Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Lato Sensu em Relações Internacionais e Diplomáticas na
América do Sul
Trabalho de Conclusão de Curso
IMPACTOS DO FOCEM NAS ASSIMETRIAS DO MERCOSUL:
ANÁLISE MULTICRITÉRIO DOS MEIOS DISTRITBUTIVOS
Autor: Lucas Soares Portela
Orientador: Dr. Ironildes Bueno da Silva
Brasília - DF
2013
LUCAS SOARES PORTELA
IMPACTOS DO FOCEM NAS ASSIMETRIAS DO MERCOSUL:
ANÁLISE MULTICRITÉRIO DOS MEIOS DISTRITBUTIVOS
Artigo
apresentado
ao
curso
de
graduação em Relações Internacionais e
Diplomáticas na América do Sul da
Universidade Católica de Brasília, como
requisito parcial para obtenção do Título
de
pós-graduação
em
Relações
Internacionais.
Orientador: Dr. Ironildes Bueno da Silva
Brasília
2013
2
IMPACTOS DO FOCEM NAS ASSIMETRIAS DO MERCOSUL:
ANÁLISE MULTICRITÉRIO DOS MEIOS DISTRIBUTIVOS
LUCAS SOARES PORTELA
RESUMO
Criado para reduzir as assimetrias na América do Sul, o MERCOSUL tem
apresentado um aumento nas diferenças econômicas e sociais de seus membros. O
objetivo deste artigo é analisar em que medida as ações do Fundo para a
Convergência Estrutura do MERCOSUL (FOCEM), visando à redução de
assimetrias, resultam em uma distribuição equitativa no MERCOSUL. Para tanto,
utiliza a análise multicritério para avaliar os projetos do FOCEM e seus impactos,
tendo como referências três variáveis: equidade; desenvolvimento como liberdade; e
nível de cooperação. Ao final deste trabalho nota-se uma equidade na distribuição
dos recursos deste fundo, porém uma ineficiência no desenvolvimento de liberdades
sociais, e uma tendência ao unilateralismo na elaboração e aplicação dos projetos.
Por fim, o crescimento das assimetrias entre o Brasil e seus vizinhos do
MERCOSUL, em termos de FOCEM, pode se dar por uma maior eficiência na
aplicação dos recursos por parte do Brasil face aos demais.
Palavras-chave: MERCOSUL. Assimetrias. FOCEM. Análise multicritério.
1 INTRODUÇÃO
O Brasil pode ser considerado um líder natural dentro do subcontinente da
América do Sul. Tal afirmativa é embasada não somente na discrepância em favor
do território brasileiro em relação aos demais países da região (COUTO, 2012), mas
também devido às assimetrias nas outras várias dimensões do poder, como a social
e a econômica (COUTO, 2012). Apesar de esta posição gerar poder ao Brasil, ela
requer uma maior responsabilidade.
Este dever é configurado por uma maior parcela dos custos para redução das
assimetrias na região (DOMINGUES & PEREIRA JR, 2012, p. 07), ou seja, dar
estímulos para produzir desenvolvimento dentro da América do Sul. Depois de duas
décadas de existência do MERCOSUL, de acordo com Renato Baumann (2012),
percebe-se uma permanência das assimetrias, contrariando o objetivo do
MERCOSUL. Além disto, de acordo com Wilson de Almeida (2003), esta integração
acaba excluindo regiões periféricas dos próprios atores, com o nordeste no caso
brasileiro, contradizendo a integração completa. Por fim, há descontentamento
regional em relação ao Brasil, pois essas assimetrias tem favorecido este ator em
detrimento dos demais (MACHADO & PESSOA, 2006, p. 53).
3
De acordo com Leandro Couto (2012) essas assimetrias são de carater
estrutural, apresentando disparidades nos campos econômico e social. Assim, o
Fundo para a Convergência Estrutura do MERCOSUL (FOCEM) é o principal
programa de redução de assimetrias do bloco, sendo o objeto deste artigo.
Por meio das considerações anteriormente, este artigo analisa em que
medida as ações do FOCEM resultam em uma distribuição equitativa no
MERCOSUL. Para norteador o estudo, o argumento central é: o MERCOSUL, por
meio do FOCEM, apresenta mecanismos distributivos equitativos, entretanto com
dificuldades quanto a sua aplicação.
Observado este argumento, o artigo será dividido em quatro partes:
“mecanismos distributivos” na teoria de integração regional; métodos de avaliação
dos mecanismos distributivos; análise dos impactos distributivos dos projetos do
FOCEM; e conclusão.
Na primeira parte são analisadas as características de mecanismos
distributivos equitativos. Como ciência que estuda a alocação de recursos escassos
por agentes racionais (PAIVA & CUNHA, 2008, p. 15), torna-se necessário a sua
abordagem para embasamento teórico. Assim, poderemos compreender a
importância do papel dos mecanismos distributivos e suas características dentro da
integração regional.
Posteriormente, se avalia o método para análise dos mecanismos
distributivos. Este tópico verifica as variações no método, como cada uma se aplica
e qual a melhor se adéqua ao contexto da pesquisa no MERCOSUL. Para tanto será
utilizado às obras de Balassa (1961), Brant (2009) e o manual de análise de projetos
preparado pela Unidade Responsável pela Avaliação DG Política Regional
Comissão Europeia (COMISSÃO EUROPEIA, 2003).
Na quarta parte, verifica-se os projetos. Na amostra do artigo compreende os
projetos do FOCEM no âmbito da Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai. Apesar de a
Venezuela ter ingressado no MERCOSUL em 2012, não houve utilização deste
fundo nos anos compreendidos na pesquisa por parte deste ator, ou seja, entre o
ano de 2007, marco inicial dos primeiros projetos, e o de 2012, ano anterior a
elaboração deste estudo. Sendo assim, não há ainda a possibilidade de verificar os
impactos de sua participação no fundo.
4
Finalizando, após estas três partes aqui propostas, analisamos as ações
utilizadas no bloco mercosulino para desenvolvimento dos Estados Partes. A partir
disto, são apresentadas as conclusões, em que se verificam quais países do grupo
recebem mais benefícios em cada projeto descrito, apontando o nível de equidade,
de liberdade e de cooperação gerada por cada um. A contribuição final é a
apresentação das falhas do fundo para a redução das assimetrias, como também
considerações para uma melhor aplicação de projetos futuros.
2 MECANISMOS DISTRIBUTIVOS NA INTEGRAÇÃO REGIONAL
Em Economia, o objeto de estudo é a racionalidade do individuo na alocação
de recursos. Diante disto, este tópico analisa os mecanismos distributivos se
adéquam a realidade da integração regional. É também observada a relação entre
integração regional e os conceitos de igualdade e equidade.
Assim, a ciência econômica tem como objetivo puro:
Estuda a alocação de recursos escassos (dinheiro, capacidade de trabalho,
energia, etc.) entre fins alternativos (lazer, segurança, sucesso, etc.) por
parte dos proprietários de recursos que buscam obter o máximo benefício
por unidade de dispêndio. (PAIVA & CUNHA, 2008, p. 15).
Neste artigo entende-se que os indivíduos fazem escolhas que podem não
ser consideradas racionais, assim podendo tomar decisões equivocadas. Esta
premissa também esta vinculada com as decisões dentro de uma integração
regional. Neste caso, os agentes decisórios são os responsáveis por escolherem em
quais projetos alocar as verbas de um fundo como o FOCEM. Essas escolhas
podem favorecer igualmente a todos ou mais um ator do que outro, dependendo da
distribuição.
Em termos de justiça social, as escolhas anteriormente citadas podem ser de
cunho igualitário ou equitativo. De acordo com John Rawls (1971, p. 303), a
categoria igualitária não gera justiça, pois concede as mesmas oportunidades para
todas as pessoas; já a categoria equitativa gera justiça, pois cria maior oportunidade
para o indivíduo mais desprovido.
Sabendo disto, é necessário compreender quais os objetivos de uma
integração regional, para referenciar os objetivos dos quais estão envolta os projetos
do FOCEM:
5
Propomo-nos definir integração econômica como um processo e uma
situação. Encarada como um processo implica medidas destinadas à
abolição de discriminações entre unidades econômicas de diferentes
Estados; como situação pode corresponder à ausência de várias formas de
discriminação entre economias nacionais. (BALASSA, 1961, p.12)
Baseado neste autor, a melhor definição para nosso estudo é a primeira, ou
seja, a integração como processo, pois os projetos de desenvolvimento fazem parte
do processo de integração e não da situação. Assim, no âmbito do MERCOSUL,
uma ação igualitária, proporcionaria para o Brasil um crescimento relativo maior do
que os demais países do bloco (informação verbal).1 Uma ação equitativa, entretanto
gera uma redução das assimetrias, como ocorreu com a China e seus vizinhos, em
que houve um crescimento modesto da liderança chinesa, face ao crescimento
considerável dos demais países (informação verbal).2
Entretanto, alguns cuidados fazem-se necessário para a avaliação da
distribuição, pois de acordo com o Institucionalismo Histórico:
Neste sentido, o que distingue o institucionalismo histórico é sua ênfase nos
efeitos que as instituições exercem na política com o passar do tempo e sua
rejeição das explicações funcionalistas para o desenho institucional: de
acordo com o funcionalismo, as instituições são vistas como algo
deliberadamente desenhado para desempenharem funções específicas, tai
como provisão de informações relevantes ou adoção de políticas confiáveis
– com pouca ou nenhuma atenção sendo dada ao legado histórico de tais
instituições. Já o institucionalismo histórico afirma que as escolhas
institucionais tomadas no passado podem persistir, moldando e
constrangendo os atores no futuro. (BRANT, 2009, p. 75-76)
Assim, as instituições são moldadas pelas escolhas tomadas no decorrer da
história. Diante disto, projetos equitativos podem não ser benéficos para o bloco
quando tais instituições evoluem erroneamente e favorecem mais um país provido
de melhores condições do que os demais. Tal evolução aumentaria a discriminações
dentro de uma integração.
Para alcançar o objetivo apontado anteriormente por Brant (2009), serão
necessários projetos que favoreçam os membros desprovidos de recursos
financeiros e desenvolvimento social. Estas iniciativas, entretanto, não devem surgir
1
Informação fornecida por Renato Baumann em apresentação na Embaixada da África do Sul, em Brasília, em
outubro de 2012. De acordo com o estudo realizado por Baumann (2012), embora os indicadores econômicos
do MERCOSUL cresçam, percebe-se em nível unilateral um aumento proporcionalmente maior do Brasil
quando comparado com os demais.
2
Ibidem.
6
somente dos tomadores de decisão dos países necessitados, mas também
empreendidas pelos Estados com maior desenvolvimento por meio da cooperação.
O Institucionalismo Histórico também contribui ao enfatizar a importância das
agendas e processos de negociações. De acordo com Pierson (1996 apud BRANT,
2009, p. 76), esta teoria concede uma importância secundária nas negociações em
si, pedindo uma atenção superior ao processo e agendas do bloco. Por isto, este
estudo deslumbrou, principalmente, os projetos financiados pelo FOCEM, sem
maiores atenções aos procedimentos para aprovação de suas propostas.
Considerado esses pressupostos, sob a ótica da integração regional, as
análises de mecanismos distributivos apresentam as seguintes relações:
QUADRO 1 – Relações de Mecanismos Distributivos e Integração Regional
PROJETOS
TIPO DE JUSTIÇA
DESCRIÇÃO
Gera as mesmas oportunidades para todos os
membros, independente da questão social e financeira
dos países. Assim um país com maior capacidade de
desenvolvimento ganhará a mesma oportunidade de um
Igualitários
Justiça de Oportunidade
país de oportunidades limitadas. Quando relativizado os
resultados, percebe-se um aumento das assimetrias.
Somente apresenta-se como positiva, caso os atores
estejam no mesmo patamar de desenvolvimento.
Geram oportunidades distintas para os membros,
dependendo da questão social e financeira dos países.
Assim, um país com maior capacidade de
desenvolvimento ganha oportunidades limitadas, face o
país com menor capacidade de desenvolvimento.
Equitativos
Justiça de Resultados
Quando analisado os resultados, percebe-se uma
redução das discriminações. Somente há um aumento
das assimetrias quando a aplicação da verba apresenta
melhor aplicação, em termos de custo-benefício, por
parte dos países com maior preparo, usualmente os
mais desenvolvidos.
Fonte: Elaboração própria a partir de Ralws (1971).
Portanto, para reduzir as assimetrias dentro de um bloco regional são
necessários projetos equitativos que apresentem um maior poder distributivo em
favor dos países com menor capacidade de desenvolvimento. Esta distribuição,
porém, também deve ser equitativa em termos de “benefícios” para a população
menos favorecida. Diante disto, um FOCEM equitativo em termos financeiros, não
reduzirá as assimetrias do MERCOSUL, pois os projetos brasileiros concederam
maior oportunidade para seus nacionais face aos demais Estados. Para a liderança
brasileira se demonstrar benéfica dentro do MERCOSUL, ela deve assumir os
custos de projetos que pouco lhe auxilie em termos de desenvolvimento social. No
7
próximo tópico é abordada a questão técnica da aplicabilidade do modelo de análise
dos mecanismos distributivos, e posteriormente aplicação aos projetos do FOCEM.
3 ANÁLISES DE MECANISMOS DISTRIBUTIVOS
Os modelos de análises dos mecanismos distributivos são utilizados para
verificar possíveis efeitos de uma ação sobre dada sociedade. Eles possibilitam
verificar se um projeto, em termos específicos, gera somente desenvolvimento
econômico ou também desenvolvimento social.
Este método também pode ser utilizado para análise de assimetrias, pois de
acordo com Alcides Vaz (2012), a natureza distributiva tem vinculos com assimetrias
economicas e sociais. . De acordo com o manual de análise de custos e benefícios
do FEDER (COMISSÃO EUROPEIA, 2003, p. 135-136),
3
existem dois métodos
para se avaliar os impactos distributivos: a aplicação do índice de GINI; e a análise
multicritério.
O índice de GINI é popular nos estudos sobre distribuição de renda, bemestar social, pobreza e desenvolvimento econômico (NISHI, 2010, p. 02). O seu
caráter multidisciplinar permite a utilização deste índice também para os demais
estudos sobre distribuição. Assim pode ser utilizado para a distribuição dos recursos
do FOCEM e dos desenvolvimentos sociais propostos, verificando também a
tendência simétrica advinda dos projetos deste fundo.
Ele consiste em utilizar a “Curva de Lorenz”
4
para calcular a razão entre área
de concentração e área de perfeita desigualdade (NISHI, 2010, p. 04). A área de
concentração trata-se da área criada pela Curva de Lorenz, em relação à linha de
igualdade perfeita e a área da desigualdade total seria o cenário em que somente
um ator detém o monopólio de todos os recursos.
Para aplicar este índice na realidade do FOCEM deve-se utilizar no lugar da
variável renda, alguma variável na área do projeto em questão, por exemplo,
projetos econômicos pode se utilizar o Produto Interno Bruto (PIB), já no campo
social pode se utilizar o nível de atendimento em programa social ou escolaridade.
3
FEDER é a sigla que designa o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional destinado a redução das
assimetrias da União Européia.
4
É a curva que mostra a variação de renda em função da população (NISHI, 2010, p. 03).
8
Além disto, dependendo do projeto, a variável população também deverá ser
alterada de acordo com o objetivo do projeto, ou seja, caso o objetivo seja aumentar
as vias de escoamento de produção, deve-se olhar a quantidade de rodovias.
Por sua vez, a análise multicritério é utilizada para comparar alternativas,
políticas e cursos de ação, identificando impactos, além de ações eficazes e de
ações que devem ser modificadas (FERNANDES, 1996 apud BOAS, 2006, p. 06).
Embora não tenha como função principal analisar mecanismos de distribuição, o
manual do FEDER (COMISSÃO EUROPEIA, 2003, p. 135) sugere esta metodologia
como também indicada para estes fins. Assim, esse modelo possibilita quantificar
quem recebe maior parte dos recursos distribuídos em uma região. Em termos de
linhas gerais, essa análise é composta por seis etapas (SOARES, 2003 apud BOAS,
2006, p. 08-09): identificação do problema; identificação de um conjunto de ações
potenciais; elaboração de critérios; avaliação de critérios; determinação de peso dos
critérios; e agregação de critérios.
Identificar o problema possibilita saber sobre a área dos projetos (BOAS,
2006, p. 08). Isto referencia as escolhas de critérios. Além disto, um modelo de
análise utilizado para um projeto de meio ambiente apresentará variáveis distintas
de um projeto militar, assim esse exercício adéqua às diversas particularidades de
cada setor. Feito isto, passa-se para a identificação do conjunto de ações potenciais.
Em um terceiro momento serão elaborados os critérios utilizados para
verificar os efeitos dos projetos, políticas e conjuntos de ações apontadas no
procedimento anterior. Depois é realizada a avaliação dos critérios elaborados. Esta
ocorre por meio de uma tabela de desempenho, contendo os projetos e ações nas
linhas da tabela e os critérios nas colunas (BOAS, 2006, p. 09). Por fim realiza a
agregação dos critérios, permitindo um julgamento ao comparar cada ação.
No caso específico deste artigo os projetos são os programas do MERCOSUL
e as linhas de ações de cada um, em especial os com objetivos de reduzir as
assimetrias. A dificuldade deste método surge na determinação de critérios, não pela
sua complexidade, mas pela subjetividade, pois como visto, são os critérios nos
quais o pesquisador considera prioridade para redução das assimetrias na região do
MERCOSUL.
9
Entre esses dois métodos, levando em consideração as características de
cada um deles, conclui-se o método multicritério como o mais apropriado aos
objetivos apresentados na introdução deste estudo. Três motivos nos levam a tal
conclusão, o índice GINI é apropriado para utilização em situações em que uma das
variáveis é “população”, sendo de complexa utilização com demais variáveis. O
segundo motivo seria a necessidade de padrão das variáveis ao comparar os
resultados obtidos pelo índice GINI. Por último, a ausência de dados estatísticos do
programa do FOCEM e da realidade do MERCOSUL para aplicação no modelo
GINI. Por último, a possibilidade de quantificar variáveis qualitativas, torna a
avaliação multicritério atraente para este estudo. Diante disto, o próximo tópico se
ocupa em realizar a estruturação e adaptação da análise multicritério.
4 AVALIAÇÃO DOS PROJETOS DO FOCEM
A análise multicritério, embora apropriada, requer ainda adaptações para o
seu uso nas Relações Internacionais, em especial no estudo das assimetrias
regionais. Compreendendo as regras anteriormente descritas desta metodologia,
parte-se neste instante para a etapa de estruturação do modelo. Este tópico realiza
esta tarefa.
O objetivo do FOCEM, como já supracitado, é a redução das assimetrias,
realizada por meio de seus programas. De acordo com Bittarello & Morgado (2009,
p. 02), o FOCEM começou a concretizar-se em 2004 e herdou os aspectos políticos
dos fundos europeus, que também foram criados para reduzir as assimetrias:
[O FOCEM] tem por finalidade o aprofundamento do processo de integração
regional no Cone Sul, por meio da redução destas assimetrias, do incentivo
à competitividade e do estímulo à coesão social entre os países-membros
do bloco. O conceito de fundos estruturais está então intimamente ligado
com a integração regional: trata-se de um instrumento estrutural que ajuda
os estados-membros de um processo de integração a reduzir as
disparidades sociais e econômicas, estabilizando a economia regional.
(BITTARELLO & MORGADO, 2009, p. 02).
O aumento destas assimetrias dentro do MERCOSUL gera impacto não
somente na estabilidade da economia regional, como visto na citação acima, como
também para as negociações, conforme aponta Alcidez Vaz e Marcos Figueira
(2006).
10
Para tal redução, o FOCEM dispõe de quatro programas, nos quais os
projetos são alocados (MERCOSUL, 2005):
QUADRO 2 - Programas do FOCEM
DESCRIÇÃO
Contribui para o desenvolvimento e ajuste estrutural das
economias menores e regiões menos desenvolvidas. Ex.:
Desenvolvimento modernização e recuperação de vias de transporte modal e
I
estrutural
multimodal; distribuição de combustíveis fósseis e
biocombustíveis; geração, transporte e distribuição de energia
elétrica; saneamento ambiental e de macrodrenagem.
Contribui à competitividade no âmbito do MERCOSUL, assim
como a pesquisa e desenvolvimento de novos produtos e
Ganhos de
II
processos produtivos. Ex.: crescimento e associativismo das
Competitividade
pequenas e médias empresas; Geração de conhecimentos
tecnológicos.
Contribui para o desenvolvimento social e poderão incluir
projetos de interesse comunitário em áreas da saúde humana,
Desenvolvimento da redução da pobreza e do desemprego. Ex.: implementação
III
Social
de unidades de serviço de atenção básica à saúde; melhoria
da capacidade hospitalar; ensino fundamental, educação de
jovens e adultos e ensino profissionalizante.
Visa à melhora da estrutura institucional do MERCOSUL e a
Reforço
IV
seu eventual desenvolvimento. Ex.: aumento da eficiência das
Institucional
próprias instituições do bloco.
Fonte: Elaboração própria a partir de MERCOSUL (2005); Bittarello & Morgado (2009).
PROGRAMA
OBJETIVO
Os projetos do FOCEM são enquadrados dentro de cada um destes
programas. Devido à variedade de cada um destes programas, é necessário utilizar
critérios universais de avaliação. O primeiro deles que pode ser aplicado em
qualquer projeto do FOCEM é a variável “Equidade”, conceituada anteriormente.
Dentro do contexto da análise, um projeto equitativo é aquele em que o valor
financiado pelo FOCEM está inversamente relacionado com a posição de cada um
dos membros em termos de desenvolvimento. Assim, se o Brasil é o mais
desenvolvido (CIA, 2013), ele deve usufruir da menor cota dos financiamentos,
enquanto o Paraguai, de menor desenvolvimento (CIA, 2013), deve usufruir de maior
parte das verbas.
O segundo critério é o indicador de tipo de liberdade que o projeto
desenvolve. De acordo com Amartya Sen (2010, p. 195) existem dois tipos de
liberdade: construtiva e instrumental. A primeira diz respeito ao desenvolvimento
representado pelo crescimento econômico. O segundo é representado por aumento
do acesso, por parte dos habitantes de uma região, de bens e serviços. Para realizar
a análise dos projetos, é necessária a quantificação destes dois dados, portanto,
11
atribui-se valor 10 para a “liberdade construtiva”, enquanto a “liberdade instrumental”
20 e quando o projeto gera os dois, consequentemente gera 30. Essa escala ocorre
para evitar a redução de assimetrias aparentes, pois nem sempre divisas é sinônimo
de estruturas e serviços adequados para o cidadão.
A terceira variável é a “interdependência”. De acordo com Bouzas (2009, p.
02), por gerar um laço de dependência entre os atores, uma ação com
características de interdependência pode desencadear um efeito spill-over, ou seja,
um efeito cascata. Apesar de este autor associar o conceito à balança de comércio
exterior, no caso das relações simétricas nas integrações regionais, este conceito
está associado à capacidade de um projeto envolver atores terceiros, aumentando a
integração entre eles e a dependência. Assim programas unilaterais, tanto no efeito
quanto
na
execução,
recebem
pontuação
-5,
enquanto
outro
que
gera
“interdependência” recebe pontuação 10. Desta forma, os critérios de avaliação
podem ser resumidos da seguinte forma:
QUADRO 3 – Critérios para Avaliações de Simetrias em Projetos
VARIÁVEL
PONTUAÇÃO
Aponta a porcentagem de verbas do FOCEM utilizadas por um dado
país. Se a porcentagem reflete inversamente o cenário de distribuição
Equidade
de desenvolvimento dentro do MERCOSUL, mais equitativo será dado
ano, quanto mais diretamente proporcional for, menor a equidade.
A liberdade é promovida pelo aumento de desenvolvimento, este pode
apresentar duas características: instrumental, quando promove somente
Tipo de Liberdade
a questão social; e construtiva, quando promove a questão econômica.
O desenvolvimento real gera pontuação de 10, o desenvolvimento
instrumental de 20, quando aplicado os dois gera 30 pontos.
Quando não há gera pontuação negativa de -10, quando há a pontuação
Interdependência
é positiva: 10.
Fonte: Elaboração própria a partir de Rawls (1971); Sen (2010); Bouzas (2009).
Esses três critérios nos possibilitam saber se um projeto tem uma tendência
simétrica baixa, neutra ou alta. Se ele gera mais liberdades do que outro programa,
ou seja, se gera acesso da população aos bens e benefícios. E por fim, permite
compreender se gera mais integração do que outro. Após avaliar os projetos do
FOCEM por meio desses critérios, o resultado pode ser resumido em duas tabelas,
uma geral e outra sobre evolução histórica dos projetos:
12
TABELA 1: Tendências Simétricas dos Projetos do FOCEM – Série Histórica (2007-2012)
PORCENTAGEM DE GASTOS DO FOCEM POR MEMBROS
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Argentina
0
0
0
5,03
0
0
Brasil
Paraguai
0
69,08
0
100
0
0
8,59
73,63
7,81
0
0
33,04
Uruguai
14,68
0
0
12,74
92,19
66,96
NÍVEL LIBERDADE GERADO PELOS PROJETOS
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Argentina
0
0
0
90
0
0
Brasil
0
0
0
60
20
0
Paraguai
120
190
0
50
0
30
Uruguai
140
0
0
10
20
10
NÍVEL DE COOPERAÇÃO
2007
2008
2009
2010
2011
2012
0
0
0
-5
0
0
Argentina
Brasil
0
0
0
25
-5
0
Paraguai
-30
-35
0
-15
0
-5
Uruguai
-15
0
0
10
5
-5
Fonte: Elaboração própria a partir de FOCEM (2013).
TABELA 2: Balanço Geral dos Projetos do FOCEM por Membro
Argentina
Brasil Paraguai Uruguai
TOTAL
Recursos (Milhões de USD)
32,8
60,5
632,4
232,2
958,1
Participação (%)
3,43
6,32
66,01
24,24
100,00
Projetos
4
5
17
10
36
Programa I
1
2
10
5
18
Programa II
1
2
4
2
9
Programa III
2
1
3
3
9
Fonte: Elaboração própria a partir de FOCEM (2013).
Finalizando, a primeira tabela demonstra os resultados da análise
multicritério, ela é composta de progressões históricas sobre cada uma das variáveis
mencionadas anteriormente. Já a segunda realiza um balancete geral sobre os
recursos do fundo utilizado pelos países membros e a porcentagem de uso destes
recursos, além da quantidade de projetos, tanto gerais, como por programa.
13
5 CONCLUSÃO
Após submissão dos projetos do FOCEM ao modelo de análise multicritério,
os resultados encontrados demonstram uma distribuição condizente com o
desenvolvimento dos Estados. Entretanto, o estudo também demonstrou problemas
com a aplicação desta distribuição. Foi detectada nos projetos do FOCEM uma
tendência unilateral na realização dos projetos; ausência de uma Política de Estado
associado às iniciativas do FOCEM; ineficiência na produção de “liberdades” há
limitadas iniciativas geradoras de cooperação; e aplicação limitada de projetos
estruturais.
Ao analisar o orçamento dos projetos do FOCEM, confirma-se a utilização do
principio da Equidade. De acordo com os documentos analisados, os países com
menor desenvolvimento são os que menos contribuem para o fundo, porém são os
que mais recebem característica de equidade positiva. Além disto, durante três anos,
ou seja, até 2010, o fundo foi utilizado unicamente por esses membros menos
desenvolvidos e pelo próprio arranjo multilateral. Entretanto, algumas considerações
necessitam ser feitas.
No que diz respeito ao institucionalismo histórico, o FOCEM continua a
perseguir seu objetivo inicial: promover a convergência estrutural; desenvolver
competitividade; e promover coesão social. Porém vale ressaltar a necessidade de
mais esforços para o fortalecimento do sistema de integração. Isto porque, se
observar as tendências simétricas dos projetos do FOCEM, percebe-se uma
predominância de iniciativas de execução unilateral por parte dos Estados.
Nota-se também um foco unilateral nas destinações destes projetos, pois
poucos se destinam a realizações multilaterais, os demais focam questões locais
dos membros. Ainda na questão da multilateral e unilateral. O único ano que houve
uma predominância destes projetos foi em 2009, porém pelo fato de não haver
iniciativas unilaterais neste ano em questão. O motivo desta ausência de projetos é
a crise de 2008, provocando uma economia de verbas pelo fundo e o foco no
fortalecimento da instituição, visando à redução de impactos da crise. Sendo assim
as iniciativas do FOCEM não apresentam características de cooperação, salvo
exceção do Brasil no ano 2010, e do Uruguai no ano de 2009 e 2010.
14
O unilateralismo do FOCEM também é notório no âmbito do programa II,
Ganhos de Competitividade, porque eles focam criações ou fortalecimento de polos
industriais e tecnológicos de âmbito nacional. Embora também destinado à
exportação, esses polos não são ideais para a redução das assimetrias, pois gera
competitividade entre os próprios membros do MERCOSUL, assim um projeto usa
de esforços contra outro também do FOCEM. O ideal seria projetos para construção
de polo industrial regional, por exemplo, um polo regional de linha branca no Brasil,
ou um polo regional automotivo na Argentina, ou seja, utilizar das vantagens
comparativas para gerar competitividade em âmbito internacional. Convergindo as
verbas dos projetos desses ambitos para um projeto único, o MERCOSUL ganharia
em competitividade, qualidade e eficiência, pois utilizaria critérios logísticos para
instalações desses polos.
Essa tendência de unilateralismo poderia ser benéfica caso os recursos
fossem utilizados de forma continua e de acordo com uma política de Estado.
Entretanto, foi notada no estudo uma utilização descontinua dos recursos, por
exemplo, o Paraguai investiu 69% dos recursos no primeiro ano e 100% no
segundo, porém no terceiro não investiu nada, retomando um investimento de 73%
em 2010, reduzindo para zero novamente em 2011 e aumentando para 33% no ano
seguinte. Infere-se uma destinação das verbas não condizente com uma Política de
Estado ou meta dos países, mas conforme o surgimento de projetos nos órgãos
responsáveis pelo FOCEM. Além disto, a premissa apontada por Wilson Almeida
(2003), descrita na introdução deste estudo, continua constante no bloco, pois a
maioria dos projetos tem como objetivo região com maior condição técnica do que
as periféricas, causando assimetrias também entre os subnacionais de um ator.
Essa insuficiência também é notória quando verificamos o nível de
“liberdades” geradas pelos projetos. Embora a maior parte da verba tenha sido
utilizada pelos pelo Paraguai e Uruguai, percebe-se pouca produção de “liberdade”
por parte destes, ou seja, muitas vezes os benefícios projetados somente são de
caráter de desenvolvimento econômico, deixando de lado a esfera social. Melhor
compreensão desta conclusão quando observado os dados de 2010, em que o
Brasil e a Argentina, com apenas 13,62% do orçamento projetaram mais do que o
dobro de desenvolvimento proposto por Paraguai e Uruguai, detentores do resto do
orçamento.
15
Por fim, o crescimento das assimetrias entre o Brasil e seus vizinhos do
MERCOSUL, em termos de FOCEM, pode se dar por uma maior eficiência na
aplicação dos recursos por parte do Brasil face aos demais. Em termos de liberdade,
o Brasil apresenta relativa facilidade para aplicação de projetos sociais, visto seu
avanço estrutural. A liderança brasileira, assim, deveria criar projetos para favorecer
os demais países, em especial o Paraguai e Uruguai. Uma solução possível a estas
questões levantadas seria a criação de uma comissão de convergência política para
os projetos do FOCEM, fomentando o fator integração e cooperação nas suas
elaborações.
Impactos del FOCEM en las asimetrías en el MERCOSUR: análisis criterio
múltiples de los medios de distribución.
Resumen:
Diseñado para reducir las desigualdades en América del Sur, MERCOSUR ha
mostrado un aumento de las diferencias económicas y sociales de sus miembros. El
objetivo de este trabajo es analizar en qué medida las acciones del Fondo de
Convergencia Estructura del MERCOSUR (FOCEM), con el objetivo de reducir las
asimetrías, generan una distribución equitativa en el bloque. Para esto, utilizamos el
análisis de criterios múltiples para evaluar los proyectos y sus impactos en el
FOCEM, tomando como referencia tres variables: la equidad, el desarrollo de la
libertad, y el nivel de cooperación. Al final de este artículo hay una distribución
equitativa percibida de los recursos de este fondo, pero una ineficiencia en el
desarrollo de las libertades sociales, y una tendencia al unilateralismo en la
preparación y ejecución de proyectos. Por último, el crecimiento de las asimetrías
entre Brasil y sus vecinos del MERCOSUR en términos de FOCEM se debe a un uso
más eficiente de los recursos por parte de Brasil contra el otro.
Palavras-chave: MERCOSUR. Asimetrías. FOCEM. Análisis Criterio Múltiples.
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Lucas Soares Portela - Universidade Católica de Brasília