A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE EM EDUCAÇÃO FÍSICA JÉSSICA BRITTI GARDIM 1 ANDRÉ RICARDO OLIVEIRA 2 Resumo Na sociedade em que vivemos se faz necessário solucionar algumas dúvidas referentes ao trabalho docente. Compreender os processos que levam a desvalorização e precarização deste profissional da educação é o ponto de partida do presente estudo. As ingerências do sistema capitalista que levam a precarização do trabalho docente em Educação Física, entre outras coisas, valorizam uma formação aligeirada e fragmentada, distanciando-o de suas funções de produção e construção do conhecimento. Podemos destacar que os problemas relacionados à precariedade do trabalho docente no país não são recentes. É uma situação constante e crescente que tem consequências diretas no resultado do trabalho destes professores. Má qualidade na formação superior, precariedade de matérias de trabalho e a desorganização do sistema de ensino também influenciam no resultado do processo de ensino e aprendizagem. Um fator que fundamenta e contribui para a precariedade dos docentes é o neoliberalismo que passa a exigir o máximo rendimento sem dar condições mínimas para que um bom trabalho ocorra. Assim, redução de gastos e imposição de novas formas de trabalho que não fazem parte da didática do professor, ou até mesmo, pela política de recursos humanos se tornam frequentes. O presente estudo se caracteriza como uma pesquisa bibliográfica com a finalidade de levantar dados sobre os motivos que levam a banalização e precarização do professor de educação física, disciplina esta que tem sido cada vez mais marginalizada. Dessa forma, tem como objetivo discutir acerca da precarização do trabalho docente em educação física na sociedade capitalista, chegando a conclusão que essa banalização e precarização são conseqüências das políticas neoliberais de um sistema em crise que mutila, enfraquece os trabalhadores e os responsabiliza por todo esse processo. Palavras-chave: Precarização; Trabalho Docente; Educação Física. INTRODUÇÃO Na sociedade em que vivemos se faz necessário solucionar algumas dúvidas referentes ao trabalho docente. Questionamentos relacionados a desvalorização e precarização deste profissional da educação que segundo Saviani (1997), tem como uma de suas funções a produção e construção do conhecimento, ou seja, o professor seria o responsável por inserir novos conhecimentos para seus alunos. Podemos destacar que os problemas relacionados à precariedade do trabalho docente no país não são recentes. É uma situação constante e crescente que tem conseqüências diretas 1 britti_66@hotmail;com / FACULDADE ESTADUAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIAS E LETRAS DE PARANAVAÍ – FAFIPA / PARANÁ 2 no resultado do trabalho destes professores, assim como, os materiais de trabalho e a organização do sistema de ensino também influenciam nas condições de trabalho dos educadores (PAIVA et al., 1998). Um dos fatores que contribui para a precariedade dos docentes é o neoliberalismo que passa a exigir o máximo rendimento sem dar condições mínimas para que um bom trabalho ocorresse, por meio de redução de gastos, imposição de novas formas de trabalho que não fazem parte da didática do professor, ou até mesmo, pela política de recursos humanos (MARONEZE, 2011). O presente estudo tem como ponto de principal discutir os motivos que levam a banalização e precarização do professor de educação física, disciplina esta que tem sido cada vez mais marginalizada e deixada de lado por pais e alunos. Assim terá como objetivo discutir acerca da precarização do trabalho docente em educação física na sociedade capitalista. CAPITALISMO x PROFISSÃO DOCENTE Discutir a precarização do trabalho docente na sociedade capitalista, a partir das mediações mais amplas que envolvem o processo de novas relações de produção, se faz necessário para compreender esse problema que se agrava com o passar dos anos. As intensas investidas contra o trabalho docente expressam as contradições inerentes ao modo de organização da produção material da vida dos homens, e com isso potencializam o caráter mutilador e fragmentado nas possibilidades de prática pedagógica (MARONEZE, 2011). O trabalho na sociedade capitalista só pode se configurar em condições de precariedade para maioria da classe trabalhadora, sendo manifestação da dimensão histórica concreta estabelecida, como afirma Alves (2007, p.115) ao explicar que “a precarização é um processo social de conteúdo histórico-político concreto, de natureza complexa, desigual e combinada, que atinge o mundo do trabalho” Segundo Maroneze (2011) os elementos que formam essa precarização são problemas que necessitam ser compreendidos em sua totalidade, ou seja, questões relacionadas a problemas de cunho social, econômico, ideológico, o que estrutura toda uma sociedade capitalista, sendo esta a responsável por construir e reconstruir as relações sociais dos homens. Partimos do pressuposto em que a sociedade está em transformação, assim sendo, em constantes mudanças, deste modo todo o contexto em que esta sociedade se insere sofre 3 conseqüentemente essas alterações, e este vai desde âmbitos da saúde, ciências, e educação o que é o foco deste trabalho. A partir das mudanças que ocorreram no Brasil, especificamente em 1990, de cunho social e econômico, o estado assume um novo papel de mediador entre as classes. O Neoliberalismo surge para respaldar os interesses capitalistas, deteriorando ainda mais os trabalhadores e formando condições propícias para a expansão do capital (NETTO E BRAZ, 2007). Mészáros (2002), ressalta que a dinâmica em que o sistema do capital está inserido, se afirma agora em reduzir o tempo de trabalho necessário para a produção de mercadorias a um valor mínimo que irá, consequentemente, otimizar o lucro, transformando parte da população trabalhadora no que o autor nomeia como Força de trabalho crescentemente supérflua. Nessa lógica, o professor é um trabalhador como os demais, submetido à lógica geral de funcionamento do mercado, enquanto tal realiza uma atividade específica. O que irá diferenciar o professor de outro trabalhador não é apenas o produto final, mas sim todo o processo de trabalho e também o local onde o exerce (FERNANDES; ORSO; s/d). Tumulo e Fontana (2008, pag. 1) afirmam que: [...] as investigações sobre o trabalho docente, em sua inter-relação com outras categorias profissionais, começaram a emergir como objeto de estudo na pesquisa educacional brasileira no final da década de 1970 (OLIVEIRA, 2003), tendo como temas centrais a organização do trabalho docente e a gestão da escola. Os problemas relacionados com a precarização, banalização e marginalidade do trabalho docente não são práticas recentes, podendo ser classificados como constantes e crescentes que terão conseqüências diretas no resultado final do trabalho destes. É notável que a partir dos anos 70 século XX, a banalização do sistema público de ensino teve efeitos diretos no funcionamento destas instituições (PAIVA et al., 1998). O trabalho docente passa, entre outras coisas, por duas problemáticas na atualidade: a primeira delas são as mudanças que ocorrem no mercado de trabalho, que são provenientes de avanços tecnológicos e também pelos processos de globalização. A segunda diz respeito às mudanças que ocorrem no campo educacional que requerem dos sistemas de ensino uma grande agilidade de adaptação para assim atender ao mercado que se encontra cada vez flexível (MANCEBO; EWALD; PRESTRELO; UZIEL; 2007). Com a adoção de práticas neoliberais, ocorrem consequências diretas no campo da docência, pois esse sistema cobra um alto rendimento de seus profissionais, sem dar o subsídio básico para que um trabalho com qualidade seja realizado, precarizando então o 4 trabalho do professor. A pressão que ocorre por essa organização do capital, afeta praticamente todas as áreas de trabalho, mais em poucos campos essa ameaça é tão direta como o campo educacional, pois em geral, o aumento da produtividade resulta em resultados menos expressivos quando pensamos em qualidade de ensino (MANCEBO 2007). As reformas na educação que ocorreram no País na última década fizeram com que o sistema educacional sofresse mudanças para atender as novas necessidades sociais no quadro da reestruturação produtiva (MARONEZE, 2011). Essas alterações geram conseqüências diretas para o professor, sendo elas segundo Mancebo (2007, p. 02): • Precarização do trabalho; • Flexibilização das tarefas; • Aceleração do tempo de trabalho, ou seja, uma mudança de ordem intensiva (aceleração na produção em um mesmo intervalo de tempo) e extensiva (aumento das horas de trabalho). Podemos citar como problemas que levam a precarização do professor: • Empobrecimento dos professores de educação básica; • Assalariamento associado à precarização profissional; • Perda do controle sobre o seu trabalho; • Transformação da categoria num trabalhador coletivo, negando-se suas peculiaridades de trabalhador individual; • Caracterização do professor como produtor de mais valia (COSTA, 2009, p. 95). De forma geral, o que leva a precarização do professor tem sua origem na sociedade capitalista que cada vez mais visa apenas o lucro e não a qualidade de ensino, aumentando significativamente a carga horária destes profissionais e diminuindo cada vez mais a sua remuneração. É importante ressaltar que o professor é a base de toda uma sociedade bem estruturada, pois, são esses profissionais que irão formar outros profissionais (médicos, engenheiros, nutricionistas, educadores e etc.), então se esse alicerce não estiver bem estruturado intrinsecamente e extrinsecamente tem-se poucas chances de profissionais bem qualificados em um mercado de trabalho que cobra tanto rendimento com tão pouco subsídio para o mesmo. 5 EDUCAÇÃO FÍSICA: UMA DISCIPLINA PRECARIZADA, BANALIZADA POR UM SISTEMA CAPITALISTA É importante levarmos em consideração que a disciplina de Educação Física precisa encontrar a sua identidade, entender a realidade em que está inserida e se reconhecer. ‘A Educação Física precisa entrar em crise urgentemente questionando criticamente seus valores. Precisa procurar sua identidade’ (MEDINA, 1986, apud FENSTERSEIFER, 1999). Hoje passados mais de vinte e cinco anos, dizemos que a educação física precisa sair desta crise, e encontrar sua verdadeira identidade e explicar-se, como disciplina e não como apenas atividade, pois isso dá aos alunos a opção de não participar das aulas (FENSTERSEIFER, 1999). Podemos então dizer que a E.F não pode apenas se justificar com o ‘ensino do movimento ou movimento humano’, ou se basear em bases da fisiologia, biomecânica e anatomia, fazer isso é de certa forma menosprezar a mesma que é um campo de estudo tão rico em seus fundamentos, fazendo com que os leigos tenham uma visão unilateral e reduzida da disciplina, que não deve ser apenas compreendida de maneira fragmentada, mais sim em uma totalidade em que se insere no mundo moderno, onde se faz importante o professor de Educação Física em uma sociedade cada vez mais tecnológica e consequentemente com maior número de crianças, jovens e adultos obesos e sedentários. A dicotomia que existe em vista da educação física é a de mente e corpo não como um conjunto, mas sim um corpo dividido em dois aspectos que possivelmente não poderiam ser trabalhos juntos. É a partir disso que o profissional de educação física se afastava e ausentava de decisões políticos – pedagógicas nas escolas, partindo do pressuposto em que o mesmo só teria o conhecimento da prática e de regras dos desportos. Porém, vale ressaltar que as instituições de ensino superior que formavam esses profissionais é que estreitavam os conhecimentos de seus educando a estas áreas de conhecimento, os deixando alienados as demais pedagogias (FENSTERSEIFER, 1999). Em princípio se faz necessário compreender qual o contexto em que a disciplina está incluída na sociedade. Uma realidade em que os professores não tem condições de trabalho adequada, em que existe uma divisão mal feita em relação a teorias e práticas, falta de estimulo da instituição de ensino e precarização do seu trabalho, problemas cotidianos que os professores enfrentam com freqüência e os saturam e os cansam dessa realidade vivida de forma tão banal todos os dias. 6 A má qualificação de seus profissionais que apenas se baseiam no ‘jogar bola’, não justifica a disciplina no currículo escolar. Porém é importante ressaltarmos que a E.F pode abordar aspectos que são fundamentais para o desenvolvimento: motor, cognitivo e psicossocial de seus educando (GUIMARÃES ; PELLINI F; ARAUJO J. & J. M. MAZZINI, 2001). CONSIDERAÇÕES FINAIS As discussões que cercam os problemas relacionados com o trabalho docente são um grande paradoxo, que nos põe a refletir sobre a real função do professor quando inserido em uma sociedade que visa cada vez mais o lucro e não uma boa qualidade do sistema de ensino. É notório que a nova organização do capitalismo, as modalidades de trabalho foram intensificadas sem os mínimos subsídios de trabalhos, sistema capitalista esse que se baseia em valorizar o trabalho e não o trabalhador (MARONEZE, 2011). Para buscarmos uma melhora na valorização dos professores, ou seja, para que ocorra uma melhora na qualidade trabalho docente, é preciso que as lutas ocorram em toda a sociedade, então podemos dizer que a melhor estratégia de defesa dos direitos desses profissionais é a extensão destes professores a todos os trabalhadores. É uma luta pela emancipação em que o trabalho é gerado de forma coletiva e valorizado dentro das instituições de ensino, já que a precarização, banalização e marginalização do professor irá ter resultados diretos na sua vida e na vida de seus educandos (FERNANDES; ORSO; 2008). Para um trabalho docente com uma boa qualidade é necessário que essa ocorra em totalidade na sociedade, em cem por cento, desde saúde, financeiro até chegarmos a educação que é sem duvidas o principal. É preciso o reconhecimento desses profissionais que de forma geral dedicam a sua vida em função do conhecimento do outro. Ressaltamos aqui que esse trabalho apenas aponta algumas referências que mostram o contexto da precarização do professor em uma sociedade capitalista. É notório que são necessários maiores estudos para uma analise mais intensa e profunda desse problema, e isso se faz de extrema importância para compreender os mecanismos da sociedade de mercadorias para deteriorar os professores e a educação. 7 REFERÊNCIAS ABREU, Claudia Barcelos de Moura; LANDINI, Sonia Regina. Trabalho docente: a dinâmica entre formação, profissionalização e proletarização na constituição da identidade. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 4, n. 8, jan./abr. 2003. ALVES, Giovanni. 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