador de calçados masculinos. A presença da indústria de
calçados atraiu curtumes, indústrias de borracha, de processamento de couros e de
colas, formando um cluster de calçados, em Franca e municípios vizinhos.
A indústria calçadista de modo geral, vem passando por transformações
significativas no seu padrão de concorrência, com destaque para a perda relativa da
importância do baixo custo salarial como determinante da competitividade do setor,
em favor de fatores como qualidade, design e prazos de entrega (Garcia, 1996) –
isto também se aplica ao Cluster de Franca.
O setor calçadista de Franca está inserido no mercado internacional, sendo
este um dos indicadores da competitividade do setor. Contudo, existe um
comportamento bastante irregular das exportações dos produtores locais, seja
porque em momentos de retração de demanda doméstica as empresas locais
procuram compensar elevando as vendas ao mercado externo; seja pelas variações
145
da política cambial com relação às exportações. E, mais recentemente, cenário
também foi bastante atingido por reflexos da crise imobiliária americana (2008).
Do outro lado, temos a cidade de Igrejinha que teve como primeiros
habitantes os Índios Caingangues. Em 1824 desembarcou, às margens do Rio dos
Sinos, o primeiro grupo de imigrantes alemães, fixando-se em São Leopoldo.
No ano de 1847, Tristão José Monteiro (que fundara em 1846, Taquara do
Mundo Novo), chegou a esta altura do vale para proceder à demarcação dos lotes
de terra que venderia, a seguir, a colonos e imigrantes. Fundou vários grupos,
dentre eles o núcleo da “Casa de Pedra”. Esta denominação vem do fato de Tristão
Monteiro ter ali construído uma grande casa de alvenaria, a primeira e única do vale,
a qual, em alemão, se chamava “Stein Haus”, onde foram instalados a capatazia e o
armazém de abastecimento dos primeiros colonos e do pessoal que procedia a
mediação das terras dessa região.
Todo o vale fazia parte da fazenda que Tristão Monteiro adquiria. Ele nutria
grandes planos de colonização, procurando atrair sempre um maior número de
colonos, concedendo, por isso, facilidades para a venda dos lotes de terra em várias
parcelas de pagamentos. As terras eram excelentes, todas cobertas de mato
espesso, embora bastante montanhosas, pois, se estendiam até a encosta da serra.
Eram ricas em madeira de lei e fauna.
Posteriormente, colonos alemães vindos de São Leopoldo e diretamente da
Alemanha, em sua maioria da região de Hunsrück (ao sul da Alemanha, divisa com
França e Suíça), fixaram-se nessa colônia, espalhando-se aos poucos pelas
margens do rio, rumo ao norte.
3. NECESSIDADE DE POLÍTICAS DE GERAÇÃO DE
TRABALHO E RENDA
Os recentes acontecimentos econômicos, em especial a crise do setor
imobiliário americano, lançaram dúvidas sobre o modelo e seguir, já que evidenciou
146
a necessidade de uma presença maior do Estado na sociedade e que não existe um
modelo único nem preestabelecido de desenvolvimento a ser seguido. No entanto, a
agenda social brasileira tem abordado expressivamente a questão do desemprego,
principalmente a partir da década de 1990, quando as orientações governamentais
de política econômica estiveram centradas na busca da estabilidade financeira e no
ajuste estrutural do Estado, e originaram uma abertura comercial indiscriminada, na
manutenção artificial até meados de 1999 de taxas de câmbio sobrevalorizadas, e
na desregulamentação crescente do mercado de trabalho (Demeter, 2001). Ao
mesmo tempo, observou-se a retirada progressiva do Estado, enquanto agente ativo
na promoção de políticas públicas sociais, e à abdicação, por parte deste mesmo
Estado, do exercício da regulação de mercados setoriais. Resultando num conjunto
de mudanças estruturais que, conforme Singer (1988, p.7): “tem sido a elevação do
desemprego e do subemprego em todas as suas formas e o agravamento da
exclusão social”.
O agravamento dos níveis de desemprego faz proliferar na atualidade
nacional e internacional, os debates em torno do pensar e fazer político, econômico
e social. Da mesma forma, são impostas revisões nesta concepção de que o Estado
pouco ou nada tem a fazer em termos de promoção ativa do emprego (DEMETER,
2001). Um item que notadamente permeou as recentes formulações governamentais
e da sociedade civil, sobre políticas públicas de geração de trabalho e renda no
Brasil, foi a constituição de prioridades como o combate à pobreza e à desigualdade
social, aliado à busca de alternativas e melhorias na distribuição de renda.
Com o avanço dos processos de descentralização política e a transferência
de funções, recursos e faculdades aos governos locais e regionais, incorporam-se a
estes as funções de formulação e execução de políticas de fomento produtivo e
geração de emprego, e também o fomento e a instituição de novas formas de
regulação com o setor privado empresarial e o restante da sociedade local, para
assim, responder, mais eficientemente aos atuais desafios do ajuste produtivo e
concretizar uma posição capaz de atingir uma mais ampla difusão do crescimento
econômico em todas as regiões, além do comprometimento, de forma consistente e
não só assistencial, com os objetivos de equidade e superação da pobreza
(ALBUQUERQUE, 1996).
147
Contribuindo ao debate sobre o que deve ser feito para combater a
desigualdade, a pobreza e a exclusão social, que se revelam como os principais
problemas ligados ao Desenvolvimento Sustentável, Singer (1998, p. 62-63) afirma
considerar:
[...] como dever do Estado a promoção de um processo público de inclusão
social, sustentando e treinando os desempregados, financiando e assistindo
de diversas maneiras a pequenas empresas ou comunidades de trabalho,
redistribuindo terras subutilizadas entre os camponeses, etc..
Azeredo (1998) analisou experiências de políticas públicas de emprego em
vários países ao longo dos anos 90, e constatou como tendência em todo o mundo
desenvolvido e nos países periféricos, a necessidade de uma política governamental
que atue diretamente sobre o mercado de trabalho, no sentido de maximizar a oferta
de emprego, dada a restrição macroeconômica e o contexto institucional (salário
mínimo, relações capital-trabalho, entre outros). Sua conclusão expressa que as
políticas públicas:
[...] têm um importante papel a cumprir em termos de socialização e
integração dos excluídos do mercado de trabalho, de preservação da
qualificação da força de trabalho desocupada, de geração de atividades á
margem do setor moderno da economia, mas capazes de garantir a
sobrevivência de indivíduos e comunidades, e em alguns casos de elevação
dos padrões de organização e consciência social e, portanto, de cidadania
(AZEREDO, 1998, p.43).
A dependência dos municípios citados, na indústria calçadista, submetendose ao mercado externo e assim sujeitando-se às variações desse mercado,
conforme o quadro 02 (apresentado na seqüência), cria em determinado momento
uma massa de desempregados destinada à marginalização.
Verifica-se nas linhas que representam os municípios, grandes variações na
sua produção industrial, a qual é concentrada em um único setor, que é calçadista,
em comparação com a “média Brasil”.
148
Quadro 02: Variações da industria
70
60
50
40
Franca
30
Brasil
Igrejinha
20
10
0
1999
-10
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
Fonte: dados da pesquisa.
Buscando uma comparação com a realidade brasileira, se faz urgente
medidas que zelem por uma existência de uma fonte de recursos sólida,
inteiramente destinada a uma política de emprego, que tenha condições de acolher
a massa de desempregados oriunda do setor calçadista, com a criação de políticas
ativas a fim de migrar a mão de obra desse setor para outros, diversificando a
produção local e colocando o país em igual ou melhor posição que muitas
economias desenvolvidas, no que diz respeito ao emprego sazonal.
Analisando a literatura internacional sobre o tema Políticas de Emprego,
Ramos (2003, p.15-18) apresenta dois tipos de instrumentos ou medidas: as
passivas e as ativas, caracterizadas no quadro 03:
Quadro 03 – Caracterização das Políticas de Emprego
CARACTERIZAÇÃO DAS POLÍTICAS DE EMPREGO
POLÍTICAS PASSIVAS
POLÍTICAS ATIVAS
Ações que tendem a tornar mais tolerável Ações que visam exercer um efeito
a condição de desempregado, o objetivo positivo sobre a demanda de trabalho,
é assistir financeiramente o trabalhador
geralmente atuando sobre o contingente
desempregado ou reduzir o excesso de
de trabalhadores.
oferta de trabalho.
EXEMPLOS
EXEMPLOS
149
Seguro-desemprego
Extensão dos ciclos escolares
Aposentadoria precoce
Formação e reciclagem profissional
Intermediação de mão-de-obra
Apoio à micro e pequenos
empreendimentos
Expulsão de imigrantes
Subsídios à contratação de uma
determinada população-alvo
Criação de empregos pelo setor público
Fonte: elaborado pela pesquisa, a partir de Ramos (2003).
O autor defende a necessidade de um diagnóstico que fundamente as
políticas públicas de emprego, uma vez que elas surgem como uma resposta a um
determinado problema. No caso do Brasil, pela heterogeneidade, não se pode falar
em “mercado de trabalho”, mas sim em “mercados de trabalho” e, desta forma, os
diagnósticos devem ser locais e as políticas, baseadas nestes diagnósticos, deverão
conseqüentemente ter um caráter local: “[...] cada estado ou região deveria ter um
diagnóstico sobre seu mercado de trabalho identificando seus problemas e, a partir
dele, desenhar a estratégia de intervenção pública” (RAMOS, 2003, p.24).
Num contexto de elevados índices de desemprego, destacam-se alternativas
e emergem algumas experiências de políticas comprometidas com a promoção do
desenvolvimento econômico e social, orientadas para a geração de trabalho e renda,
e; principalmente aquelas voltadas para setores sociais de baixa renda;
marginalizados no núcleo central do processo produtivo da economia regional. Uma
dessas propostas concretizou-se em 1994, com o acordo que criou o Programa de
Apoio à Geração de Emprego e Renda em Áreas de Pobreza – PRONAGER
Nacional.
Dentre as alternativas pode-se citar o exemplo dos Programas de Geração de
Emprego e Renda como o de Quixadá (70 mil habitantes), no sertão central do
Ceará, selecionado em 1996 pelo Programa Gestão Pública e Cidadania (FGV –
Fundação Ford). Os resultados do programa apontaram para mudanças na cultura
política e modificação na relação dos cidadãos com os órgãos públicos. Segundo o
programa, ao oferecer orientação, capacitação e pequenos financiamentos foi
possível a promoção da dignidade dos cidadãos enquanto trabalhadores e
produtores de riqueza, numa demosntração de que é possível a atuação efetiva dos
150
governos municipais na geração de trabalho e renda. Os passos fundamentais
foram: o apoio à organização e capacitação profissional, o acesso ao crédito e a
conquista de parcerias, a organização dos produtores e sua qualificação para
atuação no mercado, a organização de cooperativas e a participação de
associações e da comunidade ativamente (VAZ e BARGIERI, 1996).
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i
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da UNI-FACEF- Centro
Universitário de Franca – Franca/SP - Brasil, sob a supervisão da Profa. Dra. Melissa F. C. Bandos
CEP 14.401-135. e.mail: [email protected]
ii
Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da UNI-FACEF Centro Universitário de Franca – Franca/SP.
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