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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS
III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍCAS PÚBLICAS
QUESTÃO SOCIAL E DESENVOLVIMENTO NO SÉCULO XXI
UFMA
TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO:
implicações para a educação do trabalhador
Ana Paula Ribeiro de Sousa1
RESUMO
O presente texto contém uma análise sucinta do significado adquirido pela educação do
trabalhador, no contexto das transformações do mundo do trabalho com o advento da
reestruturação produtiva do capital e da crise do paradigma de regulação keynezianofordista e de emergência do neoliberalismo, apontando as conseqüências desse
processo para a configuração de uma educação para o trabalho numa perspectiva
utilitária e domesticadora, que contribui para a intensificação do processo de subsunção
do trabalho ao capital.
Palavras-Chave: trabalho, educação, neoliberalismo, reestruturação produtiva.
ABSTRACT
Brief analysis of the meaning of workers’ education in the context of the transformations
of work relations with the advent of the productive reestructuration of the capital and the
crisis of Keynesian-Fordist regulation paradigm and birth of neoliberalism. Consequences
of that process on the stablishment of an utilitary and taming education contributing to
intensify the process of submitting work to capital.
Key-Words: Work, Education, Neoliberalism, Productive Reestructuration.
“Corremos o risco de ver o ensino reduzido à um simples processo de treinamento, a
uma instrumentalização das pessoas, a um aprendizado que exaure precocemente ao
sabor das mudanças rápidas e brutais das formas técnicas e organizacionais do
trabalho exigidas por uma implacável competitividade”
Milton Santos
1 INTRODUÇÃO
As transformações observadas e vivenciadas no mundo do trabalho refletem o
movimento estrutural do capitalismo no decorrer das últimas décadas do século XX, resultante da crise
do modelo de regulação keyneziano-fordista, que garantiram a sustentabilidade das décadas de
prosperidade e estabilidade que precederam o 2º pós-guerra e a reprodução ampliada do capital
nesse período, constituindo-se em um sistema único, global, sem precedentes na história.
Esse movimento, que reflete o processo de atualização das contradições estruturais de
uma determinada época histórica, eclode com alcance devastador e global sobre os sistemas
econômicos, políticos e sociais em todo o mundo, gestando, assim, um novo padrão de sociabilidade
conhecido como neoliberalismo. No âmbito social mais amplo, especificamente no que tange à
instancia cultural, afirma-se a vigência de um novo paradigma - pós-industrial, pós-classistas, pósmoderno (FRIGOTTO apud RAMOS, 2005, p. 14) – pondo em xeque as concepções e práticas que
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Aluna da 7ª turma do Mestrado em Educação da Universidade Federal do Maranhão - UFMA
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se assentavam sobre o paradigma industrial, impondo a necessidade de atualizações dos aspectos
fundamentais sobre os quais se funda toda e qualquer sociedade, qual sejam, o trabalho e a
educação.
Toda sociedade vive porque consome; e para consumir depende da produção. Toda sociedade
vive porque cada geração nela cuida da formação da geração seguinte e lhe transmite algo da
sua experiência, educa-a. Não há sociedade sem trabalho e sem educação (KONDER, 2000,
apud FRIGOTTO, 2005, p. 57).
Partindo dessa referência fundamental nos propomos a analisar, de forma sucinta, a nova
configuração da relação que se estabelece entre trabalho e educação, no contexto das
transformações do mundo do trabalho e da produção, no sentido de discutir os impactos dessas
transformações no significado que a educação, especificamente e educação escolar, tem adquirido
nesse contexto de profundas alterações estruturais, que, no entanto, não apontam para a superação
das relações capitalistas em sua essência de exploração do trabalho humano e de controle privado
dos meios de produção.
Analisaremos, sobretudo, o discurso contraditório da formação para o trabalho, tal como
se apreende nas referências pedagógicas contemporâneas, demonstrando o caráter utilitário e
domesticador assumido pela educação num contexto que reforça a concepção de trabalho em sua
forma histórica capitalista – força de trabalho, mercadoria a ser negociada no mercado – e favorece os
interesses da exploração capitalista do trabalho, contribuindo para a reprodução das relações sociais
capitalistas.
.2 REESTRUTURAÇÃO CAPITALISTA, TRABALHO E EDUCAÇÃO: contradições no processo de
formação do trabalhador
Compreendemos que a relação trabalho-educação é uma relação complexa, e que por
isso necessita de análises rigorosas no sentido de compreendê-la levando em conta seus
determinantes mais diversos. Tarefa essa que se complexifica ainda mais num contexto de crise, que
de acordo com definição gramsciana, consiste no fato de que o velho está morrendo e o novo não
pode ainda nascer, num momento em que as relações se tornam mais opacas e por isso mais turva a
visão do pesquisador. No entanto, é necessário insistir na apreensão dessa relação, que de acordo
com Nosella (2002, p. 28), trata-se da relação mais radical, complexa e polêmica que a ciência
pedagógica estudou.
Iniciaremos nosso percurso com breves notas sobre o movimento de reestruturação
capitalista que se inaugura com a crise do paradigma de regulação keyneziano-fordista, que em
meados da década de 1970 começa a apresentar sinais de esgotamento, justificarando a emergência
de um novo padrão de produção e acumulação e de organização sócio-política mundial.
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Os desequilíbrios econômicos e o esgotamento do modelo de produção industrial fundado na
substituição das importações já se faziam nítidos, mas foi após o choque do petróleo (19731979) que se aceleraram os ataques aos princípios keynezianos, abrindo o caminho para os
defensores do livre mercado estenderem seu projeto de libertar a acumulação capitalista de
todas as cadeias impostas a ela pela democracia ocidental. (SILVA, 2002, p. 20).
Tais efeitos se fizeram sentir de forma profunda, abalando as bases de sustentação do
capitalismo desde o pós-Guerra, pois, de acordo com Maria Abádia da Silva (2002, p. 20), “A
singularidade
da crise não eram os problemas econômicos das décadas, mas as flutuações
conjunturais coincidindo com convulsões estruturais”. De acordo com análise de Hobsbawm (1995, p.
419), a constituição de um sistema econômico mundial único disseminou os efeitos da crise da década
de 1970 por todo o mundo2:
A crise afetou as várias partes do mundo de maneiras e em graus diferentes, mas afetou a todas
elas, fossem quais fossem suas configurações políticas, sociais e econômicas, porque, pela
primeira vez na história, a Era de Ouro criara uma economia mundial única, cada vez mais
integrada e universal, operando em grande medida por sobre as fronteiras de Estado e,
portanto, também, cada vez mais, por sobre as barreiras da ideologia de Estado. Não era a crise
de uma forma de organizar sociedades, mas de todas as formas.
Entretanto, o advento da crise da década de 1970 engendra um outro modelo de
planejamento e gestão do Estado capitalista – o neoliberalismo. Advindo da releitura de teses do
liberalismo econômico, num contexto que aponta para a mundialização da economia e para a
expansão sem fronteiras do capital, esse modelo preconiza uma redução das esferas de atuação do
Estado no que concerne ao controle da atividade econômica, que deveria ser regulada ao ritmo do
mercado. Nesse sentido, o Estado deveria funcionar como um fomentador dos mecanismos
neoliberais dentro dos limites territoriais de cada país, com vistas a garantir a livre atuação do mercado,
inclusive do mercado internacional sob as economias locais3.
Paralelamente, a década de 1970 anuncia uma nova revolução industrial, baseada nos
processos microeletrônicos aplicados à produção, fruto dos avanços tecnológicos observados no
período, originando uma “revolução informática” ou “revolução da automação” (SAVIANI, 2004), que
traz como conseqüência, a progressiva substituição dos métodos de organização da produção
baseados no paradigma taylorista-fordista e insere um novo padrão de organização da produção
definido pela flexibilidade.
Na presente configuração do capitalismo, as conseqüências para o mundo do trabalho e,
paralelamente, para a formação do trabalhador, são consideráveis. No primeiro plano, o avanço
2
Cabe ressaltar que o colapso do chamado “socialismo real” também contribui para a desequilibração do modelo keyneziano e
se configura como condicionante para a emergência de um novo modelo de acumulação do capital sem procedentes na história,
sob a hegemonia do neoliberalismo.
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Devemos, entretanto, observar que essa máxima varia de acordo com a posição de cada nação no contexto na economia
internacional, sendo válida, sobretudo, para os países que se situam na periferia do capital, tal como os países da América
Latina, onde a estratégia neoliberal que prevê “a liberalização comercial e financeira a todo custo, entra em aberta contradição
com o intenso neoprotecionismo dos países centrais”(Soares, p. 15, 2002).
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tecnológico e o novo padrão flexível de acumulação, instauram uma forma maximizada de exploração
da força de trabalho, onde a transferência das habilidades intelectuais para as máquinas patenteia um
processo de substituição de trabalhadores dos postos tradicionalmente existentes no taylorismofordismo, resultando em crescente desemprego, ou na informalização do trabalho.
No segundo plano, as políticas de desregulamentação, focalização e descentralização do
estado neoliberal, bem como a redução da presença do Estado via o abandono das políticas de
garantia dos direitos sociais dos trabalhadores, tem vulnerabilizado significativamente a posição
destes, que para se manterem inseridos num mercado de trabalho precarizado e instável, abrem mão
de direitos historicamente conquistados pela classe trabalhadora. Nesse quadro, o mito da formação e
qualificação para o mercado se estabelece como novo foco para garantir a inserção e permanência no
mundo do trabalho no lugar da luta por direitos coletivos.
Diante desse quadro, alteram-se substancialmente as relações entre educação e trabalho
no contexto da produção contemporânea. O advento da reestruturação do setor produtivo, no bojo da
Terceira Revolução Industrial, alterou os padrões de gestão da produção e, conseqüentemente, da
exploração da força de trabalho. A substituição, pelo menos em alguns setores da economia, do
paradigma taylorista-fordista, pelo paradigma denominado flexível, introduziu mudanças significativas
no mundo do trabalho, sobretudo, o caráter instável e flexível das ocupações.
A economia baseada na introdução de novas tecnologias, sobretudo de base
microeletrônica, possibilitou a alguns setores da produção prescindir da mão-de-obra especializada na
execução de algumas funções, plenamente desenvolvidas pelas máquinas. Nesse contexto, a
redução crescente dos postos de trabalho e a precarização dos existentes, ocasionada pela
sofisticação da automação e pela desregulamentação das relações trabalhistas, “coloca em discussão
a responsabilidade da educação pública quanto à formação do trabalhador que irá atuar nesse
mercado” (SILVA, 2002. p. 32).
A justificativa é a urgência em atualizar a escola aos novos imperativos da sociedade.
Numa nova era de desemprego crescente e num cenário político em que os interesses das grandes
corporações afirmam-se como prioritários, inclusive no âmbito da esfera do Estado, a escola deve
estar voltada para esses interesses. Nesse contexto, de acordo com Silva (1999), radicalizam-se os
nexos entre a educação e as funções puramente econômicas: “A educação é redefinida como uma
mercadoria cuja produção deve atender às precisas especificações do seu usuário final: a empresa
capitalista” (SILVA, 1999, p. 75).
Verifica-se, portanto, que a educação adquire uma conotação animada por uma
dimensão produtivista e economicista, que recorre às teses da “Teoria do capital humano” para
reforçar o “valor econômico da educação”, tida não como um bem social, garantido pelo Estado, mas
como um produto disponível para aquisição, que, a partir de um investimento individual, garantiria o
acesso ao mercado de trabalho. Nesse quadro, o conceito de qualificação é subsumido pelo de
“competência”, que significa a substituição de um padrão de formação estável, baseado em
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habilidades psicofísicas, para o desenvolvimento de habilidades cognitivas complexas que
caracterizam o trabalhador flexível demandado pelo capitalismo globalizado.
No que se refere às demandas de formação do trabalhador sob a égide das
competências – tarefa que deve ser assumida desde a escola e que determina, em grande medida, o
conteúdo dos ajustes direcionados ao sistema educacional – esta se desenvolve tendo em vista as
noções estruturantes subjacentes ao modelo: flexibilidade, transferibilidade, polivalência e a
empregabilidade (DELUIZ, 2001, p. 02). Essas noções transferem para o âmbito da educação as
características que se espera do trabalhador diante da atual configuração do mundo do trabalho, que
consistem em,
Dispor de trabalhadores flexíveis para lidar com as mudanças no processo produtivo, enfrentar
imprevistos (incidentes/eventos) e passiveis de serem transferidos de uma função a outra dentro
da empresa, requerendo-se, para tanto, a polivalência e a constante atualização de suas
competências, o que lhe dá a correta medida de sua “empregabilidade” (DELUIZ, 2001, p. 02).
Sob esta ótica:
O indivíduo necessita continuamente adquirir os atributos necessários para concorrer a um lugar
no mercado. Nesse contexto, o fato de o indivíduo não conseguir emprego não é atribuída à falta
de oportunidades mas porque ele não preenche aos requisitos necessários para isso, cabendo
à ele, portanto, suprir de forma contínua esses itens para que ele possa ser “empregável”.
(ALMEIDA, 2005, p. 56).
Entretanto, apesar do limite imposto pelo capital ao processo de qualificação da classe
trabalhadora como um todo, no sentido mesmo de adquirir atributos que classifiquem como
“empregáveis”, pela impossibilidade da economia em absolver todo o contingente de mão-de-obra
qualificada disponível4, pois coexistem formas de produção taylorizadas e algumas “ilhas” de
modernidade, sobretudo em países do dito “Terceiro Mundo”(Hirata, 1994), sabemos que esse
argumento serve para justificar os discursos que fundamentam a necessidade de amplas reformas no
sistema educacional, no sentido de reduzir a pobreza e fomentar o desenvolvimento em algumas
regiões, por meio da escolarização das classes trabalhadoras.
Na economia automatizada não há empregos para todos, tanto a estagnação quanto como o
crescimento advindo dos inventos tecnológicos geram desemprego e tornam as oportunidades
cada vez mais desiguais. Mesmo assim, há quem diga que todos têm oportunidades iguais e
que situações de pobreza seriam atribuídas à indolência, à desqualificação profissional ou à
incapacidade do trabalhador (SILVA, 2002, p. 37).
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Cabe lembrar que tal modelo encerra uma forma diferente de desemprego estrutural - o desemprego de pessoal qualificado,
que lança grandes contingentes de trabalhadores para a economia informal, o trabalho temporário e precário.
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Portanto, este aspecto nos leva a questionar a intencionalidade das análises que
fundamentam as teses acerca da necessidade de maior qualificação do trabalhador, pois, apesar do
discurso contemporâneo acerca da centralidade da qualificação profissional, percebemos que,
historicamente, o avanço do modo de produção capitalista sempre impôs à classe trabalhadora uma
progressiva desqualificação. Assim, apesar da importância efetivamente atribuída à escolarização para
a inserção e permanência no mundo do trabalho no atual contexto, vale ressaltar que “nem a
escolarização básica, nem a formação profissional produzem empregos e garantem a
empregabilidade” (GARCIA & LIMA FILHO 2004, p. 28). Na verdade, de acordo com Dias (2006, p.
40): “Esse processo passa pela necessidade de levar o trabalhador ao máximo de desqualificação
produzindo, seja uma limitação maior de uma subjetividade classista dos trabalhadores (sua
historicidade, suas experiências) seja, ao mesmo tempo, sua total integração à ordem”.
No mesmo sentido, apontamos as análises de Alves (2004) acerca da questão do
trabalho na sociedade capitalista, quanto ao questionamento do uso da categoria qualificação
profissional. Conforme o autor, “o movimento da produção capitalista constata que ao seu avanço
correspondeu o aprofundamento da espacialização profissional. Essa sim, guarda relação direta com a
crescente simplificação e objetivação do trabalho” (ALVES, 2004, p. 02, grifo nosso). Isso porque o
trabalho em sua forma histórica capitalista de atividade produtora imediata de valores de uso, se reduz
à mercadoria força de trabalho e tende a se confundir com emprego.
A concepção burguesa de trabalho vai-se construindo, historicamente, mediante a um processo
que o reduz a uma coisa, a um objeto, a uma mercadoria que aparece como trabalho abstrato
em geral, força de trabalho. Essa interiorização vai estruturando uma percepção ou
representação de trabalho que se iguala à ocupação, emprego, função, tarefa, dentro de um
mercado (de trabalho) (FRIGOTTO, 2002, p. 14).
Nesse sentido, essa identificação da categoria trabalho, mediação fundamental que cria a
realidade humana, no seu sentido material, estético, cultural e artístico, com a forma histórica assumida
no capitalismo, como mercadoria força de trabalho, como trabalho em sua forma geral, abstrata, reduz
seu sentido de práxis humana ao de práxis produtiva. Este aspecto possibilita uma inversão da relação
trabalho-educação que se explicita pela ênfase que se tem dado à educação para o trabalho, sem
uma crítica radical à forma que assumem as relações de trabalho na sociedade capitalista, resultando
na naturalização dessa forma histórica. No que se refere à relação trabalho-educação, entendendo-se
o trabalho em sua dimensão exclusivamente econômica, o paradoxo da situação atual se expressa de
forma clara:
Quando finalmente as exigências de competitividade econômica reclamam o uso intensivo do
conhecimento e da educação, estreitando as relações entre educação e trabalho, desaparece a
especificidade do vínculo formal com o emprego, transferindo-se a tensão para outro ponto:
embora educação para a cidadania e para o trabalho se confundam, ela é para poucos; cada
vez para menos (KUENZER, 2000, p. 37).
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No entanto, a emergência de noções como formação continuada, qualificação
profissional, empregabilidade, competências e outras que apontam para a necessidade de maior
escolarização do trabalhador, cumpri uma função política bem definida no presente estágio das
relações capitalista, pela necessidade da manutenção do consenso em torno do projeto neoliberal pela
via da adesão das classes subalternas ao projeto classista da burguesia, por meio da configuração de
uma subjetividade cada vez mais individualizada, o que facilita as estratégias de controle da mão-deobra, em função de uma busca constante da manutenção da sua “empregabilidade” individual em
detrimento das lutas coletivas.
3 CONCLUSÃO
Buscamos no decorrer desse texto apontar algumas questões acerca da relação
conflituosa entre trabalho e educação no contexto das atuais transformações do mundo do trabalho e
da produção que causam diferentes impactos sobre a educação, enquanto elemento de formação da
classe trabalhadora. Esse movimento advém das próprias contradições da sociedade capitalista que,
em virtude de seu caráter de classe, torna necessário o processo de subsunção do trabalho ao capital,
numa relação profundamente pautada pela desigualdade e pela violência e justificada ideologicamente
pela naturalização das formas capitalista oriundas do pensamento liberal burguês.
No presente contexto, a globalização da economia, pautada no imperativo do livre
mercado e do Estado mínimo, cotejada pelo processo de reestruturação produtiva, coloca em outro
patamar a problemática da educação, que, de direito social passa a categoria de serviço a ser
adquirido no mercado por sujeitos dispostos a competir entre si para galgar um espaço no mercado de
trabalho ultra-competitivo. A chave para adentrar esse mercado restrito, cujo conhecimento é o
principal fator de produção, é o acesso a uma educação geral ampla, que, além de conhecimentos
possibilite aos indivíduos a capacidade de se adaptar aos padrões de competitividade e
“empregabilidade”, cada vez mais instáveis, por meio de padrões de comportamento e atitudes,
competência e habilidades que possam ser facilmente alteradas, conforme a lógica do mercado.
No entanto, as conseqüências desse modelo para o trabalhador são desastrosas, pois
além de desarticular sua subjetividade classista frente aos interesses do capital, ainda precariza as
formas de inserção no mercado e restringe o acesso aos mais capacitados, por meio de uma
formação adquirida individualmente. Paralelamente, as novas formas de gestão do trabalho e da
produção impõem limites e promove a quebra da resistência das classes trabalhadoras, na medida em
que confunde a subjetividade classista do trabalhador e do capitalista, pondo a aparecia do fim da
contradição entre as classes fundamentais.
No entanto, no atual contexto é mister recuperar o significado político da educação, para
além da formação de indivíduos adaptados a cumprir as diferentes funções no âmbito da produção e
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que sejam politicamente inofensivos “um expert preocupado com sua avaliação e suas recompensas”
(MORAES, 2003, p. 13), ou seja, construir a identidade autêntica da classe trabalhadora, como classe
fundamental e antagônica aos interesses da classe proprietária. De acordo com Dias (2006, p. 26) “É
esse movimento crítico que permite a negação da possibilidade, dolorosa e atual, de que a ideologia
burguesa transforme o trabalhador em um militante da ordem do capital” (grifo nosso).
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