INTERPRETAÇÃO DE TEXTO Professor Sandro Lucena O filme Central do Brasil, de Walter Salles, tem como protagonista a professora aposentada Dora, que ganha um dinheiro extra escrevendo cartas para analfabetos na Central do Brasil, estação ferroviária do Rio de Janeiro. Outra personagem é o menino Josué, filho de Ana, que contrata os serviços de Dora para escrever cartas passionais para seu ex-marido, pai de Josué. Logo após ter contratado a tarefa, Ana morre atropelada. Josué, sem ninguém a recorrer na megalópole sem rosto, sob o jugo do estado mínimo (sem proteção social), vê em Dora a única pessoa que poderá levá-lo até seu pai, no interior do sertão nordestino. Dos vários momentos emocionantes do filme, o mais sensibilizante é o encontro de Josué com os presumíveis irmãos que, como o pai elaborado em seus sonhos, são também marceneiros. A câmera faz uma panorâmica no interior do sertão para mostrar um conjunto habitacional de casas populares recém-construídas; em uma das casas, os moradores são os filhos do pai de Josué que, em sua residência simples, acolhem para dormir Josué e Dora. Os irmãos dormem juntos e dividem a mesma cama. Existe uma comunhão de sentimentos entre os irmãos: os que têm um teto para morar, têm trabalho, dão amparo ao menino órfão sem eira nem beira. No filme, a grande questão do analfabetismo está acoplada a outro desafio, que é a questão nordestina, ou seja, o atraso econômico e social da região. Não basta combater o analfabetismo, que, por si só, necessitaria dos esforços de, no mínimo, uma geração de brasileiros para ser debelado, pois, em 1996, o analfabetismo da população de 15 anos e mais, no Brasil, era de 13,03%, representando um total de 13,9 milhões de pessoas. Segundo a UNESCO, o Brasil chegaria ao ano 2000 em sétimo lugar entre os países com maior número de analfabetos. No Brasil, carecemos de políticas públicas que atendam, de forma igualitária, a população, em especial aquelas voltadas para as crianças, os idosos e as mulheres. A permanência da questão nordestina é um exemplo constante das nossas desigualdades, do desprezo à vida e da falta de políticas públicas que atendam aos anseios mínimos do povo trabalhador. Não saber ler nem escrever, no Brasil, é um elemento a mais na desagregação dos indivíduos que serão párias permanentes em uma sociedade que se diz moderna e globalizada, mas que é debilitada naquilo que é mais premente ao povo: alimentação, trabalho, saúde e educação. Sem essas condições básicas, praticamente se nega o direito à cidadania da ampla maioria da população brasileira. Os ensinamentos que podemos tirar de Central do Brasil são que devemos atacar a questão social de várias frentes, em especial na educação de todos os brasileiros, jovens e velhos; lutar por políticas públicas de qualidade que direcionem os investimentos para promover uma desconcentração regional e pessoal da renda no país, propugnando por um novo modelo econômico e social. Ao garantir uma vida digna, a maioria da população saberá, por meio da solidariedade de classe, responder às necessidades da construção de uma sociedade mais justa. Central do Brasil é um exemplo vivo de que o Brasil tem rumo e esperança. Salvatore Santagada. Zero Hora, 20/3/1999 (com adaptações). A partir do texto acima, julgue os itens a seguir. 01_ Depreende-se, pelo primeiro parágrafo, que o texto faz parte de um relatório técnico, por meio do qual é dada ao leitor a síntese do roteiro elaborado por Walter Salles. 02_ De acordo com o texto, o filme Central do Brasil é perpassado por uma emocionante comunhão afetiva e um elevado sentimento de solidariedade entre Dora e Josué, assim como entre este e seus irmãos. 03_ O elemento de articulação “como” expressa diferentes relações nas linhas 1 e 10, não podendo ser substituído, nessas duas ocorrências, por porque. 04_ Na linha 2, uma vírgula pode ser colocada após “extra”, sem que se firam o sentido do texto e as regras gramaticais de pontuação. 05_ O segundo parágrafo do texto é, predominantemente, descritivo, mas, a partir do terceiro parágrafo, o texto tem caráter dissertativo, por apresentar argumentos que defendem o ponto de vista do redator. 06_ Pela passagem do texto “o mais sensibilizante é o encontro de Josué com os presumíveis irmãos que, como o pai elaborado em seus sonhos, são também marceneiros” (2º parágrafo), deduz-se que tanto os irmãos quanto a figura paterna são personagens imaginados pelo garoto. 07_ Com referência ao emprego do sinal indicativo de crase, é correto substituir o período “No Brasil (...) as mulheres” (4º parágrafo) pela seguinte construção: As políticas públicas devem auxiliar, de forma igualitária, à população, em especial às crianças, aos idosos e às mulheres. 08_ Nas formas verbais sublinhadas em “têm um teto para morar, têm trabalho”, distintamente de “tem rumo e esperança”, foi empregado o acento circunflexo porque o verbo ter está flexionado no plural. 09 Os adjetivos “acoplada , “debelado” e “debilitada” significam no texto, respectivamente, ligada, extinto e fraca. 10_ Está correta a pontuação e a concordância na seguinte reescritura do trecho “em 1996 (...) de pessoas” : em 1996, 13,03% da população de 15 anos e mais no Brasil, eram analfabetos, percentual esse que representavam o total de 13,9 milhões de pessoas. 11__ No período simples “Segundo a UNESCO, o Brasil chegaria ao ano 2000 em sétimo lugar entre os países com maior número de analfabetos”, há uma única oração cujo sentido não se altera com a seguinte reescritura: O Brasil, segundo a UNESCO, iria chegar em sétimo lugar entre os países com maior número de analfabetos, no ano 2000. Julgue as reescrituras apresentadas nos itens a seguir quanto à grafia, à acentuação, à pontuação e à preservação das ideias do último parágrafo do texto de referência. 12__ Podemos extrair de Central do Brasil o ensinamento de que devemos atacar a questão social de várias formas, especialmente educando todos os brasileiros, infantes, jovens e idosos. 13__ Lutar em favor de políticas de qualidade pública, que direcionem os investimentos à promoção de uma desconcentração da renda no País, propunando por um novo modelo econômico de benefício social, regional e particular, é um dos ensinamentos que se pode tirar de Central do Brasil. 14__ Garantindo uma vida com dignidade à maioria da população, todos saberão que, por intermédio da solidariedade entre as classes trabalhadoras, responder-se-á as necessidades da construção de uma sociedade mais justa. 15__ Central do Brasil é um exemplo pulsante de que o Brasil tem rumo e esperança, desde que a maioria da população, por meio da solidariedade de classe, ao garantir uma vida digna para todos, saberá responder aos apelos no sentido da construção de uma sociedade mais justa. PRECONCEITO CONTRA A ROÇA A sociedade brasileira, infelizmente, enxerga seu universo rural com preconceito. Em decorrência, menospreza a importância da agropecuária na geração do emprego e da renda nacional. Pior, atribui ao setor uma pecha negativa: o moderno está na cidade; o atraso, na roça. Razões variadas explicam esse terrível preconceito. Suas origens remontam ao sistema latifundiário. Com a acelerada urbanização, o violento êxodo rural subverteu, em uma geração, os valores sociais: quem restou no campo virou passado. As distâncias geográficas do interior, a defesa ecológica, a confusão da reforma agrária, o endividamento rural, todos esses fatores explicam a prevenção contra o ruralismo. Na linguagem popular, o apelido depreciativo é sempre da agricultura. Fulano é burro, vá plantar batatas! Nas finanças, o malandro é laranja. Que pepino, hein? Um grande abacaxi! Ninguém usa comparações positivas: íntegro como boi, bonito qual jequitibá! Na música, a sanfona, ou a viola, é brega. Pior de tudo, nas festas juninas, crianças são vestidas com calças remendadas, chapéu de palha desfiado e, pasmem, dentes pintados de preto para parecerem banguelas. Triste país que deprecia suas origens. Um misto de desinformação e preconceito impede que a agricultura ressalte sua força e seu valor. As mazelas do campo — ainda são muitas — suplantam, na mídia, os benefícios da modernidade rural. Os meios de comunicação focalizam seus problemas e não as vitórias alcançadas. Miopia cultural. Xico Graziano. O Estado de S. Paulo, Caderno 2, 25/7/2001 (com adaptações). A respeito das estruturas linguísticas do texto LP, julgue os itens a seguir. 16) No terceiro parágrafo, o emprego de sinais de exclamação marca o discurso indireto livre, ou seja, o que seria a fala de alguém. 17) O sinal de dois-pontos após a palavra “positivas” poderia ser substituído pela expressão tais como, sem prejuízo para a correção gramatical do período. 18) A palavra “pasmem” indica que o autor está se dirigindo às crianças fantasiadas de caipiras, como suas interlocutoras. 19) A palavra “mídia” e a expressão “meios de comunicação” estão sendo utilizadas com sentidos diferentes. 20) Seria correto e coerente transformar a frase nominal que encerra o texto para: Falta miopia cultural. Em relação ao texto LP, julgue os itens abaixo. 21) A utilização de “infelizmente”, “Pior” e “Pior de tudo” indica julgamento do autor em relação às informações do texto. 22) O primeiro e o último parágrafos apresentam a direção argumentativa do texto, que é favorável ao campo. 23) Uma das formas de dar consistência a uma argumentação é apresentar exemplos concretos, o que é feito pelo autor no terceiro parágrafo. 24) O fato de muitas pessoas terem abandonado a vida rural e ainda nutrirem nostalgia do campo atenua o preconceito contra o que é rural. 25) O vocabulário informal utilizado no texto, como “roça” e “brega”, é adequado para textos de relatórios e pareceres oficiais, pois dá a eles mais clareza e objetividade. Somando-se todos os agronegócios, estima-se que 25% do produto nacional origina-se do campo, que emprega 40% da força de trabalho, gerando US$ 15 bilhões de superávit na balança comercial. Sem essas divisas, o país quebrava. O suor dos agricultores e trabalhadores rurais conjumina-se com o avanço tecnológico. O Brasil encantou o mundo com sua participação no Projeto Genoma, decifrando o código genético da bactéria do amarelinho, praga que ataca a citricultura. Agora, acaba de ser anunciado que a EMBRAPA vai exportar moscas estéreis e ácaros predadores para auxiliar no controle biológico da agricultura mundial. O campo se transforma, avança, enquanto a ideologia urbana ainda enxerga o Jeca Tatu. Idem,ibidem. Quanto às ideias e estruturas do texto acima e ainda considerando o texto anterior, julgue os itens seguintes. 26) O último período do texto acima apresenta ideias opostas às do primeiro parágrafo do texto anterior. 27) Os dados e informações do texto acima constituem uma exemplificação do que foi anunciado no texto anterior pelas expressões: “sua força e seu valor”, “benefícios da modernidade rural” e “vitórias alcançadas”. 28) No texto acima, na expressão “suor dos agricultores e trabalhadores rurais”, a palavra “suor” é um recurso semântico que toma a parte pelo todo. 29) Na forma verbal “conjumina-se” do texto acima, o “se” é partícula apassivadora. 30) No texto acima, a forma verbal “decifrando” admite a transformação para ao decifrar, sem alterar a correção e a coerência do período. No que se refere à correção gramatical, julgue os trechos dos itens subsequentes. 31) O Brasil colherá, neste ano, 97 milhões de toneladas de grãos, enquanto, no começo da década, colhia 60 milhões. Trata-se de brutal aumento de produção. Mais surpreendente: o recorde de safra será colhido na mesma área cultivada, significando espetacular avanço na produtividade. 32) O desempenho da safra de grãos não comprometeram, como na Argentina, a pecuária. Pelo contrário. No ramo animal, o País dá show mundial. A avicultura compete em qualquer canto do mundo. 33) Nos bovinos, de US$ 300 milhões passamos para US$ 1 bilhão nas exportações de carne, sem aftosa nem vaca louca. A suinocultura ganha mercados na Rússia e Itália. Simultaneamente, aumentam no mercado interno o consumo per capita de carnes, agora com o apoio da piscicultura. 34) Há seis anos, o Brasil havia sido transformado no maior importador mundial de algodão. Hoje, abastece a indústria têxtil, que retoma suas exportações em 100 mil toneladas. 35) O milho, pela primeira vez, ganha mercados externos: será vendido no exterior 3 milhões de toneladas. O açúcar, a soja e o suco de laranja tem posição consolidada no mercado internacional, enquanto a fruticultura começa a virar gente grande. Itens adaptados de Francisco Xavier Hemerly. Ações coordenadas no campo. In: O Estado de S. Paulo, 3/10/2001. Ainda com relação à correção gramatical, julgue os fragmentos de texto apresentados nos itens a seguir. 36) Nos últimos anos vêm consolidando no meio empresarial o entendimento que não é possível uma organização responsabilizar-se sozinha por todas as etapas de um processo para geração de um produto ou prestação de um serviço. O tempo no qual todos faziam tudo passou. 37) Hoje cada organização concentra energias no que é seu negócio. Formam-se uma rede de organizações, agindo cooperativamente, na busca de um produto ou serviço desejado pelo consumidor, onde cada organização contribue com que melhor sabe fazer. 38) Quando se pensa nas organizações urbanas, é fácil perceber que estamos tratando de uns poucos representantes de cada fase de uma cadeia que, por isso mesmo, apresentam uma correlação de forças mais ou menos equivalente. 39) É mais simples conseguir fazer essas cadeias funcionarem de forma harmônica na cidade, onde o sucesso de cada um está atrelado ao sucesso da cadeia. Mas quando se insere nessa rede um componente rural, a questão é mais complexa. 40) Os produtores rurais são em grande número, estão dispersos geograficamente, têm baixo grau de organização classista e predominância de baixa escolaridade. Como se tem um grande número de ofertantes do mesmo produto, em geral perecível, é fácil entender o desequilíbrio de forças a favor dos compradores. Idem, ibidem