Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 DNA E SUAS APLICAÇÕES BIOTECNOLÓGICAS: UMA ANÁLISE DA APRENDIZAGEM DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA Lucilene Campos da Hora Silva (Aluna do Mestrado Profissional em Formação Científica para Professores de Biologia- UFRJ- Polo Xerém- bolsista CAPES) Danielle Pereira Cavalcanti (Pesquisadora do Laboratório de Biotecnologia- Inmetro/ Docente do Mestrado Profissional em Formação Científica para Professores de Biologia - UFRJ) Resumo Uma vasta quantidade de informações vem sendo acumulada na área da Biologia, tornando praticamente impossível que os professores acompanhem todas as inovações disponíveis. Dessa maneira, hoje encontramos muitos profissionais despreparados para ensinar conceitos atuais aos seus alunos, principalmente os relacionados ao tema de Biotecnologia. Em vista deste cenário, buscamos reunir material didático e atividades práticas existentes sobre DNA e biotecnologia a fim de promover um curso de atualização de professores a cerca do tema. Para averiguar o conhecimento prévio desses docentes e a eficácia da atualização oferecida, aplicamos um questionário antes e após o curso. Os resultados dessa pesquisa são apresentados neste trabalho. Palavras – chave: Biotecnologia, DNA, material didático, atualização de professores. Introdução As descobertas científicas acerca dos ácidos nucleicos e a biotecnologia A Biotecnologia é uma área da ciência em acelerada expansão, que vem causando impactos profundos na sociedade por sua quase ilimitada gama de aplicações tecnológicas. Biotecnologia é “qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos ou derivados destes, para fazer ou modificar produtos ou processos para usos específicos” (Convenção sobre diversidade biológica – ONU) 1. No mundo inteiro, projetos de pesquisa neste campo estão introduzindo avanços importantes para a saúde humana, tais 1 Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/doc_cdb1.php 5079 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 como: reprodução animal, preservação ambiental, agropecuária, indústria de alimentos entre outros. Sendo assim, a biotecnologia vem abrindo novas perspectivas para quem detém conhecimento na área e sabe utilizar seus modernos instrumentos. O aprimoramento da biotecnologia emerge com a consolidação dos conhecimentos adquiridos a respeito do ácido desoxirribonucleico (DNA). Dentre os experimentos representativos na área, destacam-se o experimento de Avery e colaboradores em 1944, quando descobriram que o princípio transformante das bactérias pneumococos era o DNA (esta descoberta foi fundamental, pois na época pensava-se que as proteínas eram as responsáveis pela transmissão das características dos seres vivos) e o trabalho de Watson e Crick de 1953, que desvendou a estrutura em dupla hélice do DNA. Na década de 70 importantes descobertas permitiram avanços até então impensados e o surgimento de técnicas para manipulação do material genético. Em 1971, Arber, Smith e Nathans descobriram as endonucleases de restrição provenientes das bactérias, que cortam o DNA viral em regiões específicas. Através dessa pesquisa, o bioquímico Paul Berg e seus colaboradores conseguiram no ano seguinte, produzir à primeira molécula híbrida, inserindo um fragmento do vírus SV40 no genoma da bactéria Escherichia coli. Em 1973, Cohen e Boyer isolaram um gene de Xenopus leavis e inseriram na bactéria E. coli, obtendo a expressão da proteína recombinante com sucesso. A partir daí, diversas proteínas recombinantes para uso comercial passaram a ser produzidas, dentre elas as proteínas humanas somatostatina e insulina. A biotecnologia moderna e a educação. Uma gama de informações vem sendo acumulada na área da Biologia. No entanto, os cursos de licenciatura dessa disciplina acabaram não acompanhando tais avanços e hoje encontramos professores despreparados para ensinar conceitos atuais aos seus alunos. O trabalho de Goedert e colaboradores (2003) aponta a fragilidade nos cursos de formação de professores, evidenciando a dicotomia entre a formação e a prática escolar, ou seja, o que vem sendo abordado nos cursos de formação não está subsidiando, de forma efetiva e adequada, o trabalho dos docentes em sua atuação no Ensino Médio e Fundamental. Devido à falta de oportunidade de cursos de atualização, os docentes acabam recorrendo aos livros didáticos para tirar suas dúvidas, que por sua vez demonstram conceitos fragmentados e descontextualizados, dificultando o entendimento. Pesquisas realizadas com livros de Biologia e Química sobre a molécula de DNA identificaram problemas, como: (i) “a 5080 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 falta de coerência dos modelos apresentados para a estrutura do DNA com os modelos cientificamente aceitos” e (ii) “um ensino fragmentado do DNA com as descobertas que são pertinentes a esta molécula” (FERREIRA e SILVA, 2008, p.09). Uma entrevista feita com professores que lecionam no Ensino Médio e Fundamental apontaram algumas dificuldades que encontram na condução das suas aulas, como, “o excesso de trabalho” e “falta de material alternativo ao livro didático e de boa qualidade” (GOEDERT, CASTILHO E LEYSER, 2003, p.10). Por outro lado, pesquisas com alunos com intuito de avaliar seus conhecimentos referentes à Biotecnologia, evidenciaram respostas baseadas em notícias que saem na mídia e apresentam, muitas vezes, conceitos errados (PEDRANCINI et al, 2007). Os discentes apresentam dificuldade, porque os próprios educadores talvez estejam despreparados para abordar temas da atualidade em sala de aula. Apesar da dificuldade dos professores em trabalhar os temas atuais da Biologia com suas turmas, o ensino de Biotecnologia faz parte de diretrizes encontradas em documentos oficiais do governo, tais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), a Matriz de Referência para o Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM) e o Currículo Mínimo de Ciências e Biologia, da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ). Os PCNs do Ensino Médio, elaborados pelo Governo Federal para estabelecer uma referência curricular a ser seguida pelas escolas do país, destacam a importância do ensino de Biotecnologia: Ter uma noção de como operam esses níveis submicroscópicos da Biologia não é um luxo acadêmico, mas sim um pressuposto para uma compreensão mínima dos mecanismos de hereditariedade e mesmo da biotecnologia contemporânea, sem os quais não se pode entender e emitir julgamento sobre testes de paternidade pela análise do DNA, a clonagem de animais ou a forma como certos vírus produzem imunodeficiências. (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO MÉDIA E TECNOLÓGICA, 2000, p. 9-10). Mesmo com a obrigatoriedade do ensino de biotecnologia estabelecida nos documentos oficiais, o que se observa hoje nas escolas é que tais conteúdos têm sido abordados superficialmente pelos professores com isso os alunos apresentam dificuldades por serem conteúdos abstratos (CARBONI e SOARES, 2006 ). Em vista de todo este contexto, torna-se premente a atualização dos professores de Ciências e Biologia. A própria Lei Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996, relata capacitação dos docentes em seu artigo 62, o qual descreve que: “§ 1º A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios, em regime de colaboração, deverão promover a formação inicial, a continuada e a capacitação dos 5081 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 profissionais de magistério”. Em seu artigo 67 comunica ainda o “aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim”. Mesmo com todas as Leis e diretrizes curriculares hoje existentes, não são evidenciadas muitas ações de atualizações dos docentes. Em vista deste cenário, buscamos reunir material didático e atividades práticas existentes sobre DNA e Biotecnologia a fim de promover um curso de atualização de professores acerca do tema e de como utilizar os recursos didáticos selecionados. Metodologia A ideia deste trabalho surgiu após constatação da dificuldade dos alunos do Ensino Médio em responder questões simples, que englobam assuntos pertinentes ao DNA, como salientado por Pedrancini et al. (2007). Surgindo a hipótese que os discentes apresentam esse obstáculo devido ao despreparo de muitos professores em trabalhar esse conteúdo em sala de aula. Oferecemos um curso de atualização para docentes da Educação Básica, que utilizou diferentes atividades experimentais para abordar o assunto. Para averiguar o conhecimento prévio desses professores a respeito do DNA e da Biotecnologia moderna, foi aplicado um questionário com 16 questões sobre o tema (anexo). O mesmo questionário foi aplicado após o curso, com a finalidade de investigar a eficácia da atualização oferecida. O curso com carga horária de 20h, dividida em 2 dias e meio, abordou os temas: histórico da descoberta do DNA, estrutura dos ácidos nucleicos, compactação do DNA nos procariotos e eucariotos, metabolismo do DNA (replicação, transcrição de tradução), tecnologia do DNA recombinante (enzimas de restrição, eletroforese, hibridização de ácidos nucleicos, reação em cadeia da polimerase “PCR”), clonagem, transgênico,projeto genoma e uma visita a um Laboratório de Biotecnologia. Além da parte teórica, oferecemos 6 atividades práticas, que podem ser facilmente reproduzidas pelos professores em sala de aula e análise crítica de livros didáticos. As atividades práticas desenvolvidas encontram-se abaixo, com uma breve descrição de cada uma delas. 1ª Atividade – “brincando com o núcleo”. 5082 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 Figura 1: Para a obtenção dessa ferramenta didática, utilizamos: isopor, lã, cola, fita adesiva colorida, tinta, canetinha e papel ofício. O produto representa o núcleo celular das células somáticas dos seres humanos, onde as lãs são as moléculas de DNA, o isopor o núcleo e os palitos que ficaram verdes, as histonas. Essa ideia foi originada após visita à exposição “De Mendel a Venter”, oferecida pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro no ano de 2013. Com este material didático o professor pode demonstrar aos alunos que o DNA das células somáticas humanas está contido em 46 cromossomos (ou 23 no caso dos gametas), trabalhar o conceito de ploidia (organismo haploide, diploide, etc), mostrar como o DNA está compactado dentro do núcleo, diferenciar cromatina e cromossomo, entre outros conceitos. 2ª Atividade – “Extração de DNA de fruta” Figura 2: Extração de DNA de kiwi, polpa de morango, banana e tomate. A extração de DNA de frutas não é uma novidade, mas ainda é desconhecida por alguns profissionais. Usamos diferentes frutas para que os professores pudessem avaliar qual apresenta melhor rendimento na extração, logo demonstramos que a execução é bem mais simples do que o encontrado em alguns protocolos disponíveis na internet e livros. Além disso, o docente pode facilmente reproduzir este experimento mesmo sem ter um laboratório na escola. 3ª Atividade – “Montando DNA com jujubas” Figura 3: Utilizamos jujubas (4 cores diferentes), que representavam as bases nitrogenadas; palitos de dentes representando as pontes de hidrogênio entre as bases e o arame, esquematizando o esqueleto açúcar-fosfato do DNA. 5083 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 Esta atividade foi retirada da revista Ciência Hoje (2002), todavia foram incrementadas algumas alterações para que pudessem ser mais fidedignas as ligações químicas das bases nitrogenadas. A molécula de DNA pode ser feita com massinha, isopor ou outros materiais e, além da estrutura em dupla hélice do DNA, o professor pode usar o modelo para simular o processo de replicação e transcrição ou até mesmo trabalhar o conceito de mutação. 4ª Atividade - “Brincando de fazer proteínas”. Figura 4: Prática da síntese proteica, utilizando papel cartão, fio de náilon, isopor, canudinhos plásticos, cola, fita adesiva, tinta plástica e canetinha. Essa prática, adaptada do livro de Amabis e Martho, busca demonstrar de forma lúdica o papel do RNA mensageiro, RNA transportador e dos ribossomos na síntese de proteínas. Contudo facilita bastante a visualização do processo de tradução, reconhecimento códonanticódon e como os aminoácidos são unidos para formar a cadeia peptídica. 5ª Atividade - “Eletroforese em sala de aula” Figura 5: Prática de eletroforese, utilizando kit desenvolvido pelo nosso grupo. Com esta prática, os professores puderam aprender sobre uma técnica rotineiramente utilizada em laboratórios de pesquisa para separação de moléculas de DNA de diferentes tamanhos, bem como separação de RNA ou proteínas. Os docentes puderam observar todo aparato envolvido na confecção do material, bem como puderam aprender sobre as aplicações práticas da técnica de eletroforese. 6ª Atividade - “Brincando com plasmídio” 5084 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 Figura 6: Modelo de uma bactéria contendo um plasmídio recombinante, empregando papel cartão para montar a célula bacteriana e a enzima de restrição, lã para simular o DNA bacteriano, emborrachado para montar o plasmídio e a fita adesiva para a enzima ligase. Este produto, também desenvolvido pelo grupo, explica como uma molécula de DNA recombinante é produzida, apontando a atuação das enzimas de restrição e DNA ligase para gerar este produto. Os materiais usados foram simples e práticos de serem reproduzidos em sala de aula. Depois da exposição do conteúdo e dos materiais didáticos, o curso foi finalizado com análise crítica dos livros adotados pelo Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM), amplamente utilizado pelos professores de Biologia. Tabela 1: Lista dos livros selecionados e analisados. Obra Bio Biologia Hoje Editora Saraiva Ática Livro Biologia Saraiva Ser Protagonista SM Coleção Biologia FTD Livro Biologia Moderna Autor (a) Sônia Lopes e Sérgio Rosso Sérgio Linhares e Fernando Gewandsznajder César da Silva, Sezar Sasson e Nelson Caldini Fernando Santiago, João Batista e Maria Argel Antônio Pezzi, Demétrio Gowdak e Neide Mattos José Amabis e Gilberto Martho Ano de Edição 2010 2011 2010 2010 2010 2010 Todos os livros selecionados para a análise possuíam informações sobre o DNA ou Biotecnologia, observando cada volume das coleções citadas. O propósito da análise era verificar se os livros continham erros conceituais, bem como analisar a coerência e conexões entre os assuntos abordados em diferentes capítulos. Resultado e Discussão A análise dos questionários respondidos antes e após o curso de atualização pelos professores está representada no gráfico 1. O gráfico exibe uma comparação dos percentuais de acertos nas referidas questões. 5085 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 Gráfico 1: Percentual de acertos em cada questão, antes e após o curso de atualização (n= 11). As perguntas não apresentavam nenhum grau de dificuldade (anexo), pois a intenção era formular questões simples e diretas, que envolvessem o dia a dia dos profissionais. No entanto, observamos muitas respostas incoerentes, erradas ou mesmo em branco. Logo no primeiro ponto, que englobava a diferença entre cromatina e cromossomo, averiguamos argumentação do tipo: “cromossomo é uma proteína...” e “...cromossomo é conjunto de moléculas de DNA que expressam uma característica”. Prosseguindo a avaliação, percebemos um bloqueio dos docentes ao se depararem com a indagação sobre a quantidade de moléculas de DNA encontradas no nosso organismo, bem como sua existência fora do núcleo, em organelas como a mitocôndria e cloroplastos (nos vegetais). Apenas 1 participante respondeu corretamente a pergunta 3 e encontramos erros, tais como: “temos apenas uma molécula de DNA” e “temos 4”. Quando especulamos o conceito de gene, apenas 1 expressou como “...trecho na fita de DNA, responsável por sintetizar determinada proteína”, que não é uma resposta completa, uma vez que um gene também pode sintetizar RNAs não codificantes, como RNA transportador e RNA ribossomal, entretanto é uma afirmação coerente para os professores, apenas uma controvérsia da atualidade. No entanto, muitos docentes exibiram informações muito simples e inconsistentes, alegando que o gene: “é o responsável pelo conteúdo genético”, “unidade que contém as informações genéticas”, “é uma estrutura que tem a informação para cada característica de ser vivo”. 5086 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 As questões 8 e 16 foram as que corroboraram o maior número de acertos, pois pediam apenas para citar alguns exemplos de transgênicos e clonagem, respectivamente. Os exemplos eram escassos e antigos, porém corretos. Alguns aludiram os alimentos como produtos transgênicos, mas disseram que nunca tinham ingerido um organismo geneticamente modificado (OGM) nos dando a entender que a rotulagem dos produtos no mercado ainda era uma incógnita para esses profissionais. Os conceitos sobre plasmídios, enzimas de restrição e clonagem reprodutiva / terapêutica, não faziam parte da bagagem dos participantes. Encontramos muitas respostas em branco e identificamos alguns lapsos, como o plasmídio: “...é uma enzima de restrição”, “estruturas celulares como cloroplastos”. Já quanto à clonagem nos deparamos com: “clonagem reprodutiva serve para facilitar casais que tenham dificuldades em gerar filhos de forma natural” e “clonagem reprodutiva está ligada à herança ligada ao sexo”. O gráfico evidencia um aumento de acertos em cada questão após o curso de atualização, com exceção da questão 8 que permanece com a mesma proporção de acertos. Todavia o padrão de resposta estava diferente, as citações dos exemplos se tornaram mais numerosos e modernos. Já a questão envolvendo engenharia genética ainda ficou incompreendida, pois muitas respostas ficaram confusas, prevalecendo menos de 50% dos acertos. Acreditamos que o embaraço dos docentes seja devido o emprego dos termos, pois no curso utilizamos o vocábulo DNA recombinante, assim pensaram que fossem conceitos divergentes. Os materiais didáticos e atividades práticas desenvolvidas no curso foram muito apreciados pelos professores. Dois docentes ressaltaram que levaram estes produtos para sala de aula, como registrado pelo próprio na figura 7. Figura 7: Alunos do ensino fundamental de turma de um dos professores do curso, utilizando o modelo “brincando com o núcleo”. Os professores, de maneira geral, comentaram da importância de todas as atividades lúdicas desenvolvidas no curso, e se mostraram dispostos a trabalhar com esses modelos em sala de aula. 5087 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 A atividade “brincando com núcleo” foi muito discutida no curso, surgindo sugestões como: representar as 23 moléculas de DNA provenientes do pai de uma cor e as outras 23, que resulta da mãe com cor diferenciada. Além disso, foi recomendado que a lã fosse matizada para representar os genes. Em relação à análise de livros didáticos, selecionamos trechos para discussão com os docentes, tais como: “O núcleo celular é uma estrutura geralmente esférica ou ovoide, presente em todas as células eucarióticas...” (Amabis e Martho, vol 1, p. 153). Essa definição aparece no início da página e os autores só comentam que as hemácias adultas são células anucleadas (no caso de mamíferos) no final da página. Além disso, na lauda seguinte define um termo incoerente sobre os poros da carioteca, salientando que “... complexo do poro, que funciona como uma válvula, abrindo-se para dar passagem a determinados materiais e fechando-se em seguida”(p. 154), no entanto esses poros ficam abertos em todos os momentos e existe um controle extremamente elaborado para reconhecimento das moléculas que devem entrar e sair do núcleo . O livro do César, Sezar e Caldini, (vol 3, p. 50) mostra uma imagem com informação inadequada, dando a entender que durante a replicação as fitas do DNA estão sendo sintetizados na mesma direção, não evidenciando a fita descontínua. Entendemos que o autor teve intuito de simplificar, mas as pessoas que não detêm esses conceitos acabarão aprendendo uma definição errada. Os autores Pezzi, Gowdak e Mattos (vol 1) comentem uma falha ao não mencionar que a carioteca apresenta duas membranas, ao explicar que “a carioteca, também denominada membrana ou envoltório nuclear...” (p.79). Mais adiante expressam que a “Biotecnologia é um conjunto de técnicas que envolvem a manipulação do material genético dos seres vivos, com fins industriais ou medicinais” (p.114); porém, a Biotecnologia abrange uma definição mais ampla, como mencionado na introdução deste trabalho. Esta atividade de análise crítica mostrou aos professores que embora o livro didático seja uma boa fonte de consulta, ainda assim apresenta conceitos errôneos ou descontextualizados. E cabe ao professor estar sempre buscando atualização para aprimorar seu conhecimento, de modo que possa identificar falhas quer seja no livro didático como qualquer outra fonte de consulta que venha utilizar. 5088 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 Se ponderarmos os dados coletados neta pesquisa, realizada com professores que trabalham na rede pública de ensino, conseguimos perceber que realmente é difícil passar para os alunos conceitos tão relevantes na sociedade atual, como clonagem, transgênicos, testes de DNA, projetos genoma, entre outros, se os próprios docentes mostraram-se confusos e inseguros quanto ao domínio desta temática. Assim, fica evidente a necessidade de atualização destes profissionais, bem como o desenvolvimento de materiais didáticos nesta área. Considerações Finais A Biologia encontra-se em uma era em que os conhecimentos crescem de uma maneira exponencial, tornando-se praticamente impossível para um professor apropriar-se de toda a informação disponível. Por isso acreditamos que os cursos de atualização deverão ser implementados nas escolas públicas, pois uma parte do fracasso escolar pode ser proveniente dos conflitos gerados pelos mediadores de ensino. Torna-se ainda importante destacar que muitos conceitos na área biológica são abstratos e de difícil entendimento até mesmo para os docentes, sendo extremamente necessário o desenvolvimento de recursos didáticos variados para auxiliar o processo de ensino-aprendizagem. Anexo QUESTIONÁRIO DESTINADO À PESQUISA DO CURSO “DNA E SUAS APLICAÇÕES BIOTECNOLÓGICAS” 1) Qual a diferença entre cromatina e cromossomo? 2) Nas células procarióticas, o DNA apresenta algum tipo de organização? 3) Quantas molécula de DNA temos dentro do núcleo? Existe DNA em outros locais da célula? Quais? 4) Qual a diferença da replicação nas fitas complementares do DNA? 5) O que é gene? 6) Você se alimenta de DNA? 7) O que é transgênico? Existe alguma diferença entre eles e organismos geneticamente modificados? 8) Quais os exemplos de transgênicos usados em sua aula? 9) Você já comeu algum transgênico? Caso positivo,cite-os. 10) Caso o sangue seja utilizado para o exame de paternidade, qual tipo de célula sanguínea não poderá ser utilizada? Explique. 5089 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 11) Existe alguma diferença entre biotecnologia e engenharia genética ou tecnologia do DNA recombinante? Caso haja, explique. 12) O que é plasmídio? 13) Sobre as enzimas de restrição, responda: a) Qual a origem, função e como funcionam estas enzimas? b) Por que o DNA da bactéria não é destruído por elas? 14) Qual a importância do Projeto Genoma? 15) Diferencie clonagem reprodutiva de clonagem terapêutica. 16) Quais os exemplos de clonagem usados em sua aula? Referências AMABIS, J M e MARTHO, G R. Livro Biologia, editora Moderna, 3ª edição, São Paulo, 2010. BRASIL, LDB. Lei 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em < www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/19394.htm>. Acesso em 03/04/13. CARBONI, P B e SOARES, M A M. A genética molecular no ensino médio. Disponível em <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_patricia_berticelli_carboni.pdf >, Acesso em 18/04/2013. CÉSAR, S J; SEZAR, S e CALDINI, N J. Livro Biologia, 9ª edição, editora Saraiva, São Paulo, 2010. FERREIRA, P F M e SILVA, R J. 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