UMA PRÁTICA POLÍTICO-EDUCATIVA SOBRE MEIO AMBIENTE NA AMAZÔNIA PARAENSE Ariwilson G. dos santos Rômulo José F. de Oliveira Luíza Nakayana Resumo Neste trabalho, apresento os resultados parciais do projeto de pesquisa de mestrado em Educação em Ciências. O objetivo foi de investigar as Representações Sociais de ambiente de acordo com os aspectos sociais e ambientais no cotidiano de alunos do ensino médio em diferentes contextos educacionais. Metodologicamente, analisei questionários e os relatórios da visitas ao ambiente Igarapé da Rocinha, na cidade de Vigia de Nazaré. Para tanto, esboço um referencial sobre o ambiente compreendido pela teoria da Representação Social. Diante do potencial político, ambiental e cultural, tanto da cidade quanto dos estudantes, fui estimulado investigar os conhecimentos ambientais construídos e compartilhados cotidianamente pelos alunos, com o intuito de possibilitar uma prática pedagógica que ampliasse seus conhecimentos ambientais. Diante das análises feitas, pude constatar que os alunos representaram o ambiente como: lugar para viver; e como elementos com vida, com exceção da vida humana. Essas representações me permitiram propor uma visita ao Igarapé, para que pudéssemos perceber, na prática, as relações sociais existentes naquele ambiente. Palavras-chave: Representação Social; Ambiente; Estudantes. Résumé Nous présentons les résultats partiels du projet de recherche de la maîtrise en sciences de l'éducation. L'objectif était d'étudier les représentations sociales de l'environnement selon les aspects sociaux et environnementaux du quotidien des élèves du secondaire dans les différents contextes éducatifs. Méthodologiquement, l'analyse des questionnaires et des rapports de visites à l'environnement Igarapé de la Rocinha, la ville de Nazareth à regarder. Ainsi, l'établissement de référence sur l'environnement compris la théorie de la représentation sociale. Face au potentiel politique, environnemental et culturel, à la fois dans la ville des étudiants, j'ai été encouragé à étudier la connaissance de l'environnement construit et le partage au quotidien par les étudiants, avec le but de fournir un environnement d'enseignement afin d'élargir leurs connaissances. Considérant l'analyse faite, j'ai pu voir que les étudiants représentent l'environnement comme lieu de vie, et que des éléments dans la vie, à l'exception de la vie humaine. Ces représentations m'ont permis de proposer une visite de Igarapé afin que nous puissions réaliser dans la pratique, les relations sociales existant dans cet environnement. Mots-clés: Représentation Sociale; l'environnement; les étudiants. 2 Introdução e Referencial Teórico Uma situação me chamou muita atenção durante a participação em um curso de Formação de Educadores ambientais, que teve como principal objetivo reunir informações necessárias para se obter subsídios na construção de uma política de Educação Ambiental para o município de Vigia de Nazaré, baseado na legislação vigente para a educação ambiental (Carta da Terra, Política de Educação Ambiental – Lei nº 9.597 de 27 de abril de 1999 e Programa Nacional de Educação Ambiental - ProNEA) e nos pressupostos teóricos do estudo do ambiente numa perspectiva patrimonial ancorados nos estudos de Silva (2007) e Barros (2008). O que me chamou atenção foi: o fato de três estudantes do ensino médio, diante da emergência dos estudos ambientais, estarem participando de um curso pensado para professores, demonstrando um interesse que me surpreendeu. Fui surpreendido por ver o potencial de força, disposição, interesse e inserção na política municipal que aqueles jovens demonstravam. Nessa lógica, acabei escolhendo fazer uma pesquisa baseada no conhecimento ambiental construído e compartilhado na vida cotidiana de estudantes do ensino médio em suas relações com professores. Pois, penso que no contexto escolar o professor é o representante da sociedade e co-responsável pela formação de conhecimentos e valores. O ponto de partida seria o conhecimento escolar, entretanto, eu já sabia que logo as quatro paredes da escola estariam superadas. Corroborando com estas gratas surpresas que tive com os estudantes, ao visitar seguidas vezes o município de Vigia de Nazaré, conheci o potencial histórico e cultural que a cidade demonstrava. Diante do potencial ambiental/patrimonial e da complexidade e diversidade cultural identificados no município, decidi visitar alguns ambientes da cidade que, de alguma forma, colaborassem para representar um pouco da história, da memória, da cultura, da vivência cotidiana das pessoas daquele município. Ora, diante do potencial ambiental/patrimonial de Vigia, das interessantes participações dos estudantes do ensino médio na política ambiental do município e da efervescência das discussões sobre as problemáticas ambientais (colaborando com pesquisas já concluídas sobre o tema no município), estaria justificada uma pesquisa que tivesse como tema o meio ambiente e como pano de fundo a teoria das Representações Sociais (RS). Nesse sentido, elaborei uma questão norteadora para esta pesquisa: Quais conhecimentos ambientais, construídos e compartilhados por estudantes do Ensino Médio em diferentes contextos educacionais, refletem uma prática pedagógica que considera a complexidade da relação sociedade e ambiente? Esta pesquisa teve como objetivo investigar as RS de ambiente de acordo com os aspectos social e ambiental no 3 cotidiano de estudantes em diferentes contextos educacionais. Esse objetivo gerou outros: a) aproximar os aspectos teóricos e práticos dos estudos ambientais; e b) construir uma práxis sócio-ambiental. Pois, estudar com base nesta teoria é produzir conhecimentos e construir ações práticas para a melhoria da qualidade de ensino e vida no cotidiano dos seres viventes. Em se tratando de representação social, posso dizer que, antes de tudo, a representação social se refere ao diálogo entre, pelo menos, dois tipos de conhecimento: a ciência e o senso comum. Ou seja, quando se fala em teoria, conceitos como ancoragem, objetivação, Núcleo Central (NC), etc., fala-se de representação social enquanto conhecimento sistemático, organizado, objetivo, isto é, fala-se dos universos reificados (das ciências) dos saberes construídos e compartilhados cotidianamente. Entretanto, quando se fala em opiniões, idéias, concepções, percepções, etc., fala-se de representação social enquanto conhecimento construído na prática social diária, sem a preocupação com a organização e sistematização na elaboração de conceitos, isto é, fala-se dos universos consensuais (do senso comum) em que são naturalizados os conhecimentos adquiridos nas experiências do dia-a-dia dos grupos sociais. Especificamente falando da teoria das RS, existem três níveis de estudos (discussões e análises) que podem ser feitos por seu intermédio e segundo De Rosa (1994) citado por Oliveira e Werba (2008, p. 105-106) estão divididos da seguinte forma: 1) Nível Fenomenológico: em que as RS constituem um objeto de investigação. Esses objetos são elementos da realidade social, são modos de conhecimento, saberes do senso comum que surgem e se legitimam na conversação interpessoal cotidiana e têm como objetivo compreender e controlar a realidade social; 2) Nível Teórico: seriam um conjunto de definições conceituais e metodológicas, construtos, generalizações e proposições referentes às RS; e 3) Nível Metateórico: seria o nível das discussões sobre a teoria. Neste, colocam-se os debates e as refutações críticas com respeito aos postulados e pressupostos da teoria, juntamente a uma comparação com modelos teóricos de outra teoria. Diante destes três níveis de estudos das RS, é preciso dizer que esta pesquisa tem em seu conteúdo os três níveis presentes. É fenomenológica, pois está se investigando o ambiente na representação de estudantes do ensino médio de Vigia de Nazaré, isto é, um elemento da realidade dos estudantes, um saber cotidiano construído por eles no senso comum, em que buscamos compreender e motivar ações de valorização do ambiente por eles. Além disso, é teórica porque busca metodologias alternativas na investigação e no resgate do valor do ambiente como um patrimônio dos seres viventes. E ainda, é metateórica, em virtude da discussão que se faz em torno da complexidade das representações de ambiente como patrimônio, que sugere muito mais que um trânsito de conhecimentos e informações dos 4 universos reificados para os universos consensuais. Entretanto, nesta pesquisa, é mais forte e evidente o nível fenomenológico de análise e discussão das RS. Como nesta pesquisa procuro compreender qual a representação social de ambiente de estudantes do ensino médio, ou seja, os conhecimentos ambientais que são construídos e compartilhados no cotidiano escolar desses jovens, então recorro à busca do Núcleo Central da representação. Este NC, segundo Castro (2004, p. 48) é uma teoria que: (...) permite descobrir a estrutura de uma representação, além de estabelecer a posição de cada um dos atributos da imagem, verificando assim quais os constituintes do núcleo central e quais fazem parte da periferia. Essa possibilidade existe em função do forte poder de associação dos elementos do núcleo central em relação aos outros atributos da imagem. Assim, em torno de cada um dos atributos centrais da informação, existe uma rede de informações periféricas (e também nucleares) que podem ser acessadas. Na concepção de Abric (1994) o NC de uma representação possui as seguintes características: diretamente associado às condições históricas, sociológicas e ideológicas; é parte compartilhada coletivamente, desempenhando uma função consensual; e é estável, coerente e resistente a mudanças, exercendo a função de permanência da representação. Essas características sugerem que o NC cumpra duas funções essenciais: a função geradora, que cria ou transforma a significação dos demais elementos que constituem a representação, e a função organizadora, que determina a natureza das ligações que estabelecem os elementos da representação entre si. Já no que diz respeito aos elementos periféricos, posso dizer que são determinados pelo contexto mais imediato, em que a flexibilidade e mobilidade são duas de suas características, possibilitando desempenhar as funções de: concretização; regulação e adaptação; e individualização da representação. Nessa lógica, a teoria do NC me faz compreender que o conteúdo das RS se apresenta organizado, constituindo não só um “tronco” central, em que estabilidade, rigidez e consenso são encontrados, como também uma “engrenagem” periférica, sendo nela encontradas um caráter mutável, flexível e individualizado. Mais próximo da idéia de engrenagem periférica, emerge o conceito de ancoragem, mas, nesse contexto, ancorar, o que é? É classificar, dar nome a algo, procurar um lugar conhecido para colocar algo desconhecido, ou como nos aponta Moscovici (2003, p. 61): É um processo que transforma algo estranho e perturbador, que nos intriga, em nosso sistema particular de categorias e o compara com um paradigma de uma categoria que nós pensamos ser apropriada. É quase como que ancorar um bote perdido em um dos boxes (pontos sinalizadores) de nosso espaço social. Um exemplo disso é, quando diante do surgimento do problema da AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) as pessoas começaram a ter muitas dificuldades para entendê-la 5 e classificá-la, sendo assim, uma das formas encontradas pelo senso comum para dar conta da sua ameaça foi ancorá-la como uma peste, dessa forma a AIDS seria menos ameaçadora. No processo de ancoragem, os acontecimentos são incorporados e reinterpretados coletivamente. A ancoragem se organiza a partir de três condições estruturantes: a) A atribuição do sentido: relaciona-se com a busca de incorporação do elemento novo, com base no molde antigo, para lhe atribuir significado; b) A instrumentalização do saber: quando o sujeito interpreta o conhecimento novo, dando-lhe uma nova forma, traduzindo-o e incorporando-o ao seu universo social, possibilitando, dessa forma, a comunicação entre o grupo ou a sociedade; e c) O enraizamento no sistema de pensamento: representado pela estabilidade das representações, que se processa em função da inserção do novo no sistema de pensamento social prévio. A partir da compreensão dos aspectos que dão unidade e dos aspectos peculiares das representações de ambiente do grupo de estudantes, bem como das condições estruturantes para que isso aconteça, uma característica do fenômeno da representação social vem à tona, esta é o caráter performativo das RS. Considerando este caráter, as RS são, segundo Xavier (2002, p. 6), um sistema (ou sistemas) de interpretação da realidade, que organiza as relações do indivíduo com o mundo e orienta as suas condutas e comportamentos no meio social, permitindo-lhe interiorizar as experiências, as práticas sociais e os modelos de conduta ao mesmo tempo em que constrói e se apropria de objetos socializados. Com o entendimento da performatividade das RS, que sugere a educação como ação política, ultrapassamos as quatro paredes da escola, com o intuito de internalizar experiências nos estudantes, no sentido de organizar as relações de suas experiências com o ambiente (Igarapé da Rocinha) de Vigia de Nazaré para a re-orientação de suas condutas e práticas sociais frente aos aspectos ambientais, o que permite que eles percebam a importância deles para o ambiente e do ambiente para eles, sendo co-responsáveis, juntamente com outras formas de vida, pela preservação e melhoria do ambiente para a manutenção da vida no planeta. Aspectos Metodológicos Esta pesquisa é caracterizada por de abordagem quanti-qualitativa, pois obedece a requisitos adequados para a análise do social, tanto numérica, quanto discursivamente. Assim, o social é visto como um mundo de significados passível de investigação e a linguagem dos atores sociais e suas práticas são as matérias-primas dessa abordagem. Foi feita com 65 estudantes do 2º ano do ensino médio de duas turmas de uma Escola Estadual Paraense, cedidas especificamente para esta investigação, no município de Vigia de Nazaré, que pertence à 6 mesorregião Nordeste Paraense e à microrregião do Salgado, localizada a 90 (noventa) km de Belém. Como instrumento de obtenção dos dados, utilizei um questionário semi-estruturado (ver ANEXO) com três perguntas relacionadas diretamente aos objetivos da pesquisa, e logo depois de uma análise do NC das RS de ambiente dos estudantes (oriunda das evocações contidas nos questionários), organizei uma visita a um ambiente de Vigia de Nazaré para levar os alunos a terem a experiência de constatar na prática educacional cotidiana, para além do ambiente escolar, a relação existente entre o ambiente e a sociedade Vigiense. O ambiente escolhido foi o Igarapé da Rocinha (IR), pois, fazer uma visita ao IR, onde se tem testemunhado sensíveis mudanças e transformações impactantes em seu ambiente seria chamar atenção dos alunos para a ampliação da compreensão do ambiente vigiense. Este Igarapé corta a cidade passando por seis bairros, nomeadamente: Vila Nova (nascente do IR), Centro, Sol Nascente, Arapiranga, Bariri e Greenville, servindo de limite entre esses bairros. Essa visita permitiu que os alunos identificassem, na prática, alguns dos problemas ambientais, pelos quais, o município de Vigia passava. Para compreender melhor esta realidade ambiental, adotei os estudos das RS de Serge Moscovici (2003) para analisar as questões que envolvem as narrativas dos sujeitos da pesquisa. Também utilizei a metodologia da busca do NC das RS baseado em Sá (1996) para compreender o conteúdo das RS de ambiente dos estudantes, pois a teoria do NC me esclarece que as partes constituintes de uma representação estão organizadas hierarquicamente, em torno de um núcleo central. Sendo este núcleo formado por um ou mais elementos que tem por função dar significado à representação. Análises e discussões: O Núcleo Central das Representações Sociais de Ambiente dos Estudantes O Núcleo Central (NC) de uma representação é determinado por uma tríade dialógica: pela natureza do objeto representado, relação que o sujeito tem com o objeto e a relação que o grupo social desse sujeito mantém com o objeto (MARKOVÁ, 2006), por isso é o elemento da representação que homogeneíza os grupos sociais, por meio da história, identidade social e memória coletiva destes grupos. O NC é determinado ainda pelas condições sociológicas, ideológicas e pelo sistema de normas vigentes no grupo social. Se assim é, logicamente o NC é resistente a mudanças e sua função é de garantir a continuidade da representação. Na busca do NC, surgem alguns elementos que constituem os Núcleos Periféricos (NP), em que ocorrem atualizações e contextualizações da dimensão normativa (CASTRO, 2004), rompendo com a imobilidade, consenso, resistência a mudança (característicos do NC), 7 gerando flexibilização e expressão individualizada. A principal função do NP é garantir a ancoragem da representação na realidade imediata, através da concretização, regulação e adaptação do NC da representação, defendendo sua significação como um amortecedor do impacto causado pelo confronto das diferentes significações de um mesmo objeto (MARKOVÁ, 2006). Como um dos objetivos desta pesquisa é a busca do NC das representações Sociais de Ambiente, elaborei algumas técnicas que me favorecessem nesta busca, fundamentadas no princípio de se fazer com que o sujeito efetue sobre sua própria produção um trabalho cognitivo de análise, comparação e de hierarquização (SÁ, 1998). Sendo assim, apliquei um questionário (ANEXO) com 3 (três) perguntas que gerariam as evocações livres sobre ambiente dos estudantes, sendo hierarquizadas e ordenadas em que em cada questão fosse feita uma evocação por cada estudante. Depois de confrontadas as palavras mais freqüentes nas 1ª, 2ª e 3ª evocações, agrupeias em categorias semânticas, em que identifico algumas características do ambiente que podem se configurar em categorias finais: uma categoria para definir os problemas básicos do ambiente – Destruição e Desmatamento; uma categoria que define o ambiente como algo para ser cuidado/preservado/protegido; uma categoria que representa o ambiente considerando os aspectos naturais e físicos: natureza, rios e florestas, vento e ar; uma categoria para definir o ambiente caracterizado por elementos da fauna e da flora ou com vida, exceto a vida humana: Seres vivos, espécies, plantas e animais, com exceção do homem; uma para evidenciar características do ambiente como limpo e belo; uma categoria para entender o ambiente sempre a disposição da sociedade ou das pessoas; e a última categoria que compreende o ambiente como um lugar ou espaço para viver e ter relações. O interessante nestas categorias encontradas é que elas já foram evidenciadas em outros estudos. Observada essa situação, decidi por bem ancorá-las nas categorias já estabelecidas por pesquisadores como Reigota (1991; 1995) e Sauvé (2005). Nesse sentido, reagrupei as categorias, e percebi que as categorias que trazem a idéia de ambiente natural, limpeza e beleza e cuidado/preservação/proteção, são explicitadas por Sauvé (2005) dizendo que o ambiente é representado como natureza para ser apreciado, respeitado e preservado, em que as características são: natureza como catedral, como útero, pura e original. E ainda, a categoria denominada como problema básico também é referida por Sauvé (2005), seu conteúdo consiste na resolução de problemas como: poluição, desmatamento, ameaças, deterioração, etc. Uma categoria com a idéia de Vida também surgiu, os estudantes consideraram os seres vivos, com exceção do ser humano, como parte do ambiente. Esta categoria está mui próxima da chamada por Sauvé (2005) de ambiente como Biosfera, em que há uma interdependência dos seres vivos com os inanimados, a diferença é que os alunos separaram a humanidade de outras formas de vida. O ambiente como Lugar foi representado significativamente, esta representação 8 consistia em lugar ou espaço para viver e ter relações, e está mui similar ao que Sauvé (2005) denomina de ambiente como um lugar em que se vive, o diferencial é que, para a autora o ambiente é para ser conhecido, para ser aprimorado, onde são observados a natureza com os seus componentes sociais, históricos e tecnológicos. O ambiente como algo à Disposição da Sociedade ou das Pessoas foi vislumbrado nas representações. Esta categoria está relacionada à visão Antropocêntrica de ambiente caracterizada por Reigota (1991; 1995) como uma visão naturalista que evidencia a utilidade dos recursos naturais e reconhece a interdependência entre elementos bióticos e abióticos e a ação transformadora do homem sobre os sistemas naturais, alterando o “equilíbrio ecológico”. Os números das evocações, bem como as categorias de representação de ambiente surgidas na pesquisa estão abaixo relacionados: Quadro 1: Distribuição percentual das evocações categorizadas sobre ambiente, identificadas por 65 estudantes do ensino médio 1ª 2ª 3ª AMBIENTE Evocação Evocação Evocação F* OME* N* % N* N* Problemas Básicos 03 4,62 05 7,69 02 3,07 10 1,9 Cuidado/Preservado/Protegido 07 10,77 13 20 01 1,54 21 1,71 Natural e Físico 32 49,23 11 16,93 20 30,77 63 1,81 08 12,31 16 24,62 28 43,08 52 2,38 02 3,07 04 6,15 00 06 1,66 A Disposição da Sociedade ou das Pessoas 03 4,62 04 6,15 06 9,23 13 2,23 Lugar ou Espaço para Viver e Ter Relações 10 15,38 12 18,46 08 12,31 30 1,93 Total 65 100 65 100 65 100 195 13,62 27,85 1,94 Vida, com Exceção Humana Limpo e Belo da Vida % Média % Fonte: coleta de dados 2009. *N: número de evocações; F: freqüência total das evocações; OME: ordem média das evocações. Neste quadro 1 (um), calcula-se a OME através da fórmula: N1x1 + N2x2 + N3x3/F. Onde N1, N2 e N3 são os valores numéricos das 1ª, 2ª e 3ª evocações respectivamente e F é o valor da soma das freqüências das três evocações em cada categoria. Calcula-se a média da OME através do quociente entre a soma das OME e o número de categorias. E calcula-se o valor da média das freqüências através da divisão entre o número total das três evocações e o número de categorias. Feitos os cálculos, agrupei as categorias de com o método Vergés (1992) para encontrar o NC de ambiente entre os estudantes: 9 Quadro 2: Cálculo para encontrar o Núcleo Central a partir da OME OME Freqüência ≤ 1,94 1. Natural e Físico (f63) (1,81) ≥ 27,85 ≤ 27,85 2. Lugar ou Espaço para Viver e Ter Relações (f30) (1,93) NC 1. Problemas Básicos (f10) (1,9) 2. Cuidado/Preservado/Protegido (f21) (1,71) 3. Limpo e Belo (f06) (1,66) ≥ 1,94 Vida, com Exceção da Vida Humana (f52) (2,38) A Disposição da Sociedade ou das Pessoas (f13) (2,23) Fonte: coleta de dados 2009. Com base no cálculo da ordem média das evocações dos estudantes associado à expressão indutora (ambiente) e às tipologias de ambiente surgidas na pesquisa, observa-se no quadro 2 (dois) a identificação do NC, no quadrante I correspondendo ao ambiente considerado em seus aspectos Naturais e Físicos e ainda o ambiente como um Lugar para Viver e Ter Relações. E nos quadrantes II, III e IV (com as outras categorias) pode ser observada a engrenagem periférica, ou seja, os elementos de uma representação que não são centrais, mas fazem parte dela como as manifestações das individualidades nas representações (MOSCOVICI, 2003). Identificados os núcleos central e periférico das RS de ambiente dos estudantes, observo que mesmo não fazendo parte do NC, a categoria que considera o ambiente constituído pela Vida, exceto a Vida Humana, tem uma freqüência bem alta, o que me leva a acreditar que os estudantes não consideram a humanidade como parte constituinte do ambiente. E as tendências do NC me fazem crer que, além dos estudantes não considerarem a vida humana como elemento que compõe o ambiente, eles entendem o ambiente como lugar ou espaço para viver e ter relações. A Visita ao IR como Prática Político/Educacional sobre Meio Ambiente Sabendo que os alunos representavam o ambiente da forma descrita anteriormente, levei-os para uma visita ao Igarapé da Rocinha que atravessa toda a cidade e tem influência na vida da população vigiense e principalmente das pessoas de seu entorno. Pois, segundo Barros (2008, p. 69), Observando o mapa da cidade de Vigia, evidencia-se a abrangência do IR. O mesmo se destaca na paisagem geográfica, pois atravessa praticamente toda a cidade bifurcando-se e desembocando no rio Guajará-Miri e o Açaí, o que denota 10 seu papel de relevância para a população da cidade na atividade pesqueira, transporte, abastecimento de água das casas e lazer. Na visita os estudantes testemunharam várias situações que lhes permitiu ampliar as compreensões sobre aquele ambiente. Dentre as principais destaco duas: os problemas com o lixo jogado e fezes despejadas no IR estão incidindo sobre o mundo do trabalho; e a ocupação do leito do IR e a falta de saneamento estão influenciando negativamente a qualidade de vida não só dos moradores do entorno, mas também de toda a população vigiense, tanto da espécie humana, como também de outras formas de vida que se abrigam às margens do Igarapé. Logo no inicio da visita, conversamos (eu e os alunos) com um morador. Perguntamos o que ele pensava sobre o ambiente IR. Ele nos disse que “a opinião dele era a opinião da maioria: o ambiente é o pior possível, as piores condições para um ser humano viver”. Em seguida um dos alunos perguntou se já haviam concluído um processo de aterramento do IR que tinham começado há dias atrás, e a resposta foi a seguinte: (...) “houve uma bifurcação do Igarapé e uma obstrução de uma delas, mudando o que era o leito natural do Igarapé, redirecionando seu curso para a construção de casas, não se pode mudar a natureza. Isso foi autorizado por pessoas da prefeitura leigas sobre meio ambiente. Agora as condições de saneamento são absurdas: a água suja desemboca no Rio, as espécies estão morrendo, pessoas ficam doentes, o odor é insuportável”. Essa realidade foi identificada em vários outros momentos da visita, pois observávamos crianças brincando na água e no leito do IR, acúmulo de lixo em alguns pontos da margem do Igarapé, ratos transitando, etc. Isso demonstra que a ocupação/habitação do leito do IR se deu sem considerar os possíveis prejuízos ambientais que poderiam ser causados. Prosseguindo com a visita, paramos em outro ponto da margem do Igarapé, neste um morador nos chamou atenção dizendo: “eu já briguei muito para não jogarem lixo ai (no IR), mas já puxaram até terçado para me agredir, então eu desisti”. E uma aluna acrescentou, perguntando: o senhor ainda joga lixo no Igarapé? A resposta foi simples e enfática: “não”. O morador disse ainda: “certa vez coloquei uma rede atravessada de uma margem à outra do IR, no outro dia quando tirei, eram quase duas caçambas de lixo (garrafas, bichos mortos, restos alimentares, etc.), jogar uma sacola no Igarapé é um crime”. Nesse contexto, outro aluno fez uma pergunta interessante: o senhor pesca nesse Igarapé? O homem tristonho respondeu: “(...) eu era pescador, mas há quatro anos que não pesco mais, ta difícil pegar peixe, só em alto mar é mais fácil. Tenho um amigo que ainda pesca, mas depois que começou a construção de casas aqui, ele tem que ir cada vez mais longe para conseguir pesca boa, lá para as bandas de Colares (município vizinho), mas ta quase parando para virar pedreiro”. 11 Diante desses relatos, pude perceber que os problemas ambientais estão incidindo sobre o mundo do trabalho, causando a migração de pessoas de suas ocupações para suas próprias sobrevivências. Mas isso tem acontecido sem que qualquer política pública dê conta da nova configuração do trabalho no município de Vigia de Nazaré. Essa realidade trabalhista tem ressonâncias em outras realidades sociais como educacionais, políticas, habitacionais, de segurança pública, etc. causando, entre outros problemas sociais, desemprego, fome, violência, doenças, etc. Aproximações Conclusivas Depois de ter identificado o conteúdo das RS de ambiente dos estudantes, que consistiu principalmente em entender o ambiente como elementos físicos e naturais, lugar para viver e ter relações e como composto por elementos com vida, com exceção da humana, pude elaborar uma prática educativa (visita) que propiciasse a compreensão mais ampla de ambiente. Esse objetivo foi alcançado quando percebi os alunos na interação tanto com as pessoas que moravam às margens do IR, quanto no momento de perceberem o prejuízo dos outros seres viventes que ali habitavam, por conta dos problemas. Os alunos saíram com uma proposta diferente daquela experiência, dispostos a contribuírem para a mudança positiva no ambiente da cidade de Vigia. Nesse sentido, os conhecimentos ambientais construídos cotidianamente pelos estudantes, que refletem uma prática pedagógica que considera a relação entre sociedade e ambiente, são os adquiridos em diferentes contextos educacionais, como ambientes tradicionais da localidade, pois assim podem incorporar elementos novos ao universo de conhecimentos que já tinham, enraizando novas experiências e novas condutas sociais. Logo, interagem com o ambiente e seus componentes, além de se compreenderem como partes constituintes do próprio ambiente. Referências ABRIC, J.C. Pratiques sociales et représentations. Paris: Presses Universitaires de France, 1994. BARROS, J. V. Representações Sociais do Ambiente Igarapé da Rocinha, como Patrimônio por Crianças das Séries Iniciais. /Orientadora: Maria de Fátima Vilhena da Silva – NPADC/UFPA - Belém, 2008. (Dissertação de Mestrado). CASTRO, S. M. V. Representação social de ciência de estudantes do ensino fundamental da rede municipal de Belém. 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Este questionário faz parte de uma atividade de pesquisa que estamos realizando. Para que tenhamos sucesso em nossa pesquisa precisamos da sua colaboração. Por essa razão, pedimos que você responda as perguntas abaixo com muita atenção e sinceridade. Responda da maneira que você considera a mais apropriada, sem se preocupar em acertar ou errar, pois não se trata de uma avaliação. Nome: __________________________________________________ Idade: _______ Série: _______Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino 1. Qual a primeira palavra que lhe vem à cabeça quando você ouve falar em ambiente? 2. Escreva uma frase que expresse ambiente para você! 3. No seu entendimento, que elementos (coisas) fazem parte do ambiente?