Topografia I Profa. Andréa Ritter Jelinek 1 Capítulo I GENERALIDADES 1. Conceitos Fundamentais Definição: a palavra “Topografia” deriva das palavras gregas “topos” (lugar) e “graphen” (descrever), que significa a descrição exata e minuciosa de um lugar. Diferença entre Geodésia e Topografia: A Topografia está inserida na Geodésia, utilizam métodos e instrumentos semelhantes, porém, a Geodésia se preocupa com a forma e dimensões da Terra, enquanto a Topografia se limita a descrição de área restritas da superfície terrestre. Apesar de a superfície terrestre ser bastante irregular, formada de depressões e elevações, é possível considerá-la regular em face da reduzida dimensão destes acidentes em relação ao raio da Terra, uma vez que a máxima depressão ou elevação é inferior a 10 km, desprezível ante a extensão do raio médio da Terra, aproximadamente igual a 6.371 km. Nestas condições, em primeira aproximação, a superfície terrestre pode ser considerada como a superfície de nível médio dos mares - supostamente prolongada sob os continentes e normais em todos os seus pontos à direção da gravidade - superfície esta denominada de GEÓIDE. Tendo em vista a impossibilidade de ser determinada a equação analítica representativa desta superfície, adotou-se como forma da Terra a de um elipsóide de revolução girando em torno do seu eixo menor, dito ELIPSÓIDE TERRESTRE, que é definido por: SEMI-EIXO MAIOR = a ACHATAMENTO: A = (a – b) / a Figura 1.2 Topografia I Profa. Andréa Ritter Jelinek 2 Elipsóide internacional de referência (Hayford, 1924): a = 6.378.388 m b = 6.356.912 m A = 1 / 297 R = (2a + b) / 3 = 6.371.220 m É sob este conceito de forma da Terra que a GEODÉSIA trabalha nos estudos que exigem maior rigor matemático. A TOPOGRAFIA por sua vez, que considera trechos de dimensões limitadas, admite a superfície terrestre como plana, o que corresponde a desprezar a curvatura da Terra. Assim sendo, a GEODÉSIA e a TOPOGRAFIA têm os mesmos objetivos, diferindo nos fundamentos matemáticos em que se baseiam: a geodésia apoiada na trigonometria esférica e a topografia, na trigonometria plana. 2. Objetivos da Topografia A Topografia tem por finalidade determinar o contorno, dimensão e posição relativa de uma porção limitada da superfície terrestre, do fundo dos mares ou do interior de minas, desconsiderando a curvatura resultante da esfericidade da Terra. Compete ainda à Topografia a locação no terreno de projetos elaborados de Engenharia. Divisões da Topografia: • PLANIMETRIA: medida de grandezas lineares e angulares em um plano horizontal; • ALTIMETRIA: medida de grandezas lineares e angulares em um plano vertical 3. Influência da forma e dimensões da Terra nos levantamentos topográficos 3.1. Introdução Por levantamento topográfico pode-se entender como sendo o conjunto de operações que tem por objetivo a determinação da posição relativa de pontos na superfície da Terra ou a pouca altura da mesma. Essas operações consistem, essencialmente, em medir distâncias verticais e horizontais entre diversos pontos, determinar ângulos entre alinhamentos e achar a orientação destes alinhamentos. Complementando essas operações tem-se o cálculo das observações permitindo determinar distâncias, ângulos, orientações, posições, alturas, áreas e volumes. Com os dados de campo, depois de calculados, pode-se representar graficamente, na forma de mapas, perfis longitudinais e transversais, diagramas entre outros. A execução de um levantamento topográfico, além da necessidade de se conhecer os instrumentos utilizados nas medições requer conhecimentos Topografia I Profa. Andréa Ritter Jelinek 3 de geometria, trigonometria plana e esférica, física, astronomia e teoria dos erros e sua compensação. Nos levantamentos topográficos parte-se do princípio que a Terra é plana e, por isso, os cálculos são essencialmente fundamentados na geometria Euclidiana e na trigonometria plana. Como a Terra não é plana, torna-se necessário verificar a sua influência nos levantamentos topográficos. 3.2. Forma e dimensão da Terra Geodésia é a ciência que estuda a forma e dimensão da Terra. Em termos de geometria, a atual superfície do Planeta é complexa. Vastas áreas (71% de sua superfície total) são tomadas pelos oceanos e depressões marítimas que podem atingir até 11.000 m de profundidade. A Terra pode caracterizar cordilheiras, montanhas, gargantas sinuosas e profundas, planícies, vales de rios e desfiladeiros. Algumas montanhas são muito altas, por exemplo, a altitude do Monte Everest é de 8.848 m. A elevação média da Terra sobre o nível do mar é de 875 m. Uma idéia generalizada da forma da Terra pode ser obtida pelo uso do conceito de uma “superfície de nível”. O fio de prumo oscilante assumirá a posição da vertical verdadeira devido à força da gravidade. Pela mesma razão uma superfície de água é horizontal e a linha de prumo verdadeira será perpendicular a esta superfície. Uma grande quantidade de superfícies de nível pode ser imaginada. Em topografia, especial importância é atribuída para a superfície de nível que coincide com o nível médio do mar, o nível de uma superfície de água inanimada dos oceanos do mundo. Esta superfície fechada e supostamente contínua, inclusive penetrando nos continentes, é perpendicular à direção da gravidade em qualquer ponto e é chamada de Superfície Datum ou simplesmente Datum. As direções da gravidade são função da distribuição das densidades das rochas que formam a crosta terrestre. As rochas estão distribuídas de forma variável na crosta terrestre. Por esta razão, a superfície Datum (geóide) que é ortogonal em qualquer ponto à linha de prumo verdadeira apresenta uma forma complexa e irregular. Quando se determina a forma geométrica de objetos procura-se, usualmente, compará-los com sólidos geometricamente regulares. A mesma analogia é seguida na geodésia para determinar a forma e tamanho da Terra. A partir de premissas teóricas e observações atuais, a Terra tem, em geral, uma forma que pode ser aproximada a um elipsóide de revolução cuja superfície pode ser calculada usando fórmulas exatas e é matematicamente bem conhecida. A União Geodésica e Geofísica Internacional já definiu o Sistema de Referência GRS80 (Geodetic Reference System, 1980), o qual adota o elipsóide de parâmetros: a (semi-eixo maior) = 6.378.137 m e α (achatamento) = 1 / 298,257 O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, responsável pela geodésia do Brasil, ao estabelecer o Sistema Geodésico Brasileiro, adotou a partir de 2005, como sistema de referência geocêntrico para as Américas, o SIRGAS 2000. Topografia I Profa. Andréa Ritter Jelinek 4 3.3. Influência das medidas lineares nos levantamentos topográficos A topografia é o conjunto dos princípios, métodos, aparelhos e convenções utilizados para a determinação do contorno, das dimensões e da posição relativa de uma porção limitada da superfície da Terra, do fundo dos mares ou do interior das minas. Compete, ainda, à topografia a locação no terreno de projetos elaborados. O topógrafo no desempenho de suas funções deve ter presente as seguintes superfícies: (a) a superfície da Terra ao longo da qual são realizadas as operações de medição; (b) o geóide que é simplesmente uma determinada superfície equipotencial do campo da gravidade; ao qual estão referidas as altitudes ortométricas. Nos continentes e ilhas acha-se no interior da crosta; e (c) a superfície do modelo geométrico, às vezes denominado de superfície de referência e sobre a qual são efetuados os cálculos geodésicos; na esmagadora maioria das vezes é o elipsóide de revolução. Na topografia, essa superfície é o plano sobre o qual o topógrafo faz os cálculos usando em essência, a geometria Euclidiana e a trigonometria plana. Não sendo a Terra plana, torna-se necessário avaliar o erro que se comete quando na topografia se faz uso do plano para os cálculos geométricos e trigonométricos dos levantamentos topográficos. Nas medidas lineares, deve-se considerar o caso de redução dessa distância para a superfície elipsoidal e, depois, a redução da distância elipsoidal para o plano de projeção topográfica. A redução da medida da distância para a superfície elipsoidal é dada por: So = S.R / R + H onde: So é a distância reduzida à superfície elipsoidal; S é a distância horizontal medida entre dois pontos do terreno; R é o raio da Terra, admitida esférica (na ordem de 6.371 km); e H é a altitude geométrica média da distância medida. Alguns autores nacionais apresentam a redução de distância ao geóide. Não é a forma mais correta, visto que, o geóide não é uma superfície de cálculo, mas sim, o elipsóide. Por outro lado, talvez se deva ao fato da dificuldade em obter-se as altitudes geométricas, pois, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística fornece as altitudes ortométricas. Entretanto, existe uma carta geoidal do Brasil, da qual se poderia obter a ondulação geoidal por interpolação gráfica e calcular a altitude geométrica. 3.3.1. Planimetria Pretende-se avaliar agora a diferença que existe quando se faz a redução da distância elipsoidal (para o plano de projeção topográfico). Topografia I Profa. Andréa Ritter Jelinek 5 Figura 1.2 Da Fig. 1.2 do triângulo retângulo A1OB1, tira-se: tg α = do / R (1.1) onde: do é a distância no plano de projeção topográfico; e α é um ângulo central. Como α é muito pequeno, podemos desenvolver em série de potência tg α e desprezando as parcelas superiores às de 3ª ordem, tem-se: tg α ≈ α + α3 / 3 + ... que substituindo na equação (1.1), obtém-se: α + α3 / 3 = do / R (1.2) mas α = So / R quando α for expresso em radianos, portanto, substituindo na equação (1.2), obtémse: So / R + So3 / 3.R3 = do / R ou do - So = So3 / 3.R2 (1.3) em que do - So representa exatamente a diferença que existe quando se faz a redução da distância elipsoidal para o plano de projeção topográfico. Torna-se necessário avaliar até onde se pode realizar um levantamento planimétrico de maneira que a influência da curvatura terrestre possa ser desconsiderada. Reescrevendo a equação (1.3), tem-se: do - So = ∆S = So3 / 3.R2 (1.4) ou, ainda, ∆S / So = So2 / 3.R2 (1.5) Topografia I Profa. Andréa Ritter Jelinek 6 Considerando R ≈ 6.371 km e alguns valores para So, então, com as expressões (1.4) e (1.5) pode-se calcular os valores da diferença ∆S e do erro relativo ∆S / So conforme se pode ver na Tab. 1.1: Tabela 1.1: ∆S (m) 0,01 1,03 8,21 So (km) 10 50 100 ∆S / So 1:1.000.000 1:48.500 1:12.000 Com a expressão (1.5) pode-se determinar o erro relativo da influência da curvatura terrestre nas distâncias medidas na superfície terrestre e depois reduzidas ao elipsóide. Assim, conhecendose a exatidão que se deseja no levantamento topográfico, pode-se estabelecer como sendo 10 km, 50 km, 100 km ou outro valor qualquer a extensão máxima do levantamento planimétrico sem levar em consideração a curvatura terrestre. 3.3.2. Altimetria Considerando-se, ainda, a Fig. 1.2 pode-se dizer: ___ ∆h = BoB - B1B (1.6) Por outro lado, considerando o triângulo retângulo A1OB1 da Fig. 1.2 e aplicando a este o teorema de Pitágoras, obtém-se: (R + ∆h)2 = R2 + do2 (1.7) que desenvolvendo chega-se a: R2 + 2.∆h.R + ∆h2 = R2 + do2 ou, ∆h2 + 2.∆h.R = do2 ∆h.(∆h + 2.R) = do2 ∆h = do2 / ∆h + 2.R ∆h ≈ do2 / 2.R (1.8) À semelhança do que foi feito no item 3.3.1 pode-se considerar R ≈ 6.371 km e para alguns valores de do calcular o valor de ∆h obtendo-se: Tabela 1.2: do (m) 0,1 0,3 0,5 0,7 1 2 ∆h (m) 0,0008 0,0071 0,0196 0,038 0,078 0,314 Topografia I Profa. Andréa Ritter Jelinek 7 Pela análise da Tab. 1.2 e comparando com os resultados obtidos na planimetria e anteriormente inseridos na Tab. 1.1, pode-se constatar que o efeito da curvatura da Terra na altimetria é muito mais acentuado do que na planimetria. Desta forma, dependendo da precisão interna que se deseja no levantamento topográfico altimétrico pode não ser aconselhável deixar-se de considerar o efeito da curvatura da Terra.