Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos Interdisciplinary approach to game design: an error, learning from everyone Werther Teixeira de Azevedo Neto; Mestrando; Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) [email protected] Clua, Luciana Rocha Mariz; Mestranda; Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) [email protected] Luiza Novaes; Doutora; Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) [email protected] Couto, Rita Maria de Souza; Doutora; Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) [email protected] Resumo O presente artigo tem como objetivo abordar a interdisciplinaridade tendo como cenário profissionais e empresas que desenvolvem games, em particular a relação interna entre seus departamentos. Será apresentado o processo de produção de um game e como se organizam algumas empresas para tentar entender como são estabelecidas estas comunicações. Palavras Chave: game design, interdisciplinaridade, produção de game. Abstract The following article aims to analyse the concept of interdisciplinarity within the real world landscape of game design studios and professionals, particularly focusing in the relationship between the multiple departments from which a game development team is comprised. In an effort to understand the interdepartamental communication, we will present the game production process and the team organization of game development firms. Keywords: game design, interdisciplinarity, game production. Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos Introdução A área de desenvolvimento de jogos apresenta-se como um interessante objeto de estudo para os pesquisadores das práticas interdisciplinares. Com equipes de projeto que variam do desenvolvedor independente e multidisciplinar aos estúdios com centenas de profissionais monodisciplinares especializados, distribuídos em multidepartamentos, a indústria dos games nos revela abordagens metodológicas de projeto singulares, especialmente no que tange o modo como são encaradas as barreiras entre as diferentes disciplinas das quais é composta. j Produção de um game A cadeia de produção de um game é articulada, de forma geral, por duas entidades principais: Distribuidor e Estúdio (Collins, 2008). O distribuidor, ou publisher, é geralmente o financiador do projeto e responsável pelos aspectos mercadológicos do game, desde o estabelecimento dos requisitos de mercado até a comercialização nos pontos de venda. É o distribuidor que normalmente contrata o estúdio para desenvolver o game. O estúdio, por sua vez, é a entidade responsável pelo planejamento, projeto, concepção e teste do game, ou seja, o design do jogo. Como o interesse neste artigo é discutir a utilização de práticas interdisciplinares na etapa de projeto, voltaremos nossa atenção para esta segunda organização. Os estúdios geralmente dividem-se em departamentos monodisciplinares especializados, com funções bem definidas. Embora esta divisão possua muitas variações dependendo do estúdio, o núcleo da maioria dos projetos costuma envolver quatro áreas: design, programação, arte e áudio. Esta organização varia de acordo com porte e metodologia do estúdio, podendo a segmentação das especializações se estender a diversos sub-níveis ou mesclar-se, no caso de uma otimização de funções e pessoas. Tal modelo de fragmentação das áreas do conhecimento não é surpresa numa indústria, liderada pelos EUA. Já foi muito discutido a respeito da divisão departamental das universidades norte-americanas e posteriormente replicado no Brasil, que, quando instaurada, objetivava “responder às necessidades impostas pelo avanço e a diversificação do saber” [...] (Sarmento; Teixeira apud Couto, 1997, p. 71). Da mesma forma, o avanço e a diversificação dos jogos eletrônicos, de simples pixels algorítmicos a experiências com variados níveis de imersão e interatividade, fez com que o conhecimento nesta área traçasse similar caminho. O ancestral primordial do estúdio de games moderno é o próprio desenvolvedor independente. Na primeira geração de jogos eletrônicos comerciais, tanto nos arcades como nos consoles domésticos, o conteúdo de um game era produzido inteiramente pelo desenvolvedor. Agindo de maneira multidisciplinar, este indivíduo era responsável pela lógica de programação, comunicação visual e produção sonora. Uma época onde desenvolvedor e estúdio eram um só. Sendo essencialmente programadores, estes profissionais lidavam com a concepção visual e sonora de maneira limitada, mas a princípio isto não configurava um problema, uma vez que as capacidades técnicas dos primeiros aparelhos de videogames não permitiam ir muito além do que estes pioneiros conseguiam produzir (Discovery Channel, 2009). 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos No entanto, a evolução do hardware foi gradualmente gerando novas possibilidades para cada um dos setores chave do desenvolvimento. Com isso a problemática envolvida no desenvolvimento dos games tornou-se complexa e extensa em demasia para ser encarada de forma individual. Foi então que surgiram as primeiras empresas que recrutaram, para o desenvolvimento de games, profissionais especialistas como o artista, o designer de áudio e o programador. A cada nova geração de consoles, os jogos tornavam-se mais elaborados e a especialização das funções crescia em efeito cascata. Na geração 16 bits, as equipes já envolviam mais de um artista de programadores, e também da presença de designers de jogos. No entanto, o mapeamento funcional dos jogos desta época (Blow, 2004) revela que em sua essência, os jogos ainda eram relativamente simples de se projetar (Figura 1). Cada caixa do fluxograma representa um elemento fundamental na funcionalidade do jogo, enquanto as ligações representam as interdependências entre estes elementos. Figura 1 - Organograma funcional de um jogo 2D datado por volta de 1994 (Blow, 2004, p. 30). Com o advento dos jogos 3D, o processo de desenvolvimento tornou-se extremamente complexo. Os projetistas de games entraram numa frenética espiral em busca da simulação do mundo real em todas as suas minúcias, o que criou a demanda por profissionais especializados em cada aspecto desta simulação. Recorrendo novamente ao mapeamento de Blow (2004), podemos contemplar o salto abissal em complexidade que se deu num período de 10 anos, como mostra o exemplo da Figura 2. Figura 2 - organograma funcional de um jogo 3D para um jogador (Blow, 2004, p. 33). 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos Conforme demonstrado por Couto (1997), o aumento na complexidade historicamente resulta na fragmentação do conhecimento e especialização das funções. No caso dos games, a demanda por profissionais especializados multiplicou o tamanho das equipes, gerando inúmeros desdobramentos em cada um dos departamentos. No departamento de artes, por exemplo, onde antes existiam um ou dois artistas para um jogo inteiro, surgiram segmentações como texturizador, modelador, ilustrador 2D, animador, artista de interface, artista de ambientação (environment), entre outros (Andrade, 2008). Por dentro do estúdio Para ampliar a compreensão da segmentação dos departamentos em uma empresa desenvolvedora de games, recorremos a uma adaptação do organograma (Figura 3) de Meigs (2003, p. 278), que nos permite esboçar uma análise preliminar da organização funcional desse tipo de empresa. Considerando que existe uma enorme flexibilidade nas carreiras de cada empresa, o autor ilustra a hierarquia do estúdio através de uma estrutura piramidal de tomada de decisões envolvendo vários vice-presidentes e diretores. Sem dúvida tal estrutura pode possibilitar a prática multidisciplinar entre as equipes que formam a base destes departamentos, pois algumas das dificuldades e necessidades do processo como todo são de conhecimento geral. Contudo, nem sempre estes departamentos promovem reuniões globais para uma discussão do projeto inteiro, ficando esta função reservada apenas para os vice-presidentes e diretores de cada área envolvida. Figura 3 - Organograma de desenvolvedor de games (adaptado de Meigs, 2003, p. 278) Tomando outro modelo como referencial que revela o cenário do desenvolvedor de games nacional, analisaremos a organização da empresa Donsoft (Figura 4). Sendo mais intimista e tendo todos os seus departamentos integrados no mesmo ambiente, a empresa permite que as dificuldades tecnológicas sejam partilhadas por todos no seu dia-a-dia. “A multidisciplinaridade pressupõe, para Piaget, a solução de um problema através de diferentes disciplinas, havendo, contudo, empréstimo, sem enriquecimento mútuo” (apud Couto, 1997, p. 31). No caso dos games, as diferentes disciplinas estão presentes em diferentes áreas do conhecimento agregados a departamentos. 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos Figura 2 - Organização do Estúdio Donsoft (Xavier, 2009). Geralmente as empresas menores têm mais chance de serem multidisciplinares na relação entre seus departamentos, mas no caso da Donsoft, ela também busca acolher profissionais com formação multidisciplinar individual, a exemplo do produtor de áudio, que é designer por formação, mas com especialização na área de música e o betatester, o qual é oriundo da engenharia de produção. Outra característica multidisciplinar do estúdio Donsoft deve-se ao fato de possibilitar a tomada de decisões por toda a equipe, não estando concentrada apenas nos cargos de gerência das distintas áreas (Xavier, 2009). As empresas podem ser compostas de diversas formas, inclusive possuindo vários estúdios multidepartamentais interligados, mas espalhados pelo mundo, como é o caso da Ubisoft. O cenário atual nos revela as consequências da cultura do departamento. Assim como ocorreu em outras áreas do conhecimento e, sobretudo, na academia, a especialização exacerbada trouxe problemas típicos. Couto (1997) aponta a fragmentação do conhecimento e o isolamento entre os pares como sendo dois dos principais malefícios causados por este fenômeno. Isto se verifica no universo de desenvolvimento de games, onde grande parte dos estúdios divide suas etapas de produção entre os departamentos com pouca comunicação entre as partes. Cada setor executa sua função sem necessariamente possuir uma visão global do processo, atribuição que em geral fica por conta dos game designers, profissionais que concebem a mecânica e a conceituação do jogo e gerenciam a implementação. Para Schuytema (2008, p. 18), o game designer precisa ser multidisciplinar. Este profissional “é contratado para ser um pensador criativo, comunicador, escritor, líder de torcida, técnico, oráculo, fonte de novas idéias e jogador de games”. Independentemente do game designer trabalhar sozinho ou numa equipe desenvolvedora, ele usará suas habilidades de modo multidisciplinar para desenvolver desde a idéia do game até sua implementação. Sob este mesmo aspecto Rouse (apud Domingues, 2009) enfatiza as características multidisciplinares do game designer quando afirma que este pode colaborar nos desenhos, no roteiro, nos efeitos sonoros e na programação do game, mas não precisa necessariamente realizar cada uma dessas tarefas por completo. Essas habilidades multidisciplinares são necessárias para o direcionamento e entendimento do projeto do game e de seu gerenciamento. Mesmo o game designer sendo um profissional com necessidades multidisciplinares, dependendo da estrutura organizacional da empresa, sua gerência 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos não impedirá que o isolamento entre os pares traga sérios problemas. Na maioria dos casos, esses problemas só serão verificados no fim do processo, quando, por questões mercadológicas, é inviável voltar atrás para corrigi-los. O departamento de áudio é frequentemente vítima deste malefício. Coleman et al. (2005, p. 99) determinam que “para facilitar a natureza autêntica e imersiva de um jogo eletrônico, o design de som deve constituir parte significativa do ciclo de vida do desenvolvimento”. Por parte significativa, entende-se que os designers de som devem interagir com membros de outros departamentos em várias etapas do processo, trocando experiências em busca do aperfeiçoamento do projeto como um todo. Trata-se de uma abordagem claramente interdisciplinar, que, como atesta Couto (1997), objetiva a flexibilização de barreiras de cada especialização, sem perder, contudo, a identidade de cada uma das áreas e de cada sujeito envolvido no processo de construção do conhecimento. Entretanto, esta abordagem ainda não é unânime no ambiente de desenvolvimento de jogos. Isto se deve em muito a uma herança da área de design de som em mídias audiovisuais, área cujo enfraquecimento contínuo “...deve-se a limitações desnecessárias nos processos de produção, baseados em antigos métodos de operação. Tais limitações colocam o som próximo ao fim da cadeia de produção.” (Deutsch, apud Coleman et al. 2005, p. 103). Sendo ainda posicionada no fim do processo em muitos estúdios, a área de design de som sofre com a incapacidade de contribuir, através de sua doutrina epistemológica, para a geração de conhecimento da equipe como um todo. Um bom exemplo de como a fragmentação constitui um fator limitante ao processo projetivo. No entanto, existe outro lado da moeda. A pesquisa etnográfica realizada por Coleman et al. (2005) no estúdio VIS Entertainment, demonstra que, mesmo numa indústria organizada de maneira compartimentada como a de games, há espaço para abordagens de projeto interdisciplinares. Ao descrever o cotidiano do designer de som, os pesquisadores relatam sua metodologia de criação, reiterando que este projetista [...] não gasta o dia inteiro com design de som. Ele tenta manter-se atento a problemas enfrentados por outros membros da equipe de desenvolvimento, portanto passa uma grande parte do dia se comunicando com outros membros do grupo por e-mail, normalmente gastando grandes quantidades de tempo num único e-mail para comunicar seu ponto de vista, particularmente quando julga que mudanças irão afetar seu ofício. (Coleman et al. 2005, p. 102). Tal método de trabalho guarda indiscutível semelhança com a metodologia de pesquisa interdisciplinar orientada que, segundo Couto (1997, p. 80), “favorece a ultrapassagem das ações especializadas e fragmentadas para priorizar ações mais integradas, visando à solução de problemas [...]”. Um simpatizante da hiperespecialização enquanto ferramenta de produtividade poderia argumentar que o designer de som está desperdiçando seu tempo em tais comunicações, quando poderia estar se dedicando a aperfeiçoar seu ofício de modo a fazer mais e melhor, em menos tempo. No entanto, o paradigma interdisciplinar preconiza que o melhor investimento que o profissional pode fazer em sua disciplina é estar em constante contato com outras áreas envolvidas no processo, de modo a constituir para a “produção coletiva de um saber novo” (Demo apud Couto, 1997, p. 80) elaborando caminhos projetuais que em última instância irão beneficiar a equipe e diminuir a margem de erro na concepção do produto. 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos Ao cruzar as barreiras departamentais e comunicar-se constantemente com seus colegas, o designer de som está ampliando sua capacidade de compreender a problemática sob diferentes pontos de vista, o mesmo valendo para seus colegas de outros departamentos. Mas a comunicação inter-departamental é só uma parte da prática interdisciplinar. A verdadeira mudança acontece quando o profissional se vê obrigado a repensar seus processos em virtude de questões provenientes de outras áreas. Coleman et al. descrevem uma situação em um game onde, numa cena de luta, muitos personagens estavam utilizando um modelo de arma muito barulhento. Em virtude disto, outros sons essenciais para a narrativa, como os diálogos presentes na cena, acabaram sendo abafados. O designer de som sugere, portanto que alguns personagens utilizem armas de outros modelos ou então que o som seja implementado pelos programadores de modo a não ser constante, abrindo espaço para outros sons importantes. Tal exemplo ilustra um tipo de problema cuja solução seria inalcançável através de uma abordagem individualista. Assim como na academia, muitos problemas que se colocam hoje na área de desenvolvimento de games “são de tal ordem que escapam de toda tentativa de encaminhá-los a partir de uma ótica exclusivista [...]” (Souza Neves apud Couto, 1997, p. 74). Fosse o áudio uma etapa realizada no fim do processo, ou de maneira completamente individualista, dificilmente seria alcançada uma solução interdepartamental dentro das limitações de tempo impostas pelo mercado. Tendências Recentes Embora muitos estúdios ainda trabalhem com metodologias que dificultam uma integração interdisciplinar entre os indivíduos, algumas tendências atuais na indústria apontam para uma crescente preocupação com a comunicação e troca de experiências entre os profissionais de diferentes áreas. O especialista em recursos humanos na área de jogos eletrônicos, Marc Mencher (2008b, p. 1), define a equipe ideal para produção de um jogo moderno: Uma equipe é feita de indivíduos que realizam tarefas únicas e que quando combinados, fabricam um produto final que é maior do que a soma de suas partes. Você quer que os membros de uma equipe dêem seu máximo e estejam prontos para ajudar uns aos outros, então deve-se promover um senso de coesão. Mencher (2008a, p. 1) ainda acrescenta que “fortes e positivos elos de informação entre uma equipe, o resto da organização e o cliente são vitais. [...] mas o trabalho em equipe não acontece se uma pessoa consistentemente dispara suas idéias e não deixa os outros falarem”, reiterando, portanto a importância da comunicação e ilustrando a gradual transição paradigmática do indivíduo para o coletivo. O fato de tal preocupação ser expressa por um indivíduo cujo trabalho é avaliar a aptidão profissional de novos candidatos à equipe indica que times de desenvolvimento já começam a se formar no sentido de se obter maior entrosamento entre suas células disciplinares. Em termos metodológicos, o trabalho interdisciplinar em equipe encontra respaldo na recente adoção dos métodos de desenvolvimento ágeis pelas empresas de tecnologia da informação e, em particular, pelos estúdios de games. O paradigma Scrum, um dos mais representativos da metodologia ágil, busca resolver alguns problemas crônicos do desenvolvimento de softwares e games através de uma abordagem interdisciplinar. Um destes problemas é a falta de integração aqui relatada. 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos Scrum é um método que reúne membros de cada uma das equipes disciplinares em volta de uma mesa de conferência (ou vídeo conferência) em reuniões semanais ou bi-semanais, onde desafios, idéias para novos produtos ou práticas metodológicas podem ser abordadas e alteradas ao longo do processo de desenvolvimento. (Mencher, 2008b, p. 2). O conceito fundamental do Scrum parte da constatação de que, quanto maior a equipe, maior e dificuldade de comunicação entre os membros que a compõem, sejam eles integrantes de um mesmo grupo disciplinar ou não. Keith (2008, p.1) explica que “a complexidade da comunicação aumenta exponencialmente conforme o tamanho da equipe cresce. Segundo Keith (2008), uma equipe de 20 pessoas tem uma complexidade de comunicação quatro vezes maior do que a de uma equipe de 10 indivíduos. Buscando agilidade no processo produtivo e a adaptabilidade a mudanças no escopo do projeto, equipes que adotam essa metodologia dividem-se em pequenos grupos multidisciplinares compostos por aproximadamente oito indivíduos. Estes profissionais objetivam a concretização de pequenos módulos funcionais do game a cada uma ou duas semanas e para isto devem estar em constante comunicação: Além das reuniões semanais ou bi-semanais, o Scrum também prevê uma reunião diária, onde a equipe deverá discutir seus problemas e avaliar o progresso do projeto. (Keith, 2008). Empresas de tecnologia brasileiras já perceberam os benefícios que os métodos ágeis trazem para o processo de desenvolvimento de software e, em virtude disto, a taxa de adoção do Scrum tem aumentado (March, 2009). A empresa Mídia 3, da qual participou um dos autores, adotou a metodologia no início de 2009 e desde então se utiliza exclusivamente de métodos ágeis em seu processo de desenvolvimento. Embora esta empresa não seja desenvolvedora de games citamos um case para melhor entendimento da metodologia ágil Scrum. No projeto “Portal do Anunciante”, desenvolvido para o jornal O Globo, por exemplo, o constante diálogo entre programadores, designer visual e designer de experiência, foi indispensável para que as peculiaridades de cada disciplina pudessem ser expostas, possibilitando mudanças imediatas no rumo do projeto e proporcionando um aperfeiçoamento constante do processo projetivo como resultado da interação entre os pares. Com o passar do tempo, os desenvolvedores passaram a antever questões de usabilidade que anteriormente só eram apontadas pelo designer de experiência. Dessa forma, os desenvolvedores achavam soluções diferenciadas no momento do desenvolvimento. De maneira análoga, os designers passaram a participar dos debates envolvendo limitações tecnológicas, o que os levou a projetar soluções mais eficazes em virtude do conhecimento adquirido. O constante diálogo e o tamanho restrito da equipe possibilitaram o enriquecimento coletivo através do intercâmbio entre disciplinas. Os resultados claros desta interação interdisciplinar foram o aumento na velocidade do desenvolvimento e a diminuição no índice de erros, levando à maior qualidade no produto final. Considerações finais Inicialmente como observamos na sessão Produção de games, esta era elaborada inteiramente pelo desenvolvedor, e de maneira multidisciplinar ele tinha que desenvolver o game como um todo, ou seja, a programação, comunicação visual e 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Abordagem interdisciplinar no design de games: Erro de um, aprendizado de todos produção sonora. Com o desenvolvimento tecnológico, os games ganharam uma grande complexidade, gerando uma fragmentação no processo de produção, o que resultou na fragmentação do conhecimento e especialização das funções (Couto, 1997). Na sessão seguinte Por dentro do estúdio observamos a organização funcional de alguns estúdios de desenvolvimento de games, denotando que esta estrutura funcional pode possibilitar a prática multidisciplinar entre as equipes que formam a base de cada departamento, com base em alguns conhecimentos gerais. Contudo, esta multidisciplinaridade é inexistente ao considerarmos numa escala mais alta das funções, pois a tomada de decisões do projeto como um todo é reservada apenas para os vicepresidentes e diretores de cada área. Porém, no exemplo do estúdio Donsoft, percebemos que esta multidisciplinaridade é possível não somente por partilhar problemas do dia-a-dia da empresa, ou por agregar profissionais com seu histórico pessoal e formação multidisciplinar, mas por possibilitar que a tomada de decisões seja compartilhada em reuniões com todos os membros da empresa. Por fim, observamos que as tendências mais recentes no processo de desenvolvimento de jogos, sobretudo a adoção cada vez maior das metodologias ágeis, como, por exemplo, o Scrum, tem demonstrado preocupação por parte dos estúdios em promover um trabalho menos setorizado e uma comunicação mais eficiente entre os diversos núcleos disciplinares envolvidos no processo. Finalmente a indústria começa a perceber os malefícios que a hiper-especialização trouxe para o resultado dos projetos e já ensaia seus primeiros passos rumo ao trabalho interdisciplinar, flexibilizando as barreiras entre as disciplinas e iniciando um diálogo frutífero entre os pares. É interessante atentar, no entanto, que encarar um projeto sob uma perspectiva interdisciplinar não significa necessariamente eliminar do processo a participação de indivíduos especializados. Pelo contrário, os problemas específicos de cada disciplina continuam apresentando crescentes complexidades que demandam profissionais com conhecimento específico. Mas é a capacidade de interagir com disciplinas externas à sua que torna o profissional capacitado a lidar com problemas maiores, que afetam o processo como um todo. O profissional atual da área de games tem um olhar especializado, mas necessita também ter a visão do projeto como um todo. Assim como o acadêmico intelectual descrito por Jencks e Riesman (apud Couto 1997), é essencial que os praticantes do desenvolvimento de jogos tenham habilidade e experiência fora de sua especialização. A troca de experiência entre as partes em tempo real leva ao desenvolvimento do grupo, onde cada erro individual resulta em um aprendizado coletivo. E é aí que reside a essência do paradigma interdisciplinar. Referências Bibliográficas ANDRADE, Paulo. As carreiras no mercado de games. In: BOBANY, Arthur. Videogame Arte. Teresópolis: Novas Idéias, 2008. BLOW, Jonathan. Game Development: Harder Than You Think. 2004. Revista Queue. Disponível em: http://portal.acm.org/citation.cfm?id=971564.971590 Acesso: jun.2009 COLEMAN, Grame W. et al. Approaches to Auditory Interface Design - Lessons From Computer Games. In: ICAD - 11th ICAD, 2005. Irlanda: University Of Limerick, p.99-104. 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