2. Sistemas Articulados
24
2. Sistemas Articulados
2.1- Sistema articulado plano
Para os primeiros autores que escreveram sobre a teoria dos sistemas articulados, um tal
sistema era composto por haste rígidas, sujeitas a mover-se num mesmo plano, ligadas entre elas
por pivots normais ao plano de maneira a deixar variar os seus ângulos.
Esta maneira de ver explica-se porque os primeiros aparelhos articulados como o
pantógrafo, o paralelogramo de Watt, o aparelho de Peaucellier, eram formados por hastes ou
rectas articuladas em que os pontos descreventes estavam sempre em linha recta com os pontos
de articulação.
Mais tarde, com Sylvester passamos a considerar a trajetória dum ponto invariavelmente
ligado a uma haste e formar com ele um triângulo. Podemos, agora, considerar uma placa
triangular em substituição de uma haste. Então, considerar uma simples haste é, no fundo,
equivalente a ter uma placa plana que desliza sobre o seu próprio plano.
Podemos, agora, dar a seguinte definição de sistema articulado plano:
Conjunto de placas ou figuras planas sujeitas a mover-se sobre um só e mesmo plano
que estão ligadas entre elas por pivots normais ao plano comum.
Se três placas A,B,C são ligadas duas a duas pelos pivots, então formam um triângulo;
elas constituem um sistema indeformável.
2.2- Sistemas de quatro membros
Os sistemas de quatro membros são os mais simples dos sistemas articulados. No entanto,
eles têm uma importância real pelo uso constante que deles fazemos no estudo de sistemas
articulados mais complicados. Como vimos, podemos reduzir cada membro à haste rígida que
junta os pivots aos quais se articulam os membros adjacentes.
Quadrilátero articulado:
Suponhamos que dispomos de quatro hastes de comprimentos a, b, c, d , que se
articulam entre elas pelas suas extremidades e pela seguinte ordem: a haste a com a b, depois a
b com a c, depois a c com a d e, por fim, a d com a a . Formamos, então, um quadrilátero
articulado.
Um quadrilátero articulado pode
c
D
C
apresentar três formas de aspectos diferentes. È
sempre possível, em primeiro lugar, formar
com as hastes, seguindo a ordem abcd , um
b
quadrilátero convexo ABCD. Seja C’ o
c
simétrico de C relativamente à diagonal BD, o
B
quadrilátero
ABC’D
então
obtido
é
d
b
denominado quadrilátero uni-côncavo; ele é
c
formado pelas mesmas hastes seguindo a
C'
D'
mesma ordem abcd . Seja, por fim, D’ o
H
θ
simétrico de D relativamente à diagonal AC’, o
d
A
quadrilátero
ABC’D’,
que
chamamos
quadrilátero cruzado (ou bi-côncavo), é
igualmente formado pelas hastes precedentes e
Figura 2.1: três formas de quadriláteros articulados.
pela mesma ordem abcd .
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2. Sistemas Articulados
25
Consideremos as hastes a e d que se articulam no ponto A, seja B a extremidade da
haste a e D a extremidade da haste d . Chamaremos θ o ângulo BAD. Através do triângulo
BAD, sabemos que:
2
BD = a 2 + d 2 − 2ad cosθ
A haste b articula-se em B e a haste c em D. Obtemos C articulando as hastes b e c ,
isto é, C é o ponto de encontro dos círculos de centros B, D e raios b, c , respectivamente. Então,
podemos escrever as seguintes desigualdades:
2
(b − c) 2 < BD < (b + c) 2 ,
ou então,
(b − c) 2 < a 2 + d 2 − 2ad cosθ < (b + c) 2 .
Podemos agora escrever:
a 2 + d 2 − (b + c) 2
a 2 + d 2 − (b − c) 2
.
< cosθ <
2ad
2ad
Estas condições limitam, em geral, o valor do coseno do ângulo das hastes a e d , de
modo que a revolução relativa das hastes em torno do seu pivot comum é limitada. Mas, se
temos:
 a 2 + d 2 − (b + c) 2
≤ −1

2ad
 2
2
2
 a + d − (b − c) ≥ 1
2ad

o coseno pode receber todos os valores compreendidos entre − 1 e + 1 . Dizemos, então, que o
pivot é de revolução completa; que o quadrilátero é, neste caso, construtível para todos os
valores do ângulo θ .
Das condições anteriores podemos escrever:
(a + d ) 2 − (b + c) 2 ≤ 0 ⇔ (a + b + c + d )(a + d − b − c) ≤ 0 ⇔ a + d − b − c ≤ 0
e
(d − a ) 2 − (b − c) 2 ≥ 0 ⇔ (d − a + b − c)(d − a + c − b) ≥ 0.
Podemos chamar a a mais pequena das hastes a, d . Suponhamos, ainda, para fixar as
idéias, b < c (o caso b > c é análogo). Resulta, então, que o factor d − a + c − b é positivo e as
desigualdades reduzem-se a:
a + d − b − c ≤ 0 e d − a + b − c ≥ 0.
A primeira desigualdade escreve-se:
( a − b) + ( d − c ) ≤ 0
e a segunda
d −c ≥ a−b.
A primeira desigualdade é incompatível com a hipótese a > b , pois teríamos a − b e
d − c positivos e, portanto, a sua soma não poderia ser negativa.
Temos forçosamente a ≤ b e, como b < c, vem que a ≤ b < c; tínhamos suposto a < d ,
donde resulta que a é a mais pequena haste do quadrilátero.
Teorema: Um pivot é de revolução completa quando pertence à haste mais pequena do
quadrilátero e a soma da haste mais pequena com a maior é inferior ou igual à soma das outras
duas.
Se d é a haste maior, ela resulta da condição suposta anteriormente:
a + d − b − c ≤ 0;
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2. Sistemas Articulados
26
suponhamos, ao contrário, que seja c a haste maior, temos b < c e verifiquemos que nesta
hipótese se tem:
d −a+b−c ≥ 0 ⇔ a+c−b−d ≤ 0
que demonstra o teorema. Usamos a mesma demonstração se b é a haste maior.
O recíproco deste teorema verifica-se e vai-nos conduzir a um resultado completo.
Suponhamos que a mais pequena haste a, ligada à maior dão uma soma, no máximo,
igual à das outras duas hastes. Vamos provar que os dois pivots situados sobre a haste mais
pequena são de revolução completa.
Seja, com efeito, d uma haste que se articula com a; é suficiente provar as
desigualdades
a + d − b − c ≤ 0 e (d − a ) 2 − (b − c) 2 ≥ 0
que exprimem que o pivot onde d e a se articulam é de revolução completa, porque a mesma
demonstração se aplica ao outro pivot pertencente a a.
Suponhamos que d é a maior das quatro hastes, temos então, por hipótese,
a+d ≤ b+c ⇔ a+d −b−c ≤ 0
que é justamente a primeira desigualdade a verificar. Suponhamos, agora, b < c (o caso b > c é
análogo). Como temos d > c e a < b então:
d −a > c−b,
onde d − a e c − b são positivos e elevados ao quadrado obtém-se:
( d − a ) 2 > (c − b) 2
que é a segunda condição.
Façamos agora uma outra hipótese e suponhamos que a maior haste seja b ou c, c por
exemplo. Tem-se, por hipótese,
a + c − b − d ≤ 0 ⇔ a + d − b − c + 2(c − d ) ≤ 0 ;
como c − d é positivo, então a + d − b − c terá de ser negativo, que era a primeira desigualdade a
provar. Agora, temos da hipótese
a+c−b−d ≤ 0 ⇔ c−b ≤ d −a
que c − b e d − a são positivos e, portanto,
(c − b ) 2 ≤ ( d − a ) 2
que é a segunda desigualdade a verificar. O caso em que b é a maior das quatro hastes trata-se
de forma análoga.
Assim, em resumo:
Se um pivot dum quadrilátero é de revolução completa, então existe um segundo nas
mesmas condições e estes dois pivots estão nas extremidades da haste mais pequena; a soma da
mais pequena e da maior haste é, no máximo, igual à soma das outras duas hastes. Esta
condição é necessária e suficiente para que exista pivots de revolução completa.
O teorema é válido mesmo que se verifique a igualdade entre as duas somas.
Vejamos agora se existem quadriláteros articulados que admitam mais de dois pivots de
revolução completa. Neste caso, dois pivots opostos, A e C, por exemplo, são de revolução
completa.
Temos as seguintes condições para que A seja de revolução completa:
 a +d −b−c ≤ 0
;

2
2
(d − a ) − (b − c) ≥ 0
Para que C seja de revolução completa terá de verificar:
 b+c−a−d ≤0
;

2
2
(b − c) − (d − a ) ≥ 0
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Destas desigualdades obtemos que
 a+d −b−c = 0
.

2
2
(d − a ) − (b − c) = 0
Temos, então, dois casos a distinguir:
a + d − b − c = 0
1º caso:
;

d − a + b − c = 0
a + d − b − c = 0
2º caso:
.

d − a − b + c = 0
O primeiro caso dá-nos a = b e
D
d = c. Obtemos um quadrilátero no qual as
duas hastes que se articulam em B são
iguais e as duas hastes que se articulam em
D também são iguais. Temos que as hastes
A
opostas são sempre diferentes. Um tal
Β
quadrilátero chama-se romboíde e pode ter
uma das formas da figura 2.2. Suponhamos
Α
AB, BC as hastes mais pequenas,
B
C
verificamos então que os pivots A,B,C são
côncavo
convexo
de revolução completa, mas o pivot D é de
Figura 2.2: Romboíde.
revolução limitada.
Examinando o segundo caso, verificamos que a = c e b = d . As hastes opostas do
quadrilátero são iguais. O quadrilátero pode, então, ter uma das seguintes formas:
D
A
D
C
B
A
Paralelogramo
D
C
B
contra-paralelogramo
C
Figura 2.3
Verificamos que, neste caso, todos os pivots do quadrilátero são de revolução completa.
Três-barras:
Consideremos
o
quadrilátero
articulado ABCD. Se fixarmos uma das
hastes, AB, por exemplo, o sistema
constituído pelas outras três hastes tem o
nome de três-barras. AD e BC são duas
manivelas e CD é a biela. Se considerarmos
um ponto, M, rigidamente ligado à biela CD
então, durante a deformação, ele traça a
curva da figura 2.4, que varia em função do
comprimento das hastes.
Figura 2.4: três-barras.
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2.3- Sistemas obtidos com um quadrilátero articulado
2.3.1- Paralelogramo
O paralelogramo é um translador evidente do movimente circular. Uma utilização
bastante conhecida do paralelogramo articulado é a do pantógrafo de P. Scheiner.
Seja ABCD um paralelogramo articulado onde imaginamos os lados suficientemente
prolongados. Consideremos quatro pontos P,Q,R,S fixos sobre AB,AD,BC e CD,
respectivamente, desse paralelogramo. Suponhamos que esses quatros pontos se encontram em
linha recta numa certa posição do paralelogramo. Vamos provar que, quando o paralelogramo se
deforma, eles mantêm-se sempre em linha recta.
Com efeito, porque estes quatro
D
pontos estão uma vez em linha recta, os
segmentos constantes PA, AQ, PB, BR
verificam a proporção:
C
PA PB
=
.
S
AQ BR
R
Agora, se esta proporção é sempre
satisfeita, resulta inversamente que, em toda
Q
a posição do paralelogramo, os triângulos
P
APQ, BPR são semelhantes e, então, os
A
pontos P,Q,R estão em linha recta. A mesma
demonstração para os pontos P,R,S mostra
que os quatro pontos P,Q,R,S estão em linha
recta. Notamos que, segundo a semelhança
B
constante dos triângulos APQ, BPR, CRS, os
Figura 2.5: pantógrafo de P. Scheiner.
comprimentos variáveis PQ, PR, PS mantém
entre eles relações constantes.
Fixamos P sobre o lado AB, se Q descreve uma figura, R descreve a figura homotética de
BR
centro P e de razão
.
AQ
Vejamos agora um outro processo de obter um pantógrafo: o pantógrafo de Sylvester,
que permite a realização de uma semelhança.
Sobre a haste CD e BC dum paralelogramo articulado construímos dois triângulos
semelhantes BEC, CDF nos quais os pares de ângulos iguais são:
</ FDC =</ CBE , </ FCD =</ CEB , </ DFC =</ ECB.
Suponhamos que fixamos o paralelogramo
pelo seu pivot A e consideremos os dois triângulos
BCE e CDF rígidos. Vamos provar que se fazemos o
ponto E descrever uma figura, o ponto F descreve a
F
figura homotética, que terá rodado um ângulo
constante.
E
A semelhança dos triângulos BCE e CDF dáC
nos, com efeito,
BC DF
=
B
D
BE DC
e como BC = AD, DC = AB podemos escrever
AD DF
A
=
.
BE AB
Figura 2.6: pantógrafo de Sylvester.
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2. Sistemas Articulados
29
Como os ângulos em D e B dos triângulos FDA, EBA são iguais, essa proporção prova a
semelhança deste dois triângulos e temos, por conseqüência,
AF AD DF
=
=
= constante.
AE BE AB
Podemos acrescentar que o ângulo </ FAE é igual ao ângulo constante </ CBE , porque o
ângulo </ DAE, devido ao paralelismo de BC e AD, vale a soma dos ângulos </ AEB, </ CBE.
Ora, concluímos que </ DAF =</ AEB e </ FAE =</ CBE como queríamos provar.
O mesmo aparelho permite realizar uma rotação. Se o triângulo CDF e, por conseqüência,
o triângulo CBE são isósceles, então AF é igual a AE. Portanto, quando o ponto E descrever uma
figura, o ponto F descreverá a mesma figura só que rodada um ângulo constante α =</ FDC.
Temos uma interessante aplicação do pantógrafo Sylvester na demonstração de um
notável teorema de M. Roberts:
A curva descrita por um ponto rigidamente ligado à biela de um três-barras pode ser
obtida de duas outras maneiras por meio de outros dois três-barras.
H
Reparemos na figura 2.7. Suponhamos que E
descreve um círculo de centro G e de raio EG, o
ponto F descreverá um outro círculo de centro H e
L
G
raio FH. Construímos os paralelogramos CEGK e
K
CFHL; unimos os pontos L e K. Então, formamos
F
um triângulo onde o ângulo </ KCL é igual ao
E
ângulo constante α =</ FDC =</ CBE =</ FAE. Com
efeito, os dois raios homólogos EG, FH são paralelos
C
a KC, LC, que formam entre eles o ângulo α . Os
lados KC, LC são constantes e, portanto, o triângulo
KCL tem uma forma indeformável. Este triângulo é
semelhante aos triângulos CDF e EBC.
D
Podemos considerar o ponto C do triângulo
CDF ligado à biela FD no três-barras ADFH. Mas,
podemos também ver que C é um vértice do
A
triângulo BCE ligado à biela BE no três-barras
Figura 2.7: teorema de M. Roberts.
ABEG; ou ainda notar que C é também vértice do
triângulo LKC ligado à biela LK no três-barras
GKLH.
Assim se pode estabelecer a tripla geração de M. Roberts.
B
2.3.2- contra-paralelogramo
O contra-paralelogramo permite construir três tipos de mecanismos simples e célebres.
Engrenagem elíptica:
Seja ABCD um contra-paralelogramo onde
fixamos a haste AB. Seja P a intersecção das hastes
BC e AD. Então, temos que:
PA + PB = AD e PD + PC = AD;
isto prova que P descreve uma elipse de focos A,B.
No plano móvel rigidamente ligado à haste CD, P
descreve uma elipse de focos C,D.
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Figura 2.8: engrenagem elíptica.
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2. Sistemas Articulados
30
A velocidade de C é ortogonal a BC e a velocidade de D é ortogonal a AD. P é, então, o
centro instantâneo de rotação do movimento do plano móvel rigidamente ligado a CD
relativamente ao plano fixo de AB. Resulta que a elipse de focos C,D rola sem deslizar sobre a
outra.
Engrenagem hiperbólica:
Seja ABCD um contra-paralelogramo
onde fixamos a haste AD. Seja Q a
intersecção do prolongamento das hastes AB
e CD. Então, temos que:
QA - QD = AB e QC - QB = AB;
isto prova que Q descreve uma hipérbole de
focos A,D e, no plano móvel rigidamente
ligado à haste BC, Q descreve uma hipérbole
de focos B,C. Tal como no caso da
engrenagem elíptica, estas duas hipérboles
são iguais e a hipérbole de focos B,C rola
sem deslizar sobre a outra.
Figura 2.9: engrenagem hiperbólica.
Inversor de Hart:
Seja ABCD um contra-paralelogramo e P,Q,R,S quatro pontos fixos sobre as hastes
AD,AB,CD e BC, respectivamente. Para uma certa posição do contra-paralelogramo, estes
quatro pontos estão sobre uma recta paralela às diagonais AC e BD. Constatamos facilmente que
esses pontos mantêm-se sempre sobre essa recta paralela às diagonais quando o contraparalelogramo sofre uma deformação.
Os triângulos semelhantes APQ,
ADB e DPR, DAC dão-nos:
D
B
PQ BD
PR AC
=
,
=
;
PD AD
AP AD
donde
PA ⋅ PD
PQ ⋅ PR =
⋅ BD ⋅ AC.
2
AD
Q
R
S
P
Agora, fazemos BI paralela a DA; a
figura AIBD é um paralelogramo tal que
BD = AI e IBC é um triângulo isósceles, de
A
C
I
O
modo que a perpendicular por B a IC dá-nos
Figura 2.10: inversor de Hart.
o ponto médio, O, de IC. Então, temos que:
2
2
BD ⋅ AC = AI ⋅ AC = (AO - OI)(AO + OI) = AO − OI ,
mas os triângulos retângulos BAO e BIO dão-nos
2
2
AB = AO + OB
2
2
2
2
BC = BI = OI + OB
donde, por subtração,
2
2
2
2
2
AB − BC = AO − OI = BD ⋅ AC.
Temos então, em definitivo,
2
2
PA ⋅ PD
(AB − AD ).
PQ ⋅ PR =
2
AD
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2. Sistemas Articulados
31
Está assim provado que o produto PQ ⋅ PR é constante.
Se sujeitarmos a haste AD a rodar em torno do pivot P e se fazemos o ponto Q descrever
uma figura, o ponto R descreverá uma figura inversa da primeira.
Demonstramos analogamente que o produto QP ⋅ QS é constante, de modo que se
fazemos a haste AB rodar em torno do pivot Q, os pontos P e S descrevem agora duas figuras
inversas, mas com potência negativa de inversão.
2.3.3- Romboíde
Devemos a Reuleaux um outro dispositivo bastante interessante. Ele é conhecido como o
duplicador de voltas de Reuleaux. Consideremos um romboíde no qual as duas hastes maiores
BC = BA são o dobro das duas mais pequenas DA = DC. Fixamos uma das hastes pequenas,
por exemplo DA, e fazemos rodar AB a partir da posição AB 0 , então DC está sobre DA.
Quando B descreve o arco B 0 BB1 igual a
B1
B
180º −60º = 120º , o ponto C descreve a
semi-circunferência ACC1 . Quando em
B2
C
seguida B descreve o arco de
60º B1 B 2 C1 , o ponto C descreve a semicircunferência C1C 2 A. Ora, logo que AB
ϕ
está sobre AC1 , DC está de novo sobre
θ
C1
B0
A
D
DA. Assim, após meia volta de AB, DC
fez uma volta completa. Constatamos
facilmente em seguida que continuando
C2
AB a sua volta, DC recomeça uma outra.
Quando B está na posição simétrica de
B1 relativamente a AD (B1' ) , DC estará
B'1
de novo sobre DC1 . Finalmente, quando
AB regressa a AB 0 , DC voltará
P
novamente a DA. Em resumo, após uma
Figura
2.11: duplicador de voltas de Reuleaux.
volta completa de AB, DC fez duas
voltas.
A teoria analítica deste aparelho é, de resto, das mais fáceis. Designamos por θ o ângulo
de AB com AB 0 e por ϕ o ângulo de DC com DA. No triângulo ADB, o ângulo </ ADB vale
1
ϕ
ϕ
e o ângulo </ DBA vale θ − . Como DA = AB , temos que:
2
2
2
ϕ
sin(θ − )
2 = DA = 1 .
ϕ
AB 2
sin
2
Observamos que, no caso geral de um romboíde qualquer, se DA = d e AB = a , o
mesmo método dar-nos-á:
ϕ
sin(θ − )
2 = DA = d .
ϕ
AB a
sin
2
Por fim, o centro instantâneo de rotação da barra BC é o ponto P, interseção de AB com
CD. Então, P descreve, no plano fixo, um Limaçon de Pascal.
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2. Sistemas Articulados
32
2.4- Sistemas obtidos combinando os precedentes
C
2.4.1- Translador e Reversor de Kempe
D
O
translador
de
Kempe
obtém-se
considerando dois paralelogramos articulados ABCD e
BPP’C que têm uma haste comum, BC. Fixamos a
haste AD e se fazemos descrever uma figura no ponto
P, então é claro que o ponto P’ descreve uma figura
que se deduz da precedente por uma simples translação
de PP' = AD .
O reversor de Kempe permite-nos, dadas duas
hastes ∆, ∆' articuladas em A, guiar uma terceira, ∆'' ,
articulada também em A de modo a mantê-la simétrica
de ∆ relativamente a ∆' .
Tomamos sobre ∆, ∆' dois comprimentos
AB,AD, respectivamente, e encontramos o contraparalelogramo articulado ABCD. A introdução destas
novas hastes não interfere em nada no movimento
relativo das hastes ∆, ∆' . Tomamos em seguida sobre
DC um comprimento DE tal que
A
DE DA
=
DA DC
e encontramos o contra-paralelogramo articulado
ADEF. Este novo contra-paralelogramo será, segundo
a proporção anterior, semelhante ao primeiro e uma
das suas hastes maiores coincide com uma das mais
pequenas do outro. A haste AF ou ∆'' fará o mesmo
ângulo que ∆' faz com ∆.
O reversor de Kempe pode servir para realizar
a simetria relativamente a uma recta ∆' .
Suponhamos, com efeito, que temos dois reversores de
Kempe: um permite-nos obter as hastes ∆ e ∆''
simétricas em relação a ∆' ; o outro, as hastes ∆ 1 e ∆'1' ,
independentes das primeiras, que também se articulam
em A e são simétricas relativamente a ∆' . É claro que
podemos construir sobre ∆, ∆ 1 , duma parte, e ∆'' , ∆'1' ,
da outra, dois paralelogramos articulados que se
mantêm simétricos em relação ao eixo de simetria ∆' .
A
Os pontos M, M ' mantêm-se sempre simétricos.
Os reversores permitem também obter a adição
e subtração de ângulos. Se chamarmos a α o ângulo
que ∆ 1 faz com ∆ e a β o ângulo que ∆'1' faz com ∆ ,
temos que ∆'' faz com ∆ um ângulo igual a α + β . A
subtração de ângulos verifica-se de forma análoga.
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P'
B
A
P
Figura 2.12: translador de Kempe.
∆''
∆'
F
D
∆
B
E
C
Figura 2.13: reversor de Kempe.
∆''
∆''1
M'
∆'
∆1
β
α
M
∆
Figura 2.14: “simetrissor” de Kempe.
Trabalho de monografia 00/01
2. Sistemas Articulados
33
O reversor pode ser considerado de
um outro ponto de vista. Ele permite guiar
uma haste ∆'' que faz com ∆ um ângulo
duplo do ângulo que ∆ faz com ∆' . Então,
ele pode servir como duplicador de ângulos.
Mas podemos ir mais longe, sobre o
contra-paralelogramo ADEF construímos
um segundo, AFGH, da mesma forma que
construímos ADEF a partir de ABCD.
Obtemos o pivot G sobre EF tal que
FG AF
=
.
AF EF
∆''
∆'''
∆'
F
∆
D
H
B
G
E
A
A haste AH ou ∆''' faz com ∆ um
C
ângulo triplo do ângulo θ de ∆' com ∆ . A
Figura 2.15: trissector de Kempe.
este sistema articulado chamamos trissector
de Kempe.
Por fim, continuando a aplicar contra-paralelogramos de forma análoga, podemos guiar
uma haste ∆( n ) articulada em A fazendo com ∆ um ângulo igual a nθ . Este método é conhecido
como multiplicador de ângulos de Kempe.
O problema da trissecção do ângulo não foi apenas estudado por Kempe. Pascal
encontrou um interessante mecanismo para a sua resolução.
Suponhamos que temos três hastes de
comprimento igual, PA = AO = OB , que se
Β
articulam de acordo com a figura 2.16. O pivot P
2θ
mantém-se fixo enquanto o pivot A se move; os
A
pivots B e O deslocam-se sobre as rectas PA e
2θ
PO, respectivamente. Tem-se então um sistema
articulado que permite resolver o problema da
3θ
θ
θ
trissecção de um ângulo. Seja P’ o simétrico de P
P
O
relativamente a O. Então, temos que o ângulo
Figura 2.16: trissector de Pascal.
</ BOP ' vale o triplo do ângulo </ BPO .
2.4.2- Inversor de Peaucellier
Este inversor é, segundo a ordem histórica, anterior ao de Hart.
Ele é composto por um losango BCDC ' e, aos pivots B e D, articulam-se duas hastes
iguais AB e AD livres de rodar em torno do mesmo pivot A. Os pivots C,C’ estão alinhados
sobre A. Então, tem-se
2
2
AC ⋅ AC ' = (AE + EC)(AE - EC) = AE − EC .
Ora, os triângulos rectângulos ADE, DEC dão-nos
2
2
2
2
2
AE = AD − DE
2
2
2
, EC = DC − DE ,
donde
2
2
AC ⋅ AC ' = AE − EC = AD − DC = constante.
Resulta que quando o pivot C descreve uma figura, o pivot C’ descreve uma figura
transformada da primeira por raios vectoriais recíprocos.
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2. Sistemas Articulados
34
A grandeza relativa das hastes AD, AB e das hastes do losango não é importante.
Poderemos então ter as hastes A ' D, A ' B mais pequenas que as do losango só que agora a
potência de inversão será negativa.
D'
D
C'
A
A'
E
C
B
Figura 2.17: inversor de Peaucellier.
Podemos generalizar o inversor de Peaucellier substituindo o losango BCDC ' pelo
romboíde BCD ' C ' .
Recordemos que se num quadrilátero a soma dos quadrados de dois lados opostos é igual
à soma dos quadrados dos outros dois lados, as diagonais desse quadrilátero são rectangulares. A
condição é necessária e suficiente. Então, se deformarmos um tal quadrilátero, as suas diagonais
mantêm-se rectangulares. É o caso do losango e do romboíde.
Consideremos agora o romboíde BCD ' C ' e o quadrilátero de diagonais rectangulares
ABCD ' que têm em comum as hastes BC e CD ' (Fig 2.17). As diagonais CC ' , CA estão sempre
normais à diagonal comum BD ' , isto é, são sempre coincidentes. Constatamos então que o
produto AC ⋅ AC ' é constante e, portanto, se C ' descreve uma curva qualquer, C descreve uma
curva inversa desta relativamente a A.
2.5- Teorema de Kempe
Com base nos seus simples aparelhos, que mostramos atrás (translador, reversor,...),
Kempe criou a demonstração do seu notável teorema:
Podemos sempre encontrar um sistema articulado onde um ponto descreve uma curva
algébrica dada anteriormente, pelo menos localmente.
Oy
P
Ν
C
q
p
ϕ
Ο
M
θ
Ox
Figura 2.18.
A demonstração deste teorema oferece um
exemplo curioso de argumentos gerais que podemos fazer
sobre os sistemas articulados.
Seja dada uma curva algébrica C, P um dos seus
pontos, O um ponto fixo do plano e Ox, Oy dois eixos
rectangulares.
Construímos um paralelogramo articulado onde os
lados p, q terão comprimentos fixos e onde O, P serão
dois pivots opostos. Quando o ponto P descrever a curva
C, o paralelogramo deformar-se-á e os ângulos θ , ϕ que as
hastes fazem com o eixo Ox variam mantendo-se estas
ligadas por uma relação fácil de formar.
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2. Sistemas Articulados
35
Sejam x, y as coordenadas do ponto P, temos então que:
x = p cosθ + q cos ϕ
;
y = p sin θ + q sin ϕ
logo, f ( x, y ) = 0 é a equação inteira e racional em x, y da curva C, f ( x, y ) poderá ser escrita
sob a forma de um polinômio inteiro em cosθ , sinθ , cosϕ , sinϕ e, substituindo todas as
potências de senos e cosenos pelas dos senos ou cosenos dos múltiplos dos arcos, chegamos à
aplicação dessa equação sob a forma:
(2.1)
A cos (mθ ± nϕ + α ) = 0
∑
onde m, n são inteiros, A um coeficiente positivo constante e o ângulo α designado seja 0,
±
π
2
ou π .
Como θ é o ângulo OM com Ox e ϕ é o de ON com o mesmo eixo, sabemos, por meio
de reversores empregues como multiplicadores, aditores ou subtratores, realizar o deslocamento
duma recta ∆ ( m , ± n ,α ) que se articula em O e faz com Ox o ângulo mθ ± nϕ + α , enquanto que
OM e ON rodam em torno de O.
Suponhamos, pois, construídos todos os eixos que correspondem cada um a um termo da
equação (2.1). Agora, sobre cada um desses eixos a partir de O, encontramos um segmento
OH ( m , ± n ,α ) cujo comprimento seja proporcional ao coeficiente A do termo cos(mθ ± nϕ + α ) na
equação (2.1).
A equação (2.1) exprime que a soma das projeções sobre Ox de todos os seus segmentos
é nula.
Para evitar a complicação das notações anteriores, denotemos por OG 1 , OG 2 , K , OG µ os
segmentos precedentes.
Sobre OG 1 construímos o paralelogramo
articulado OG 1 L1 K 1 e depois o paralelogramo
G'2
L2
articulado L1 K 1O ' G 1' ; o segmento O ' G 1' é constante,
L1
G2
G1
G'1
igual e paralelo a OG 1 . Igualmente, construímos os
dois paralelogramos OG 2 L 2 K 2 e K 2 L 2 G '2 G 1' ; o
segmento G 1' G '2 será constante e equivalente ao
K2
K1
O'
O
Figura 2.19.
segmento OG 2 . Poderemos continuar assim e
construir uma figura poligonal O ' G 1' G '2 K G 'µ -1G 'µ ,
do qual cada lado será equivalente a um dos
segmentos OG 1 , OG 2 , K, OG µ .
Poderemos, sem interferir no movimento das hastes OG 1 , OG 2 , K , OG µ , fixar o ponto
inicial O ' . Posto isto, para que a equação (2.1) seja satisfeita, quer dizer para que o ponto P
descreva a curva C, será necessário e suficiente que o ponto extremo G 'µ descreva a recta
proveniente de O ' , perpendicular a Ox . Se, com efeito, isto acontece, a soma das projeções do
contorno O ' G 1' G '2 K G 'µ sobre Ox será igual a zero. Ora, iremos ver que podemos sempre
realizar por um sistema articulado o deslocamento rectilíneo de um ponto e, por conseguinte,
obrigar o ponto G 'µ a descrever a recta considerada. O teorema está, pois, demonstrado.
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2. Sistemas Articulados
36
Uma época duvidou-se mesmo da possibilidade do deslocamento rectilíneo de um ponto.
O teorema de Kempe resolveu logo uma questão que poderia ser objeto de uma dúvida maior, a
do deslocamento de um ponto sobre uma curva algébrica de qualquer ordem. Ele fez, de resto,
notar bem que jamais um sistema articulado não permitirá descrever uma curva transcendente, já
que todas as relações que existem a cada instante entre as linhas e as distâncias dos pontos do
sistema são de ordem essencialmente algébrica.
2.6- Problema do deslocamento rectilíneo
2.6.1- Soluções aproximadas
J. Watt (1784):
O deslocamento aproximado do movimento rectilíneo de um ponto pode-se realizar por
um dos mais antigos sistemas articulados, o paralelogramo de Watt. Este mecanismo oferece
uma aplicação do movimento do três-barras combinado com o pantógrafo de Scheiner.
Consideremos
o
três-barras
F
ABCD em que os pivots A,D estão fixos
e AB = CD . M é o ponto médio da biela
C
BC. Então, M descreve uma curva que se
aproxima de uma recta quanto maior for o
D
comprimento das manivelas AB e DC
E
M
relativamente a BC.
Agora, prolonguemos a manivela
DC de uma quantidade CF = DC e
B
encontremos o paralelogramo CFEB.
Traçamos a linha imaginária ED; esta
linha passa pelo ponto médio, M, da haste
BC. Segundo a propriedade essencial do
pantógrafo de Scheiner, o pivot E vai
A
descrever uma curva homotética à da
Figura 2.20: paralelogramo de Watt.
trajetória de M.
A relação de homotetia é igual a 2 e D é o centro de semelhança. Portanto, o pivot E
descreverá, sensivelmente, uma linha recta e a amplitude do seu deslocamento será o dobro da
amplitude do deslocamento de M.
Tchebychef (1850):
C
C
P
D
P
D
A
B
A
Consideremos o quadrilátero
cruzado ABCD onde fixamos os
pivots A e B. Temos a seguinte
relação:
AD = BC = 5a ,
AB = 4a ,
CD = 2a .
O ponto médio P da haste CD
irá descrever, aproximadamente, uma
recta paralela à distância 4a de AB.
B
Figura 2.21: solução de Tchebychef.
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2. Sistemas Articulados
37
Roberts (1860):
Seja ABCD um trapézio isósceles
articulado no qual fixamos os pivots A e B.
Consideremos a haste AB o dobro de CD e
CPD
um
triângulo
isósceles
ligado
invariavelmente à sua base CD. Temos, então:
AD = BC = CP = PD ;
O ponto P alcança o meio de AB. Logo
que o sistema se deforma, o ponto P descreve
uma curva que se confunde praticamente com o
segmento AB. Vemos imediatamente que a
curva passa pelos pivots A e B, assim como
pelo ponto médio de AB.
Esta aproximação é melhor que as
anteriores.
D
C
A
B
P
Figura 2.22- solução de Roberts.
2.6.2- Soluções exatas
A solução exata do movimento rectilíneo de um ponto foi resolvido por Peaucellier e,
depois, por Lipkine, através de um mesmo aparelho.
Observemos que todo o inversor fornece um meio de realizar o deslocamento rectilíneo
de um ponto. É suficiente, com efeito, através de uma haste, obrigar um ponto a descrever um
círculo passando pelo centro de inversão para que o ponto inverso descreva um segmento de
recta.
O inversor de Peaucellier e o de Hart fornecem, então, uma solução imediata do
problema.
Solução de Peaucellier-Lipkine:
Obtém-se acoplando dois romboídes
semelhantes. Se considerarmos o círculo de
centro O e raio OC ' = OA , a potência de A
relativamente a esse círculo vale:
2
C
2
AC ' ⋅ AC = AD − DC ;
Assim, se C’ descreve um círculo
passando por A, C descreve a recta inversa
desse círculo no inversor de pólo A e potência
2
D
C'
B
A
O
2
AD − DC . Esta recta é perpendicular à recta
por A e O.
Figura 2.23- solução de Peaucellier-Lipkine.
Soluções de Hart:
A primeira solução de Hart consiste na utilização de um inversor de Hart. Temos, então,
um contra-paralelogramo em que AB = CD e AD = BC . Se O, P, Q são três pontos fixos nas
hastes AB, AD, BC, respectivamente, tal que OPQ é uma linha paralela a AC (e BD), então em
qualquer posição do sistema articulado tem-se:
OP ⋅ OQ = BQ ⋅ QC − AO ⋅ OB ,
que é constante.
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2. Sistemas Articulados
38
Agora, sendo O fixo, acrescentamos uma haste que permita mover P no círculo sobre O.
Então, Q irá descrever uma linha recta.
É uma solução que comporta um número mínimo de hastes.
A
C
O
P
Q
G
B
D
Figura 2.24: primeira solução de Hart.
A segunda solução de Hart, tal como a primeira, comporta cinco hastes para a resolução
deste problema. Consideremos, então,
AB = CD ,
P
EF = BP = DP .
B
Estas cinco hastes são dispostas de tal
maneira que os pivots A e C estão fixos e
AC = AB . Agora, E está preso sobre AB, F
está preso sobre CD e verificam:
D
E
F
BE = DF ,
2
BE ⋅ BA = BP .
Nestas condições, o ponto P descreve a
mediatriz do segmento AC.
A
C
Figura 2.25: segunda solução de Hart.
Soluções de Kempe:
A primeira solução utiliza dois contraparalelogramos semelhantes ABCD, ADEF tal
que:
AB = CD = AQ , AD = BC = EF ,
P
B
Q
D
2
AF = DE =
DA
.
DC
E
F
C
Resulta, então, que:
</ QAD =</ BAD .
Fixamos os pivots A e D. Obtemos o
pivot P ligando-o a B e Q por duas hastes
iguais. P irá, então, descrever uma recta.
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A
Figura 2.26: primeira solução de Kempe.
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2. Sistemas Articulados
39
A segunda solução de Kempe utiliza
um losango OABC no qual fixamos os pivots
B e C. Depois, construímos dois romboídes
semelhantes OABR e OPQR tal que:
B
C
R
BR = OR = QR .
Como os dois
semelhantes, tem-se que:
romboídes
são
Q
2
OP = PQ e OP ⋅ AO = OR .
Resulta, então, que Q descreve a recta
perpendicular a AC.
A
O
P
Figura 2.27- segunda solução de Kempe.
2.6.3- Dois outros problemas de Kempe sobre o movimento rectilíneo
Movimento do paralelismo:
G
Obtém-se por uma combinação de
romboídes semelhantes:
ACGH = DFGI ,
BCGI = EFGH .
Os pivots A, B, C estão alinhados e
fixos. Os pivots D, E, F estão alinhados, pois
resultam das igualdades:
AC = AH = DF = DI ,
GC = GI = GH = GF ,
BC = BI = EF = EH ,
C
F
I
B
H
E
2
CA ⋅ CB = CG .
A haste DEF, paralela a ABC, tem um
movimento de translação rectilíneo.
A
D
Figura 2.28: movimento do paralelismo.
Movimento do deslizamento:
Obtém-se, também, por uma combinação de romboídes semelhantes:
ACGH = DFGI e BCGJ = EFGK .
Os pivots A, B, C estão alinhados e fixos. Os pivots D, E, F também vão estar alinhados,
pois são satisfeitas as seguintes igualdades:
AC = AH = DF = DI , GC = GH = GJ = GF = GI = GK ,
2
BC = BJ = EF = EK , CA ⋅ CB = CG .
Resulta, portanto, que a haste DEF desliza sobre a haste ABC.
I
H
G
J
A
B
K
C
F
E
D
Figura 2.29: movimento do deslizamento.
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2. Sistemas Articulados
40
2.7- Os movimentos e as transformações que um mesmo sistema
articulado pode realizar
Consideremos um sistema articulado de ligações completas. Então, podemos, com esse
mesmo aparelho, obter vários movimentos e várias transformações.
Comecemos por notar os vários movimentos que podemos realizar com um mesmo
sistema articulado. Vejamos que podemos fixar qualquer um dos membros do sistema e
considerar a trajetória de um ponto rigidamente ligado a qualquer um dos outros membros. Por
exemplo, no caso do romboíde (Fig 2.30), fixando uma das hastes mais pequenas e considerando
a trajetória do ponto P rigidamente ligado à biela BC, obtemos um Limaçon de Pascal. Se, por
outro lado, fixarmos uma das hastes maiores, notamos que o ponto Q, rigidamente ligado à biela
BC, descreve uma figura bastante diferente da anterior.
Figura 2.30: movimentos distintos de um mesmo sistema articulado.
Vimos também que, no caso do contra-paralelogramo, fixando a haste mais pequena ou a
maior podemos obter uma elipse ou uma hipérbole, respectivamente (Fig 2.8 e 2.9). Portanto, o
mesmo sistema articulado permite-nos realizar movimentos distintos.
Agora, vejamos as várias transformações que podemos realizar com o mesmo sistema
articulado. Fixamos então, por um pivot, o ponto O de um membro do sistema. Escolhemos de
seguida um ponto M e um ponto N ligados cada um a um dos membros (ou mesmo servindo de
pivot a dois ou vários membros do sistema). O ponto M será o ponto director e N o ponto que
traça. Então, se fazemos o ponto director M descrever os contornos de uma figura, o ponto N
traçará os contornos correspondentes à figura transformada. Ora, podemos escolher
arbitrariamente os pontos O,M,N no sistema e realizar assim diversas transformações. Não são
todas igualmente interessantes, mas em certos casos poderemos, com o mesmo sistema, obter
vários resultados úteis.
Assim, reparemos no contra-paralelogramo que nos permitia descrever uma elipse e uma
hipérbole. Vimos também que Hart o utilizou como inversor fixando o ponto O sobre uma haste
e prendendo sobre as duas hastes adjacentes dois pontos M,N que se mantém alinhados sobre O.
Temos, então, que OM ⋅ ON = constante.
Mas, em vez de fixar o ponto O, fixamos o ponto M, então a relação deduzida pode ser
escrita da seguinte forma:
MO(MN − MO) = k = constante
e a relação entre MO e MN exprime uma transformação da forma:
k
ρ1 = ρ +
ρ
onde ρ , ρ1 são os raios vectoriais MO e MN.
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2. Sistemas Articulados
41
Podemos então descrever
cúbicas circulares com eixo de
simetria. Por exemplo, se o ponto O,
considerado como ponto director,
descreve uma recta ρ cosθ = p , o
ponto N, considerado como traçador,
descreve a cúbica circular
k
( x − p )( x 2 + y 2 ) = x 2 ;
p
esta curva tem um ponto duplo e um
Figura 2.31: outra transformação do inversor de Hart.
eixo de simetria.
Acabamos de ver que o mesmo aparelho, o inversor de Hart, permite-nos realizar várias
transformações. De forma análoga, verifica-se que outros sistemas já estudados, como o inversor
de Peaucellier ou os pantógrafos, permitem-nos obter figuras transformadas distintas.
Reparemos ainda num outro aspecto bastante interessante. Nós sabemos guiar, por meio
de um sistema articulado, o movimento rectilíneo de um ponto. Então, através do mesmo
instrumento, saberemos realizar o deslocamento de uma figura plana sujeita à única condição de
que uma das suas rectas desliza sobre um ponto fixo.
Tomemos o aparelho de linha
recta de Peaucellier. Suponhamos os
dois pivots fixos O, O ' unidos por uma
haste que constituirá com o duplo
romboíde e a haste O ' B um sistema
articulado tal que se fixamos o membro
OO ' o ponto M descreverá uma recta
perpendicular a OO ' . Esta recta
intersecta o prolongamento de OO ' no
ponto fixo Q. Agora, concebemos um
segmento RR ' dessa recta que está
rigidamente ligado ao aparelho. Então,
Figura 2.32: deslocamento de placa uma sobre um ponto fixo.
o segmento RR ' desliza sobre o ponto
fixo Q.
2.8- Aplicação de sistemas articulados à resolução de equações e à
representação de funções
Fizemos notar que os sistemas articulados podem servir para representar funções ou
resolver equações. Essa aplicação é essencialmente curiosa do que verdadeiramente prática.
Fixamos uma haste ∆ de um sistema articulado de ligações completas. Um ponto M de
um membro do sistema descreve uma curva que intersecta ∆ em certos pontos. As suas
distâncias a um ponto tomado por origem sobre ∆ são racionais de uma certa equação algébrica.
Então, se temos ∆ graduado, é suficiente notar que esses pontos de ∆ são alcançados por M
através da deformação do sistema articulado. Conhecemos assim os racionais da equação
proposta.
Os coeficientes dessa equação são de parâmetros que figuram na definição do sistema
articulado. Os racionais da equação constituem os valores de uma função algébrica desses
parâmetros independentes e, a esse respeito, o sistema articulado fornece uma representação de
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2. Sistemas Articulados
42
valores dessa função algébrica, pelo menos em certos limites de variação dos parâmetros. Se
soubermos encontrar facilmente os comprimentos das hastes que permitem determinar os
coeficientes da equação de valores numéricos dados e contidos em certos limites, então temos
uma classe de equações resolúveis por meio do sistema articulado proposto.
A este processo de resolução mecânica podemos, em primeiro lugar, apontar o
inconveniente não fornecer, com uma fraca aproximação, os racionais procurados. Mas a este
junta-se um outro. Vimos que, por vezes, os quadriláteros não permitem determinar as figuras
completas. Assim, por uma deformação continua, o ponto M não descreverá uma parte da sua
trajectória e poderá acontecer que o aparelho não forneça parte dos racionais que deveria
encontrar.
Vamos agora resolver mecanicamente uma equação do terceiro grau.
C
Consideremos um quadrilátero ABCD
no
qual
prolongamos os lados AB e CD até
c
ao
ponto
de intersecção em E. Chamamos θ
D
o ângulo </ DEA e obtemos, então, as
b
f
seguintes igualdades:
d
B
a
θ
A
Figura 2.33.
2
2
2
2
2
2
2
2
AD = ED + EA − 2ED ⋅ EA cosθ ,
E
BC = EC + EB − 2EC ⋅ EB cosθ ,
donde, eliminando cos θ , vem:
2
2
2
2
(ED + EA − AD )EC ⋅ EB = (EC + EB − BC )ED ⋅ EA .
Constatamos facilmente que esta equação é geral e independente da disposição dos
pontos situados sobre uma mesma recta, tendo em conta que se atribui sinais contrários a dois
segmentos opostos.
Imaginemos que articulamos em A,B,C,D o quadrilátero e que fixamos a haste AB,
prolongada. Um ponto E da haste prolongada CD descreve uma curva que intersecta AB em
certos pontos. Vamos formar a equação que admite por racionais as distâncias do ponto E ao
ponto A. Chamamos a, b, c, d aos lados AB,BC,CD,DA do quadrilátero, f a distância DE e x a
distância AE (calculamos x positivamente no sentido BA). A equação deduzida é:
[
]
( f + c)( x 2 + f 2 − d 2 )( x + a ) = f ( x + a ) 2 + ( f + c) 2 − b 2 x,
ou desenvolvendo,
[
]
cx 3 + a (c − f ) x 2 − c( f 2 + d 2 ) + f (a 2 − b 2 + c 2 + d 2 ) x + a( f + c)( f 2 − d 2 ) = 0 .
Podemos identificar esta equação com uma equação do terceiro grau do tipo:
x + nx 2 + px + q = 0 .
Suponhamos o caso particular onde n é nulo, que fará tomar f = c , pelo que as equações
de identificação serão:
2( c 2 + d 2 ) + a 2 − b 2 = − p ,
2a (c 2 − d 2 ) = q ;
obtemos então que:
q
4c 2 = b 2 − a 2 − p +
a
q
4d 2 = b 2 − a 2 − p −
a
Estas fórmulas permitem-nos conhecer c, d sendo a e b constantes. No entanto, se os
3
valores precedentes de c 2 , d 2 se tornam negativos é possível aumentar b de maneira a torná-los
positivos.
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43
2.9- Exemplos de curvas
Lemniscate de Bernoulli:
Podemos obter um lemniscate de Bernoulli através de dois sistemas articulados distintos.
O primeiro (Fig 2.34), consiste em considerarmos um três-barras onde fixamos os pivots A,B e
AB = CD = 2AD = 2BC . Então, o ponto médio P da biela CD traça a curva pretendida. O
segundo (Fig 2.35), consiste num mecanismo em que fixamos os pivots A,B e
AB = AD = 2BC = 2DC . Agora, obtemos P no prolongamento da haste CD em que C é o
ponto médio de DP. Então, P traça um lemniscate de Bernoulli.
Figura 2.35: segundo mecanismo.
Figura 2.34: primeiro mecanismo.
Oval de Cassini:
Como indica a figura, um inversor de Peaucellier permite traçar uma oval de Cassini de
pólos A e B. Os pontos Q, Q ' descrevem essa oval.
Figura 2.36: Oval de Cassini.
Limaçon de Pascal:
Na primeira solução do movimento
rectilíneo de Kempe (Fig 2.26), eram
utilizados
dois
contra-paralelogramos
semelhantes ABCD e ADEF. Agora, em
vez de fixar os pivots A e D, vamos fixar os
pivots E e F. Então, B irá descrever um
Limaçon de Pascal.
A figura mostra que, no caso de
EC = 2BC , obtemos um cardióide.
Figura 2.37: cardióide.
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