Sociologia Clássica II Pós-graduação Lato Senso em Sociologia da UGF/SP Profa. Dra. Mirlene Simões Severo Índice Introdução Parte I 1) Vida e obra de Max Weber 2) Cronologia 3) Introdução à teoria de Max Weber 4) Weber e a sociologia da música 5) Política como vocação e Ciência como vocação 6) A religião na obra de Weber Parte II 7) Sociologia brasileira: um breve histórico 8) Florestan Fernandes e a sociologia no Brasil 9) Octavio Ianni e o Brasil moderno 10) Sociólogos brasileiros contemporâneos - Chico de Oliveira - José de Souza Martins - Maria da Glória Gohn Parte III 11) Considerações finais Parte IV 12) Bibliografia 1 Introdução No curso de Sociologia I vimos como a sociologia nasceu e os caminhos que Comte e Durkheim seguiram para que esta ciência pudesse ganhar seu espaço na sociedade industrial que surgira na época deles. Vimos também, nesta primeira parte do curso, que a França foi onde se concentrou estas discussões acerca da ciência que propunha estudar a sociedade. No curso que agora iniciamos (inserir vídeo Gama Filho) veremos que a Alemanha deste período também tinha núcleos de pesquisadores interessados em desvendar e explicar as mudanças sociais que estavam acontecendo. Max Weber é um destes estudiosos e, com o mesmo intuito de Comte e Durkheim queria fundar uma ciência social que interpretasse os movimentos populares, que aprofundasse as relações agora existentes no Estado Moderno como a democracia os partidos e as lideranças políticas. Weber queria também estudar as estruturas religiosas e de qual forma influenciavam na vida econômica da sociedade. Estudou e buscou estas respostas por meio do empirismo e da comparação entre sociedades e instituições. Embora Durkheim e Weber fossem contemporâneos, nunca se conheceram ou leram um a obra do outro. Weber fecha a trinca de pesquisadores fundadores da sociologia. Karl Marx surge com outras interpretações e metodologias e inaugura outro momento de investigação sociológica, apoiada pela observação social a partir do sistema econômico. Nesta primeira parte vamos estudar a teoria e obra de Max Weber e depois partiremos para a Sociologia e os sociólogos no Brasil. 2 Marx dizia que aquele que estuda a sociedade não pode colocar-se na mesma posição de um físico ou químico, pois lhe falta a possibilidade de experimentação e os instrumentos disponíveis para esses cientistas. Assim, é preciso, (...) utilizar a “faculdade da abstração”. Neste sentido, Marx rompe com a tese do positivismo clássico de Comte e Durkheim a respeito da unidade metodológica entre ciências naturais e ciências humanas (se bem que ele não colocava a questão nesses termos, já que essa não era uma preocupação dele). Apesar de ver a diferença entre o estudo da natureza e o estudo da sociedade, ele não tinha uma posição semelhante a Weber, já que para ele era possível a explicação das relações sociais e cabia ao pesquisador constituir conceitos, compreendidos por Marx não como “tipos ideais” (construções subjetivas que raramente se encontram em estado puro na realidade), e sim como “expressão da realidade”, isto é, como uma expressão mental de algo que existe realmente. Marx propunha partir do concreto-dado para chegar ao concretopensado por via da abstração. É preciso ressaltar que Marx pensava em termos de “concreto-dado”, e não de “empírico”. O empírico, tal como se vê em Durkheim e Weber é o que é perceptível via experiência. Isso se deve ao fato de que Marx, em razão de sua formação filosófica, não tina uma visão ingênua de experiência. Ele sabia que a experiência é histórica, constituída socialmente. Daí ser impossível tratar as relações sociais, ou “fatos sociais”, como coisas, tal como um cientista natural. (...) Assim, o método dialético se distingue tanto do objetivismo de Durkheim quanto do subjetivismo de Weber. (...) Por conseguinte, observamos aqui a diferença metodológica entre Marx e os demais clássicos da sociologia. Para Marx, o pensamento deve ir aumentando progressivamente a concreção, chegando ao concreto-determinado, uma “síntese de suas múltiplas determinações”. (...) Desta forma, Marx, ao contrário de Durkheim e Weber não buscou lançar as bases da sociologia. No entanto, ele passou a ser considerado um clássico da sociologia. Como isso é possível? Isso ocorreu por dois motivos básicos: um de natureza intelectual e outro de natureza social. Do ponto de vista intelectual, a obra de Marx abordava os mesmos temas que a Sociologia nascente (...) e produziu uma complexa teoria da sociedade capitalista. (...) O outro motivo, de caráter social, reside na influência crescente de Marx no movimento operário e nos partidos social-democratas que surgiram no final do século XIX e inicio do século XX (...). Nildo Viana, 2006 3 Max Weber – Ilustração: André Toma (Revista Cult – Dossiê Jan. 2011 Parte I 1) Vida e obra Max Weber Karl Emil Maximilian Weber nasceu em Erfurt em 1864, filho de pais protestantes. Weber viveu em um ambiente culto, seu pai era advogado e sua mãe de profunda erudição. Aos treze anos, Weber já escrevia ensaios históricos. (inserir apresentação Gama Filho) Em 1869 muda com a família para Berlim, seu pai foi deputado e por isso Weber desde cedo convivia com políticos e filósofos que freqüentavam sua casa. Em 1882 ele cursou direito em Heidelberg, no ano seguinte muda para Estrasburgo para servir o exército, retoma seus estudos universitários em Berlim, onde 1886 se submete ao primeiro exame de direito. 4 Em 1889 termina sua tese de doutorado sobre o desenvolvimento das sociedades comerciais na Itália da Idade Média. No ano seguinte se fixa como advogado em Berlim. Em 1893 assume o cargo de professor de história do direito na Faculdade de Berlim. Casa-se com Marianne Schnittger, militante do movimento feminista na Alemanha. Ela terá importante papel na publicação de sua obra, principalmente na edição e supervisão dos escritos póstumos. Em 1894 assume a cadeira de Economia na Universidade de Friburgo. Com esgotamento mental e depressões agudas, Weber em 1898 adoece gravemente o que o faz afastar-se dos trabalhos acadêmicos. Volta para Heidelberg somente em 1901, onde reassume parcialmente as atividades de docente. Sua volta o faz reavaliar as concepções teóricas que tinha e irá se dedicar a sociologia a partir deste ano. Esta reinterpretação intelectual será o momento onde publicará suas principais obras para a ciência social. Em 1903 junto com Werner Sombart1 assume a direção da revista Archiv für Sozialwissenschaft und Sozialpolitik a mais importante da Alemanha em sua época. Weber viaja para os Estados Unidos em 1904 para que pudesse entender o papel das burocracias na democracia. Impressiona-se bastante com o desenvolvimento norte-americano e de volta à Alemanha, escreve A ética protestante e o espírito do capitalismo. Em 1910 funda a Sociedade Alemã de Sociologia e após a Primeira Guerra Mundial, na qual Weber participou ativamente, muda-se para Viena. 1 Sombart (1863-1941) foi da escola histórica alemã, pensador controverso da ciência social e seguidor da sociologia compreensiva de Weber. Poucas obras suas estão traduzidas para o português, para pesquisar sobre este autor, http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1218651140W1vYN9cb0Dw02MR6.pdf 5 Já em 1919 vai para Munique onde ocupou a cátedra de sociologia, e onde também irá proferir suas duas principais palestras, que posteriormente foram editadas e publicadas A Ciência como Vocação e A Política como Vocação. Weber morreu em junho de 1920, vítima de uma pneumonia. 2) Cronologia Cronologia de Max Weber 1864 - Max Weber nasce em Erturt, Turíngia, a 21 de abril. 1869 - Muda-se para Berlim com a família. 1882 - Conclui seus estudos pré-universitários e matricula-se na Faculdade Direito de Heidelberg. 1883 - Transfere-se para Estrasburgo, onde presta um ano de serviço militar. 1884 - Reinicia os estudos universitários. 1888 - Conclui seus estudos e começa a trabalhar nos tribunais de Berlim. 1889 - Escreve sua tese de doutoramento sobre a história das companhias de comércio durante a Idade Média. 1891 - Escreve uma tese com o tema A História das Instituições Agrárias. 1893 - Casa-se com Marianne Schnitger. 1894 - Exerce a cátedra de economia na Universidade de Freiburg. 1896 - Aceita uma cátedra em Heidelberg. 1898 - Consegue uma licença saúde na universidade 1899 - É internado numa casa de saúde para doentes mentais, onde permanece algumas semanas. 1903 - Participa, junto com Sombart, da direção de uma das mais destacadas publicações de ciências sociais da Alemanha. 1904 - Publica ensaios sobre os problemas econômicos das propriedades dos Junker, sobre a objetividade nas ciências sociais e a primeira parte de A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. 1905 - Parte para os Estados Unidos, onde pronuncia conferências e recolhe material para a continuação de A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. 6 1906 - Redige dois ensaios sobre a Rússia: A Situação da Democracia Burguesa na Rússia e A Transição da Rússia para o Constitucionalismo de Fachada. 1914 - Início da Primeira Guerra Mundial. Weber, no posto de capitão, é encarregado de organizar e administrar nove hospitais em Heidelberg. 1918 - Transfere-se para Viena, onde dá um curso sob o título de Uma Crítica Positiva da Concepção Materialista da História. 1919 - Pronuncia conferências em Munique, que serão publicadas sob o título de História Econômica Geral. 1920 - Falece em conseqüência de uma pneumonia aguda. Coleção Os Economistas, 1997 3) Introdução a teoria de Max Weber A obra de Weber é um dos fundamentos da metodologia na sociologia moderna. O seu pensamento foi influenciado por um conjunto de situações presentes na Alemanha como as discussões familiares na área da política e religião (em especial com sua mãe), pelo clima universitário e político da Alemanha do começo do século vinte e pelas viagens que fez, com destacada atenção à viagem para os Estados Unidos da América. (inserir filme I) Berlinck credita à este conjunto de situações o sentido do pensamento de Weber e sua principal motivação: a racionalidade. Para Weber a racionalidade diz respeito a uma equação dinâmica entre meios e fins. Nesse particular, ele acreditava (e essa crença permeou o pensamento dos sociólogos funcionalistas contemporâneos, tais como Parsons, Williams, Homans, etc.) que toda ação humana é realizada 7 visando a determinadas metas – concepções afetivas do desejável – ou valores. Tais valores são fenômenos culturais e possuem bases extra-científicas. Em outras palavras, as definições do que é bom e do que é mau, do que é bonito e do que é feio, do que é agradável e do que é desagradável constituem proposições extra-empíricas. (WEBER, 1993, p. 10) Sua teoria sempre esteve com a preocupação em determinar a ação do homem, e segundo Weber esta ação pode ser critério para a determinação de valores. Max Weber foi o fundador da sociologia em sua terra natal a Alemanha. Dedicou-se a fundamentar a nova ciência por meio do objeto e métodos próprios. A tradição filosófica da Alemanha permitiu que ele pudesse realizar uma reflexão mais acentuada na cientificidade do saber e de sua aplicação na nova sociedade. Este raciocínio fez com que o positivismo comtiano em seu país fosse rapidamente superado. Weber é fortemente influenciado pela teoria de Kant “ele defende a tese da distinção entre ciências naturais e ciências humanas – uma vez que as primeiras buscam a explicação, as leis, e as ciências do homem buscam a compreensão dos fenômenos singulares” (VIANA, 2006, p. 39). Weber busca compreender os fenômenos e não se preocupa especificamente com as leis que regem a sociologia ou as ciências humanas na busca da interpretação da sociedade. E por se preocupar fundamentalmente com a interpretação dos fenômenos é que vai criar o conceito de tipo ideal, que corresponde aos aspectos da realidade individual. Os tipos ideais são os modelos abstratos da sociedade contemporânea, 8 são por um lado, ‘o especialista sem espírito’, que tudo sabe acerca do seu pequeno mundo de atividade e nada sabe (nem quer saber) acerca de contextos mais amplos que determinam seu pequeno mundo, e, por outro lado, o ‘homem do prazer sem coração’, que tende a amesquinhar seu mundo sentimental e emotivo à busca de prazeres momentâneos e imediatos. (...) A percepção do indivíduo moderno como suporte das ilusões da independência absoluta e da própria perfeição narcísica quando, na verdade, realiza, sem saber, todas as virtualidades de uma razão instrumental que termina em consumismo e conformismo político (...). (SOUZA, 2008, p. 44) O tipo ideal é um elemento de análise a partir dos elementos que constituem a sociedade, tais como religião, economia, burocracia, capitalismo, e a história social. Segundo Weber captar a realidade como um todo é difícil, portanto os tipos ideais são fundamentais para o sociólogo fazer sua análise. O tipo ideal é um recurso metodológico para que o cientista possa restringir sua busca na diversificada realidade social. “Por isso mesmo esses tipos necessitam ser construídos no pensamento do pesquisador, existem no plano das idéias sobre os fenômenos e não nos próprios fenômenos. (COHN, 1979, p. 08) Segundo Weber o sociólogo deve ser neutro em sua análise, não deve indicar qual modelo ou estrutura ideal para a sociedade e sim indicar, com sua pesquisa, os caminhos de uma vida melhor em sociedade. Muitos intelectuais das ciências sociais relacionaram o racionalismo weberiano com o marxismo crítico do sistema capitalista para analisar a sociedade do século 9 passado. Daí surgiu a interpretação de que o método de pesquisa weberiano é o método compreensivo. Enquanto objeto da ciência, Weber definiu a ação social para seus estudos. A ação para o autor é toda aquela que o indivíduo atribui um sentido que está relacionado com os outros. Toda ação leva em conta comportamentos e reações das pessoas de acordo com seus costumes e cotidiano. “A ação social pressupõe um sentido e, mais que isso, que ele esteja voltado para os outros. Se um homem faz uma serenata para uma mulher, temos aí uma ação social, já que o sentido da ação estava voltado para outra pessoa” (VIANA, 2006, p. 40). Ele queria estabelecer por meio desta interpretação que a sociologia deveria compreender a ação dos indivíduos e não, como forjado pelos estudos anteriores, a partir das instituições ou dos grupos sociais. Isto atribuía à sua metodologia de pesquisa o oposto do que propunha o positivismo, isto porque, em sua metodologia o sociólogo elabora o conhecimento, enquanto no positivismo o sociólogo apenas registra os acontecimentos. A ação humana sempre em Weber terá um sentido dominantemente cultural. Ele procura entender o que legitima as ações dos indivíduos e de qual forma surgem as relações sociais. Já que o indivíduo na teoria weberiana sempre está em ação, então toda ação terá um sentido que são os atos parciais encadeados entre si. Na ação social, Weber atribui quatro tipos principais, que são: a ação social afetiva que pode ser expressa no amor, no ódio ou na amizade; a ação social tradicional que vem dos costumes e tradições; a ação social 10 racional com relação a valores que se orientam por entendimentos de valores e a ação social racional com relação a fins que se orienta pela racionalidade. A principal obra de Weber é A ética protestante e o espírito do capitalismo, é nesta obra que Weber irá apresentar a importância da ação social racional. Parte do princípio que o catolicismo não permitia que o capitalismo se desenvolvesse porque, os valores sociais dos católicos se baseavam na partilha entre o grupo, em oposição ao individualismo. Já o protestantismo, segundo Weber, era a realização da ação social racional, pois era movido pelo trabalho e pelo asceticismo que moviam o desenvolvimento das atividades capitalistas. “Assim, a ética protestante, que era uma ação racional com relação a valores, abriu caminho para a racionalização, o racionalismo de tipo ocidental, isto é, uma ação social racional com relação a fins” (VIANA, 2006, p. 41). A análise das religiões tinha papel central nos estudos de Weber, pois ele acreditava que as tendências religiosas poderiam interferir na economia geral da sociedade, assim como nos esclarece Martins, Este seu trabalho jamais teve a intenção de afirmar, como interpretaram erroneamente alguns de seus críticos, que a causa explicativa do capitalismo era a ética protestante, ou que os fenômenos culturais explicariam a vida econômica. Sua pesquisa apenas procurou assinalar que uma das causas do capitalismo, ao lado de outras, como os fatores políticos e tecnológicos, foi a ética de algumas seitas protestantes. (MARTINS, 1982, p. 68) 11 Max Weber não tinha um posicionamento crítico com relação ao sistema capitalista, ele acreditava que algumas instituições, principalmente as grandes empresas, eram exemplos de organização racional da sociedade, e considerava que os empresários eram revolucionários que puderam intervir na história da sociedade de sua época. O capitalismo para o autor se expande pela relação de valores étnicos doutrinários da burguesia protestante, trabalhando para o lucro e universalizando o capital. A ética é o próprio exercício da dominação, não é um sistema e por isso a legitimação do capitalismo passa por ela, na aceitação ou permissão dos dominados. A ética está presente na ação e não na instituição. As forças de expansão do sistema capitalista, diz Weber, tem soma de capitais e interesses associados aos industriais, e a política financeira está atrelada às instituições internacionais que tem seus interesses próprios. Ele se afasta do conceito de materialismo-histórico de Marx para encontrar um curso próprio e determinado dos processos históricos. “Weber está enfatizando a sua idéia básica de que não é possível encarar um período histórico como se nele estivesse já configurada a época seguinte (...). (CONH, 1979, p.14) A sua análise social era, muitas vezes, melancólica, influenciada em parte pelo filósofo alemão Nietzsche2 (1844-1900), que considerava que a crescente racionalização da sociedade, advinda do capitalismo, fazia com que a intuição do pensamento e da imaginação do homem deixasse de existir em detrimento ao mecânico e racional. 2 Friedrich Nietzsche abordava em suas obras temas como a razão entre os homens, as religiões, a cultura ocidental e principalmente a crítica à ciência. A obra mais conhecida é Assim falou Zaratrusta de 1883 que narra os ensinamentos de um filósofo, por meio de uma linguagem poética. Sobre este autor, Citações e Pensamentos de Friedrich Nietzsche. Paulo Neves da Silva (org.), Leya, 2011. 12 Weber quer apresentar aos pesquisadores sociais que a sociologia tinha um método próprio de análise da sociedade: o método compreensivo. Desta forma ele apresentou uma metodologia exposta e exemplificada em várias obras de sua autoria. Compreender é o condicionante ético intelectual que visa o saber científico, distante das posições políticas que se constituem no interior da sociedade. É a conduta ética intelectual é que legitimará a humanidade. Assim como Durkheim, Weber buscou institucionalizar a sociologia na academia, e em 1910 fundou a Sociedade Alemã de Sociologia, importante espaço de discussão de pesquisadores alemães na época. Mas na teoria Weber se contrapôs a Durkheim principalmente porque este via na divisão do trabalho a suavização da luta social, enquanto Weber vê no confronto de interesses, entre dominação e poder, valores inconciliáveis (CONH, 1979). Ele não propõe uma revolução científica ou um novo paradigma científico, ao contrário de Comte e Durkheim, Weber não tinha discípulos e pesquisadores que colaboravam com suas pesquisas, A influência da obra de Weber, embora crescente ainda quando ele estava vivo, não era do tipo que possibilitasse uma escola. Mesmo essa influência foi drasticamente interrompida, na Alemanha, 12 anos após sua morte, pela chegada dos nazistas ao poder. (MISSE, 2011, p. 02) Mesmo sem os autores da sociologia definirem uma “escola weberiana”, suas interpretações influenciaram grandes intelectuais como Karl Mannheim (1893-1947), Georg Lukács (1885-1971), Talcott Parsons (190213 1979), Alfred Schutz (1899-1959), Wright Mills (1916-1962), entre outros. “Parsons procurou aproximar Weber do funcionalismo durkheimiano, Wright Mills fez aproximação com a tradição marxista, extraindo daí não só uma interpretação, mas um efeito – em suas próprias obras – crítico e politicamente renovador”. (MISSE, 2011, p. 03). A sociologia norte-americana, iniciada pela obra de Parsons, ainda tem forte influência dos conceitos weberianos e se apóia na recuperação constante deste autor. São vários os intelectuais da sociologia norte-americana que ainda hoje levantam as hipóteses de Weber na discussão atual da sociedade como, por exemplo, David Landes. Assim também foi com a Escola de Frankfurt3, onde a influência de Weber é direta principalmente em Habermas. (inserir filme II) No Brasil segundo Souza (2008) a influência de Weber entre os intelectuais não só da sociologia mas da ciência social, do direito e da filosofia se deve ao desenvolvimento conceitual deste autor acerca do racionalismo ocidental, ‘Racionalismo’ significa a forma, culturalmente singular, de como uma civilização específica e, por extensão, também os indivíduos, que constituem sua forma de pensar e agir a partir desses modelos culturais, interpreta o mundo. Isso implica, antes de tudo, que não existe definição ‘universal’ possível acerca do que é ‘racional’ ou do que seja ‘racionalidade’. A forma como a racionalidade vai ser definida em cada sociedade específica depende, desse modo, da matriz civilizacional a qual essa sociedade 3 A escola de Frankfurt é a denominação informal que se dá para uma série de intelectuais que se uniram na Universidade de Frankfurt, na Alemanha, para estudar as reinterpretações da teoria Marxista. Fazem parte deste conjunto de autores: Theodore Adorno, Jürgen Habermas, Axel Honneth, entre outros. Sobre esta escola ver: A Escola de Frankfurt, Paul-Laurent Assoun, Ática, 1991 14 particular pertença. Em relação à civilização ocidental moderna, Weber irá definir seu racionalismo específico como sendo o do “racionalismo da dominação do mundo” (SOUZA, 2008, p. 42) Neste trecho Souza quer mostrar que Weber transforma a racionalidade objetiva independente da vontade e por isso há de existir a sociologia compreensiva para estudar este sentido subjetivo nos homens. Este, para Souza, é o fator decisivo de interpretação de Weber para os intelectuais brasileiros. Weber relaciona o funcionamento do Estado racional e do mercado como fatores decisivos para a eficiência dos mecanismos de racionalização, de aspectos subjetivos e objetivos. Por isso a literatura acerca de sua teoria no Brasil permeia as interpretações liberais. Para Souza, esta imprecisão em analisar a teoria weberiana ocupa lugar em diversas obras, e segue por outros conceitos como: estamento e burocracia. “(...) a marca da riqueza da reflexão weberiana é precisamente perceber a ambigüidade constitutiva dessas instituições (...), e, com isso, perceber a ambigüidade imanente ao próprio racionalismo ocidental. (SOUZA, 2008, p. 46). Ainda segundo Souza, é necessário uma nova abordagem de Weber no Brasil a partir do seu conceito de patrimonialismo para que também seja reavaliado o Estado e o mercado e deste as condições precárias de vida de uma grande parcela da população. Weber vê na administração burocrática o nascimento do Estado ocidental moderno. Analisa a burocracia a partir da democracia já que a impessoalidade, a universalidade e o procedimento dependem da burocracia. A 15 pergunta que ele faz é de que forma este processo pode ser ágil, sem complicações e permanecer intocada a democracia. (inserir simulador) Mas as conexões entre democracia e burocracia têm desdobramentos mais complexos na sociologia política de Weber. Em particular, a peculiar posição em favor de uma democracia plebiscitária, em que lideranças carismáticas capazes de se dirigir com êxito às massas possam justamente prevalecer sobre o espírito burocrático, embora devam ser controladas institucionalmente pelos poderes parlamentar e judiciário e manter-se em equilíbrio com eles (devendo mesmo emergir e amadurecer através da carreira parlamentar). (REIS, 2008, p. 51) Ele conceitua Estado sem atribuir-lhe um caráter substantivo, obrigatoriamente tem que estar atrelado às ações concretas dos indivíduos. Weber credita ao Estado as formas de gerir os controles materiais, e a racionalização surge nas instituições burocráticas não na materialização do capitalismo no Estado. Enquanto Marx fala da ditadura do proletariado no Estado, Weber, em oposição, propõe que o funcionalismo controle o Estado, já que, toda relação se passa na burocracia e o funcionário é fundamental para existir esta relação. Para Weber a saída da burocratização é a existência de um parlamento forte. Ainda dentro deste tema, Weber considera que os partidos políticos criam máquinas como no caso norte-americano em que a estrutura partidária 16 garante cargos ou privilégios econômicos. Aprofundaremos este conceito weberiano mais adiante. Outro tema abordado na obra de Weber são as instituições democráticas e a dominação. Segundo Weber existe legitimidade na dominação e os dominados acreditam nela. Sendo assim, uma relação de dominação também pode ser legítima. Com relação ao tema da racionalidade e da ética, em que Weber considera, como abordado brevemente nas páginas iniciais deste texto, que existem dois tipos fundamentais: a racionalidade com fins e a racionalidade de valores. Weber não contrapõe o mundo das normas e o mundo da racionalidade, A questão geral das relações entre racionalidade e ética é sem dúvida complicada. De toda forma, há um claro ganho de entendimento se partirmos de reconhecer que toda racionalidade é instrumental: a noção mesma de racionalidade envolve por força a idéia da articulação entre meios e fins, e a natureza dos fins é irrelevante para a caracterização da racionalidade como tal. (REIS, 2008, p. 54) Desta forma Weber propõe uma racionalidade que envolve complexas cadeias de fins e meio que envolvem ideais, é uma solução alternativa para ser alcançada. 4) Weber e a Sociologia da música Weber foi o criador da sociologia da música, que no início de seus estudos tinha como princípio a sociologia da arte. O livro póstumo Os 17 fundamentos racionais e sociológicos da música foi publicado em 1920 e revela a organização geral da sociologia weberiana. Sua investigação partiu da música moderna ocidental em comparação com o racionalismo ocidental, “Isso significa que compreender a moderna música do ocidente implica, em primeiro lugar, reconhecer sua peculiaridade (...) e, em segundo lugar, reconhecer a multiplicidade de possibilidades de racionalização (...) (WAIZBORT, 2008, p. 55). (inserir filme III) Weber define que o desenvolvimento da arte depende do desenvolvimento da técnica e que as condições de caráter econômico que possibilitarão a organização artística. Para ele a sociologia da música deve estudar os meios técnicos dessa expressão, pois são neles que a investigação empírica aparecerá. A importância que atribui à música aparece nas notas dos Escritos reunidos de sociologia da religião em que destaca a música como fundamental para o racionalismo ocidental. Portanto, a sociologia da música trata de investigar os meios técnicos e seus desenvolvimentos, assim como suas influências na volição artística, como domínio empírico e liberto de qualquer valoração estética. Esse ponto é absolutamente central, pois com a exclusão da valoração estética tornou-se possível “fundar epistemologicamente um comparatismo transcultural e trans-histórico dos fatos artísticos”, como disse Phillipe Despoix. (WAIZBORT, 2008, p. 57) 18 Para Weber a racionalização está nos meios artísticos e assim o sociólogo deverá em sua pesquisa abordar os critérios de racionalização, e qual a sua direção. Este processo de racionalização que resultou na música ocidental moderna. 5) Política como Vocação e Ciência como Vocação Wolfgang Schluchter aventa a hipótese de que as conferências “são textos filosóficos que pretenderam levar os ouvintes e, logo, os leitores a reconhecer fatos e encorajar a auto-reflexão, a fim de ganhá-los para esforços responsáveis dirigidos para uma causa realista”. A questão estaria definitivamente associada às circunstâncias históricas e à posição de Weber quanto à construção da nação alemã, que propugnava por um estado nacional moderno dependente da prontidão dos indivíduos de se engajar em tarefas que exigiam auto-renúncia e distanciamento. (...) Os traços comuns às duas conferências não as configuram enquanto uma unidade. “Ciência como vocação” destacou-se e teve recepção bem diferente da conferência “Política como vocação”. Causou grande impacto, não só aos ouvintes, como aos leitores, depois de sua publicação em 1919, provocando uma polêmica apaixonada da qual fizeram parte Ernst Robert Curtius, Erich Von Kahler e Arthur Salz, (...), cujo tema era o papel da ciência no mundo moderno. O cerne do debate dizia respeito à necessidade de reafirmar uma unidade para a ciência e abandonar o relativismo frouxo de Max Weber, que pregava o politeísmo e a batalha dos deuses. (...) “Ciência como vocação” foi, portanto, proferida aos estudantes em um contexto de mudanças políticas e sociais profundas, e de rompimento de Weber com seus “aliados” (...) quer mostrar aos estudantes que o trabalho intelectual enquanto profissão significa uma vida cheia de renúncia e não de reconciliação. O que mais causou mal-estar entre os estudantes (...), teria sido justamente sua insistência na base ascética das ações profissionais. Elas não poderiam estar mescladas com ideais, sobretudo com ideais de ordem política. Profissão como auto-limitação era a mensagem que Weber queria transmitir aos estudantes. Com o intuito de provar a base secular das profissões, Weber associa profissão e renúncia a um terceiro termo – personalidade. (...) Weber acredita que a ciência como vocação exigia uma vocação interna. O fundamento da 19 conferência, no que diz respeito à ciência como profissão/vocação, encontra-se em A ética protestante e o “espírito” do capitalismo (1905). (...) Em “Ciência como vocação”, Weber questiona mais uma vez o surgimento da profissão e da especialização no mundo da cultura e de uma ciência livre de valores. Como combinar a formação com os rigores e limites de uma especialização no âmbito das universidades? Essa questão perpassa o seu pensamento e sua obra. Quanto à “novidade” do tom dramático com que se refere ao problema, isto sim talvez possa ser compreendido pela dúvida de Weber em voltar para o mundo acadêmico para o qual muitas vezes dizia que não era “talhado”, ou dirigir o sentido de seu dever para a ação política, sabendo de seu insucesso como homem político, desligado dos partidos e defensor da ética da responsabilidade que não empolgou os políticos nem tampouco os estudantes que o ouviram na Universidade de Munique. Gláucia Villas Bôas, 2008 Em A política como vocação, Weber está preocupado com as condições essenciais ao funcionamento do Estado moderno, ressaltando a burocracia como regulamentadora do sistema quanto da sociedade. Para ele as lideranças políticas são características próprias de cada sociedade, e as organizações administrativas manterão estas lideranças. Estas organizações vão exercer um maior ou menor controle do sistema político ou, nas palavras de Weber vão determinar a racionalidade do sistema e poder sobre a sociedade. A racionalidade do sistema político gera a distinção entre viver para a política e viver da política, são duas formas de vocação política. Este contraste para Weber é uma distinção econômica, viver para a política implica que não se aproveita dos privilégios da política, e viver da política garante-se o controle dos políticos por meio de uma renda. Assim como nos explica Berlinck, 20 Ainda que Weber não o afirme categoricamente, essa distinção ajuda a compreender as motivações da ação política e, por sua vez, gera o problema da corrupção, na organização política. Em segundo lugar, a racionalidade do sistema político aumenta na medida em que ocorrem uma diferenciação de status-papéis e uma especialização funcional dentro das organizações administrativas. A brilhante e erudita análise de Weber sugere que a diferenciação ocorre quando há uma especialização entre a administração, que deve ser exercida sine ira et studio, e a liderança política, cuja ação é, por natureza, fundamentada na ira et studium. Essa especialização, por sua vez, tende a mudar os critérios de alocação de status-papéis na organização política. Os critérios deixam de ser plutocráticos e passam a basear-se no desempenho e no conhecimento especializado. Não há portanto, nessa nova organização, lugar para o diletante, pois o seu “sucesso” depende, cada vez mais, da ação especializada. (WEBER, 1993, p. 12) Weber em A política como vocação tem o objetivo de demonstrar, como exposto acima, que a especialização restringe o papel diversificado que a liderança política tem que exercer. A política para o autor tem duas características. Uma tem o sentido mais amplo de liderança política e que independe da ação, o outro é a política restrita onde a liderança representa uma associação, ou o próprio Estado. (inserir filme IV) A liderança política tem como atividade principal e exclusiva o recrutamento de novos agentes. Para Weber esta liderança tem como objetivo o Estado, vê a partir de seu território os meios para tentar controlar o 21 monopólio da força física. O Estado para este autor é um instrumento de legitimação das pessoas enquanto para Marx é um instrumento de dominação. A liderança política tem ainda que ter carisma e vocação. Em sua obra Weber divide em três tipos de liderança política: o profeta que explica tudo pelo sobrenatural; o senhor da guerra que é uma liderança de coragem e transmite confiança; e o condottiere que lidera pessoas desajustadas, foras da lei. Além destas características da liderança política, outras duas se destacam no estado moderno, e são: 1) o demagogo que convence a sociedade através da oratória e 2) o líder partidário que aparece junto às eleições e são figuras decisivas no papel social pois representam as formas de poder. O estado moderno, segundo Weber, é uma associação compulsória que organiza a dominação e sua forma principal é a liderança política. Diante disto, os políticos profissionais surgem durante o processo de busca do líder. Ao contrário dos líderes por vocação ou dos líderes carismáticos, estes não querem se colocar a serviço de um senhor político. O homem político profissional, que vive “da” política, pode ser um puro “beneficiário” ou um “funcionário” remunerado. Em outras palavras, ele receberá rendas, que são honorários ou emolumentos por serviços determinados – não passando a gorjeta de uma forma desnaturada, irregular e formalmente ilegal dessa espécie de renda – ou que assumem a forma de remuneração fixada em dinheiro ou espécie ou em ambos ao mesmo tempo. O político pode revestir, portanto, a figura de um “empreendedor”, à maneira do condottiere, do meeiro ou do comprador de carga ou revestir o aspecto de boss norte-americano que encara suas despesas como investimento de capital, que ele transforma em fonte de lucros, mercê da exploração de sua influência 22 política; ou pode ocorrer que ele simplesmente receba uma remuneração fixa, tal como se dá com o redator ou secretário de um partido, com o ministro ou funcionário político modernos. (...) As lutas partidárias não são, portanto, apenas lutas para consecução de metas objetivas, mas são, a par disso, e sobretudo, rivalidades para controlar a distribuição de empregos. (WEBER, 1993, p. 69) Os políticos ocasionais são aqueles que não se dedicam às relações de poder para exercê-la. Todos nós, portanto, somos políticos ocasionais, participamos de abaixo-assinado, vamos a comícios ou manifestações, ou seja, é uma atividade ocasional e não fundamental. Para Weber, são três as características do homem político: a paixão, o senso de responsabilidade e o senso de proporção. A paixão é a dedicação objetiva a uma causa, tendo que ser diferenciada da situação estéril que pode provocar uma revolução e cair num vazio isento de responsabilidade. O senso de proporção é a responsabilidade psicológica de saber escolher o que em uma ação pode acontecer com relação aos homens. Weber indica ainda que a vaidade no homem político é um defeito fatal já que ela impede a dedicação deste homem à uma causa, assim como a falta de objetividade e de responsabilidade. A responsabilidade é a relação entre ética e política, e a ética deve permanecer para que se possam estabelecer critérios entre o “tudo ou nada” da política. Ter ethos na política para Weber é a causa que dá qualidade e liderança. Weber classifica em tipos os políticos profissionais, a saber: 1) clero alfabetizado/celibatário, controladores e administradores do príncipe; 2) os literatos de educação humanista; 3) nobreza cortesã atraída pela política 23 diplomática; 4) gentis-homens, específico na Inglaterra4; 5) juristas de formação universitária5; 6) demagogo é aquele que usa a palavra oral ou escrita para convencer e 7) funcionários de organização política que se interessam pelo controle político. O partido no estado moderno é a reunião de aristocratas e se mantém vivo pela rotatividade das eleições, só por meio desta que se torna necessário a organização política. Para Weber a organização partidária na Inglaterra deu origem ao agente político e ao partido de organização empresarial, isto porque, no século XIX os notáveis, pilares fundamentais da organização política daquele país, que eram profissionais da organização política, entram para a estrutura do estado por meio da distribuição de cargos. Surge também neste período os comitês e a democracia de marcas que rigidamente mantém o controle partidário. Com os comitês se fundamenta a contratação de funcionários remunerados introduzindo a máquina política com a estrutura político-eleitoral de representação. A partir do momento que se monta a máquina política tem que financiar esta estrutura e, assim sendo, recorrer ao mundo financeiro para sua manutenção. Segundo Weber, nos Estados Unidos em 1824 a máquina partidária começa se devolver a partir de uma estrutura de distribuição de cargos do 4 Por conta das guerras feudais a nobreza feudal sumiu surgindo outra, sem tradição. Eles tinham um poder social que salvou a Inglaterra da burocratização que a Europa passava. 5 Estes juristas buscavam referências da estrutura do Estado Moderno, racionalizando as regras do novo mundo (o racionalismo jurídico é fundamental para o Estado Moderno). A moderna democracia advém da jurisprudência, controlando grupos influentes através do treino da palavra e da escrita e, assim, tendo privilégios na política. A palavra é um instrumento do advogado que o funcionário público não a tem. 24 poder executivo. Considera que nesta estrutura os candidatos obrigatoriamente passam pela máquina partidária e o chefe político é o capitalista político, ou seja, o fornecedor de votos. Weber utiliza os Estados Unidos como exemplo para demonstrar que a máquina partidária capitalista não permite políticos principiantes em sua organização. Estamos, portanto, diante de uma empresa política dotada de forte estrutura capitalista, rigidamente organizada de alto a baixo e apoiada em associações extremamente poderosas, tais como o Tammany Hall. Essas associações, cuja linhas lembram as de uma ordem, não tem outro propósito, senão o de tirar proveito da dominação política, particularmente no âmbito da administração municipal – que constitui, nos Estados Unidos da América, a melhor porção dos despojos. Essa organização dos partidos só foi possível porque os Estados Unidos da América eram um país democrático e porque eram um “país novo”. Essa conjuntura privilegiada faz, entretanto, com que, em nossos dias, esse sistema esteja condenado a morrer lentamente. Os Estados Unidos da América não podem continuar a ser governados exclusivamente por diletantes. Há cerca de quinze anos, quando se perguntava aos trabalhadores norte-americanos porque eles podiam deixar-se governar por homens que confessadamente desprezavam, obtinham-se a seguinte resposta: “Preferimos ser governados por funcionários sobre os quais podemos escarrar a ser governados por uma casta de funcionários que, tal como na Alemanha, escarra sobre os trabalhadores”. Era o velho ponto de vista da “democracia” americana, mas, já por aquele tempo, as áreas socialistas do país tinham outra opinião. (WEBER, 1993, p. 99) 25 Em sua terra Natal, na Alemanha os partidos são subordinados aos políticos tradicionais e se tornaram associações sem deixar de se destacar as lideranças políticas. Segundo Weber isto fez com que a Alemanha tivesse uma característica diferente em sua estrutura política comparada a outros países. Temos então, a democracia com lideranças e com máquina partidária e a democracia sem líder onde os políticos profissionais sem vocação e sem carisma dominam esta máquina partidária, de acordo com o calendário eleitoral o que fortalece a máquina partidária. Em A ciência como vocação Weber quer mostrar o quanto a ciência interfere na vida de cada pessoa já que ela impulsiona a tecnologia e desenvolve os métodos de pensamento. A ciência indica os meios para se alcançar determinadas metas e a prática científica se torna o exercício da racionalidade. Segundo Berlinck, a racionalidade em Weber assume condição formalista já que ela se adequa na explicação dos meios para os fins, sem uma análise crítica dos fins. Weber expõe que a distinção do homem em detrimento a ciência e sua postura em reconstruir somente os fatos significativos e universais, deve se basear na distinção em ser do deve ser, desta forma, A razão pela qual em todas as ocasiões eu argumento tão enfaticamente e talvez polemicamente contra a fusão entre o ‘ser’ e o ‘dever ser’ não reside em que eu subestime as questões relativas ao ‘dever ser’, mas pelo contrário, em que eu não posso suportar quando problemas da mais alta importância, do maior alcance intelectual e espiritual sejam transformados aqui em questões de uma ‘produtividade’ técnico-econômica e sejam convertidas em tópicos de 26 discussão de uma disciplina técnica como a economia. (CONH, 1979, apud Weber, 1977, p. 20) Para Weber a ciência não pode propor o fim da ação prática, ela pode mostrar os valores envolvidos e não a concepção de mundo. Tem que se distinguir com rigor o que na ciência exprime ‘conhecimento empírico’ e o que é apenas ‘juízo de valor’. Já o objeto do conhecimento social é formado pelo pesquisador e seu método. O pesquisador deve ordenar racionalmente a realidade empírica, ou seja, dar ordem ao que está como experiência e a multiplicidade de fenômenos. Em sua palestra, Weber está preocupado, assim como na Política como vocação, em transmitir aos jovens qual a postura de um cientista, a singularidade e a especialização da ciência. Assim ele diz, Creio que, em verdade, os senhores esperam que eu lhes fale de outro assunto, ou seja, da vocação científica propriamente dita. Em nossos dias e referida à organização científica, essa vocação é determinada, antes de tudo, pelo fato de que a ciência atingiu um estágio de especialização que ela outrora não conhecia e no qual, ao que nos é dado julgar, se manterá para sempre. A afirmação tem sentido não apenas em relação às condições externas do trabalho científico, mas também em relação às disposições interiores do próprio cientista, pois jamais um indivíduo poderá ter a certeza de alcançar qualquer coisa de verdadeiramente valioso no domínio da ciência, sem possuir uma rigorosa especialização. (...) Só a especialização estrita permitira que o trabalhador científico experimente por uma vez, e certamente não mais que por uma vez, a satisfação de dizer a si mesmo: desta vez, consegui algo que permanecerá. Em nosso tempo, obra verdadeiramente definitiva e importante é 27 sempre obra de especialista. Conseqüentemente, todo aquele que se julgue incapaz de, por assim dizer, usar antolhos ou de se apegar à idéia de que o destino de sua alma depende de ele formular determinada conjetura e precisamente essa, a tal altura de tal manuscrito, fará melhor em permanecer alheio ao trabalho científico. Ele jamais sentirá o que se pode chamar a “experiência” viva da ciência. (...) Com efeito, para o homem, enquanto homem, nada tem valor a menos que ele possa fazê-lo com paixão. (WEBER, 1993, p. 24) A ciência para Weber era o caminho para se conhecer a realidade sobre a existência humana, e que essa realidade tem que ser provada. Como em sua obra tudo é compreensível por meio das relações racionais, a ciência também, obrigatoriamente, tem que ser provada. “A ciência weberiana vinculase a consciência daquilo que não é conhecido.” (JASPERS, 2007, p. 123). A relatividade da ciência pressupõe na concepção de Weber o nascimento da consciência. A separação da ciência entre natural e social é fundamental na teoria de Weber, tinha-se que se compreender o fenômeno social em sua ação humana. 6) A religião na obra de Weber Os estudos sobre a sociologia da religião de Weber causaram um profundo impacto nos estudos acerca da sociedade. Em A ética protestante e o espírito do capitalismo, Weber procurou demonstrar a relação entre a religião 28 protestante e a idéia de vocação e o impulso para o lucro por meio do êxito empresarial. (inserir filme V) Weber procurava com esta obra os modernos costumes da sociedade e o significado para a economia mais particularmente o que poderia ser uma regulação racionalista da vida. Assim como ele próprio descreve, A gênese do espírito capitalista no meu sentido do termo pode ser pensada como a passagem do romantismo das aventuras econômicas para a conduta racional da vida econômica, (...) parece haver uma espécie de afinidade entre certos princípios conceituais importantes para a regulação racional da conduta e o modo de pensar protestante. (CONH, 1979, apud Weber, 1977, p. 24) Weber demonstra que sem a presença da religião protestante o desenvolvimento do capitalismo moderno seria concebido de outra forma, isto porque, o autor compara com religiões diferentes desta em outras sociedades e demonstra que o capitalismo se desenvolveu de forma diferente. Analisa os casos do budismo, do judaísmo, do hinduísmo e do islamismo. O que procurava responder através destas comparações era saber qual era a ética econômica destas religiões. Em A ética protestante Weber constrói o tipo ideal na conduta religiosa que possibilitou o desenvolvimento do capitalismo. Este era seu novo objeto de análise sociológica: a religião e não o sistema capitalista. É que tanto a moralidade quanto a necessidade de compreensão do mundo, para Weber, nascem como movimentos endógenos à racionalização religiosa. Daí que Weber, ao procurar as raízes da especificidade da cultura 29 ocidental, tenha dado especial atenção ao estudo comparativo das grandes religiões mundiais. (SOUZA, 1998, p. 02) Weber procura na interpretação das religiões a interação do homem no meio social e natural, e por isso a história e análise das religiões será fundamental para saber até que medida pode influenciar na ação deste homem. Novamente recorremos a Souza para exemplificar esta teoria weberiana, Ao falar da gênese das religiões, Weber esclarece que não pretende tratar da "essência" da religião, senão apenas indagar sobre as condições e efeitos deste tipo de ação comunitária. De acordo com o seu enfoque compreensivo, o ponto de partida são sempre as vivências e representações subjetivas dos indivíduos atores, ou seja, o "sentido" dado à ação pelos sujeitos (Weber, 1985, p. 245). Esse "sentido", pelo menos nas primeiras manifestações da religião e da magia, é dirigido a "este mundo" criado pela expectativa de que as coisas possam "ir bem e que se viva longos anos" (ibid). O elemento religioso ainda se encontra entranhado nos outros aspectos da vida cotidiana, especialmente o de natureza econômica. Esse é o reino do naturalismo préanimista, onde coisas e significados ainda não se separaram e o "sentido do mundo" como problema ainda não aparece. Apenas a maior ou menor cotidianidade dos entes é objeto da cognição mágica. O elemento apartado da familiaridade imediata do cotidiano é o que Weber chamará de "carisma" (idem, p. 247). (SOUZA, 1998, p. 03) 30 O racionalismo ocidental é explicado pela religiosidade, onde a ética é fundamental, e segundo Weber é originária da ética judaica antiga, que enfatiza a tensão com o mundo. O calvinismo, de todas as seitas protestantes, foi o que esteve presente nos países capitalistas desenvolvidos e influenciou com base na certeza da salvação, uma vida metódica que se valha como meio para a glória divina. (Souza, 1998) Weber considera que é preciso entender os dogmas religiosos para que se possa compreender a conduta dos homens e com especial atenção às relações econômicas. Ele procura identificar o tipo de religião para que o capitalismo racional ocidental pudesse ter êxito em outros países. Weber relaciona o espírito do capitalismo e o espírito protestante com a formação da sociedade ocidental. (Aron, 2008) Na sociedade contemporânea o profano ou o mítico não explicam a sociedade e por isso o processo de racionalização se constitui. A relação da religião com a formação social e o capitalismo cria um tipo de desenvolvimento econômico. A partir de todos os elementos da religião, Weber os compara e procura abranger o objeto estudado da diversidade presente. De fato, o summum bonum dessa ética, o ganhar mais e mais dinheiro, combinado com o afastamento estrito de todo prazer espontâneo de viver é, acima de tudo, completamente isento de qualquer mistura eudemonista, para não dizer hedonista; é pensado tão puramente como um fim em si mesmo, que do ponto de vista da felicidade ou da utilidade para o indivíduo parece algo transcendental e completamente irracional. O homem é denominado pela geração de dinheiro, pela aquisição como propósito final de vida. A aquisição econômica não mais está subordinada ao homem como um meio para a satisfação de suas 31 necessidades materiais. Essa inversão daquilo que chamamos de relação natural, tão irracional de um ponto de vista ingênuo, é evidentemente um princípio-guia do capitalismo, da mesma forma que soa estranha para todas as pessoas que não estão sob influência capitalista. Ela expressa ao mesmo tempo um tipo de sentimento que está intimamente ligado a certas idéias religiosas. (WEBER, 2004, p. 49) Weber nesta obra demonstra que o capitalismo força os indivíduos a se conformarem com as regras do sistema de mercado. A religião impulsiona estes mesmos indivíduos a aceitarem tais regras no sentido de conduzir seus lucros e ganhos em uma conduta ideal de suas vidas. Para finalizar, nas palavras de Weber, Por outro lado, contudo, não temos qualquer intenção de sustentar uma tese tola e doutrinária, pela qual o espírito do capitalismo (...) possa ter surgido apenas como resultado de certos efeitos da Reforma, ou mesmo que o capitalismo, como sistema econômico, seja efeito da Reforma. O fato de que certas formas importantes de organização capitalista dos negócios são sabidamente mais antigas que a Reforma bastaria, por si só, para refutar tal afirmação. Ao contrário, queremos apenas nos certificar se, e em que medida, as forças religiosas tomaram parte na formação qualitativa e na expansão quantitativa desse espírito pelo mundo. Além disso, verificar que aspectos de nossa cultura capitalista podem apontar para aquelas. Tendo em vista a tremenda confusão das influências interdependentes das bases materiais, as formas de organização social e política e as idéias vigentes no tempo da Reforma, apenas poderemos investigar se, e em que pontos, podemos considerar certas 32 correlações entre as formas de crença religiosa e as práticas éticas. Ao mesmo tempo, na medida do possível serão esclarecidas a maneira e a direção geral em que por força de tais relacionamentos, os movimentos religiosos influenciaram o desenvolvimento da cultura material. Só depois de o termos determinado com precisão razoável poderemos tentar avaliar em que medida o desenvolvimento histórico da cultura moderna pode ser atribuída a tais religiosas e em que medida podem ser relacionadas a elas. (WEBER, 2004, p. 75). Parte II 7) Sociologia brasileira: breve histórico O desenvolvimento principal da ciência sociologia ocorreu na França, posteriormente na Alemanha e em seguida nos Estados Unidos. No Brasil assim como outros países (tais como Inglaterra, Itália, Rússia) demorou um pouco mais para se solidificar. (inserir apresentação Gama Filho) Para Viana (2006), a sociologia tanto no Brasil como na América Latina passou por quatro momentos distintos, o primeiro até 1930, passou por uma fase sem elaboração teórica, apenas com reprodução das teorias sociológicas européias. O segundo, entre 1930 e 1945, compreende os primeiros passos para a institucionalização da sociologia, com a inauguração da Escola Livre de Sociologia e Política, Surgem os primeiros livros didáticos de Sociologia, escritos por Arthur Ramos (1903-1949), Delgado de Carvalho (19011951), Fernando de Azevedo (1884-1974), Carneiro Leão 33 (1887-1966), etc., bem como a tradução de As regras do método sociológico de Durkheim e a fundação da Sociedade de Sociologia de São Paulo. Também a vinda de intelectuais estrangeiros, como Roger Bastide (1898-1974), Jacques Lambert (1901-), Levi Strauss (1908-2009), entre outros, marcam um processo institucionalização da de aprimoramento Sociologia no Brasil. da Outras publicações como as de Caio Prado Júnior (1907-1990) e Gilberto Freire (1900-1987) marcam um processo de formação de um pensamento mais elaborado e fundamentado em relação ao existente antes dos anos 30. (VIANA, 2006, p. 102) O terceiro momento da sociologia no Brasil, segundo Viana (2006), tem início em 1945, é a consolidação desta ciência em nosso país. Os pesquisadores começam usar técnicas próprias para o estudo da sociedade. O referencial teórico ainda é o europeu, aplicado à realidade brasileira, mas isto se deve também ao nascimento da sociologia em um ambiente de subordinação econômica vivida em nosso país, o que impactou na publicação de artigos originais e inovadores. A sociologia subordinada brasileira nunca teve grande originalidade e foi sempre influenciada pelas tendências norte-americanas e francesas, principalmente. Nesse período, surgem obras importantes na história da sociologia brasileira: A revolução brasileira, de Caio Prado Júnior; Sociedade de classes e subdesenvolvimento, de Florestan Fernandes (1920-1995); Industrialização e atitudes operárias, de Leôncio Martins Rodrigues; Brancos e negros em São Paulo, de Florestan Fernandes e Roger Bastide, (...). (VIANA, 2006, p. 102) 34 No quarto momento há o desenvolvimento da sociologia tanto com sua institucionalização pelo Brasil como também pela abordagem, com maior complexidade nas interpretações da realidade brasileira. Octavio Ianni considera que a produção sociológica brasileira após 1945 encontrou três ciclos para sua solidificação. Um que diz respeito à crise de transição do capitalismo agrário para o capitalismo industrial, o segundo que se refere a reinterpretação social da história do país e o terceiro diz respeito às transformações sociais, a revolução burguesa. (IANNI, 1989) Muitos artigos, ensaios e monografias, sobre os mais variados temas, relacionam-se de alguma forma a esses três núcleos principais de problemas. Seja a análise do populismo ou a do golpe de Estado, seja a polêmica sobre os modelos políticos do desenvolvimento econômico ou a controvérsia metodológica relativa a questões de objetividade e amplitude das interpretações, em quase todos os casos é evidente que a produção sociológica brasileira está polarizada em torno desses núcleos. Isto porque a sociologia (como as outras ciências sociais, principalmente a economia política) nessa época está recebendo fortes solicitações e influências das classes sociais hegemônicas e subalternas que se movimentam no cenário político e cultural do país. As “novas” classes sociais, de base urbanoindustrial, pressionam e influenciam todas as esferas da produção cultural, suscitando novos problemas e perspectivas para pesquisa, análise e discussão. (IANNI, 1989, p. 08) 35 Ainda segundo Ianni, a sociologia constitui o tipo de capitalismo que se formou no Brasil e após 1945 foi um forte instrumento que apresentou os movimentos das classes sociais e suas perspectivas. Liedke Filho (2005) considera que, assim como os filósofos sociais na Europa foram precursores da sociologia, também no Brasil tivemos um período pré-científico para a teoria social que se estendeu até o início do século XX. Sob influência das teorias de Comte, Spencer, Cousin, os políticos ou pensadores autodidatas brasileiros procuravam soluções para problemas sociais da época, tais como: a oposição entre liberais e autoritários, a identidade nacional e a questão racial. A sociologia como ciência, assim como pontuamos acima, iniciou por volta de 1920, quando a sociologia foi introduzida nos cursos de direito e economia. O movimento da Escola Nova, por volta de 1924, também influenciou o ensino de sociologia, haja visto que, publicavam manuais de sociologia e se ensino. Azevedo (1951), enfocando esta fase de introdução do ensino da Sociologia em escolas do país (1928-1935), argumenta que a origem da consolidação da Sociologia na mesma deve ser procurada, não em uma única causa determinante, senão em múltiplas causas que estão estreitamente ligadas, sendo possível distingui-las unicamente para fins analíticos. A multiplicidade de fatores decorrentes dos contatos, conflitos e acomodações de povos e culturas diversas; o contraste entre as sociedades em mudança e as culturas de folk remanescentes em toda a vasta extensão territorial; a variedade de paisagens culturais e a contemporaneidade ou justaposição nas realidades concretas, de séculos ou de “camadas históricas”, deveriam 36 certamente sacudir a atenção e despertar o interesse pelo estudo científico dessas realidades sociais vivas e atuais, postas sob os olhos de todos e que não escaparam, pela intensidade dos fenômenos, aos observadores menos atentos. (...) O primeiro surto industrial, em 1918, em conseqüência da guerra mundial, as transformações da estrutura econômica e social que daí resultaram, e a revolução de 1930 que, provocada por essas mudanças, contribuiu para intensificálas repercutindo nas esferas culturais, devem estar na origem da nova atitude crítica na mentalidade das elites novas, dos movimentos de renovação em diversos setores, como nos das letras e das artes, da educação e da política, e do interesse crescente pelos estudos científicos das realidades sociais. (LIEDKE, 2005, p. 382) A sociologia como ciência no Brasil começou a ser discutida em 1934, mas seu apogeu ocorreu somente em 1950. Como vimos acima, a primeira experiência de institucionalização foi com a Escola de Sociologia e Política em São Paulo. A criação desta Escola tinha como objetivo formar e organizar a elite a partir de métodos científicos elaborados na Europa. A partir de seus estudos, publicaram pesquisas com relação a comunidades, baseadas nas teorias da Escola de Chicago e que podem ser consideradas como as primeiras pesquisas sociológicas no Brasil. Com o advento da industrialização a partir de 1920 e a revolução de 1930 foram criados os motivos por novos movimentos e pelo estudo da situação social brasileira. (inserir filme VI) A Escola de Sociologia da USP (Universidade de São Paulo) surgiu em 1955 sob a liderança de Florestan Fernandes que desenvolveu pesquisas 37 sobre as relações raciais brasileiras. Mas a sociologia cientifica ainda tinha um longo caminho para percorrer no Brasil, A emergência dos “novos” regimes autoritários latinoamericanos, a partir da década de sessenta, e seus impactos negativos sobre a práxis sociológica na região vieram a ser interpretados como “obstáculos” à consolidação da sociologia científica (Germani, 1969; Fernandes, 1977). Uma “crise” da Sociologia seria interpretada seja como um sinal de “imaturidade” das ciências sociais ou como uma disfunção entre os requisitos universais-normativos da ciência e os interesses e atitudes sociais, sendo concebida em ambos os casos como uma fase transitória que, uma vez superada implicaria no florescimento pleno da “Sociologia Científica”. (LIEDKE, 2005, p. 390) Várias abordagens se sucederam após a sociologia científica se institucionalizar no Brasil. Pensava-se em uma sociologia nacional, que enfatizasse a democracia nacional e representasse a realidade da sociedade. Esta corrente da sociologia criticava o cientificismo, creditando a este a alienação das pesquisas elaboradoras sobre o Brasil. A alienação da Sociologia brasileira decorre de que ela não é, em regra, fruto de esforços tendentes a promover a autodeterminação de nossa sociedade, sendo que o sociólogo brasileiro tem realmente assumido uma atitude perfeitamente equivalente à do estrangeiro que nos olha a partir de seu contexto nacional e em função deste nos interpreta (LIEDKE FILHO, 2005, p. 393) 38 Em 1960 ambas abordagens sofreram críticas marxistas que provocou um novo campo de análise da sociologia com novas interpretações metodológicas sobre a realidade brasileira. Desta forma e diante da crise democrática que o país vivia, a diversificação da sociologia ocorreu rapidamente. Após o golpe de 1964, mesmo com os impactos repressivos sobre associações e institutos de sociologia, observou-se um aumento na institucionalização da mesma, principalmente após 1969, data da reforma universitária. (LIEDKE FILHO, 2005) Após o período militar, a ênfase nas pesquisas mudou e a abordagem passou para a sociedade civil, com destaque aos movimentos sociais. A sociologia brasileira de 1960 para 1990 passou da temática macroestrutural com relação ao sistema econômico e político, para a análise da transição democrática e o papel dos movimentos sociais. De forma muito rápida, em meados da década de 1990, esta temática também mudou para as pesquisas dedicadas a identidade e representação social. Na atualidade, dentro de um contexto de busca de uma nova identidades das ciências sociais brasileiras, “pode (se) constatar face à expansão e diferenciação dos grupos de pesquisa constantes do Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq, novos temas e novas abordagens (que) vieram a ser propostos para a explicação e/ou compreensão da situação social brasileira.” (LIEDKE FILHO, 2005, p. 426) Para Schwartzman com a profissionalização, o sociólogo perdeu credibilidade, isto porque, a sociologia está entre a economia e a política com a diferença que não possui os mesmos instrumentos técnicos para análise social 39 que estas outras ciências têm. Para este autor, as transformações sociais com o fim do socialismo geraram a perda de referenciais outra defendidos pelos sociólogos, o fundamento moral da ação intelectual e profissional do cientista social, antes baseado no engajamento político em favor de um projeto claro de transformação social, também se fragmentou e diversificou. Para muitos dos que continuam na militância política e social, a ética dos direitos individuais, subjetivos e imediatos toma o lugar dos projetos globais e de longo prazo de transformação, e os interesses dos grupos e movimentos em que participam passam a ser interpretados como se fossem de interesse geral. Para outros, sobretudo nas universidades, prevalecem os valores da produção científica e intelectual, medida de forma empobrecida pelos indicadores convencionais de desempenho acadêmico; para os poucos que se dedicam ao trabalho profissional para clientes públicos e privados, são os valores do sucesso profissional, expresso nas carreiras em empresas e organizações, assim como nas recompensas salariais, que adquirem primeiro plano. E existem ainda os que escrevem e se comunicam com o grande público, através de jornais e livros de cunho geral, e que valorizam, sobretudo, o papel que possam ter como formadores de opinião. (SCHWARTZMAN, 2009, p. 272) A fragmentação da sociologia, tanto no Brasil como em outros países, pode ser analisada de duas formas, ou seja, tanto pode significar um retrocesso para esta ciência como também pode indicar novas formas de pesquisa e análise sociológica. Schwartzman aponta como campo para a sociologia a sociedade civil. 40 Diante desta afirmação, Burawoy propôs que existiam quatro tipos de sociologia, assim indicado: a primeira é a sociologia profissional presente na academia; a segunda é a sociologia crítica também presente na academia, mas com a preocupação de saber a natureza da sociologia; a terceira é a sociologia aplicada que tem o intuito de estudar políticas publicas, e a última é a sociologia pública onde a presença do sociólogo está além da academia. A preocupação fundamental de Schwartzman é demonstrar que a sociologia no Brasil cresceu, mas ainda falta campo de trabalho já que fundamentalmente o sociólogo exerce sua profissão em universidades, como professor, assim relata Minha hipótese é de que os principais campos de trabalho para os sociólogos brasileiros, hoje, são as organizações não-governamentais da sociedade civil, o trabalho na administração pública e a carreira acadêmica. Diferentemente de Burawoy, acredito que é no mundo acadêmico, da liberdade de pesquisa e do rigor científico, que deveria estar a âncora que desse ao sociólogo a liberdade de trabalhar com autonomia e independência intelectual nos outros setores. A questão que se coloca é se essa âncora realmente funciona, ou se, ao contrário, são as agendas das organizações da sociedade civil e das burocracias públicas, assim como dos partidos e movimentos políticos que permeiam as instituições, que acabam determinando o que ocorre no âmbito da pesquisa acadêmica e profissional. Não há dúvida de que uma sociologia aberta para o público, com temas trazidos pela sociedade e cujas conclusões são testadas e discutidas pela sociedade, é muito mais rica e interessante que uma sociologia trancafiada nos muros disciplinares e dedicada aos rituais dos jogos de poder e prestígio da academia. O desafio que vejo para os sociólogos no Brasil é o de estarem 41 atentos e sintonizados com essa agenda pública e, ao mesmo tempo, consolidar uma sociologia que mantenha sua independência e sua relevância, tanto em relação aos rituais acadêmicos quanto em relação às organizações e movimentos sociais com os quais dialoga ou dos quais participa. Existem duas condições para que isso possa ser feito. A primeira é que o campo do espaço acadêmico possa se fortalecer cada vez mais, fazendo com que os valores e os benefícios do trabalho e da independência intelectual prevaleçam sobre outras motivações e interesses. O segundo é que a sociologia consiga retomar, de forma criativa e significativa, seu espaço intelectual e sua relevância para a sociedade. (Schwartzman, 2009, p.277) Para este autor, os sociólogos brasileiros têm que pensar no sentido de colaborar com a transformação do estado nacional, bem como das instituições públicas, mesmo que estes não sejam mais objetos exclusivos da sociologia. O objeto e o tema de pesquisa tem sido recorrente na sociologia. A certeza é que, de forma geral, as relações entre ciência e sociedade tem se realizado pela sociologia. No Brasil isto assume formas de temas de pesquisa que, segundo Liedke Filho, se concentram em sete grandes eixos, a saber: 1) as etapas da institucionalização da sociologia para alcançar o status acadêmico-científico; 2) a tipologia da evolução institucional do trabalho sociológico; 3) as periodizações da sociologia na América Latina; 4) a situação vivida sob o regime autoritário não só no Brasil mas em toda América Latina; 5) o conceito de comunidade acadêmico-científica; 6) a presença da sociologia em Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq); 7) a 42 capacidade da sociologia de enfrentar teórico-metodologicamente os desafios temáticos e históricos que as sociedades apresentam. (LIEDKE FILHO, 2003) A seguir acompanharemos a trajetória dos principais sociólogos brasileiras da contemporaneidade. Faremos uma recuperação dos principais temas abordados em suas obras como também da importância de seus métodos científicos para a sociologia nacional. Começaremos por Florestan Fernandes. 8) Florestan Fernandes e a Sociologia no Brasil Florestan Fernandes em entrevista (fonte: novaescola.com) A evolução das orientações teórico-metodológicas e das preocupações temáticopolíticas que caracterizam a obra de Florestan Fernandes, permitem a identificação de quatro etapas distintas: Etapa de Formação Intelectual (1941-1952); Etapa da Sociologia numa Era de Revolução Social (1952-1967); Etapa da Reflexão sobre a 43 Revolução Burguesa no Brasil (1967-1986) e Etapa da Militância-Cidadã (1986-1995). (...) A Etapa de Formação Intelectual de Florestan Fernandes estende-se do seu ingresso na Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo em 1941, até o momento em que assume a Cadeira de Sociologia I em 1953. Destacam-se, nessa etapa entre os estudos empíricos, os levantamentos acerca do Folclore e da Mudança Social em São Paulo (1976a), A Organização Social dos Tupinambás (redação em 1947 e primeira publicação em 1949; 1963), A Função Social da Guerra na Sociedade Tupinambá (1949; republicado 1970). Entre os estudos teórico-metodológicos, merecem destaque a introdução, de sua autoria, para a tradução, da Contribuição à Crítica da Economia Política de Marx, realizada em 1946, como “tarefa” de sua, então, militância no movimento trotskista, e a monografia acerca da “Concepção de Ciência Política de Karl Mannheim” (In 1974b), redigida em 1946, sob orientação do Professor Emílio Willems, como trabalho da Cadeira de Antropologia da Pósgraduação na Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo. Destaque cabe também ao texto “O Problema do Método na Investigação Sociológica” (1947, in 1971), no qual se configura a originalidade da formulação teórica inicial da obra de Florestan, a qual imantou a organização da “Escola de Sociologia da USP”. (...) Uma segunda etapa da obra de Florestan - Etapa da Sociologia numa Era de Revolução Social (1952-1965) – tem por base a historicização da problemática original da obra de Florestan Fernandes, a qual passa a ser nucleada na relação entre razão e possibilidades de construção da ordem social, industrial e democrática no Brasil, cabendo, neste processo de intervenção, um papel relevante à Sociologia Aplicada. Florestan Fernandes, no texto “Desenvolvimento Histórico-Social da Sociologia no Brasil” (1957, in 1977), propôs uma periodização da evolução da Sociologia no Brasil tendo por base o objetivo dominante da produção de conhecimentos sociológicos, o que permite compreender o significado que ele atribuía à Sociologia e ao seu próprio trabalho intelectual nesta etapa. (...) Em 1952, Florestan Fernandes assumiu a Cadeira de Sociologia I, em substituição a Roger Bastide que retornava então à Europa, e deu início à organização de um grupo de colaboradores, constituído inicialmente por Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni e Renato Jardim Moreira, originando a “Escola de Sociologia da USP”. Por “Escola de Sociologia da USP” ou “Escola de Sociologia de Florestan Fernandes” entende-se o grupo de cientistas sociais que trabalharam ligados a este sociólogo no período de 1954 a 1969, na antiga Faculdade de Filosofia da USP, desenvolvendo uma série de projetos de pesquisa comuns, abrangendo temas referentes (1) às 44 relações raciais no Brasil, (2) à empresa industrial em São Paulo e (3) à análise sociológica do desenvolvimento no Brasil, (...) A reflexão acerca da Sociologia Aplicada ocupa lugar de destaque na produção intelectual de Florestan Fernandes nesta etapa, sendo a mesma concebida como a “análise dos efeitos disnômicos da vida social e das condições previsíveis de intervenção racional no controle das situações em que elas emergem socialmente”, sendo uma das exigências fundamentais da mesma, que seja uma análise do presente. (1971, p. 151). São desta etapa da obra de Florestan, expressando suas bases teórico-metodológicas, os textos “O Método de Interpretação Funcionalista em Sociologia” (Tese de Livre-Docência à Cadeira de Sociologia I, defendida em 1953); “O Problema da Indução na Sociologia” (1954) e “A Reconstrução da Realidade nas ciências sociais” (1957), publicados na coletânea Fundamentos Empíricos da Explicação Sociológica (Fernandes,1980a). (...) Uma terceira etapa da obra de Florestan Fernandes – Etapa da Reflexão sobre a Revolução Burguesa no Brasil – inicia-se sob o impacto do movimento de 1964, quando se realiza uma ruptura radical com a problemática até então vigente na sua produção intelectual. A dignidade intelectual de Florestan Fernandes nos dramáticos momentos que se seguiram a 1964, está registrada em seu discurso de paraninfo da turma da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de 1964, intitulado “A Revolução Brasileira e os Intelectuais” (1965, in 1969), e, particularmente, em sua “Autodefesa”, carta enviada ao Encarregado do Inquérito Policial-Militar junto à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP e que precedeu sua prisão por três dias em setembro de 1964, carta esta publicada como “Apêndice” ao texto “Em Busca de Uma Sociologia Crítica e Militante” (1977). “Sociedade de Classes e Subdesenvolvimento” (1967, in 1969) é o texto-marco dessa ruptura, enquanto instauração da problemática do subdesenvolvimento como forma específica de realização do capitalismo mundial, a qual se apresenta como uma forma particular de Revolução Burguesa, despojada de qualquer impulso construtivo e revolucionário. O referido texto, que dá o nome à coletânea em que foi publicado, distancia-se profundamente dos demais textos desta, os quais, redigidos entre 1965 e 1967, ainda se encontram dentro dos marcos teóricos da problemática anterior da produção de Florestan Fernandes, tendo o conceito de Dilema Social como conceito explicativo principal. Ressalte-se, todavia, que o caráter particular da Revolução Burguesa no Brasil, a partir da formação histórica da sociedade brasileira, adquire importância 45 crescente ao longo desses textos redigidos entre 1965 e 1967, vindo a culminar na referida ruptura. (...) Ainda em 1986, com a aceitação do convite formulado pelo Partido dos Trabalhadores para concorrer à Câmara dos Deputados, tem início uma quarta etapa – Etapa da Militância-Cidadã, em que, junto com a crítica ao jogo político das elites para a manutenção de seus privilégios durante a fase Constituinte, à Nova República e à eleição presidencial de 1989, vieram a ocupar lugar de destaque as intervenções de Florestan Fernandes como Deputado Federal Constituinte e membro da Comissão de Educação, a favor de uma educação verdadeiramente popular e democrática, tendo proposto a lei que estabelece um percentual para a educação e ciência. Nessa etapa, destacam-se os livros Que Tipo de República? (1986), O Processo Constituinte (1988), Florestan Fernandes - Pensamento e Ação - O PT e os Rumos do Socialismo (1989), A transição prolongada (1990), Democracia e Desenvolvimento - A Transformação da Periferia e o Capitalismo Monopolista na Era Atual (1994) e Tensões na Educação (1995). Riedke Filho, 2005 A USP (Universidade de São Paulo) em 1934 surgiu das novas concepções vindas das elites políticas paulistas tradicionais e de projetos educacionais avançados. Este espaço foi importante para a formação de cientistas que poderiam se dedicar exclusivamente à docência e à pesquisa acadêmica, e desta forma as ciências sociais puderam se institucionalizar de forma moderna e transformadora. (ARRUDA, 2010) Florestan Fernandes (1920-1995) foi um dos primeiros cientistas sociais formado pela USP e que em seguida ingressou no corpo docente da faculdade. (inserir apresentação Gama Filho) Nenhum dos seus contemporâneos identificou-se, como ele, com a missão de edificar as bases científicas da sociologia 46 no Brasil; tampouco a nenhum da sua geração pôde-se atribuir papel de tal proeminência no campo da teoria, da pesquisa sociológica, da atuação institucional e do entendimento da dimensão profissional do métier. Por essa razão, a imagem do sociólogo brasileiro, hoje difundida, inspirou-se largamente na sua trajetória pessoal e institucional, estilo que vinha se desenvolvendo desde, pelo menos, o meio século XX, como decorrência da fundação da Universidade de São Paulo e do modelo de pesquisa introduzido pela Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, criada em 1933, combinados à tradição brasileira do intelectual público, especialmente marcante no Rio de Janeiro. O perfil do cientista social compôs-se, portanto, no encontro entre essas diversas tradições, que pressupôs o ensino sistemático das disciplinas em moldes científicos e o envolvimento com as questões públicas do país. (ARRUDA, 2010, p. 11) Foi em São Paulo que ocorreu as maiores e mais rápidas mudanças na sociedade brasileira, dadas a crescente industrialização e a grande representatividade de forças políticas e intelectuais. E por isso, e não podia ser diferente, foi onde a sociologia primeiro se desenvolveu. Segundo Arruda, o tema dos intelectuais deste período era a mudança social, isto porque “A sociologia no Brasil bebeu na fonte da modernização em curso e elegeu como problema fundamental da reflexão a formação da sociedade moderna no país: suas possibilidades, tensões, impasses e dilemas no desenrolar das transformações. (ARRUDA, 2010, p. 12) Em meio a estas transformações que Florestan Fernandes começou suas pesquisas 47 As concepções sociológicas de Florestan hauriram da sociologia mannheimiana parte essencial das suas motivações, evidenciadas no significado que atribuiu ao papel dos intelectuais na vida das sociedades, presentes nas suas formulações sobre a “civilização científica”, resultaram também das análises sobre os dilemas da modernização no Brasil. A consciência de que a nossa formação moderna era particular não o impediu, especialmente ao longo dos anos de 1950, de admitir a real possibilidade de se criar no país princípios de uma modernidade ancorada em valores democráticos. Nos seus termos, apesar de a “transplantação da civilização ocidental para a zona tropical” constituir-se “em processo penoso, cheio de dificuldades e de transtornos”, era viável a construção da civilização moderna no país, caso certos requisitos como o da expansão da educação e o da intervenção racional das ciências sociais fossem realizados (Fernandes, 1974. p. 311 – as referências seguintes a essa obra seguirão a segunda edição). (ARRUDA, 2010, p. 13) Quando Florestan foi admitido, em 1945, na USP como docente sua pesquisa apontou variações na análise do processo de formação do Brasil. Neste mesmo ano Florestan escreve o livro Tiago Marques Aibopureu: um bororo marginal para um seminário sobre os índios no Brasil. Neste artigo, é destacado o tratamento de conflito entre homens e sociedade, como também a história de herança e negação junto às escolhas individuais. Estes caminhos percorridos por Tiago, segundo Arruda também representaram os caminhos de Florestan que, situado entre dois mundos – o das classes populares e o da Universidade –, diferentemente do Índio Bororo, construiu 48 uma “solução ativa” que lhe permitiu romper o estranhamento inicial, gestado na natural dificuldade de uma pessoa socialmente desenraizada conviver com um ambiente bastante elitizado da Faculdade de Filosofia, nos seus primeiros tempos. (ARRUDA, 2010, p. 14) Com muito empenho Florestan rompeu preconceitos e fez uma construção de si mesmo diante dos novos desafios que lhe era apresentado. Sua obra intelectual demonstra isso, ou seja, a preocupação em construir a moderna sociedade brasileira. A década de 1950, acompanhado pelo momento político brasileiro de modernização e transformação, foi o período de maior destaque da sociologia de Florestan. A sociedade durante anos acreditou no potencial transformador dessas idéias vindas do conhecimento social, e por isso, a sociologia ganhou espaço entre as promessas e estudos organizados para este novo momento. (ARRUDA, 2010) (inserir filme VII) A Escola Paulista de Sociologia, no entanto, buscou demarcar, com muita nitidez, as diferenças entre a atuação pública do cientista social do seu compromisso com o conhecimento rigoroso, seguindo a orientação de Florestan, que não se alforriava da ciência e para qual dirigia a maior parte de suas energias, projeto, aliás, comum a outros cientistas sociais da América Latina que tiveram papel central na renovação das disciplinas, delineando seus rumos vindouros, como foi o caso de Gino Germani, na Argentina peronista (cf. Neiburg, 1997, pp. 157-184). Por todos os motivos assinalados, esses cientistas sociais tiveram que moldar os novos papéis, modelar a nova figura, em um espaço aberto a estilizações. Não por casualidade, Florestan e Germani eram representantes típicos da 49 condição outsider: o primeiro por ser originário dos estratos inferiores das camadas populares; o segundo em função da sua condição de recém-emigrado que “não era individualmente conhecido [...] nem estava conectado com algum movimento intelectual visível” (Blanco, 2006, p. 244). A compreensão do potencial de inovação requeria, portanto, o tratamento das disposições diversas aos sujeitos imersos no processo, bem como a maneira como aderiam ao novo estilo e identificavam-se com as instituições. (ARRUDA, 2010, p. 16) A preocupação científica de Florestan com a sociologia revelava sua consciência em fazer desta ciência uma agenda de pesquisa com implicações à própria sociologia. Ele propunha fazer desta ciência no Brasil novos métodos para que se conseguisse abordar as sociedades heterogêneas presentes em nosso país. Todo este projeto passava pela universidade que poderia legitimar a sociologia no Brasil. Outra obra que marcou a produção teórica de Florestan foi A integração do negro na sociedade de classes. Esta foi sua tese para o concurso da cátedra de sociologia na USP, apresentada em 1964. Neste trabalho Florestan retoma a temática das relações raciais e revela o amadurecimento da reflexão sociológica com questões sobre a constituição do Brasil moderno Explicita-se, (...) o entendimento da particular realização da sociedade moderna no Brasil, como processo complexo e de resultados híbridos, uma vez que, a despeito do ritmo das transformações, padece de uma sorte de fraqueza congênita, comprometendo todo o seu desenvolvimento ulterior. As análises sobre a herança da escravidão 50 inseriam-se, dessa maneira, na busca de compreender como os fundamentos da sociedade brasileira produziam bloqueios à plena consecução de princípios civilizados, verdadeiros anteparos à pura modernidade capitalista. O projeto de investigar o papel das relações escravistas no Brasil na constituição da sociedade nacional desdobrou-se nos trabalhos escritos por seus assistentes, como Fernando Henrique Cardoso, Octávio Ianni, Maria Sylvia de Carvalho Franco, entre outros colaboradores. A articulação dos temas de pesquisa deu frutos e produziu afinidades intelectuais ao grupo reunido por Florestan, justificando a identificação posteriormente construída e sintetizada na expressão Escola Paulista de Sociologia, apesar de a convivência não ter sido sempre apaziguada e comportar diferenças internas entre os participantes. (ARRUDA, 2010, p. 19) Nesta obra, Florestan identifica que o imigrante em São Paulo teve relativa aceitação e sucesso em sua incursão, diferente do grupo negro que teve um processo de lenta integração. O autor reconstrói o passado destes grupos por meio da análise de sua história econômica e social. Verifica que o fim da escravidão e o crescimento rápido da cidade de São Paulo ao foram motivos de inclusão dos negros aos postos de trabalho. “É justamente sobre este “drama histórico” que se concentra a maior parte da reconstrução histórica apresentada em A integração do negro na sociedade de classes.” (BRASIL JR., 2010, p. 182) O elevado número de imigrantes que entrou na capital paulista representou, segundo Fernandes, um impacto demográfico e econômico que gerou diferenças e desigualdades na estrutura social. 51 O fato de a urbanização e a industrialização se darem, em grande parte, como consequência da imigração concedia ao imigrante uma posição altamente vantajosa em relação ao elemento nacional e, em segundo lugar, quase anulava as possibilidades de competição do negro e do mulato, automaticamente deslocados para os setores menos favorecidos do conglomerado nacional. (FERNANDES, 2008 apud BRASIL JR., 2010, p. 183) Os imigrantes estrangeiros ou de outros estados do Brasil tinham garantido postos de trabalho melhores que os dos negros. Florestan através desta afirmação, responde sociologicamente, com a análise de que os negros não tinham ainda se ajustado as novas regras do mercado de trabalho, o que tornava um caminho quase que impossível dissociar a pessoa humana do trabalho que agora era livre e com contrato, onde o que se vende a força de trabalho. para manter a pessoa intangível, procuravam cumprir as obrigações contratuais segundo um arbítrio que, formalmente, prejudicava os interesses do contratante, por causa das incertezas e imprevistos que se introduziam na relação patrão-assalariado. A recusa de certas tarefas e serviços; a inconstância na frequência ao trabalho; o fascínio por ocupações real ou aparentemente nobilitantes; a tendência a alternar períodos de trabalho regular com fases mais ou menos longas de ócio; [...] essas e outras “deficiências” do negro e do mulato se entrosavam à complexa situação humana com que se defrontavam no regime de trabalho livre (FERNANDES, 2008 apud BRASIL JR., 2010, p. 184). 52 A expansão do capitalismo na cidade de São Paulo teve seu ajuste a partir de uma desigualdade entre negros e imigrantes. Florestan certifica que os negros não tiveram a experiência de uma nova sociedade, mais moderna, pois as mudanças sociais trazidas com os imigrantes bloquearam este trabalhador (BRASIL JR, 2010), desta forma, a industrialização de São Paulo não permitiu a integração de todos os grupos sociais na esfera econômica do período. Florestan Fernandes em A integração do negro na sociedade de classes dá um destaque à constituição familiar, considera que os negros tinham uma família incompleta, pois em uma sociedade de classes a família era o único apoio que o indivíduo tinha Sem um mínimo de cooperação e de solidariedade domésticas, ninguém podia vencer naquela “selva selvagem”; a “competição individualista”, irrefreada ou não, requeria um complexo substrato institucional, de que a família integrada constituía o patamar. Os exemplos dos imigrantes são conclusivos, pois entre eles a família sempre servia, direta ou indiretamente, de alicerce à rápida ascensão econômica, social e política. (FERNANDES, 2008 apud BRASIL JR., 2010, p. 196) Fernandes sugere que os grupos negros foram os mais prejudicados por este processo de modernização em São Paulo, mas considera também que outros grupos, definidos pelo autor como rústicos, foram excluídos deste processo de mudança sócio-econômica. 53 Outra abordagem relevante que o autor faz na obra A integração do negro na sociedade de classes é com relação aos movimentos sociais dos negros. Florestan considera que estes movimentos estavam ligados aos setores mais frágeis da sociedade, pois não conseguiam envolver outros grupos e a própria sociedade de forma completa. “Neste ‘drama histórico’, a sociedade brasileira teria deixado aos negros a ‘responsabilidade de se fazer justiça com as próprias mãos’, condenando ao malogro as tentativas de democratização da sociedade.” (BRASIL JR., 2010, p. 209) A revolução burguesa no Brasil, outra obra de destaque, publicada em 1975, revela, além de seu conteúdo científico, o percurso intelectual de Florestan. Neste livro, ele analisa a formação da sociedade burguesa no Brasil, assim exposto, É preciso que o leitor entenda que não projetava fazer obra de “Sociologia acadêmica”. Ao contrário, pretendia, na linguagem mais simples possível, resumir as principais linhas da evolução do capitalismo e da sociedade de classes no Brasil. Trata-se de um ensaio livre, que não poderia escrever se não fosse sociólogo. Mas que põe em primeiro plano as frustrações e as esperanças de um socialista militante (FERNANDES, 1958 apud ARRUDA, 2010, p. 20). Florestan aborda a construção da sociedade de classes e a formação da racionalidade burguesa brasileira, assim como explica [...] trata-se [...] de determinar como se processou a absorção de um padrão estrutural e dinâmico de organização da economia, da sociedade e da cultura. Sem a 54 universalização do trabalho assalariado e a expansão da ordem social competitiva, como iríamos organizar uma economia de mercado de bases monetárias e capitalistas? É dessa perspectiva que o “burguês” e a “revolução” aparecem no horizonte da análise sociológica. Não tivemos todo o passado da Europa, mas reproduzimos de forma peculiar o seu passado recente, pois este era parte do próprio processo de implantação e desenvolvimento da civilização ocidental moderna no Brasil. Falar em revolução burguesa, nesse sentido, consiste em procurar os agentes humanos das grandes transformações histórico-sociais que estão por trás da desagregação do regime escravocratasenhorial e da formação de uma sociedade de classes no Brasil. (FERNANDES, 1958 apud ARRUDA, 2010, p. 21) Desta forma Florestan busca, por meio da recuperação da história das classes sociais, se certificar sobre a formação do Brasil moderno, e assim responder questões da origem e da identidade brasileira e os caminhos para superar o tradicionalismo existente. A revolução burguesa no Brasil é atual e suscita discussões e referências pois, “Florestan localiza o problema da nossa história na incapacidade ou impossibilidade de superar os princípios inerentes à ordem social anterior. As noções de capitalismo dependente e ordem social competitiva estruturam a análise, permitindo-lhe compreender os limites do ‘estilo competitivo de vida social’ e da ‘mentalidade econômica racional’.” (ARRUDA, 2010, p. 22) Com relação a formação do homem enquanto modelo de competição, Florestan recupera no período escravocrata brasileiro o comerciante de escravos e seu papel externo e interno no mercado com 55 relação ao senhor de escravos. Segundo o autor este foi o início do agente humano competidor, assim como justifica Florestan, Não obstante, esse agente humano interessa seriamente à análise sociológica. É que ele está na raiz da formação do modelo brasileiro de “competição”. Seria injusto subestimar o esforço criador – no sentido puramente econômico – do agente humano envolvido no “alto comércio” de exportação e de importação. Mas também seria ingênuo tentar compreendê-lo como se ele estivesse à testa de processos econômicos de um desenvolvimento capitalista auto- sustentado, auto-suficiente e hegemônico. Ele era um produto acabado da “pirataria” e do caráter extorsivo do comércio neocolonial, que a indirect rule inglesa espalhou pelo mundo. Havia um substrato econômico nos “termos de negócio”. Todavia, o mais importante não estava aí. Isso aconteceria se os “termos de troca” constituíssem uma operação estritamente econômica nos moldes do mercado capitalista especificamente moderno. No comércio neocolonial contava, essencialmente, a capacidade de ditar ou de determinar as condições dos “termos de troca”. Como o setor agrário, o “setor mercantil” iria definir a sua compreensão da “iniciativa privada” e da natureza da “competição” em termos estamentais: como um privilégio, ou seja, como a faculdade de influenciar ou de estabelecer as condições dentro das quais as relações e os processos econômicos deveriam ser adaptados à situação de interesses do agente econômico. Dessa perspectiva, este não realizava o seu destino econômico no e através do mercado, mas fora e acima dele, pela manipulação de estruturas de poder suscetíveis de regular, direta ou indiretamente, o fluxo dos custos, dos preços e dos lucros. Essa representação puramente instrumental da “iniciativa privada” e da “competição” deturpava a ação econômica, pois a privilegiava e a potencializava independentemente 56 das “forças do mercado” (e, conforme as circunstâncias, até contra elas). Contudo, ela não só alimentou a integração política do setor, como perdurou ao longo da evolução posterior do mercado capitalista no Brasil. (FERNANDES, 2006, p. 224) Florestan reitera o surgimento e a formação da sociedade de classes, principalmente da origem da burguesia no Brasil. O estado, segundo o autor, foi o transformador desta sociedade já que não era fundamental para a classe burguesa o processo de industrialização. Mas, ao mesmo tempo, a dependência econômica levou a burguesia romper com as relações externas pois não era possível uma organização nacional com implicações externas. “É por esse motivo que a análise da “revolução burguesa no Brasil consiste na crise do poder burguês, que se localiza na era atual e emerge como consequência da transição do capitalismo competitivo para o capitalismo monopolista” (ARRUDA, 2010, p. 23) Além dos livros acima abordados Florestan Fernandes deixou uma vasta obra para a sociologia brasileira, nos atemos em maior parte A revolução Burguesa no Brasil, pois simboliza a profundidade e o rigor científico do autor e seu compromisso com a superação dos problemas sociais brasileiro. 9) Octavio Ianni e o Brasil moderno 57 Octavio Ianni proferindo palestra (fonte:universia.com) A Sociologia de Florestan Fernandes inaugura uma nova época na história da Sociologia brasileira. Não só descortina novos horizontes para a reflexão teórica e a interpretação da realidade social, como permite reler criticamente muito do que tem sido a Sociologia brasileira passada e recente. Permite reler criticamente algumas teses de Silvio Romero, Oliveira Vianna, Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freire entre alguns outros. Simultaneamente, retoma e desenvolve teses esboçadas por Euclides da Cunha, Manoel Bonfim, Caio Prado Júnior, entre outros. A partir desse diálogo com uns e outros, a Sociologia de Florestan Fernandes inaugura uma nova interpretação do Brasil, um novo estilo de pensar o passado e o presente. (IANNI, 1996, p. 25) Com estas palavras Octavio Ianni (1926-2004) inicia um de seus artigos que irá traçar a obra e a teoria de seu professor Florestan Fernandes. Ele participou junto com Florestan da escola de sociologia paulista, escreveu vários livros, e antes de sua morte se dedicou ao tema da globalização, da dinâmica social e da modernidade expressa na contemporaneidade brasileira. Ocupou a cadeira de sociologia I, outrora de Florestan, na Universidade de São Paulo (USP). Muitos de seus artigos abriram caminhos 58 para novas pesquisas na sociologia, como O colapso do populismo no Brasil de 1968. “Desenvolveu uma agenda de trabalho panorâmica e diversificada, pontuada de interesse pela questão racial, pelo desenvolvimento, pela industrialização, pela formação do Estado nacional, pela globalização”. (DOSSIÊ, 2004, p. 167) (inserir filme VIII) Ianni tinha a preocupação de unir o rigor metodológico com a simplicidade para que o público fora da academia tivesse contato com as teorias sociais. Raça e mobilidade social em Florianópolis de 1956 e, As metamorfoses do escravo de 1926 são reflexões que destacam o contexto da escola de sociologia paulista da qual Ianni fazia parte. Ainda na primeira metade da década de 1960, publicou duas obras que revelam a presença de nova inclinação intelectual: A industrialização e desenvolvimento social no Brasil, em 1963, e o Estado e o desenvolvimento econômico no Brasil, em 1964. Textos fundamentais à compreensão das mudanças em curso, as análises absorveram o debate dominante no período, tendo exposto, comitantemente, a importância do chamado Seminário Marx na reorientação das suas reflexões, apresentando, sobretudo, o modo como os jovens professores da Faculdade de Filosofia participavam do crescente engajamento que marcava a cultura do tempo. Com a edição do livro O colapso do populismo no Brasil, em 1968, Octavio Ianni coroou as suas preocupações com os acontecimentos da história recente, absorvendo a reflexão da política no entendimento dos impasses do modelo de desenvolvimento implementado até a queda do governo João Goulart. (DOSSIÊ, 2004, p. 170) 59 Professor da USP até 1969, Ianni teve sua aposentadoria compulsória dada pelo regime militar, por conta disso, passou pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC) e por fim na Unicamp. Buscou compreender e interpretar o Brasil moderno, tendo este como tema principal de sua sociologia. Sua teoria é a análise da realidade social, política e econômica brasileira. Outro tema relevante de suas pesquisas diz respeito à industrialização, tendo publicado Industrialização e o desenvolvimento social no Brasil de 1963 e Estado e capitalismo no Brasil de 1965. Para Costa Lima (2005) Octavio Ianni está entre os pensadores sociais brasileiro de maior destaque e figura entre os fundadores da sociologia nacional como Florestan Fernandes, Antonio Candido, Guerreiro Ramos, entre outros. Em sua análise da monarquia e da oligarquia brasileiras, Ianni introduz a persistência do caráter autoritário do poder estatal no país, apontando, desde a Independência, a reiteração das estruturam o soluções estado autoritárias, brasileiro pelo segundo alto, que interesses oligárquicos, burgueses e imperialistas. E afirma: “o que se revela, ao longo da história, é o desenvolvimento de uma espécie de contra-revolução burguesa permanente”. E aponta Frei Caneca, já em 1824, denunciando o caráter antidemocrático da constituição outorgada por D. Pedro I; mais adiante, Quirino dos Santos em 1869, ao afirmar que o povo não aparecia nas cogitações dos governantes. Em 1877, Tobias Barreto, que lamentará que o povo não tivesse forças para se afrontar com o Estado organizado, que não é a nação, pois o povo permanece “amorfo” e “dissolvido”. Este desleixo só se alterava no momento de reagir 60 negativamente às reivindicações populares, donde a repressão no Nordeste, no Rio Grande do Sul, no Rio Grande do Norte, todas elas violências cometidas na década de 1870 e que irão culminar em Canudos, em 1897. Sob vários aspectos, conclui Ianni, “a brutalidade do estado monáquico foi a contrapartida das reivindicações, protestos e lutas de forças populares no campo e na cidade”. (COSTA LIMA, 2005, p. 05) Para Costa Lima Ianni interpreta as teses racistas perpetradas pelo período monárquico para relacionar com a formação do Estado no Brasil. No artigo publicado em 2000 sob o título de Tendências do pensamento brasileiro Ianni através da história do Brasil, recupera os intelectuais nacionais e suas interpretações sobre nosso país. A pergunta inicial deste artigo diz respeito aos motivos que a intelectualidade e os diversos campos de pesquisa da sociologia reiterada e continuamente se perguntam sobre o que tem sido o Brasil ao longo de sua história. Segundo o autor, muitas vezes a teoria passa por cima da história, como ideologia ou como utopia. Muitas vezes a causa desta busca se dá pelos problemas vividos no presente e suas relações com o futuro. Um dos temas na sociologia brasileira em que se faz a referência tal como descrito acima é o Estado, sua organização e poder. Ianni explica da seguinte forma, Implícita ou explicitamente, essa tese estabelece que a sociedade civil é débil, pouco organizada, gelatinosa. É claro que os argumentos variam. Há argumentos nos quais 61 sobressaem as raízes coloniais e escravocratas da sociedade nacional, compreendendo tradições patrimoniais, coronelismos, caciquismos, políticas de campanário. Outros são abertamente evolucionistas, ou mesmo situados na linha do darwinismo social, apelando para o racismo, o arianismo, uma europeização imaginária. Em geral tomam escritos europeus como se fossem expressões indiscutíveis da formação das nações européias, modelos definitivos para as outras sociedades. Idealizam o que, em certos casos, os europeus também idealizam. Nessa linha de pensamento encontram-se Alberto Torres, Oliveira Vianna, Azevedo Amaral, Francisco Campos, Hélio Jaguaribe, Oliveiros Ferreira, Bolivar Lamounier e alguns outros. Sempre com variações em seus argumentos, inclusive no que se refere ao caráter mais ou menos autoritário do estado, em suas relações com a sociedade civil como um todo e com seus diferentes setores sociais: classes e grupos sociais, agrários e urbanos, civis e militares, partidos políticos e sindicatos, movimentos sociais e correntes de opinião pública. Esta tese é antiga e nova, periodicamente renovada. Tem raízes em várias conjunturas históricas. Nasce dos problemas com os quais se defrontam os governantes, ou blocos de poder, quando se defrontam com uma sociedade civil muito especial: três raças tristes, escravos e livres, índios, negros e brancos, imigrantes e nacionais, regiões mais ou menos isoladas, economia primária exportadora decisivamente influenciada por relações do tipo imperialista e remanescentes colonialistas. Diante dessa realidade, o modelo jurídico-político de estado-nação adotado é o europeu com ingredientes norte-americanos, inspirado no liberalismo, constitucionalismo, divisão dos três poderes, democracia e cidadania; sem maiores compromissos com a efetivação desses princípios ou ideais. Essa a visão da história de boa parte das “elites” deliberantes e governantes, visão essa na qual está implícita ou explícita a idéia de que o povo, enquanto coletividade de cidadãos, precisa ser criado e tutelado, de cima para baixo. Inclusive porque a 62 composição índios, negros e brancos, isto é, escravos e livres, ou dominantes e subalternos, pode ser explosiva. (IANNI, 2000, p. 58) Ianni confirma que ao longo dos séculos XIX e XX no Brasil o tema do Estado está presente como organizador da sociedade e da história nacional e isto é comprovado pelo pensamento social e pelas pesquisas sociológicas. Ainda no artigo Tendências do pensamento brasileiro, Octavio Ianni considera que além do Estado outro tema de importância no pensamento social em nosso país é a formação e a mudança da sociedade. O autor exemplifica, demonstrando que a partir do século XX, com um novo ciclo do capitalismo há um novo arranjo entre os políticos, as oligarquias patriarcais e o estado. Estas oligarquias ganham novos contornos, se modernizam no sentido de se associarem a empresas de mídia em geral, por exemplo. Na história do pensamento brasileiro debruçado sobre a sociedade e sua cultura, são freqüentes e às vezes notáveis os tipos que se criam e recriam, taquigrafando a difícil e complexa realidade. Assim, a história aparece como uma coleção de tipos relativos a indivíduos e coletividades, a situações e contextos marcantes, a momentos da geohistória que se registram metafórica ou alegoricamente. Esclarecem ou ordenam o que se apresenta complexo, contraditório, difícil, como é habitualmente a realidade histórico-social, em suas formas de sociabilidade e em seus jogos de forças sociais. Na história, geografia, antropologia, ciência política, psicologia, teatro, romance, poesia e outras linguagens são freqüentes as construções típicas. Algumas estão rentes ao universo empírico, outras captam tipos médios, mas há as 63 que elaboram tipos extremos. Poderiam ser tomados como naturalistas, realistas, impressionistas, surrealistas ou de outros estilos. São taquigrafias de uma história difícil. (IANNI, 2000, p. 60) Para Ianni há uma complexa rede de tipos idealizados que fazem parte da cultura social, da política, da economia e do inconsciente coletivo. Estes tipos interferem no compromisso da interpretação social, segundo Ianni, eles são vividos e formulados em uma sociedade que viveu quatro séculos de escravismo. Com a abolição, continua Ianni, toda a cultura do trabalho é redefinida a partir de um complexo processo social, “daí os tipos, como estereótipos sátiros, irreverentes e críticos, inocentes e negativos, com os quais se taquigrafam e exorcizam traços, figuras e figurações, ou modos de ser, que a nova ideologia dominante rejeita.” (IANNI, 2000, p. 61) Em Tendências do pensamento brasileiro, Ianni irá apontar a religião como presença constante e poderosa no pensamento social e nas formas de sociabilidade. Para o autor a religião tem sido o tema mais envolvente para intelectuais pois é fundante da história do Brasil, desde a catequese dos indígenas, promovido pelos colonizadores portugueses, até o Golpe de 1964 com as Marchas com Deus, Pátria e Família. O catolicismo tem sido, desde o princípio da história no Brasil, uma poderosa argamassa na tecitura das formas de sociabilidade e na tecitura das relações entre as “elites”, as esferas de poder, em especial os aparatos estatais, com a sociedade civil, principalmente em seus setores sociais subalternos, rurais e urbanos. 64 Esse tem sido um catolicismo herdeiro da ContraReforma e fortemente enraizado e constituído ao longo de séculos de organização social e técnica do trabalho em termos de escravatura. Portanto, séculos de uma formação social de castas, na qual distinguem-se jurídica, política, social e culturalmente o “senhor” e o “escravo”, envolvendo em geral indígenas, africanos e brancos, em suas mesclas e descendências. É óbvio que essa antiga e poderosa tradição pesa nas décadas posteriores à Abolição da Escravatura, quando se desenvolve a sociedade de classes, apoiada em outro tipo de organização social e técnica de trabalho “livre”. Em várias ocasiões cruciais da história da sociedade brasileira, durante a República, a alta hierarquia da Igreja tem estado solidária com as “elites” dominantes, deliberantes; sem prejuízo de que alguns setores do clero sempre estiveram e continuam solidários com setores sociais subalternos, na cidade e no campo. (IANNI, 2000, p. 62) O catolicismo predomina em símbolos públicos como também na mídia em geral, e isso para Ianni é desconsiderar e desrespeitar as outras religiões, crenças e credos dos brasileiros. Com relação a formação do capitalismo nacional, Ianni considera neste artigo que este capitalismo encontrou fases bem definidas, que os intelectuais das ciências sociais dividiram em: gênese, prosperidade, êxito, problemas, contradição, declínio e esgotamento. E, com relação ao capitalismo transnacional no Brasil outras fases distintas de interpretação se fizeram presentes, e se sucederam da seguinte forma: combate ao nacionalismo, 65 presença da ideologia internacionalista e multiculturalista, e no final do século XX, a globalização. A globalização para Ianni é um pensamento que envolve uma rede de técnicos e intelectuais que propagam e defendem os ideais globalizantes, envolvendo economistas, sociólogos, administradores, empresários, cientistas políticos, e outros. O que está em causa é a primazia do “mercado”, em do detrimento “planejamento”. Os autores e atores empenhados na crítica e no desmonte do projeto de “capitalismo nacional” preconizam a associação ampla com o capitalismo norte-americano, europeu, japonês e outros, isto é, a franca, rápida e ampla “inserção” da economia brasileira na colaboração, economia associação mundial. ou Assumem fusão de que a empresas, corporações e conglomerados, compreendendo nacionais e estrangeiros, é o melhor caminho para o desenvolvimento, o progresso, a modernidade, o “primeiro mundo”. (IANNI, 2000, p. 65) Em contraposição tanto ideológica quanto prática desta concepção, é apontada por Octavio Ianni a tese do socialismo, onde ele descreve que inúmeros autores da sociologia que seguem esta corrente do pensamento social, interpretaram e sugeriram alternativas aos problemas sociais brasileiros a partir desta teoria. Estas são algumas das interpretações teóricas de Octavio Ianni sintetizadas em um artigo. Percebemos que sua obra influenciou gerações e 66 poderá influenciar outras haja visto que sua pesquisa foi um marco para a sociologia brasileira. Mostraremos nos próximos tópicos alguns dos sociólogos da contemporaneidade que de alguma forma foram influenciados tanto pela teoria de Ianni quanto de Florestan Fernandes em suas pesquisas. 10)Sociólogos brasileiros contemporâneos (inserir simulador) - Francisco de Oliveira Francisco de Oliveira (Recife, 1933) é professor aposentado da USP, fundador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Em 2010 recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Federal da Paraíba. Entre suas obras destacamos O Ornitorrinco (1972), A economia brasileira: crítica à razão dualista (1973), Elegia para uma re(li)gião (1977), Os direitos do antivalor (1998), Os sentidos da democracia: políticas do dissenso e hegemonia global (em colaboração com Maria Célia Paoli – 1999), Os sentidos da democracia (em colaboração com Maria Célia Paoli – 2000), Hegemonia às Avessas (em colaboração com Ruy Braga e Cibele Rizeck – 2010). Destacamos aqui o artigo de Francisco de Oliveira na obra que também é organizador Os sentidos da democracia: politicas do dissenso e hegemonia global, intitulado Privatização do público, destituição da fala e anulação da política: o totalitarismo neoliberal. Neste artigo Chico de Oliveira, indica que o individuo é a referência histórica para a realização da sociabilidade, e o mercado aparece como única 67 instituição reguladora das relações sociais. Neste sentido o mercado é a soma das vontades individuais. Oliveira recupera o conceito de esfera pública, originário em Hegel, usado também em Marx e que hoje novamente é abordado em decorrência dos sujeitos coletivos representantes de classe. Oliveira também vai recolocar o debate acerca do estado de bem estar social, sua naturalização e a preocupação com o abandono da militância política. Para o autor onde a política se torna nula e a administração do estado de bem estar se torna consenso, a geração de políticas públicas sociais é um resultado mínimo. - José de Souza Martins José de Souza Martins (São Caetano do Sul, 1938) é professor aposentado de sociologia da USP onde em 2008 recebeu o título de Professor Emérito. Foi aluno tanto de Florestan Fernandes quanto de Octavio Ianni, em 2009 recebeu o prêmio Jabuti de Ciências Humanas. Dentre seus livros, destacamos: Imigração e a crise do Brasil Agrário (1973), Os Camponeses e a Política no Brasil (1981), O Poder do Atraso (1994), Fronteira - A degradação do Outro nos confins do humano (2009), Florestan - Sociologia e consciência social no Brasil (1998), O Cativeiro da Terra (2010), Exclusão Social e a Nova Desigualdade (2007), A Sociabilidade do Homem Simples (Cotidiano e História na Modernidade Anômala – 2008). Destacamos nesta última obra alguns referencias teóricos principais que Martins aborda. O objetivo do livro é verificar a vida do homem simples e os aspectos de alienação que fazem deste homem criar uma distorção com relação à história e ao seu destino. O autor quer que o homem comum se torne 68 agente ativo de seu destino e a partir disto analisa a esperança como mediação entre o viver e o sonhar. Para Martins as contradições da modernidade no Brasil estão presentes na realidade social. Esta realidade reflete a consciência da transitoriedade do novo e do atual. A modernidade se apresenta quando o conflito é cotidiano, sobretudo na forma de conflito cultural, ela é a expressão do ser e não do viver. A crítica de Martins à modernidade está posta no sentido de ser uma resistência ao novo, sem a perspectica de criar doutrinas. - Maria da Glória Gohn Maria da Glória Gohn professora da Unicamp, tem como linha de pesquisa os movimentos sociais no Brasil e na América Latina. Em Movimentos Sociais e redes de mobilização civis no Brasil contemporâneo, publicado em 2010, a autora idenfica as formas pelas quais é tratado as causas da desigualdade social como diferença social. Segundo a autora são conceitos distintos e que na abordagem dada desloca-se o foco da desigualdade. A autora relata ainda que há uma geopolitica criada a partir da globalização que interfere na vida social, como por exemplo, a geopolitica das drogas, do tráfico de seres humanos, das armas, entre outras. Gohn ainda reflete sobre a distinção entre os movimentos sociais e as organizações não governamentais, que segundo ela a difernça está, por exemplo, em uma ação coletiva iniciada por um movimento social que se institucionaliza, já nas organizações não governamentais o caminho é da 69 conquista de direitos. Ainda com esta temática, Gohn demonstra que há uma disputa ente grupos sociais na busca de novos conceitos. As práticas e experiências locais tem relevância política e teórica. Segundo a autora há a necessidade de superação da definição de participação política como produção de consenso. Parte III 11)Considerações finais Os exemplos acima são alguns diante dos vários sociólogos brasileiros contemporâneos que pensam e criam alternativas aos problemas sociais. Poderíamos ainda citar Vera da Silva Telles, Marco Aurélio Nogueira, Maria Arminda Arruda, Maria Angela D’Incao, Dulce Whitaker, Augusto CacciaBava, entre outros. A sociologia no Brasil em muito tem ajudado para a interpretação e intervenção da sociedade na democratização social, tem sido também ambiente de reflexão para a libertação nacional e continua no caminho da reflexão dos novos problemas apontados pelo momento que vivemos como a violência, as novas organizações do trabalho, a juventude, entre outras. A sociologia vive hoje um período de desenvolvimento, não só no Brasil mas em todo o mundo. Após ter sua fase formativa em que filósofos sociais como Saint-Simon, Comte, Proudhon se empenharam para elaborar uma ciência social, os clássicos, Durkheim, Weber e Marx apontaram métodos de análise que permanecem atuais em nossos dias. 70 Falar em desenvolvimento da sociologia é pensar em uma fase complexa, “uma vez que o desenvolvimento do pensamento sociológico está intimamente ligado ao que ele estuda, isto é, à sociedade, e por isso possui avanços e retrocessos, está ligado a interesses, a relações de poder, e a um conjunto complexo de relações sociais.” (VIANA, 2006, p. 104). E é por isso que devemos a partir destas indicações, e também como sociólogos de formação, procurar leituras que abordem o desenvolvimento da sociologia para que as pesquisas sociais sejam mais completas e possam revelar o produto social da qual a ciência sociologia é capaz de apontar. Parte IV 12) Bibliografia ARON, R. As etapas do pensamento sociológico. Max Weber. tradução: Sergio Bath. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 725-835. Coleção Tópicos. ARRUDA, M. A. N. A sociologia de Florestan Fernandes. Tempo Social, revista de sociologia da USP, v. 22, n. 1, p. 09-27. BOAS, G. V. Max Weber entre duas vocações. Cult – Revista Brasileira de Cultura. São Paulo: Bragantini, n. 124, ano 11, maio/2008, p. 58-61. BRASIL JR., A. O Imigrante e seus irmãos: as pesquisas empíricas de Florestan Fernandes e Gino Germani. Lua Nova, São Paulo, 81: 175-213, 2010. CONH, G. Max Weber. Coleção grandes Cientistas Socias, n. 13. São Paulo: Ática, 1979. 71 COSTA LIMA, M. A sociologia totalizante de Octavio Ianni. Acesso em 25 de maio de 2011 em http://aprendendoapensarcomasociologia.wordpress.com/2011/03/23/asociologia-totalizante-de-octavio-ianni/ CULTURA BRASIL. Max Weber, acesso em 23/05/2011 em http://www.culturabrasil.org/weber.htm DOSSIÊ OCTAVIO IANNI. Estudos de Sociologia, Araraquara, 16, 167-168, 2004. FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5ª ed. São Paulo: Globo, 2006. IANNI, O. Sociologia da sociologia: o pensamento sociológico brasileiro. 3ª ed. São Paulo: Ática, 1989. Série Fundamentos. _________ A sociologia de Florestan Fernandes. Estudos Avançados, nº 10 (26), 1996, p. 25-33 _________ Tendências do pensamento brasileiro. Tempo Social, Revista de Sociologia da USP, São Paulo, 12(2), p. 55-74, novembro de 2000. JASPERS, K. Método e visão do mundo em Weber. IN: Sociologia:para ler os clássicos. Gabriel Conh (org.). 2ª ed. Rio de Janeiro: Azougue, 2007, p. 105124. LIEDKE FILHO, E. D. A Sociologia no Brasil: histórias, teorias e desafios. Sociologias, Porto Alegre, ano 7, nº 14, jul/dez 2005, p. 376-437 ___________________ Sociologia Brasileira: tendências institucionais e epistemológico-teóricas contemporâneas. Sociologias, Porto Alegre, ano 5, nº 9, jan/jun 2003, p. 216-245 MARTINS, C. B. O que é Sociologia. 31 ed. São Paulo: Brasiliense, 1982 72 MISSE. M. Existe uma sociedade weberiana? Revista Cult. São Paulo: Os Clássicos do Pensamento Social. Jan. 2011. Consulta em http://revistacult.uol.com.br/home/category/edicoes/dossie-cult/ REIS, F.W. Três temas weberianos. Cult – Revista Brasileira de Cultura. São Paulo: Bragantini, n. 124, ano 11, maio/2008, p. 51-54 SCHWARTZMAN, S. A Sociologia como profissão pública no Brasil. Caderno CRH, Salvador, v. 22, n. 56, p. 271-279, Maio/Ago. 2009 SOUZA. J. A atualidade de Max Weber no Brasil. Cult – Revista Brasileira de Cultura. São Paulo: Bragantini, n. 124, ano 11, maio/2008, p. 42-46. _________ A ética protestante e a ideologia do atraso brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 13, n. 38, São Paulo, 1998 VIANA, N. Introdução à Sociologia. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. WAIZBORT, L. Música e Racionalismo em Weber. Cult – Revista Brasileira de Cultura. São Paulo: Bragantini, n. 124, ano 11, maio/2008, p. 55-57. WEBER, M. Ciência e Política: duas vocações. Trad. Leonidas Hegenberg & Octany Silveira da Mota. Prefácio: Manoel Berlinck. São Paulo: Cultrix, 1993. __________ A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Martin Claret, 2004. Coleção a Obra-Prima de Cada Autor. __________ Textos Selecionados. Trad. Mauricio Tragtenberg. São Paulo: Nova Cultural. 1997. Coleção Os Economistas 73 QUESTÕES DISSERTATIVAS E DE MÚLTIPLA ESCOLHA SOCIOLOGIA CLÁSSICA II DISSERTATIVAS Questões fórum de discussão: 1) Max Weber fundou a sociologia na Alemanha. Dentre sua principal contribuição, destaque-se a metodologia de pesquisa em ciência social. Descreva o que significa o tipo ideal em Weber e de que forma este conceito pode ser usado para as pesquisas sociológicas contemporâneas. 2) Muitos autores consideram que a pesquisa sociológica no Brasil iniciou tardiamente. Isto pode ser explicado através da história nacional de subdesenvolvimento e dependência. A partir dos estudos de Viana (2006) comente as quatro fases da sociologia no Brasil. Questões avaliação final: 1) Na obra A ética protestante e o espírito do capitalismo Weber procura através da religião analisar sociologicamente o capitalismo nos Estados Unidos. Identifique as principais interpretações do autor acerca desta afirmação. 2) Florestan Fernandes no Brasil inaugurou a sociologia moderna, com novas técnicas de análise da realidade social. Descreva a partir da obra A integração do negro na sociedade de classes, as principais interpretações deste autor sobre o Brasil. MÚLTIPLA ESCOLHA OBS: as alternativas corretas estão em negrito 1) Qual a principal preocupação da sociologia de Weber a) criar uma escola de sociologia weberiana b) determinar a ação do homem c) comparar a sociologia Alemã com a sociologia Francesa 74 d) nenhuma das questões anteriores 2) Weber teve influência da teoria de Kant, e por isso procurou em sua metodologia científica a) aplicar o positivismo b) relacionar as ciências naturais e as ciências humanas c) formular a tese da vinculação das ciências d) distinguir as ciências naturais das ciências humanas 3) Resumidamente, qual o conceito de tipo ideal? a) o tipo ideal corresponde a realidade individual, são modelos da sociedade contemporânea b) o tipo ideal é um elemento de análise a partir das instituições que compõem a sociedade c) o tipo ideal é um método de análise para que o sociólogo restrinja seu campo na realidade social d) todas as alternativas estão corretas 4) Assinale a alternativa que corresponde a definição de ação social em Weber a) ação é toda aquela que o indivíduo atribui um sentido e que está relacionado com outros indivíduos b) a ação social está relacionada restritamente a interação do individuo com sua família c) a ação social está relacionada somente ao próprio individuo d) a ação social não deve analisar a cultura dos indivíduos e sim os seus grupos 5) Qual o objetivo de Weber quando conceitua ação social? a) convencer sociólogos para sua teoria social b) vincular ciências jurídicas e sociais em um só método científico c) queria estabelecer que a sociologia deveria compreender a ação dos indivíduos e não somente os grupos e instituições d) relacionar as ações entre grupos de sexos opostos 6) Assinale os quatro tipos de ação social definidos por Weber 75 a) positiva, de observação, afetiva, tradicional b) afetiva, tradicional, racional de valores, racional a fins c) racional de valores, de parentesco, de amor, comunitária d) racional a fins, tradicional, relacionamentos, grupos 7) Para Weber o estudo da religião era fundamental nas sociedades, isto porque, a) as tendências religiosas podiam interferir na economia geral da sociedade b) as religiões são a base de todas as sociedades pós-industriais c) as sociedades estão estruturadas em grupos de religiões d) de acordo com o desenvolvimento da religião também se dá o desenvolvimento da sociedade 8) Assinale a alternativa que melhor define o conceito de ética em Weber a) a ética são os valores que os indivíduos atribuem ao sistema social b) a ética é um conjunto de ações atribuídas aos indivíduos c) a ética são as relações sociais entre familiares e a sociedade no geral d) a ética é o exercício da dominação, está presente na ação e não na instituição. 9) Sobre o método compreensivo de Max Weber, assinale a alternativa correta a) compreender os indivíduos para depois analisá-los b) o método compreensivo é o distanciamento do cientista das questões políticas da sociedade c) valorizar a compreensão sociológica acerca das diversas interpretações sociais existentes d) buscar por meio da compreensão científica a explicação social 10) Qual o desenvolvimento da arte que Weber considera fundamental? a) a reunião de um maior número de grupo de músicos se apresentando b) o desenvolvimento da arte é parte do desenvolvimento das escolas livres de música 76 c) o desenvolvimento da arte depende do desenvolvimento da técnica e as condições econômicas que possibilitarão a organização artística d) o desenvolvimento da arte é um processo complexo e demorado 11) Assinale o conceito de liderança política em Max Weber a) a liderança política tem como atividade principal o recrutamento de novos agentes políticos, tem que ter carisma e vocação b) a liderança política é o eleito pelo povo para ocupar um cargo no poder executivo c) a liderança política é o agente que na sociedade identifica os problemas no Estado nacional d) a liderança política é um instrumento organizador da sociedade 12) Para Weber são três as características do homem político, assinale abaixo quais são elas, a) a elegibilidade, a popularidade e a responsabilidade b) a popularidade, a responsabilidade e o zelo público c) a paixão, o senso de responsabilidade e o senso de proporção d) a paixão, a elegibilidade e o senso de proporção 13) Com relação a ciência, Weber considera que a) a ciência deve ocupar seu espaço acadêmico sem interferir na sociedade b) a ciência deve ser separada entre as ciências naturais e sociais, deve ser comprovada e ter singularidade c) a ciência não pode ser especializada, deve sempre acompanhar o método das ciências físicas e naturais d) a ciência não deve pesquisar os fenômenos humanos por serem múltiplos e variados 14) Qual o objetivo de Weber em estudar a religião protestante nos Estados Unidos? a) entender a religião para compreender a conduta dos homens e suas relações econômicas b) identificar a religião que o capitalismo ocidental teve êxito 77 c) relacionar o espírito do capitalismo e o espírito protestante com a formação da sociedade ocidental d) todas as alternativas anteriores estão corretas 15) Assinale os quatro momentos ou etapas da sociologia no Brasil a) 1) formação e instituição; 2) desenvolvimento; 3) análise de teorias internas; 4) solidificação teórica; b) 1)reprodução teórica; 2) institucionalização da sociologia; 3) consolidação da sociologia; 4) desenvolvimento da sociologia c) 1) primeiras análises sociológicas; 2) desenvolvimento sociológico; 3) interpretação dos clássicos; 4) segunda etapa de desenvolvimento; d) 1) reprodução; 2) elaboração de teorias internas; 3) institucionalização; 4) solidificação teórica; 16) Após 1945, fase de consolidação da sociologia no Brasil, Ianni descreve que existiram três ciclos para esta consolidação, assinale abaixo quais foram estes ciclos, a) 1) análise da conjuntura; 2) associação aos centro de sociologia no mundo; 3) análise social brasileira; b) 1) analise dos trabalhadores do campo; 2) modelos sociais alternativos ao sistema vigente; 3) economia e sociedade; c) 1) crise de transição do capitalismo agrário para o industrial; 2) reinterpretação social da história; 3) transformações sociais; d) 1) transformações sociais ; 2) análise da conjuntura; 3) economia e sociedade. 17) Segundo Riedke Filho a sociologia de Florestan Fernandes tem quatro momentos distintos, etapas teóricas de estudo. Assinale abaixo quais são estas etapas; a) 1) críticas ao estado; 2) sociologia numa era da revolução social; 3) estudo de grupos sociais; 4) estudos da política social; b) 1) formação e introdução da história social; 2) reflexão sobre a revolução burguesa; 3) críticas ao estado; 4) sociologia moderna 78 c) 1) formação intelectual; 2) críticas ao estado; 3) introdução à história social; 4) sociologia e política; d) 1) formação intelectual; 2) sociologia numa era da revolução social; 3) reflexão sobre a revolução burguesa no Brasil; 4) militância cidadã. 18) Um dos temas relevantes para a teoria de Florestan Fernandes é da Sociologia numa Era de Revolução Social. Esta etapa de Florestan compreende a) é a sociologia baseada em teorias européias com aplicação à realidade brasileira b) é a recuperação dos clássicos da sociologia (Comte e Durkheim) para interpretar a sociedade plural no Brasil c) tem por base a historicização da problemática original da sua obra com relação a construção social, industrial e democrática do Brasil. d) é o estudo das relações sociais atuais sem a análise histórica e social 19) Com relação a obra A integração do negro na sociedade de classes de Florestan Fernandes, há uma diferença entre o negro e o imigrante estrangeiro, assinale qual alternativa está correta, a) os negros não tinham ainda aprendido, tanto formalmente quanto culturalmente, as novas regras do mercado de trabalho b) quase não existia negros em São Paulo neste período para venderem sua força de trabalho c) os imigrantes vieram para São Paulo pois os negro não aceitavam o trabalho por contrato d) os negros paulistas não vendiam sua força de trabalho para brancos paulistas. 20) Octavio Ianni critica na Tendências do pensamento brasileiro, a criação de tipos sociais pelos intelectuais no sentido de qualificar as mudanças da sociedade na história do Brasil, segundo sua teoria, a) estes tipos podem ajudar no entendimento da sociedade brasileira que é heterogênea e multicultural; 79 b) estes tipos interferem no compromisso da interpretação social pois eles são vividos em uma sociedade que viveu quatro séculos de escravidão, daí poderem aparecer como sátira ou negativos c) os tipos são criações de sociólogos brasileiros para demonstrar que a sociedade brasileira continua por anos da mesma forma; d) para caracterizar as transformações sociais é necessário no Brasil criar tipos para popularizar a sociologia entre a população. 80