Caso Clínico
Síndrome de Potter
Apresentação: Eder Ferreira Soares
(interno ESCS)
Geneticista: Romina S. Heredia Garcia Silva (R2) Coordenação:
Paulo R. Margotto
www.paulomargotto.com.br
Brasília, 19 de julho de 2011
ESCS
UTI Neonatal do HRAS
Hospital Regional da Asa Sul
Dra. Romina G. Silva, Dr. Paulo R. Margoto, Do Éder F. Soares
Antecedentes Pré-natais
 Mãe, 19 anos, internada na UGO/HRAS desde 18/03/11 devido a
quadro de oligoâmnio severo;
 Realizou 14 dias de Amoxicilina, com término no dia 10/05/2011;
 Sorologias maternas: não há sorologias anotadas no prontuário,
porém mãe refere ter realizado todas e que as mesmas se
encontram descritas no cartão pré-natal;
 Esteróide pré-natal: 2 doses de betametasona (março 2011);
 Nega etilismo ou tabagismo;
 TS mãe: O+;
 DUM: 18/09/10;
 Mãe: G2P0A1;
 IG: 34+3 (até 02/06/11).
Identificação
RN de RNSV, feminino;
Nascimento: 02/06/2011 às 17:36h;
Parto cesáreo: ILA 0 a esclarecer + ROPREMA;
Apgar: 3,5,5;
Reanimação: sim, VPP sob máscara;
Peso: 1680g; Est.: 38cm; PC: 29,5cm;
Intercorrências na gestação: ILA zero.
Evolução
Parto cesáreo pélvico;
Ausência de líquido amniótico;
Não chorou ao nascer;
Colocado em berço aquecido e secado;
Aspiradas boca e narinas;
Cianose central, bradicárdico, hipotenso,
movimentos respiratórios irregulares;
Evolução
Realizada VPP, sem melhora do quadro;
Feita intubação traqueal com cânula 3.0 e
aumentada pressão e fluxo do CFR: sem
melhora;
Feito cateterismo venoso: 2 expansões com
SF0,9% 10ml cada;
Realizada massagem cardíaca mais 2 doses de
adrenalina: persistência da bradicardia,
perfusão ruim e ausência de diurese;
Evolução
Feita nova dose de adrenalina e bicarbonato
5ml: 5ml AD. Repetido bicarbonato;
Oitenta ml de volume infundidos em 1h;
Melhora da perfusão e da bradicardia (FC: 110
– 125bpm), mas continuava sem diurese;
Encaminhado para UTI às 18:45h.
Evolução
Exame Físico:













Cabeça: normocéfalo, fontanela anterior aberta e normotensa.
Orelhas: implantação baixa (?).
Boca: simétrica.
AR: expansibilidade ruim; tiragem intercostal.
ACV: RCR 2T, bulhas normofonéticas, sem sopro. FC: 110 – 115bpm. Pulsos
impalpáveis em MMSS.
Abdome: flácido, umbigo 2A e 1V.
Genitália: edema de grandes e pequenos lábios.
Ânus: pérvio.
MMII: perfusão lentificada.
Ortolani negativo.
Dorso: sem lesões.
Capurro: 33+6.
Índice ponderal: 1680/54872 = 3.
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Evolução
Hipóteses diagnósticas:






RNP/PIG simétrico
Asfixia perinatal
Hipoplasia pulmonar ?
Sindrômico ?
Sepse ?
Membrana hialina ?
Conduta:




Encaminhado a UTI;
Neo em incubadora aquecida;
Intubado com cânula 3;
Cateterismo umbilical.
Evolução
UTI:
Soro fisiológico (20ml/Kg em 30’);
HV com TIG 5 + dopamina 5 + dobutamina 10;
Evolução
Às 20:00h:
 Ventilação mecânica com PI 40x6, FiO² 100%, FR 60ipm;
 Sem relato de diurese até o momento;
 Dreno tórax: secreção sanguinolenta em moderada
quantidade;
 SOG: sem secreção;
 EF: RN GRAVÍSSIMO, chocado, desidratado;
 Pouca expansibilidade torácica;
 Bulhas abafadas. FC: 96 – 100bpm;
 Estertores bolhosos em HTE. PSaO² (saturação de O2):35 –
45%;
 Fígado a 2cm do RCD.
Evolução
Conduta:
Dopa 7,5 e dobuta 10;
Solicitado concentrado de hemácias + plasma;
Nova expansão com SF 0,9% (15ml/Kg);
Adrenalina 0,3mg;
Resgatar Rx tórax pós-drenagem torácica;
Fentanil + Cefepime + Amicacina.
Evolução
Às 20:25h:
 Rx tórax: TOT pouco alto; dreno com extremidade em
cavidade abdominal (?).
 CD: dopamina 10 e dobutamina 20; nova dose de
adrenalina.
Às 21:30h:
 Dissecção de veia jugular interna esquerda e
reposicionamento dreno;
 Mantida bradicardia e PSaO² de 25 – 30%;
 CD: nova etapa SF0,9% (15ml/Kg); adrenalina contínua
(0,5ug/g/min).
Evolução
Às 22:15h:
 Melhora discreta da expansão pulmonar. PI: 50;
 Perfusão ruim. FC: 92bpm. PSaO² (saturação de
O2): 18 – 22%;
 Ausência de diurese;
 Gasometria: pH 6,74, PCO² 150, PO² 15.9, BE -16.
Às 22:50h:
 Dreno fora do tórax; pneumotórax refazendo-se;
 CD: Repassado dreno de tórax;
Evolução
Às 3:10h:




GRAVÍSSIMO estado geral;
FC: 85 – 90bpm, RCR 3T, B3, bulhas abafadas;
Ausência de diurese;
CD: solicitados ecografias cardíaca, cerebral e abdominal.
13h de vida:
 FiO² 100%, PI 50, PSaO² 21%, FC: 52bpm;




Palidez importante, péssima perfusão, cianose;
Diurese ausente;
Ecografia abdominal: agenesia renal bilateral.
Ecografia transfontanelar: cisto plexo direito.
Evolução
Às 9:30h:
Permanece em estado GRAVÍSSIMO.
Às 11:05:
Constatado óbito.
Lista de Problemas
 Escassez de informações pré-natais;
 Ecografias oriundas da UGO pouco descritivas;
 Oligoâmnio grave;
 RNP/PIG;
 IR grave;
 Instabilidade hemodinâmica;
 Orelhas com implantação baixa;
PATOLOGIA
(filme da autópsia: Dr. Paulo R. Margotto)
Supra-renais
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Ausência de rins e ureteres e bexiga rudimentar
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Pulmões hipoplásicos
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Síndrome de Potter
Dr Edith Potter
(1901–93).
Correspondence
to:
P M Dunn,
Department of
Child Health,
University of
Bristol,
Southmead
Hospital,
Southmead,
Bristol BS10 5NB,
UK;
p.m.dunn@bristol.
ac.uk
1) Conceito
Conjunto de achados fenotípicos fetais
relacionados a oligoâmnio grave secundário à
insuficiência renal.
2) Epidemiologia
Incidência de 0 – 3/1000 nascimentos (Potter,
1946);
Proporção de 2 – 7/1 M/F;
Baixo peso;
PIG;
Cariótipos geralmente normais;
Apresentação pélvica é comum.
Pashayan, Dowd, and Nigro, 1977
Pashayan, Dowd, and Nigro, 1977
3) Etiologia
ETIOLOGIA DESCONHECIDA;
Substâncias teratogênicas não encontradas;
Causa genética:
 autossômica recessiva c/ sexo como fator
limitante ?
 herança recessiva ligada ao sexo ?
 supressão 22q11 ?
Pashayan, Dowd, and Nigro, 1977
4) Fisiopatologia
Agenesia renal
Oligoâmnio
Impactação
feto/parede
Hipoplasia
Pulmonar
Fitch and Lachance, 1972
5) Quadro clínico
 Implantação baixa das orelhas;
 Hipertelorismo;
 Pregas epicânticas
 Nariz achatado;
 Pescoço curto;
 Membros tortos;
 Insuficiência respiratória;
 Micrognatia;
 Pulmões rígidos durante reanimação.
Pashayan, Dowd, and Nigro, 1977
Fitch and Lachance, 1972
Pashayan, Dowd, and Nigro, 1977
Fitch and Lachance, 1972
Margarita et al, 2005
Trissomia do 7
A. Biri et al. / European Journal of Medical Genetics 48 (2005) 67–73
Trissomia do 7
A. Biri et al. / European Journal of Medical Genetics 48 (2005) 67–73
Fitch and Lachance, 1972
6) Patologia
Agenesia renal bilateral;
Hipoplasia pulmonar;
Ausência de líquido amniótico;
Outras malformações associadas.
Margarita et al, 2005
Margarita et al, 2005
7) Curso da doença
Natimortos: 60% dos casos;
Morte em até 48 horas;
Evolução para IR em 2 semanas;
Gestação geralmente termina antes do termo.
8) Tratamento
Quadro de prognóstico inevitavelmente fatal!
9) Prevenção
Rastreamento ecográfico pré-natal;
Dificuldade ecográfica antes de 20 semanas de
gestação;
Desenvolvimento da anomalia no 1 trimestre;
Oligoâmnio observado no final do 2 trimestre.
Margarita et al, 2005
10) Diagnóstico Diferencial
I) Sirenomelia
SINDROME DE REGRESSÃO CAUDAL /
SIRENOMELIA
Autor(es): Zaw W, Stone D G/Das BB,
Rajegowda BK, Bainbridge R, Giampietro
P
Cortesia Dr. Paulo R. Margotto
Cisto em plexo coróide
• descritos em mais de 50% das autópsias, sendo geralmente
menor que 1mm e não causam sintomas obstrutivos.
• Acredita-se que representam dobras neuroepiteliais que
podem subsequentemente se encherem de líquor
cefalorraquidiano e debris celulares. Estes cisto podem
desaparecer por volta da semana 20-23.
• incidência de ocorrência de cisto no plexo coróide de 3%,
variando de 1-4mm, raramente ultrapassando 7mm
(seguimento de 13 meses; sem alterações; pode ser um
achado normal e não requer seguimento)
•
Cisto de 2-8 cm podem ocasionar sintomas (hipertensão
intracraniana) em crianças mais velhas e adultos, dependendo
da sua localização (no foramen de Monro -fazer
acompanhamento por 6 meses)
Margotto,2011;Neurossonografia neonatal
Fakhry et al, Lam e Villanueva, Riebel et al
Cisto no plexo coróide
• Ostlere et al tem relacionado grandes cistos
bilaterais (>1mm) no plexo coróide com
cromossopatia, principalmente trissomia do 18 (3%)
e possivelmente, trissomia do 21.
• Fitzsimmons et al relataram que 71% dos fetos
abortados com trissomia do 18 apresentavam cistos
no plexo coróide
No entanto, para submeter a paciente a diagnóstico
invasivo, analisar a presença de restrição do
crescimento intra-uterino e a presença de outras
anormalidades estruturais.
Margotto,2011;Neurossonografia neonatal
Cisto no plexo coróide
Lam e Villanueva
•
enorme cisto no plexo coróide
(setas) extendendo-se do teto
do 3º ventrículo para o corno
frontal do ventrículo esquerdo
Margotto, Castro
Margotto,2011;Neurossonografia neonatal
Quando não iniciar/Quando
interromper a reanimação
Requisitos para a não intervenção:
Malformações facilmente reconhecidas;
Prognóstico letal ou sobrevivência vegetativa;
Diagnóstico laboratorial rapidamente disponível.
Cariótipo, US, TC:
Simples defeito requerendo correção heeóica ou
medidas terapêuticas para sobrevida: agenesia
renal bilateral.
Margotto, PR,
www.paulomargotto.com.br
Goldsmith (1998)
Quando não iniciar/Quando
interromper a reanimação
 RN com severas anomalias congênitas;
 Distúrbios identificáveis ou defeitos específicoestruturais incompatíveis com a vida (Lista de Jones):








Hidroanencefalia;
Anencefalia;
Trissomias do 13 e do 18;
Agenesia renal bilateral;
Holoprosencefalia;
Triploidia;
Sirenomelia;
Síndrome dos membros curtos.
Margotto, PR,
www.paulomargotto.com.br
Goldsmith (1998)
ASPECTOS GENÉTICOS
Romina S. Heredia Garcia Silva
Genética Médica (R2)
2011
• Síndrome: ocorre quando o agente
responsável pela malformação (gene
mutante ou teratógeno) causa múltiplas
anormalidades em paralelo.
• Sequência: ocorre quando o agente
responsável pela malformação afeta
apenas um órgão em um ponto no
tempo e é a perturbação desse órgão
que provoca uma gama de defeitos
secundários em outras estruturas.
Nussbaum RL., McInnes R., Willard HF.Thomsom & Thompsom Genética Médica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008
Perda crônica
de LA
Alterações
renais no feto
OLIGOÂMNIOS
Compressão
fetal
Falta de
desenvolvim
ento alveolar
www.omim.org
• Doenças renais perinatais letais:
Casos familiares – espectro fenotípico:
 BRA
adisplasia renal hereditária (Buchta et
al., 1973)
 BRD
 URA/RD
 SOU
• “Síndrome Potter” → Potter (1946) –
alterações renais (incluindo hipoplasia renal
e doença multicística) + “fácies de Potter”.
• A alteração de renal não é patognomônica da
síndrome Potter (Scott and Goodburn, 1995).
• Outros autores relataram, ainda, outras
alterações renais (Schmidt et al., 1982. Kiprov
et al., 1982).
• McPherson et al. (1987): herança AD com
penetrância entre 50-90%, com um risco
empírico de 15-20% na descendência de um
afetado
ou
heterozigoto
obrigatório
(adisplasia renal).
Diagnóstico
•
•
•
•
Ecografia gestacional
Ecografia abdominal
Necropsia
Ecografia renal dos pais e dos irmãos: 9% dos
parentes em 1º grau apresentaram
malformações renais assintomáticas.
(Roodhooft, 1984)
• Outros...
 Citogenética [aberrações no cromossomo 5;
monossomia 10q26; translocação
(1;2)(q32;p25)].
 Genética molecular: mutações nos genes
UPK3A e RET
• Gene RET (protooncogene): receptor tirosina-kinase
(molécula da superfície celular que traduz sinais
para o crescimento e diferenciação celular).
Mutãções no gene RET estão associadas a S.
MEN2A, MEN2B, HSCR, MTC, agenesia renal
(agenesia renal →perda de função, inativação da
proteína – Skinner et al., 2008).
• Gene UPK3A (uroplakin 3A): proteína integral de
membrana do urotélio. Mutações nesse gene
resultariam em obstrução funcional ao fluxo
urinário, levando a alterações no desenvolvimento
dos
rins
(Jenkins
et
al.,
2005).
Deltas C.,Papagregoriou G. Cystic Diseases of the Kidney. Arch Pathol Lab Med 134: 569-582, 2010.
CAKUT; genes mutated in the renal-coloboma (paired box 2; PAX2), renal cysts and diabetes (hepatocyte nuclear factor 1b; HNF1b)
and branchio-oto-renal (eyes absent 1; EYA1) syndromes encode transcription factors and related proteins
“The identification of the exact nature of
the lesion is therefore of paramount
importance, not only for the prognosis of
the propositus, but especially for the
correct genetic counselling of the family.”
(Moerman P, Fryns JP -2002).
Bibliografia consultada
 The pathogenesis of Potter's syndrome of renal agenesis (1972): Naomi Fitch,
M.D., PH.D. and R. Claude Lachance, M.D., F.R.C.P. [C], Montreal;
 Double aneuploidy involving trisomy 7 with Potter sequence (2005): Aydan Biri,
MeralYirmibes Karaog uz , Gönül DidemI˙nce , Mehmet Ali Ergün , Sevda Menevs,
Banu Bingöl;
 Síndrome de Potter (2005): Hospital General “Dr. Juan Bruno Zayas”
Síndrome de Potter
 Bilateral absence of the kidneys and ureters (1977): From the Department
ofPediatrics, Tufts-New England Medical Center Hospitals, Boston Floating
Hospitalfor Infants and Children, Boston, Massachusetts, USA
 Chromosome 22ql 1 deletion presenting as the Potter sequence (1997): Koenraad
Devriendt, Philippe Moerman, Dominique Van Schoubroeck, Kamiel
Vandenberghe, Jean-Pierre Fryns
 Prognosis of antenatally diagnosed oligohydramniosof renal origin (05/01/2007):
Markus J. Kemper & Dirk E. Mueller-Wiefel
 PRENATAL DIAGNOSIS OF POTTER´S SYNDROME BY ULTRASOUND (1983):
INGEMAR HELIN, IRÉNE AXELSSON and PER-HÂKAN PERSSON;
 Potter´s Syndrome Associated With Renal Agenesis or Dysplasia (1985);
 Dr Edith Potter (1901–1993) of Chicago: pioneer in perinatalpathology (2005).
 Margotto PR. Neurosonografia neonatal, ESCS, 2011 (no prelo)
•
•
•
•
•
http://www.omim.org
Deltas C.,Papagregoriou G. Cystic Diseases of the Kidney.
Arch Pathol Lab Med 134: 569-582, 2010.
Nussbaum RL., McInnes R., Willard HF.Thomsom &
Thompsom Genética Médica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008
Jones KL. Smith’s recognizable patterns of human
malformation. Philadelphia: Elsevier,2006
Kerecuk L. et al. Autosomal dominant inheritance of nonsyndromic renal hypoplasia and dysplasia: dramatic variation
in clinical severity in a single kindred. Nephrol Dial
Transplant (2007) 22: 259–263
O Quarteto Fantástico
Dr. Paulo R. Margotto, Ddo Carlos, Ddo Éder e Ddo Thiago
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Éder Ferreira Soares, Romina S. Heredia