UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA FATORES PREDITIVOS PARA A MÁ EVOLUÇÃO RESPIRATÓRIA NA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ UMA REVISÃO DA LITERATURA KÁTYA DE CARVALHO MAURICIO RAPHAEL AKIRA SIQUEIRA ISHIBASHI SÃO PAULO 2007 KÁTYA DE CARVALHO MAURICIO RAPHAEL AKIRA SIQUEIRA ISHIBASHI FATORES PREDITIVOS PARA A MÁ EVOLUÇÃO RESPIRATÓRIA NA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ UMA REVISÃO DA LITERATURA Monografia apresentada a Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Especialista em Intervenção Fisioterapêutica nas Doenças Neuromusculares. Orientadora: Profa. Dra. Sissy Veloso Fontes SÃO PAULO 2007 ii Universidade Federal de São Paulo Escola Paulista de Medicina Especialização em Intervenções Fisioterapêuticas nas Doenças Neuromusculares Chefe do Departamento: Débora Amado Scerni Coordenadores do Curso de Especialização: Prof. Dr. Acary Souza Bulle Oliveira Profa. Ms Francis Meire Fávero Profa. Dra. Sissy Veloso Fontes iii Kátya de Carvalho Mauricio Raphael Akira Siqueira Ishibashi FATORES PREDITIVOS PARA A MÁ EVOLUÇÃO RESPIRATÓRIA NA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ UMA REVISÃO DA LITERATURA Banca Examinadora Professora Orientadora: Profa. Dra. Sissy Veloso Fontes Professor Examinador: Prof. Dr. Abrahão A. J. Quadros Professor Examinador Aprovada em: ____/____/_____ iv DEDICATÓRIA Aos nossos pacientes, verdadeiros motivadores para a realização desta especialização. A todos aqueles que se dedicam ao árduo trabalho de pesquisa, enriquecendo e valorizando o trabalho do fisioterapeuta. v AGRADECIMENTOS A Deus, que em nossas vidas proporcionou a oportunidade do conhecimento. Aos nossos familiares pelo carinho, incentivo, paciência e compreensão dedicados durante a realização deste trabalho e em todos os momentos de nossas vidas. A Miriam, pela valiosa contribuição na revisão gramatical e ortográfica deste trabalho. vi LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS • AIDP - Polineuropatia Inflamatória Desmielinizante Aguda • AMSAN - Neuropatia Sensitivo-Motora Axonal Aguda • AMAN - Neuropatia Motora Axonal Aguda • CMV - Cytomegalovirus • CO2 – Gás carbônico • CV – Capacidade vital • CVF – Capacidade vital forçada • DPOC – Doença pulmonar obstrutiva crônica • EMG – Eletromiografia • IOT – Intubação oro-traqueal • PaO2 – Pressão Parcial de Oxigênio • Peak Flow – Pico de fluxo de tosse • PEmáx – Pressão expiratória máxima • PImáx – Pressão inspiratória máxima • SGB - Síndrome de Guillain-Barré • Vmin – Volume minuto vii RESUMO Introdução: A Síndrome de Guillain-Barré é uma polineuropatia inflamatória, desmielinizante, aguda, de origem auto-imune e representa a causa mais comum de paralisia flácida nos países ocidentais; sua progressão é rápida e pode resultar em severo comprometimento dos músculos respiratórios em até 30% dos casos. Idealmente o risco de desenvolver insuficiência respiratória deve ser identificado o mais precocemente possível, uma vez que o rápido suporte ventilatório oferecido a estes pacientes diminui as complicações secundárias à falência respiratória, melhorando seu prognóstico. Objetivo: Identificar os fatores capazes de predizer a falência respiratória na Síndrome de Guillain-Barré. Método: Foram realizadas buscas eletrônicas nas bases de dados MEDLINE, LILACS, SCIELO, além do site PUBMED, a fim de identificar os artigos científicos indexados e publicados de 1997 a 2007. A primeira estratégia de busca utilizada nas bases de dados MEDLINE, LILACS e SCIELO foi: descritor de assunto= “GuillainBarré syndrome” AND “respiratory failure”. Na PUBMED foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory failure” AND limits= adult humans. A segunda estratégia de busca utilizada nas: MEDLINE, LILACS e SCIELO foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory insufficiency”. Na PUBMED foi: “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory insufficiency ” AND limits= adult humans. Foram selecionados para esse estudo ensaios clínicos, estudos prospectivos e retrospectivos, realizados com humanos adultos, com diagnóstico de SGB segundo o critério padrão; estudos que envolviam outras doenças além da síndrome de Guillain-Barré foram descartados. Resultados: A primeira estratégia de busca nos trouxe 163 títulos com seus respectivos resumos; De acordo com os critérios de inclusão, apenas 6 estudos foram incluídos nesta revisão. A segunda estratégia de busca nos trouxe 57 títulos com seus respectivos resumos sendo que desses, nenhum foi incluído nesta revisão. Esses estudos envolveram 1486 pacientes dos quais 535 receberam ventilação mecânica e 951 não receberam. Conclusão: Os fatores preditivos mais utilizados são, de acordo com a revisão, o grau de incapacidade no momento da admissão, a presença de disfunção autonômica, a disfunção bulbar, a arreflexia generalizada e a rápida evolução dos acometimentos. Os testes simples de função pulmonar que podem ser realizados à beira do leito como a CV, PImáx e PEmáx, têm a capacidade de, isoladamente, predizer a possibilidade de falência respiratória. Considerando que estes testes são de fácil aplicação e de baixo custo, devem constituir prática comum nos serviços de saúde. viii ABSTRACT Introduction: Guillain-Barré syndrome is an acute inflammatory demyelinating polyneuropathy and represents the most common cause of acute flaccid paralysis in western countries; it progresses rapidly and leads to severe weakness of respiratory muscles in 30% of the patients. Ideally the potential of respiratory failure development must be promptly identified as the early ventilatory support can reduce secondary complications of respiratory failure, improving patient prognostic. Objectives: To identify the predictive factors of respiratory failure in Guillain-Barré syndrome. Method: Electronic research in the MEDLINE, LILACS and SCIELO databases and PUBMED website in order to identify articles published from 1997 to 2007. In the first search it was used the terms “Guillain-Barré syndrome” and “respiratory failure” and in the second one, the terms “Guillain-Barré syndrome” and “respiratory insufficiency”. In PUBMED website it was also used the “limit= adult humans”. It was selected clinical trials, prospective and retrospective studies with adult human beings who had diagnosis of Guillain-Barré syndrome; the studies that involve other diseases were rejected. Results: The first searching strategy brought 163 articles with their respective summaries. According to inclusion criteria, only 6 articles were considered in this review. The second searching strategy brought 57 articles with their respective summaries. Although none of them were included. These studies involved 1486 patients, of whom 535 received mechanical ventilation and 951 didn’t. Conclusion: The usual predictive factors are: disability grade in admission, presence of autonomic dysfunction, bulbar dysfunction, generalized areflexia and rapid disease progression. Simple bedside measurements like pulmonary function tests (vital capacity, maximal inspiratory and maximal expiratory pressures) allow respiratory failure prediction by themselves. Considering that application of these procedures is easy and at low cost, they must be always used in clinical practice. ix SUMÁRIO Capa...................................................................................................................... i Folha de rosto.................................................................................................. ii Folha de identificação...................................................................................... iii Termo de aprovação........................................................................................ iv Dedicatória....................................................................................................... v Agradecimentos............................................................................................... vi Lista de abreviaturas e siglas.......................................................................... vii Resumo............................................................................................................ viii Abstract............................................................................................................ ix Sumário............................................................................................................ x I – Introdução................................................................................................... 01 I.1 Síndrome de Guillain-Barré........................................................................ 01 I.1.1 Definição.................................................................................................. 01 I.1.2 Manifestações Clínicas............................................................................ 01 I.1.3 Epidemiologia.......................................................................................... 01 I.1.4 Diagnóstico.............................................................................................. 02 I.1.5 Patogênese.............................................................................................. 04 I.1.6 Fatores desencadeantes......................................................................... 04 I.1.7 Classificação............................................................................................ 05 I.1.7.1 Polineuropatia Inflamatória Desmielinizante Aguda (AIDP).................. 05 I.1.7.2 Neuropatia Motora Axonal Aguda (AMAN)........................................... 06 I.1.7.3 Neuropatia Sensitivo-Motora Axonal Aguda (AMSAN)......................... 06 I.1.7.4 Síndrome de Miller Fisher..................................................................... 06 I.1.7.5 Outros subtipos..................................................................................... 07 I.1.8 Comprometimento autonômico................................................................ 07 I.1.9 Comprometimento respiratório................................................................ 08 I.1.9.1 Testes de função pulmonar.................................................................. 11 I.1.9.1.1 Capacidade Vital................................................................................ 11 I.1.9.1.2 Pressão inspiratória máxima e pressão expiratória máxima............. 12 I.1.9.1.3 Pico de fluxo de tosse – Peak Flow................................................... 13 I.1.10 Tratamento............................................................................................. 14 I.1.10.1 Suporte............................................................................................... 14 I.1.10.2 Imunoterapia....................................................................................... 14 II – Objetivo...................................................................................................... 15 III – Método...................................................................................................... 16 III.1 Tipo de estudo.......................................................................................... 16 III.2 Estratégias de busca................................................................................ 16 III.3 Critérios de inclusão e exclusão............................................................... 16 IV – Resultados................................................................................................ 17 IV.1 Descrição dos estudos............................................................................. 19 V – Discussão.................................................................................................. 25 VI – Considerações finais................................................................................ 27 VII – Referências bibliográficas....................................................................... 28 VIII – Anexos.................................................................................................... 32 VIII.1 – Escala de Hughes............................................................................... 32 VIII.2 – Escala de funcionalidade.................................................................. 33 x I - INTRODUÇÃO I.1 Síndrome de Guillain-Barré I.1.1 Definição A Síndrome de Guillain-Barré (SGB), entidade clínica que deve seu nome ao dos autores que a descreveram pela primeira vez, é uma polineuropatia inflamatória, desmielinizante, aguda, de origem auto-imune, com uma ampla gama de sintomas motores e sensitivos1-8. Com a erradicação da poliomielite nos países ocidentais, tornou-se a causa mais freqüente de paralisia flácida aguda3,5,6,9,10. Na maioria dos pacientes a neuropatia é precedida por infecção bacteriana ou viral1,5,10,11. I.1.2 Manifestações Clínicas Manifesta-se principalmente com fraqueza muscular ascendente e simétrica com ou sem distúrbios sensoriais e autonômicos1,3,5,7. A fraqueza é mais importante nos músculos proximais e os membros inferiores são comumente mais afetados que os membros superiores. São freqüentes as parestesias proximais, que se propagam, mas raramente atingem punhos ou tornozelos. Nos pés são relatadas sensações de formigamento ou “alfinetadas”. Os reflexos profundos são abolidos no decorrer de alguns dias1,7,12. Este quadro pode evoluir em poucas horas ou mesmo em alguns dias ou semanas, e seu grau de acometimento pode variar de uma simples fraqueza de membros inferiores a um quadro de quadriplegia1,7,13. A esta fase progressiva da doença, segue-se um platô com persistência dos sintomas, que se mantêm inalterados. O tempo de recuperação varia de semanas a meses. I.1.3 Epidemiologia Os estudos epidemiológicos mostram uma incidência anual amplamente variável de 0.4 a 4 casos em cada 100.000 habitantes, com uma prevalência maior xi em homens que em mulheres1,5,8,12,14. Um estudo retrospectivo, realizado no hospital Santa Marcelina, de janeiro de 1995 a dezembro de 2002 e publicado em 2004, indicou uma incidência anual de 0.6 casos/ 100.000 habitantes, na proporção de 1.4 homens para 1 mulher15. Apesar do prognóstico de recuperação atribuído aos pacientes com Síndrome de Guillain-Barré ser muito favorável, a taxa de mortalidade encontrada pode variar de 2 a 10% dos casos1,16. I.1.4 Diagnóstico O diagnóstico na SGB é baseado principalmente nas características clínicas e, muitas vezes, é considerado arbitrário uma vez que ainda não há um marcador diagnóstico específico1,5,7,12. As características que permitem um diagnóstico incluem critérios laboratoriais e eletrofisiológicos além dos clínicos (quadro 1)17. Laboratorialmente, verifica-se aumento da proteína liquórica, sem pleocitose. Um exame de líquor normal nas primeiras 48hs não exclui o diagnóstico, mas ao final de uma semana o nível protéico deve estar elevado. Os picos de elevação protéica se dão de quatro a seis semanas do início dos sintomas, podendo tal fato ser atribuído ao processo inflamatório das raízes nervosas, com quebra da barreira hematoencefálica e transudato de proteínas do plasma para o líquor, levando à dissociação albumino-citológica5,7,12. Os estudos eletrodiagnósticos revelam uma polineuropatia desmielinizante multifocal com degeneração axonal secundária17; a eletroneuromiografia demonstra diminuição da velocidade de condução nervosa7,12; alterações na eletromiografia são raras na fase inicial e as primeiras alterações são o recrutamento anormal das unidades motoras, os potenciais de desnervação ocorrendo normalmente após a terceira semana17. Quadro 1 - Critérios Diagnósticos para a Síndrome de Guillain-Barré segundo Asbury e Cornblath17 Características necessárias para o diagnóstico • Debilidade motora progressiva em ambos os membros superiores e inferiores • Arreflexia xii Características que apóiam fortemente o diagnóstico • Rápida progressão dos sinais e sintomas por até quatro semanas • Relativa simetria dos sintomas • Sinais e sintomas sensitivos leves • Sinais de envolvimento dos nervos craniais, especialmente fraqueza bilateral dos músculos faciais (ocorrem aproximadamente em 50% dos casos), da língua e da deglutição • Início da recuperação de duas a quatro semanas após o término da evolução • Disfunção autonômica – arritmias, alterações de pressão e sintomas vasomotores, quando presentes, apóiam fortemente o diagnóstico • Ausência de febre durante o surgimento dos sintomas neurológicos • Alta concentração de proteína liquórica na primeira semana do surgimento dos sintomas, com concentração celular menor que 10células/mm3 • Achados eletrofisiológicos como a diminuição na velocidade de condução nervosa ou bloqueio da mesma, quando presentes, apóiam fortemente o diagnóstico (aproximadamente 80% dos casos de SGB) Características que excluem o diagnóstico • Diagnóstico de Botulismo, Miastenia, Poliomielite ou Neuropatia Tóxica • Metabolismo anormal das porfirinas • História recente de Difteria • Síndrome puramente sensorial, sem fraqueza muscular Na grande maioria dos casos de SGB verifica-se, precedendo os sintomas neurológicos, presença gastrointestinais. de Entretanto, mal estar, presença de febre, sintomas vômito, dor respiratórios abdominal, ou anemia, insuficiência renal, febre, perda de peso ou anorexia simultâneos à evolução da neuropatia, sugerem fortemente um diagnóstico primário de doença sistêmica ou xiii intoxicação com concomitante polineuropatia, mas excluem o diagnóstico de síndrome de Guillain-Barré17. I.1.5 Patogênese A SGB apresenta uma natureza auto-imune, com múltiplas evidências tais como atividade de linfócitos T e B no líquor e elevação dos marcadores de ativação de macrófagos. Desta maneira pode-se afirmar que a SGB resulta de uma resposta imune aberrante contra o tecido nervoso, com inúmeros anticorpos dirigidos a uma grande variedade de gangliosídeos que são glucolipídeos estruturais (GM1, GM2)2,5,8. I.1.6 Fatores Desencadeantes Mais de dois terços dos pacientes com SGB relatam história de infecção prévia ao surgimento dos sintomas neurológicos, sendo as mais comuns as infecções do trato respiratório superior ou as gastroenterites1,2,5,7,11,12,15. O intervalo entre o processo infeccioso e o início dos primeiros sintomas neurológicos varia de uma a quatro semanas. Múltiplos agentes infecciosos têm sido associados à SGB, sendo os mais freqüentes o Campylobacter jejuni seguido do Cytomegalovirus (CMV)1,2,5,7,8,10-12. Há ainda infecções pelo vírus Epstein-Barr, Mycoplasma pneumoniae, HIV – sobretudo na fase de soro conversão, Helicobacter pylori, vírus da varicela-zoster, Haemophilos influenzae e citomegalovirus1,2,5,7,12. Outros eventos precedentes incluem procedimentos cirúrgicos, vacinações, doenças lifomatosas, doenças auto-imunes, embora muitas ocorrências se refiram a casos específicos e coincidências não possam ser descartadas5,8. A infecção pelo Campylobacter jejuni é o fator desencadeante da SGB mais freqüente no mundo2,8. Apesar disso, apenas um em cada mil casos de gastroenterite por C. jejuni precedem a SGB8. Esta bactéria como fator desencadeante da SGB tem a função de induzir uma resposta imune específica contra nervos motores identificados como antígenos2,8. O gangliosídeo GM1 apresenta-se como o alvo, pois anticorpos anti-GM1 estão fortemente associados à SGB precedida por infecção pelo Campylobacter jejuni e altas concentrações de xiv GM1 estão presentes na mielina das fibras motoras em comparação às fibras sensoriais2,5,8. O Cytomegalovirus (CMV) é a causa viral mais comum de infecção prévia na SGB e a presença de anticorpos IgM sugere infecção recente. A alta freqüência de envolvimento de nervos craniais e sensitivos indica que a infecção por CMV induz resposta imune específica contra antígenos presentes nestes nervos. Anticorpos anti-GM2 estão associados à SGB precedida por infecção pelo CMV, mas a distribuição do GM2 no sistema nervoso periférico é desconhecida2,5,8. I.1.7 Classificação A Síndrome de Guillain-Barré compreende quatro subtipos, de acordo com sua fisiopatologia e seu comportamento eletrofisiológico1,12. I.1.7.1 Polineuropatia Inflamatória Desmielinizante Aguda (AIDP) Forma mais comum e mais estudada, correspondendo a 85-90% dos pacientes com SGB. Por esta razão o termo Síndrome de Guillain-Barré utilizado é 1,5 freqüentemente como sinônimo de AIDP . É uma doença autoimune, mediada por anticorpos, deflagrada por infecção viral ou bacteriana prévia. A eletroneuromiografia mostra diminuição da velocidade de condução nervosa, padrão que indica tipicamente uma desmielinização. Provavelmente o alvo imunológico é a membrana da célula de Schwann ou a própria bainha de mielina. Verifica-se grande infiltrado linfocitário nos nervos periféricos e invasão de macrófagos na bainha de mielina e células de Schwann, deixando os axônios desmielinizados. Tardiamente, e secundariamente à desmielinização, pode ocorrer degeneração axonal. A localização das lesões explica a distribuição dos déficits neurológicos, que podem ser predominantemente proximais, distais ou ambos; podem gerar comprometimento somente sensorial, motor ou sensório-motor; com ou sem comprometimento autonômico, apesar de ser comum, principalmente com alterações cardíacas e da pressão arterial que, juntamente com as complicações repiratórias, são as principais causas de má evolução, podendo levar à morte1,5,7,8,12. xv I.1.7.2 Neuropatia Motora Axonal Aguda (AMAN) Mais comum em crianças, é uma forma puramente motora com lesão axonal, sem comprometimento da bainha de mielina. A lesão axonal não é causada simplesmente por processo degenerativo, mas também por um bloqueio de condução reversível nos nódulos de Ranvier, o que explica a rápida recuperação nestes pacientes. A eletroneuromiografia mostra uma diminuição no potencial de ação muscular, sem diminuição significativa na velocidade de condução nervosa. Contrariamente à AIDP, alguns pacientes apresentam hiperreflexia durante a fase de recuperação. O comprometimento autonômico é raro e, quando presente, é brando. A recuperação de uma lesão axonal é geralmente mais lenta que a lesão desmielinizante, entretanto o tempo médio de recuperação é o mesmo, o que se deve aos casos de simples bloqueio de condução nos nódulos de Ranvier1,5,7,12. I.1.7.3 Neuropatia Sensitivo-Motora Axonal Aguda (AMSAN) Afetando tipicamente adultos e com baixa incidência, esta forma acomete raízes e nervos sensitivos e motores com degeneração axonal; verifica-se mínima inflamação e desmielinização. Apesar da AMSAN diferir da AMAN apenas pelo envolvimento sensorial, está associada a uma grave enfermidade e a uma lenta recuperação1,5,7,12. I.1.7.4 Síndrome de Miller Fisher Caracterizada pela tríade clínica: oftalmoplegia, ataxia e arreflexia. A síndrome foi incluída como subtipo da SGB devido à presença de dissociação albuminocitológica e pela recuperação total e espontânea, apesar da fraqueza muscular não ser a característica principal; os pacientes apresentam moderada fraqueza de membros, diminuição da propriocepção, sem perda sensitiva. Há desmielinização e inflamação do III e VI pares cranianos, gânglios espinhais e nervos periféricos. O prognóstico é geralmente bom, com total recuperação em até três meses1,5,7,12. xvi I.1.7.5 Outros Subtipos Alguns autores descrevem ainda um quinto subtipo, Síndrome Sensitiva, de comprometimento exclusivamente sensitivo18. Apesar de a SGB ser classicamente caracterizada por uma debilidade motora progressiva em ambos os membros superiores e inferiores, estes autores encontraram evidência neurofisiológica de desmielinização de fibras sensitivas, dissociação albumino-citológica, infecção precedente e total recuperação. Defendem também não se tratar de polirradiculopatia desmielinizante inflamatória crônica devido à total recuperação dos pacientes envolvidos18. I.1.8 Comprometimento Autonômico O comprometimento autonômico, embora usualmente benigno, ocorre em média em 65% dos pacientes com SGB, que invariavelmente necessitam de monitoramento e conseqüentemente admissão em unidade de terapia intensiva. Os acometimentos específicos são a hipertensão paroxística, hipotensão paroxística, hipotensão postural, hiponatremia, sudorese intensa, obstrução ilíaca, bradicardia, taquicardia ou arritmias cardíacas, bexiga neurogênica e alterações das glândulas salivares e lacrimais19. A disautonomia apresenta-se como complicador na abordagem das vias aéreas, quando a intubação orotraqueal é necessária; arritmias cardíacas, particularmente bradicardias podem ocorrer durante a manipulação das vias aéreas; além disso, deve-se sempre considerar a possibilidade de hipercalemia, evitando o uso de succilcolina (bloqueador neuromuscular) e também a possibilidade de resposta hipotensiva associada ao uso de algumas drogas como os barbitúricos e benzodiazepínicos19-21. A maioria das complicações secundárias aos distúrbios autonômicos ocorre em pacientes com fraqueza muscular generalizada e falência respiratória19,20. xvii I.1.9 Comprometimento Respiratório Existem evidências que mostram que a falência respiratória (quadro 2) e a dependência de ventilação mecânica estão intimamente relacionadas a maiores taxas de morbidade e mortalidade20,22-25. Aproximadamente 30% dos pacientes com SGB evoluem com falência respiratória e necessitam de intubação orotraqueal e ventilação mecânica13,20,22-24,26. Além disso, entre os pacientes com SGB dependentes de ventilação mecânica, a taxa de mortalidade pode chegar a até 30%22. A falência respiratória causada por doença neuromuscular é particularmente perigosa uma vez que se instala de forma insidiosa e silenciosa sem os sinais clínicos mais característicos; a capacidade vital pode cair a um nível muito baixo antes que a hipoxemia apareça; a hipercapnia é uma característica tardia13,27. Quadro 2 – Insuficiência Respiratória A falência ou insuficiência respiratória pode ser definida como a incapacidade do sistema respiratório de realizar adequada troca gasosa, podendo ser expressa por uma inadequada oxigenação do sangue arterial, pela retenção de dióxido de carbono sanguíneo ou pela combinação destes dois processos28. É convencionalmente definida por uma pressão parcial de oxigênio arterial < 60 mmHg, por uma pressão parcial de dióxido de carbono arterial > 45mmHg, ou ambos29,30. Entretanto, os significados clínicos destes valores devem levar em consideração a história pregressa do paciente29. O sistema respiratório é basicamente formado de duas partes: os componentes pulmonares (vias aéreas e alvéolos), responsáveis pela troca gasosa e os componentes que garantem a mecânica ventilatória (centro respiratório no sistema nervoso central, trato córtico espinhal, corno anterior da medula, motoneurônios, junção neuromuscular e a caixa torácica e sua musculatura). O equilíbrio deste sistema depende do funcionamento dos componentes citados28 e o tipo de insuficiência respiratória é determinado pela parte do sistema afetado. Uma falência nos componentes pulmonares leva a uma insuficiência tipo I que cursa com hipoxemia e normo ou hipocapnia, normalmente associadas a uma grande xviii variedade de doenças pulmonares (pneumonias, atelectasias, enfisemas, doenças intersticiais). Uma falência nos componentes responsáveis pela mecânica ventilatória leva a uma insuficiência tipo II que cursa com hipoventilação alveolar e conseqüente hipercapnia, com ou sem hipoxemia29,30. É importante ressaltar a possibilidade de coexistirem ambos os tipos I e II no mesmo paciente. Pelo menos quatro fatores contribuem para a evolução do comprometimento respiratório: a) perda da proteção das vias aéreas superiores, por fraqueza da musculatura facial, da orofaringe e laringe interferindo com os mecanismos de deglutição e limpeza de secreções, aumentando o risco de broncoaspiração e de obstrução mecânica do fluxo de ar, principalmente na posição supina; b) fraqueza da musculatura inspiratória (diafragma, intercostais e músculos acessórios) resultando em uma inadequada expansão pulmonar, com conseqüentes microatelectasias, principalmente na periferia do parênquima pulmonar e levando a uma desigualdade na relação ventilação-perfusão com conseqüente hipoxemia; segue-se taquipnéia compensatória com baixos volumes pulmonares e diminuição progressiva da complacência pulmonar, levando a um aumento do trabalho respiratório e possivelmente à fadiga; c) fraqueza da musculatura expiratória com comprometimento dos mecanismos de higiene brônquica, notadamente da qualidade e eficácia da tosse, aumentando os riscos de broncoaspiração e conseqüente pneumonia; d) finalmente, complicações pulmonares secundárias como as próprias atelectasias, pneumonias, embolismo pulmonar, entre outras13,23,24,26,31,32. O avanço das terapias de cuidados intensivos e o rápido suporte ventilatório oferecido a estes pacientes, diminuem as complicações secundárias à falência respiratória, melhorando seu prognóstico; se a intubação orotraqueal for retardada por qualquer razão, quadros de atelectasias e broncoaspirações poderão ocorrer, prolongando ainda mais o tempo de ventilação mecânica13,16 e, conseqüentemente, os riscos de complicações secundárias a esta, como atelectasias, pneumonias, empiemas e pneumotórax, entre outras13,26. Critérios absolutos para intubação imediata incluem diminuição do nível de consciência, parada cardíaca ou respiratória, choque, arritmias, disfunções bulbares com comprovada broncoaspiração31. Muitos pacientes entretanto, não preenchem xix estes critérios, mas evoluem com fraqueza generalizada. Tais pacientes devem ser acompanhados cuidadosamente e avaliados regularmente a fim de evitar uma intubação em situação de emergência, o que muitas vezes ocorre durante a noite25,31-33. A hipoventilação, que leva à desigualdade na relação ventilaçãoperfusão, ocorre inicialmente durante o sono, particularmente no sono REM, como resultado da diminuição da ação dos músculos intercostais e acessórios, deixando o suporte ventilatório a cargo apenas de um diafragma enfraquecido32,34. Avaliações subjetivas através das características clínicas do paciente, associadas à aplicação de testes de função pulmonar (avaliações objetivas), podem ajudar a identificar o risco de desenvolvimento da insuficiência respiratória, optandose pela intubação orotraqueal eletiva. Muitos são os sinais clínicos que devem alertar para uma possível falência respiratória: progressão da fraqueza generalizada; presença de disfagia e disfonia que denotam o envolvimento bulbar; ortopnéia, dispnéia ao pequeno esforço; incapacidade para adequada higiene brônquica; taquipnéia; taquicardia; fadiga; sensação de pânico; uso de musculatura acessória da respiração; respiração paradoxal; tosse após deglutição que é um forte indício de broncoaspiração; necessidade de pausa ao ler uma frase ou incapacidade de contar até 15, após uma inspiração máxima, o que pode indicar comprometimento da capacidade vital21,27,31,32,35. Distúrbios do sono são um forte indício da hipoventilação e devem ser considerados. Em muitos pacientes estes distúrbios precedem a dispnéia aos mínimos esforços ou ao repouso. Com o aumento da fraqueza muscular, além do sono REM, todas as demais fases do sono são afetadas pela hipoventilação com repetidos episódios de dessaturação, o que resulta na fragmentação do sono21,32,34. Além do monitoramento da oximetria noturna, vale observar a presença de sonolência diurna, diminuição de apetite, dores de cabeça ao despertar e comprometimento cognitivo e intelectual21,27,34. Os testes de função pulmonar fornecem valores objetivos do grau de comprometimento da função respiratória. Muitos testes existem para a avaliação da função respiratória; entretanto, pela praticidade e facilidade de aplicação são utilizados testes simples de capacidade vital forçada (CVF), máximas pressões inspiratórias e expiratórias (PImax e PEmax) e pico de fluxo de tosse (Peak flow)3538 . Estas avaliações devem ser repetidas a cada 6 a 8 horas13,21,33,35, uma freqüência xx maior podendo aumentar o risco de fadiga muscular35. Também, a fim de detectar precocemente uma queda na saturação de oxigênio, especialmente durante o sono, os pacientes devem ser monitorados pela oximetria de pulso13,38. Vários estudos realizados indicam fatores preditivos não diretamente relacionados a sinais e sintomas de insuficiência respiratória: a) tempo decorrido entre o surgimento dos primeiros sintomas e a admissão hospitalar inferior a 7 dias7,23,24,32,33,39; b) presença de anticorpos anti-GQ1b40,41; c) incapacidade para levantar a cabeça7,23,24,32,39; d) oftalmoplegia41; e) síndrome desmielinizante32,39; f) escala de Hughes, que avalia graus de incapacidade na admissão26; g) disfunção autonômica7,24,33; h) aumento de enzimas hepáticas7,23. Entretanto muitos testes preditivos, apesar de altamente reprodutíveis, apresentam seu uso limitado pela dificuldade de aplicação (estudos eletrofisiológicos). Na prática, os mais utilizados são a avaliação clínica, o movimento da caixa torácica, a capacidade de higiene brônquica e os testes simples, realizados à beira do leito, principalmente a medida da capacidade vital, que é a mais estudada e utilizada39. I.1.9.1 Testes de Função Pulmonar • I.1.9.1.1 Capacidade Vital É o teste de função pulmonar mais amplamente utilizado nas doenças neuromusculares34,38,42; é uma medida , ou ao menos seu componente inspiratório, da capacidade dos músculos respiratórios de contraírem-se maximamente contra as forças elásticas do pulmão e da caixa torácica43. Para a análise dos dados são utilizadas pelo menos três manobras que não difiram entre si mais do que 100ml44. Entretanto, a precisão desta medida depende do esforço do paciente, da sua cooperação, bem como da sua capacidade de oclusão labial e nem sempre isso é possível para os pacientes com envolvimento bulbar34,42,44. A relação pressãovolume em um pulmão normal é tal que apenas pequenas pressões são necessárias para insuflar completamente o pulmão; sendo assim, a força muscular deve estar substancialmente reduzida em qualquer diminuição encontrada nos valores preditos xxi da capacidade vital42. Ainda assim é uma medida mais significativa que a avaliação da retenção de gás carbônico (CO2) como indicativo da hipoventilação – verifica-se uma diminuição de 30% na capacidade vital (CV) antes que haja um aumento da pressão parcial de CO2 arterial42. Uma variação que se mostrou muito útil na avaliação isolada da fraqueza diafragmática é a comparação das medidas realizadas nas posturas sentada e supina34,38,43,45. A integridade do diafragma é necessária para expandir o tórax contra a resistência imposta pelo conteúdo abdominal na postura supina e um decréscimo dessas medidas maior que 20-25% sugere disfunção diafragmática e a necessidade de novas avaliações34,43,45. Em indivíduos normais verificamos uma queda máxima de aproximadamente 14% na CV45; em indivíduos com doença neuromuscular a queda na CV na postura supina pode chegar até a 55%19; entretanto, uma redução de 25% já indica fraqueza diafragmática44 e, uma redução superior a 40% mostra fraqueza significativa do diafragma38. A capacidade vital em indivíduos normais é de 60-70ml/Kg peso31; uma CV< 30ml/Kg está associada a uma tosse fraca e à presença de atelectasias pulmonares e uma CV < 15ml/Kg peso é geralmente aceita como critério absoluto para intubação orotraqueal e dependência de ventilação mecânica1,16,19,31. Outros autores mostram-se menos tolerantes, indicando ventilação mecânica quando a capacidade vital cai abaixo de 20ml/Kg7,13,20,21. • I.1.9.1.2 Pressão Inspiratória Máxima e Pressão Expiratória Máxima O procedimento mais comum usado para avaliar a força dos músculos respiratórios é a medida da pressão inspiratória máxima (PImáx) e da pressão expiratória máxima (PEmáx); a medida da PImáx é muito importante pois a musculatura inspiratória é a responsável pelo trabalho respiratório; já, a medida da PEmáx é fundamental quando objetivamos determinar especificamente a fraqueza de diafragma (apresentaria apenas alteração da PImax)34,42,43, sendo também um bom indicador da capacidade de realizar a higiene brônquica27. Novamente, para a precisão destas medidas, torna-se necessária a colaboração do paciente, uma boa compreensão dos comandos verbais e a capacidade de oclusão labial. Ambas as medidas de PImax e PEmax dependem dos volumes pulmonares; esta dependência está relacionada à capacidade de um músculo gerar força de acordo com o seu xxii comprimento (relação comprimento X tensão) e também às mudanças na configuração torácica que ocorrem durante a expansão e contração da caixa torácica43. Desta forma é muito importante que a medida das pressões inspiratória e expiratória máximas seja realizada a partir de volumes pulmonares preestabelecidos. Usualmente a medida da PImáx é realizada a partir do volume residual, ou seja, após uma expiração forçada; a medida da PEmáx é realizada, normalmente, a partir da capacidade pulmonar total, ou seja, após uma inspiração máxima. As medidas são realizadas comumente na postura sentada, utilizando um clipe nasal um bucal com orifício de 2mm a fim de minimizar a força gerada pela acção dos músculos faciais44. Novamente são realizadas pelo menos três medidas com variação menor que 20% entre si, sendo utilizado o maior valor44. Os valores de referência para a PImáx e a PEmáx apresentam uma grande variação mesmo em indivíduos saudáveis, principalmente entre homens e mulheres, havendo, também, um importante decréscimo nestes valores com o envelhecimento. Comumente, aceita-se como normais números negativos com valor absoluto de PImáx superiores a 80 cmH2O e valores de PEmáx superiores a 80 cmH2O34. Como critério para indicação de intubação orotraqueal utiliza-se valores absolutos de PImáx inferiores a 30cmH2O e de PEmáx inferiores a 40 cmH2O7,13,20,16,21,31. • I.1.9.1.3 Pico de Fluxo de Tosse – Peak Flow A tosse é o mecanismo natural de higiene brônquica, através do qual a secreção é eliminada e a broncoaspiração evitada36,38,39; a tosse efetiva é um processo complexo que requer uma inspiração máxima, o fechamento da glote, a manutenção deste fechamento contra uma pressão expiratória crescente que se torna máxima, seguida de uma súbita abertura da glote em sincronia com uma vigorosa e coordenada exalação do ar27,36. A avaliação da tosse é realizada pela medida objetiva do pico de fluxo de tosse, ou peak flow, cujo valor normal é superior a 300l/min36. Quando o peak flow cai abaixo de 160l/min, a tosse não é suficientemente efetiva para a adequada higiene brônquica; quando está entre 160270l/min, é passível de cair abaixo de 160l/min se uma infecção pulmonar ocorrer34,36,37,38, o risco de pneumonia e insuficiência respiratória aumentando grandemente37. xxiii I.1.10 Tratamento O tratamento para a síndrome de Guillain-Barré tem dois componentes: tratamento de suporte e o específico7. O tratamento de suporte é o ponto-chave da terapia pois, os pacientes que conseguem superar a fase aguda da doença apresentam melhor potencial de recuperação7. I.1.10.1 Suporte Envolve o acompanhamento rigoroso do paciente a fim de predizer a má evolução respiratória, prevenir complicações secundárias à falência respiratória, complicações decorrentes de uma longa permanência no leito como as tromboses venosas, monitorar alterações provenientes da disautonomia e minimizar ocorrência de dor7,12,19,46. Somam-se ainda o acompanhamento fisioterapêutico1,7,12,19,20,35, terapêutico ocupacional, nutricional e psicológico1,7,19,20,35 . I.1.10.2 Imunoterapia Plasmaferese tem sido aceito como o tratamento de escolha para a SGB há pelo menos 20 anos46. Apresenta benefício comprovado durante as primeiras quatro semanas sendo que é maior o benefício, quanto antes for oferecido o tratamento46. Entretanto, nos últimos dez anos, estudos realizados mostraram que o tratamento com imunoglobulina intravenosa é equivalente a plasmaferese na redução dos sintomas após 4 semanas de tratamento47, assim como na redução do tempo de ventilação mecânica, da mortalidade e das incapacidades residuais46. Desde então há uma tendência em eleger a imunoglobulina intravenosa como tratamento preferencial, uma vez que é um tratamento muito mais simples, mais confortável para o paciente, de menor custo46,47 e com menores riscos de complicações iatrogênicas (a plasmaferese depende da passagem de um cateter central, havendo o risco de pneumotórax)19. xxiv II - OBJETIVO Identificar através de uma revisão bibliográfica da literatura os fatores capazes de predizer a falência respiratória na Síndrome de Guillain-Barré. xxv III - MÉTODO III.1 Desenho do Estudo Revisão da literatura. III.2 Estratégias de Busca Para a caracterização dos fatores preditivos para a má evolução respiratória na Síndrome de Guillain-Barré, foram realizadas buscas eletrônicas nas bases de dados MEDLINE (Medlars Online), LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), e SCIELO (The Scientific Electronic Library Online), além do site PUBMED, através do acesso a base bibliográfica MedLine, desenvolvida pela NLM (National Library of Medicine), a fim de identificar os artigos científicos indexados e publicados de 1997 a 2007. A primeira estratégia de busca utilizada nas bases de dados MEDLINE, LILACS e SCIELO foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory failure”. Na PUBMED foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory failure” AND limits= adult humans. A segunda estratégia de busca utilizada nas: MEDLINE, LILACS e SCIELO foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory insufficiency”. Na PUBMED foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory insufficiency ” AND limits= adult humans. III.3 Critérios de Inclusão e Exclusão Inclusão: foram selecionados para esse estudo ensaios clínicos, estudos prospectivos e retrospectivos, que avaliaram os fatores preditivos para a má evolução respiratória na SGB, e que foram realizados com humanos adultos com diagnóstico de SGB segundo o critério padrão. Exclusão: estudos de caso, revisões, consensos, opiniões de especialistas; estudos que envolvam outras doenças além da síndrome de Guillain-Barré. xxvi IV - RESULTADOS A pesquisa eletrônica inicial utilizando os unitermos Guillain Barré Syndrome and respiratory failure, identificou: • Base de dados Medline: 90 títulos com os respectivos resumos; foram identificados e descartados estudos de revisão narrativa e estudos de caso (n=56), estudos realizados com crianças (n=3), estudos relacionados a outras doenças (n=8) e estudos relacionados a assuntos irrelevantes (n=17). Apenas 6 estudos se enquadravam nos critérios de inclusão. Artigos completos analisados (n= 42). • Site PubMed: 70 titulos com os respectivos resumos; foram identificados e descartados estudos duplicados, já indexados na base de dados Medline (n=54), estudos de revisão narrativa e estudos de caso (n=7), estudos relacionados a outras doenças (n=2) e estudos relacionados a assuntos irrelevantes (n=7). • Base de dados Lilacs: 3 títulos com os respectivos resumos; foram identificados e descartados estudos duplicados já indexados na base da dados Medline (n=1) e estudos de revisão narrativa e estudos de caso (n=2). • Base de dados Scielo: nenhum título. Fluxograma 1. Representação dos resultados das buscas utilizando os unitermos Guillain Barré Syndrome and respiratory failure. Resultados das Buscas Títulos com resumos identificados: 163 - PubMed - Medline - Lilacs - Scielo (n=70) (n=90) (n=03) (n=00) Artigos completos: 42 Estudos Excluídos: - PubMed - Medline - Lilacs (n=70) (n=84) (n=03) Estudos Inclusos para a revisão (n=6) xxvii A pesquisa eletrônica inicial utilizando os unitermos Guillain Barré Syndrome and respiratory insuficiency, identificou: • Base de dados Medline: 12 títulos com os respectivos resumos; foram identificados e descartados estudos duplicados (n=4), estudos de revisão narrativa e estudos de caso (n=6) e estudos realizados com crianças (n=2). • Site PubMed: 41 títulos com os respectivos resumos; foram identificados e descartados estudos duplicados (n=40) e estudos relacionados a assuntos irrelevantes (n=1). • Base de dados Lilacs: 3 títulos com os respectivos resumos; foram identificados e descartados todos pois eram duplicados. • Base de dados Scielo: 1 título com o respectivo resumo que foi identificado e descartado por ser duplicado. Fluxograma 2. Representação dos resultados das buscas utilizando os unitermos Guillain Barré Syndrome and respiratory insuficiency. Resultados das Buscas Títulos com resumos identificados: 57 - PubMed - Medline - Lilacs - Scielo (n=41) (n=12) (n=03) (n=01) Estudos Excluídos: - PubMed - Medline - Lilacs - Scielo (n=41) (n=12) (n=03) (n=01) Estudos Inclusos para a revisão (n=0) xxviii IV.1 Descrição dos Estudos Os estudos foram realizados na América do Norte (1)33, América do Sul (1)48, Europa (2)23,40 e Ásia (2)24,26. Foram publicados em seis diferentes jornais entre os anos de 1999 e 2006. O número total de participantes estudados foi de 1486 indivíduos, do sexo feminino ou masculino, divididos em dois grupos: 535 que receberam ventilação mecânica e 951 que não receberam. Quadro 3 – Caracterização dos Estudos selecionados Autores Ano Durand et al, 200640 Sundar et al, 200524 Cheng et al, 200426 Sharshar et al, 200323 n° de participantes 154 46 77 791, dos quais 69 foram excluídos por necessitarem de suporte ventilatório logo na admissão Desenho do Estudo Método de mensurações Ventilados Não ventilados Estudo Prospectivo • Exames laboratoriais • Exames clínicos • Testes eletrofisiológicos 34 120 2 anos • Comparação de retrospectivos variáveis clínicas e 4 anos demográficas. prospectivos • Eletrodiagnóstico. Estudo retrospectivo Estudo clinico randomizado • Eletrodiagnóstico, estudo de condução nervosa, EMG • Classificação de Hughes • PImáx, PEmáx, Vmin • Exames clínicos e dados demográficos • Classificação de Hughes • Exames laboratoriais • Escala funcional de MMSS e MMII • Envolvimento de nervos cranianos e disfunção autonômica • Mensuração da CV 28 18 25 52 313 409 xxix Lawn et al, 200133 Schottlender et al, 199948 114 44 • Classificação de Hughes • Exames laboratoriais • Exames clínicos: fraqueza Estudo facial, paralisia de Retrospectivo MMSS, disfunção autonômica, fraqueza bulbar • CV, PImáx, PEmáx Estudo Retrospectivo • Exames laboratoriais • Comparações de variáveis demográficas e epidemiológicas • EMG, função respiratória CV 60 54 31 13 Durand et al.40 estudaram todos os pacientes adultos com o diagnóstico de SGB admitidos em uma unidade de tratamento intensivo na França entre setembro de 1998 e janeiro de 2006. Foram incluídos no estudo 154 pacientes, que realizaram os testes eletrofisiológicos completos pelo mesmo neurofisiologista e que não necessitaram de ventilação mecânica antes ou durante as 24 horas em que o teste foi realizado. Anormalidades eletromiográficas foram observadas em todos os pacientes e anormalidades da condução nervosa sensitiva, em 71% dos pacientes. O teste eletrofisiológico evidenciou desmielinização em 58% dos pacientes. Em média, 34 pacientes necessitaram de ventilação mecânica após 4 dias de inclusão. Estes pacientes, no momento da admissão apresentavam maior fraqueza de membros, dos músculos respiratórios (mensurada pela medida da capacidade vital), e maior freqüência de envolvimento bulbar e alterações das enzimas hepáticas, bem como padrão eletrofisiológico desmielinizante. Os autores sugerem que a desmielinização na SGB agrava o risco da necessidade de ventilação mecânica, e relatam que o teste eletrofisiológico deve ser utilizado tanto para diagnóstico como para prognóstico, especialmente se somado à mensuração da capacidade vital, ambos como preditivos para a má evolução respiratória. No entanto, ressaltam a xxx dificuldade de realização do teste eletrofisiológico padrão na prática diária. Embora os dados sejam controversos, em 70 dos 154 pacientes, o estudo eletrofisiológico do nervo frênico não pode ajudar na antecipação da ventilação mecânica. A hipótese de que a desmielinização dos nervos periféricos causada pela SGB induz a um bloqueio da condução do nervo frênico, levando assim à falência respiratória não pode ser determinada, pois o estudo não demonstrou diferença significativa entre o grupo de pacientes ventilados e não ventilados. Acrescentam os autores que, na prática diária, o monitoramento dos pacientes com SGB é baseado nos exames clínicos, em particular no movimento da caixa torácica e na capacidade de eliminar a secreção, e também nas mensurações da capacidade vital, principalmente se estas forem seqüenciais. Sundar et al.24 estudaram, em um período de seis anos, sendo dois retrospectivamente e quatro prospectivamente, 82 pacientes admitidos em um hospital na Índia com diagnóstico de paralisia flácida; destes, 46 pacientes satisfizeram os critérios para o diagnóstico de SGB. Dados clínicos e demográficos foram comparados entre o grupo dos que evoluíram com dependência de ventilação mecânica (n=28) e o grupo dos que não necessitaram dela (n=18). Os resultados mostram que idade, sexo, infecções prévias, fraqueza facial bilateral, fraqueza cervical e paralisia precoce de membros superiores, não predizem a necessidade de ventilação mecânica. A presença de paralisia bulbar (64% no grupo ventilado e 11% no não ventilado) e disfunção autonômica (50% no grupo ventilado e 5,5% no não ventilado) foram significativamente mais comuns no grupo ventilado. Da mesma forma, o tempo de evolução da doença foi menor neste mesmo grupo. Estudos eletrofisiológicos foram realizados nos dois grupos antes do pico de evolução da doença e o achado comum aos dois grupos foi uma radiculopatia motora; a diminuição na velocidade de condução foi encontrada preferencialmente no grupo ventilado, representando neste grupo grave desmielinização distal ou perda axonal. Embora 36 dos 46 pacientes tenham recebido tratamento com plasmaferese ou imunoglobulina intravenosa, o efeito da terapia relacionado à necessidade de intubação não pôde ser avaliado, pois um significativo número de pacientes iniciaram a terapia depois do pico da evolução da doença ter sido atingido. Cheng et al.26 avaliaram retrospectivamente estudos eletrodiagnósticos e registros médicos de 77 pacientes com SGB admitidos em um hospital na China xxxi entre janeiro de 1987 e dezembro de 2001. Dos 77 pacientes, 32% evoluíram para falência respiratória e necessidade de suporte ventilatório; estes pacientes apresentaram, na admissão, classificação < 3 na escala de Hughes. O tempo decorrido entre o aparecimento dos sintomas e a intubação foi, em média, de 11 dias. No momento da intubação foi realizada a mensuração da PImáx e PEmáx. Os pacientes que apresentaram baixos valores de PImáx e PEmáx no momento da intubação, apresentaram complicações após o início da ventilação além de uma pior evolução; 72% tiveram complicações após a ventilação mecânica, sendo que 64% desenvolveram pneumonia com ou sem septicemia, 4% desenvolveram pneumonia com empiema e 4% pneumonia com pneumotórax. Sharshar et al.23 realizaram em uma unidade neurológica e de tratamento intensivo na França, um estudo no qual incluíram 791 pacientes em duas triagens clinicas randomizadas com o tratamento de plasmaferese, a primeira triagem realizada entre 1981 e 1985 (n=220), a segunda triagem realizada entre 1986 e 1993 (n=571); sessenta e nove pacientes foram excluídos por necessitarem de ventilação mecânica no momento da admissão. Os pacientes que evoluíram para dependência de ventilação mecânica apresentavam, no momento da admissão, um quadro clínico mais severo com déficit motor e sensorial difusos, arreflexia generalizada, disfunção bulbar, paralisia facial bilateral e disfunção cardiovascular autonômica. De acordo com os resultados obtidos, no momento da admissão hospitalar, seis variáveis foram associadas à má evolução respiratória e conseqüente dependência de ventilação mecânica: a) tempo decorrido entre o surgimento dos primeiros sintomas e a admissão hospitalar inferior a 7 dias; b) incapacidade de elevar os cotovelos da cama; c) incapacidade de levantar-se; d) incapacidade de levantar a cabeça; e) tosse ineficaz; f) aumento das enzimas hepáticas. A probabilidade de má evolução respiratória aumenta de 8 a 100% conforme o paciente apresente, na admissão, nenhuma (8%) até 6 das variáveis citadas (100%). O trabalho também mostrou que a plasmaferese pode afetar o curso da SGB e conseqüentemente a evolução para falência respiratória. Por fim, o valor médio obtido no momento da admissão, de CV foi significativamente mais baixo nos pacientes que necessitaram de ventilação mecânica em comparação aos que não necessitaram; valores de CV menores que 60% do predito no momento da admissão estão significativamente associados à evolução para ventilação mecânica. xxxii Lawn et al.33 analisaram, através de registros médicos, 114 pacientes admitidos em uma unidade de tratamento intensivo norte-americana, entre janeiro de 1976 e dezembro de 1996. De acordo com os resultados do estudo, os pacientes que necessitaram de ventilação mecânica tiveram uma evolução mais severa da SGB evidenciada pela presença da disfunção bulbar, disfunção autonômica e paralisia facial bilateral. A necessidade de ventilação mecânica foi associada a um menor tempo decorrido entre o surgimento dos sintomas neurológicos e o pico de evolução da doença. Não houve diferenças significativas entre aqueles que evoluíram para ventilação mecânica e os outros quanto a variáveis como sexo, idade, presença de distúrbio gastrointestinal precedente, paralisia de membros superiores ou doenças pulmonares. Resultados da análise do líquor foram similares nos dois grupos. Nesse estudo, a ausência de tratamento com imunoglobulina intravenosa e plasmaferese não foi associada à necessidade de intubação e ventilação mecânica. Os pacientes que necessitaram de ventilação mecânica apresentaram, no momento da admissão hospitalar, menores valores nas mensurações da CV, PImáx e PaO2, comparados aos que não necessitaram. Os pacientes que necessitaram de ventilação mecânica evoluíram com um decréscimo da CV abaixo de 20 ml/Kg após a admissão, ou uma redução de pelo menos 30ml/Kg do valor predito, além de uma diminuição de 30% nos valores de PEmáx e da PImáx. Finalmente, o estudo demonstra que valores de PImáx menores que 30cmH2O e de PEmáx menores que 40cmH2O estão fortemente associados à dependência de ventilação mecânica. Anormalidade radiográficas como infiltrados pulmonares e atelectasias, foram mais comumente encontradas nos pacientes que necessitaram de ventilação mecânica. Schottlender et al.48 analisaram as histórias clínicas de todos os pacientes que apresentaram diagnóstico de SGB entre os anos de 1987 e 1996, admitidos em um hospital na Argentina. Durante esse período, 44 pacientes com SGB ingressaram no serviço com comprometimento respiratório, sendo que 70.5% evoluíram para falência respiratória necessitando de ventilação mecânica. Em 64% dos casos houve um evento precedente relacionado com a SGB, 86% deles com história de processo inflamatório nos 30 dias anteriores ao surgimento dos sintomas e 14% com história de traumatismo. Em 39 pacientes foi realizado EMG e em 20.5% deles houve comprometimento axonal o que, segundo os autores, está relacionado a uma xxxiii maior severidade da doença. Foi realizado o tratamento com plasmaferese em 14 participantes e com imunoglobulina intravenosa em 3, e no grupo tratado houve uma tendência a menor mortalidade. Os pacientes que em menos de 48 horas evoluíram para a ventilação mecânica tiveram um período mais prolongado de suporte mecânico: os autores sugerem que o início brusco dos sintomas com comprometimento severo é sinal de mau prognóstico. As disfunções autonômicas ficaram evidenciadas em 43% dos pacientes, dos quais 2 foram a óbito por disfunção autonômica severa; para minimizar o risco dessas complicações, os autores sugerem que é imprescindível o monitoramento cardíaco e dos sinais de disautonomia. Entre o grupo de pacientes ventilados, 26% foram a óbito, o que foi relacionado com a maior idade, sepsis, barotrauma e disautonomia severa. xxxiv V - DISCUSSÃO Devido aos avanços tecnológicos em suportes de cuidados intensivos, o prognóstico na SGB pode ser favorável, a taxa de mortalidade, relativamente baixa e a morbidade residual, mínima. Essa porém, é a mais comum das morbidades neuromusculares, sua progressão é bastante rápida e está associada à falência respiratória. Faz-se assim necessário que a equipe esteja atenta a fatores que podem predizer essa falência respiratória para que se intervenha e se tomem medidas eficazes em momento oportuno, garantindo assim um prognóstico favorável. De acordo com a análise dos estudos, variáveis demográficas como sexo e idade, não estão associadas à má evolução respiratória, não podendo ser utilizadas como fatores preditivos23,24,26,33,40; idade porém, pode estar associada a maior morbidade22,26. Outras variáveis que não estão relacionadas à má evolução respiratória, segundo resultado de três estudos, são: infecções gastrointestinais precedentes23,24,33, fraqueza facial bilateral23,24, paralisia precoce de membros superiores23,24,33, doenças pulmonares (DPOC, asma, fibrose pulmonar) 33 e ausência de reflexos isolados23, embora alguns desses acometimentos estejam relacionados à história da doença e sejam comumente encontrados em pacientes com SGB, ventilados ou não. Os fatores encontrados, nas populações estudadas, capazes de predizer a má evolução respiratória foram a rápida evolução dos sintomas23,24,26,33,40, baixo score na escala de Hughes (quanto maior o comprometimento inicial maior foi a evolução para ventilação mecânica)23,26,33, disfunção autonômica23,24,33, disfunção bulbar22,24,33,40 , arreflexia generalizada23,26 , fraqueza facial bilateral33. Apesar de a capacidade de elevar a cabeça do leito ser tida como preditivo, os estudos23,24 avaliados concluíram que isoladamente a fraqueza da musculatura cervical não prediz a má evolução respiratória. Nos estudos avaliados, a capacidade vital foi apresentada como um teste importante na determinação da má evolução respiratória e evolução para ventilação mecânica23,26,33,40,48. Vários fatores podem explicar a ampla utilização deste xxxv parâmetro: a) a existência de vários estudos precedentes apontando valores-limite similares; b) teste de fácil aplicação e baixo custo; c) teste facilmente reprodutível. Nenhum dos estudos revisados entretanto, descreveu se a aplicação do teste foi realizada em diferentes posturas e nem ressaltou a importância da realização deste na posição supina, pois uma variação de 20-25% nos valores medidos nas diferentes posturas (sentada e supina) sugere disfunção diafragmática e a necessidade de novas avaliações34,43,45 e uma redução de 40% ou mais mostra fraqueza significativa de diafragma38. Dos estudos revisados, dois26,33 utilizaram as mensurações da PImáx e PEmáx como preditivos para a má evolução respiratória e, apenas um estudo26 ressalta que, pelo fato da capacidade vital só apresentar alteração quando há acentuada fraqueza muscular42 e a PImáx refletir diretamente a força da musculatura inspiratória, especialmente de diafragma, esta variável reflete acometimento primário da insuficiência respiratória na SGB. Cheng et al. melhor 26 o também ressaltam a importância da mensuração da PEmáx como preditor, uma vez que a fraqueza da musculatura expiratória está diretamente relacionada a uma tosse ineficaz e, conseqüentemente ao comprometimento respiratório. Apesar de muitos estudos indicarem a tosse ineficaz como um importante preditivo para a má evolução respiratória, nenhum dos estudos revisados utiliza o pico de fluxo de tosse, peak flow, como método de quantificação da efetividade da tosse, embora este método seja de simples aplicação, baixo custo e alta reprodutibilidade. Embora os testes eletrofisiológicos sejam importantes preditores, a sua aplicabilidade na prática clínica diária é difícil, pois proporcionam desconforto ao paciente26, necessitam de um equipamento de alto custo, da disponibilidade de um profissional capacitado e, principalmente, porque a aplicação deles demanda tempo, o que limita seu uso como preditor em uma doença de rápida evolução como a SGB. xxxvi VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS A má evolução respiratória nos pacientes com síndrome de Guillain-Barré pode ser precocemente predita utilizando-se as avaliações clínicas e simples testes de função pulmonar. As avaliações clínicas mostram-se preditores importantes especialmente se presentes em associação. Assim, de acordo com a revisão, os preditores mais utilizados são: a) o grau de incapacidade no momento da admissão; b) a presença de disfunção autonômica; c) o comprometimento bulbar; d) a arreflexia generalizada; e) a rápida evolução dos acometimentos. Os testes de função pulmonar, CVF, PImáx e PEmáx são capazes de, isoladamente, predizerem a possibilidade de falência respiratória. Devido à baixa sensibilidade do teste de CVF, é recomendável, na avaliação da fraqueza diafragmática, a comparação das medidas realizadas nas posturas sentada e supina. Apesar da capacidade vital ser o teste de função pulmonar mais utilizado para predizer a má evolução respiratória na SGB, a diminuição da força muscular é o acometimento primário nas doenças neuromusculares, precedendo a diminuição dos volumes pulmonares e, por esta razão, a PImáx é um teste mais sensível que a capacidade vital. Por fim, a mensuração do peak flow deve ser incorporada na prática clínica a fim de quantificar a efetividade da tosse, podendo assim tornar-se também um fator preditivo para a falência respiratória. As avaliações clínicas e testes simples de função pulmonar que podem ser realizados à beira do leito, são capazes de predizer o curso da SGB e por isso, se faz necessário que essa seja uma prática comum nos serviços de saúde, a fim de minimizar as comorbidades decorrentes da doença. xxxvii VIII – ANEXOS VIII.1 Escala de Hughes 0 Normal 1 Mínimos sinais e sintomas / capaz de correr 2 Capaz de andar 5 metros sem auxílio mas incapaz de correr 3 Capaz de andar 5 metros com auxílio 4 Incapaz de andar – acamado ou em cadeira de rodas 5 Necessita de ventilação mecânica em pelo menos parte do dia 6 Morto xxxviii VIII.2 Escala de Funcionalidade proposta por Sharshar et al.23 Classificação funcional dos membros superiores (cada item pontuado de 0 a 2) 1 Mover os dedos 2 Segurar uma caneta entre o polegar e o indicador 3 Realizar a flexão de cotovelo com antebraço pronado 4 Realizar a flexão de cotovelo com o antebraço supinado 5 Em supino, erguer os cotovelos 6 Manter os membros superiores extendidos Classificação funcional dos membros inferiores (itens 1-6 pontuados de 0 a 2; itens 7-10 pontuados de 0 a 1) 1 Mover os dedos 2 Realizar a dorsiflexão do tornozelo 3 Realizar a flexão plantar do tornozelo 4 Em supino, fletir os joelhos 5 Em supino, elevar o membro inferior 6 Em supino, manter o membro inferior elevado 7 Ficar em pé 8 Deambular por 5 metros com auxílio 9 Deambular por 5 metros sem auxílio 10 Levantar a partir da postura agachada xxxix VII - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.Kuwabara S. 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