José Ronaldo de Castro Souza Júnior RESTRIÇÕES AO CRESCIMENTO ECONÔMICO NO BRASIL: UMA APLICAÇÃO DO MODELO DE TRÊS HIATOS (1970-2000) Belo Horizonte, MG UFMG/CEDEPLAR 2002 José Ronaldo de Castro Souza Júnior RESTRIÇÕES AO CRESCIMENTO ECONÔMICO NO BRASIL: UMA APLICAÇÃO DO MODELO DE TRÊS HIATOS (1970-2000) Dissertação apresentada ao curso de mestrado do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Economia. Orientador: Prof. Dr. Frederico Gonzaga Jayme Júnior Belo Horizonte, MG UFMG/CEDEPLAR 2002 AGRADECIMENTOS Agradeço à minha mãe e à minha namorada pelo apoio que me deram sempre que precisei. Às minhas irmãs, ao meu pai, à minha Tia Maria Tereza e ao meu Padrinho Avelar pela confiança em mim demonstrada. Ao professor Frederico pela sua orientação e ensinamentos. À professora Viviane e ao professor Adalmir por suas ajudas e sugestões. À todos os familiares e amigos, principalmente, Andrey, Fabiano, Rutelly, Leonardo e ao pessoal da FIEMG, que participaram ativamente desta vitória. À Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mais precisamente ao Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (CEDEPLAR) pelo apoio institucional. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que disponibilizou a bolsa de estudo durante o curso de mestrado. SUMÁRIO INTRODUÇÃO .....................................................................................................................1 CAPÍTULO 1 – MODELOS DE HIATOS ...........................................................................3 1.1. O Modelo de Três Hiatos................................................................................................4 1.1.1. Hiato de Poupança .......................................................................................................4 1.1.2. Hiato de Divisas...........................................................................................................5 1.1.3. Hiato Fiscal ..................................................................................................................6 1.2. Interações entre os Três Hiatos .......................................................................................7 1.2.1. Hiatos de Poupança e de Divisas .................................................................................7 1.2.2. Hiatos de Poupança e Fiscal ........................................................................................8 1.2.3. Hiatos de Divisas e Fiscal ..........................................................................................10 1.3. A Evidência para o Brasil .............................................................................................11 1.4. O Endividamento Externo e sua Substituição por Dívida Interna ................................14 1.5. O Ajuste Externo, a Estabilidade de Preços e a Dívida Pública Interna.......................17 1.6. Notas Conclusivas.........................................................................................................18 CAPÍTULO 2 – A ECONOMIA BRASILEIRA NA DÉCADA DE 1990 .........................20 2.1. A Abertura Econômica .................................................................................................20 2.2. O Crescimento da Dívida Pública Interna ....................................................................26 2.3. Relação entre Dívida Pública Interna e Passivo Externo Líquido ................................29 CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DA ECONOMIA BRASILEIRA ATRAVÉS DO MODELO DE HIATOS.........................................................................................................................32 3.1. Considerações Metodológicas ......................................................................................32 3.1.1. Testes de Raiz Unitária ..............................................................................................32 3.1.2. Co-Integração.............................................................................................................34 3.2. Hiato Fiscal ...................................................................................................................35 3.3. Hiato de Poupança ........................................................................................................40 3.3.1. Produto Potencial .......................................................................................................41 3.3.1.1. Estimativa da Produtividade Total dos Fatores (PTF)............................................42 3.3.1.2. Estimativa do Produto Potencial.............................................................................46 3.3.2. Estimativa do Hiato de Poupança ..............................................................................47 3.3.3. Análise dos Componentes que Formam a Poupança .................................................50 3.4. Hiato de Divisas............................................................................................................51 3.4.1. Uma Versão do Modelo de Thirlwall para Países em Desenvolvimento ..................53 3.4.2. Estimativa do Hiato Externo para a Economia Brasileira, 1955-2000 ......................54 CONCLUSÕES ...................................................................................................................58 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................60 ANEXO................................................................................................................................64 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Balança Comercial Mensal de 1994 e 1995 (US$ bilhões) ..............................22 Gráfico 2 – Saldo em Transações Correntes do Balanço de Pagamentos (US$ milhões) ...23 Gráfico 3 – Passivo Externo Líquido (US$ bilhões) ...........................................................25 Gráfico 4 – Relação entre Passivo Externo Líquido e Renda de Capitais Enviada ao Exterior ................................................................................................................................25 Gráfico 5 – Dívida Interna Líquida do Setor Público (% do PIB).......................................27 Gráfico 6 – Pagamento de Juros Reais (% do PIB) .............................................................27 Gráfico 7 – Superávit Primário (% do PIB).........................................................................28 Gráfico 8 – Relação entre Dívida Pública Interna e Passivo Externo Líquido (% do PIB).30 Gráfico 9 – Investimentos Privados (IP) e Investimentos do Setor Público (IG) no período de 1970 a 2000 (R$ bilhões a preços constantes de 1998) ..................................................38 Gráfico 10 – Índice da Produtividade Total dos Fatores (PTF) 1976-2000 ........................45 Gráfico 11 – Produto Efetivo e Produto Potencial (R$ bilhões 1998).................................47 Gráfico 12 – Investimento Efetivo e IS (R$ bilhões, a preços constantes de 1998) ............48 Gráfico 13 – Hiato de Poupança ..........................................................................................49 Gráfico 14 – Taxa de Investimento 1970-2000 (a preços constantes de 1998) ...................50 Gráfico 15 – PIB Efetivo e PIB Estimado (índice 1955=100) ............................................56 Gráfico 16 – Fluxo Líquido de Capitais Estrangeiros* (índice 1955=-100) ........................57 Gráfico 1A - Taxa Selic (% ao ano)....................................................................................66 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Balança Comercial Brasileira de 1987 a 2000 (US$ milhões)...........................21 Tabela 2 – Fluxos Líquidos de Investimentos Externos (em US$ milhões)........................24 Tabela 3 – Teste de Raiz Unitária: sem intercepto nem tendência linear............................36 Tabela 4 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto sem tendência linear............................36 Tabela 5 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto e tendência linear.................................37 Tabela 6 – Teste de Co-Integração entre IG e IP * ................................................................37 Tabela 7 – Coeficientes de Correlação entre IG e IP ............................................................38 Tabela 8 – Taxas Reais de Crescimento Acumulado...........................................................45 Tabela 9 – Taxa de investimento e Custo Relativo do Investimento de 1970 a 2000 .........50 Tabela 10 – Taxas Médias de Poupança a Preços Correntes (% do PIB) – 1981/2000.......51 Tabela 11 – Teste de Raiz Unitária: sem intercepto nem tendência linear..........................54 Tabela 12 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto sem tendência linear..........................55 Tabela 13 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto e tendência linear...............................55 Tabela 14 – Teste de Co-Integração entre Y e X..................................................................56 Tabela 1A – Estoque e Fluxo de Investimento Estrangeiro Direto por Setor de Atividade 65 Tabela 2A – Necessidades de Financiamento do Setor Público ..........................................67 LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Hiatos de Poupança e de Divisas..........................................................................8 Figura 2 – Hiatos de Poupança e Fiscal (1) ...........................................................................9 Figura 3 - Hiatos de Poupança e Fiscal (2) ............................................................................9 Figura 4 – Hiatos de Divisas e Fiscal...................................................................................10 RESUMO O objetivo deste trabalho é analisar as restrições ao crescimento econômico brasileiro baseado na versão dos modelos de hiatos desenvolvida por BACHA (1990). Embora discutidos com grande freqüência no Brasil nos anos setenta e oitenta, modelos desta natureza há algum tempo têm sido pouco utilizados para analisar a economia brasileira. No entanto, em que pesem as transformações ocorridas no país a partir de 1990, com a abertura comercial e as reformas estruturais, as restrições ao crescimento econômico manifestam-se quando diminuem as disponibilidades de divisas externas, revelando que a restrição externa certamente possui um papel significativo no baixo desempenho econômico do Brasil. O modelo de três hiatos, no entanto, contribui para avaliar em que sentido, não só a restrição externa, mas também a de poupança e fiscal contribuem para este fato e aqui se pretende estimar o papel de cada uma dessas restrições ao crescimento no Brasil. O período analisado foi maior possível dada a disponibilidade de dados para a estimação (1970-2000). ABSTRACT The aim of this dissertation is to study the constraints to growth in Brazil using Gap Models first developed by BACHA (1990). Although more used in 1970s and 1980s, there is no contemporaneous discussion of Gap Models for the Brazilian Economy. Despite the structural reforms and trade liberalization after 1990, balance of payments seems to constraint economic growth in Brazil. Indeed, when capital inflows reduce, growth is constrained by foreign resources. Gap Models contribute not only to analyze external constraints to growth, but also fiscal and saving restraints to growth. The period 1970-2000 was chosen to study due to availability of data, as well as being a period in which one of each of these constraints appeared. The results confirm that economic growth in Brazil is constrained by external and saving gaps, although it was not possible to confirm that fiscal gap explains it. 1 INTRODUÇÃO O objetivo desta dissertação é o de estudar as restrições ao crescimento econômico em uma economia em desenvolvimento, especificamente o Brasil. Durante a década de oitenta a economia brasileira assistiu a uma crise sem precedentes, iniciada com o colapso do crédito externo, que havia sido fundamental na garantia do crescimento econômico desde meados dos anos sessenta. As conseqüências desta crise foram estagnação, alta inflação e desequilíbrios fiscais e monetários. Nos anos noventa, a abertura comercial e financeira, aliada a um aumento do fluxo de capitais voluntários para economias emergentes, viabilizaria a estabilização, embora não garantisse a retomada sustentada do crescimento econômico. A hipótese desta dissertação é a de que a dificuldade em recuperar o crescimento sustentado encontra nas restrições reais e financeiras a sua principal causa. Especificamente procura-se, neste trabalho, investigar o papel dos constrangimentos fiscais, de poupança e de divisas ao crescimento de longo prazo no Brasil. Após um longo período de elevado crescimento do PIB, com média anual de 7,63% entre 1955-1980, o Brasil passou por um período (1981-2000) em que o crescimento médio foi significativamente menor, 2,17%. Nos anos de maior prosperidade, entre 1955 e 1980, o crescimento esteve fortemente atrelado aos investimentos do setor público financiados pelo aumento do endividamento externo e/ou pela arrecadação de imposto inflacionário. Duas conseqüências diretas destes tipos de financiamento foram a eclosão da crise da dívida externa e a elevação das taxas de inflação na década de 1980. Estes problemas, assim como as medidas tomadas na tentativa de soluciona-los, resultaram em graves reduções nas taxas de investimento e de crescimento da economia. A redução duradoura da inflação só ocorreu após a recuperação do fluxo de capitais forâneos em 1993 e o programa de estabilização em 1994 (o Plano Real), além do aprofundamento da abertura comercial e financeira. Este último iniciado através da liberalização comercial, com a série de reduções de tarifas de importação realizadas a partir de julho de 1988 e com a eliminação de barreiras não-tarifárias, a partir de 1990; e intensificada com o aumento dos investimentos estrangeiros, verificado a partir de 1993. Porém, apesar do sucesso do plano de estabilização da economia, o crescimento continuou modesto, média de 3,04% ao ano entre 1994-2000. A fim de dar subsídios à discussão sobre as alternativas para a retomada do crescimento econômico no Brasil, este trabalho irá analisar as restrições ao crescimento baseado na versão do modelo de três hiatos desenvolvida por BACHA (1990). Embora discutidos com grande freqüência no Brasil nos anos 1970 e 1980, modelos desta natureza há algum tempo têm sido pouco utilizados para analisar a economia brasileira. No entanto, em que pesem as transformações ocorridas no país a partir de 1990, com a abertura comercial e as reformas estruturais, as restrições ao crescimento econômico se manifestam 2 quando diminuem as disponibilidades de divisas externas, revelando que a restrição externa certamente possui um papel significativo no baixo desempenho econômico do Brasil. O modelo de três hiatos, no entanto, contribui para avaliar em que sentido, não só a restrição externa, mas também a de poupança e fiscal contribuem para este fato e aqui se pretende estimar o papel de cada uma dessas restrições ao crescimento no Brasil. O período analisado foi maior possível dada a disponibilidade de dados para a estimação (1970-2000). Para se atingir o objetivo geral, que é analisar as limitações ao crescimento da economia brasileira, dividiu-se a dissertação em três capítulos, cada um com seus objetivos específicos. O primeiro capítulo dedica-se a uma descrição do modelo de três hiatos, à discussão sobre suas aplicações empíricas e os fatos estilizados que sugerem a validade deste tipo de modelo para economia brasileira. Há, também, uma discussão sobre alguns trabalhos que abordam assuntos importantes para o estudo dos atuais determinantes dos hiatos. O segundo capítulo trata das profundas mudanças ocorridas na economia do País na década de 1990, dentre as quais destacam-se a abertura econômica e o crescimento da dívida pública interna e do passivo externo líquido. O objetivo é mostrar os efeitos de tais mudanças sobre as restrições ao crescimento. O terceiro capítulo incumbe-se de apresentar os procedimentos metodológicos utilizados para a estimação das restrições e de analisar os resultados das estimativas dos hiatos fiscal, de poupança e de divisas, respectivamente. Cabe ressaltar, entretanto, que a metodologia utilizada necessita estudar cada hiato separadamente, não sendo possível determiná-los simultaneamente. Desta forma, é possível analisar o(s) hiato(s) que mais fortemente limitou(aram) o crescimento econômico em determinado ano ou período. Por último, na parte destinada às conclusões, são ressaltados os resultados mais importantes obtidos ao longo dos três capítulos antecedentes. 3 CAPÍTULO 1 – MODELOS DE HIATOS Poucos modelos de crescimento econômico foram desenvolvidos para analisar, especificamente, economias de países em desenvolvimento. Um desses modelos, o modelo de dois hiatos, foi concebido durante década de 1950 por Hollis Chenery e formalizado por CHENERY & BRUNO (1962). Neste modelo existem dois entraves importantes ao investimento e, por conseguinte, ao crescimento econômico de países em desenvolvimento, o hiato de divisas e o hiato de poupança. Chenery desenvolveu o modelo como uma tentativa de estender a formulação de Harrod-Domar, que analisava a relação entre a crescimento econômico e a oferta de poupança, incorporando o conceito de “estrangulamento externo” desenvolvido por economistas da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL) da Organização das Nações Unidas (ONU) – com destaque para Raul Prebisch.1 O modelo de dois hiatos demonstra que um país com acesso limitado ao mercado de capital internacional, usualmente por falta de credibilidade quanto à capacidade de pagamento de sua dívida, passa a ter restrições ao crescimento da economia. Isto acontece porque, ao mesmo tempo em que tem suas importações limitadas (hiato de divisas), o país transita da situação de receptor líquido de recursos para a situação em que é forçado a transferir parte da renda doméstica aos credores estrangeiros (poupança externa negativa), o que pode desestimular o processo de acumulação de capital do país devedor. Sem que haja uma elevação equivalente na poupança doméstica e/ou na produtividade do capital instalado, o envio de recursos ao exterior pode prejudicar a capacidade de crescimento do produto, quando forem esgotadas as margens de ociosidade. (FRITSCH & MODIANO, 1988). Existem diferentes formalizações teóricas do modelo além da versão de Chenery e 2 Bruno. Há, também, diversas inovações e novas versões do modelo de dois hiatos, conforme detalhado por TAYLOR (1994). Uma das mais importantes inovações é a introdução de uma terceira restrição aos investimentos, o hiato fiscal. O modelo que incorpora essa nova restrição é o modelo de três hiatos, que será descrito nas duas próximas seções com base na formalização proposta por BACHA (1990). Em seguida, serão revisadas algumas experiências empíricas dos modelos de hiatos aplicadas ao caso brasileiro, para, posteriormente, descrever fatos estilizados que sugerem a validade deste tipo de modelo para economia brasileira. Por último, serão apresentados alguns trabalhos sobre a política de estabilidade de preços e a dívida pública interna relevantes para o estudo dos atuais determinantes dos hiatos. 1 Para maiores detalhes ver, por exemplo, PREBISCH (1950). 2 Ver, por exemplo, MCKINNON (1964) e BACHA (1982). 4 1.1. O Modelo de Três Hiatos O modelo de três hiatos considera que o investimento e, conseqüentemente, o crescimento econômico podem ser limitados por restrições na disponibilidade de poupança privada, pública e externa (hiato de poupança), pela insuficiência de reservas em moedas estrangeiras (hiato de divisas) e/ou pela falta de capacidade de investimento do setor público (hiato fiscal). Desta forma, o nível máximo de investimento ( I * ) na economia será limitado pela menor das taxas de investimento impostas pelos hiatos, ou seja: I * = min{IS , IE , IT } (1.1) onde IS é o limite do investimento definido pela disponibilidade de poupança, IE aquele definido pela restrição de divisas e IT o limite definido pelo hiato fiscal. 1.1.1. Hiato de Poupança O hiato de poupança pode ter efeitos negativos sobre os investimentos produtivos quando não há uma disponibilidade adequada de poupança. Ademais, a oferta de crédito pode ser insuficiente e/ou ter custos excessivamente elevados (juros altos) para atender às necessidades de todos os setores econômicos, principalmente no que se refere a financiamentos de longo prazo. A formalização do hiato de poupança, inicia-se pela identidade macroeconômica básica: Y = C + I + (X nf − M nf ) (1.2) onde Y é o PIB, C é o consumo privado e do governo e (X nf − M nf ) são as exportações menos as importações de bens e serviços não-fatores. Da equação (1.2) obtém-se: I = (Y − C ) + (M nf − X nf ) (1.3) Do balanço de pagamentos, observa-se que: (M nf − X nf ) = (F − J ) (1.4) onde F é a entrada líquida de capitais3 e J o pagamento líquido de serviços relativos a fatores de produção. Substituindo (1.4) em (1.3): I = (Y − C ) + (F − J ) (1.5) Desagregando Y em renda privada ( Y P ) e renda do governo (T ) 4, assim como C em consumo privado ( C P ) e consumo do governo ( G ), tem-se: 3 A entrada líquida de capitais, F, inclui o fluxo de capitais compensatórios. Líquida de pagamentos de juros da dívida interna, de subsídios e de transferências ao setor privado. 4 5 I = S P + (T − G ) + (F − J ) ( (1.6) ) onde S P = Y P − C P é a poupança privada. Quando a renda atinge seu limite potencial, Y * , obtém-se o investimento máximo determinado pelo hiato de poupança: IS = S *P + (T − G ) + (F − J ) (1.7) onde S *P = Y*P − C P é a poupança privada potencial. 1.1.2. Hiato de Divisas Os países em desenvolvimento, de modo geral, possuem diversas deficiências em suas estruturas produtivas, sendo que uma das mais importantes é verificada no setor de bens de capital. Este tipo de deficiência torna-se um problema na medida em que, quanto maiores forem os investimentos em aumento da capacidade produtiva da economia em geral, maior deverá ser a oferta de divisas estrangeiras para cobrir as necessidades de importação de máquinas e equipamentos não produzidos em escala suficiente ou simplesmente não produzidos no país. Para suprir este aumento das necessidades de divisas internacionais é preciso que haja um aumento das exportações e/ou do fluxo líquido de capitais estrangeiros. Caso contrário o crescimento econômico será limitado pelo hiato de divisas. Para formalizar este argumento, as compras externas serão divididas em importações de bens de capital ( M K ) e outras importações ( M O ): M K = mI (1.8) onde 0 < m < 1 é o conteúdo importado dos investimentos. As exportações líquidas são definidas como: E = X − MO (1.9) Substituindo (1.8) e (1.9) em (1.4), obtém-se: I = (1 m )[E + (F − J )] (1.10) Assumindo E * como sendo o nível máximo das exportações líquidas determinado exogenamente pela demanda mundial, obtém-se o maior investimento possível dado o limite imposto pelo hiato de divisas: [ ] IE = (1 m ) E * + (F − J ) (1.11) Dessa maneira, E * pode ser interpretado como a capacidade máxima do esforço exportador para sustentar as importações de bens de capital e, por conseguinte, o investimento. (F − J ) representa um acréscimo a essa capacidade e m representa as 6 características da estrutura industrial do país, quanto maior seu valor, maior será a restrição imposta pelo hiato de divisas. O parâmetro m está diretamente relacionado com a elasticidade-renda das importações. MCCOMBIE & THIRLWALL (1999) destacam que países com a mesma taxa de crescimento das exportações podem ter diferentes níveis de restrição externa, uma vez que o crescimento de uma economia com a elasticidade-renda das importações elevada irá demandar aumentos das importações a taxas maiores que as de países com uma elasticidade relativamente baixa. Isto afetará, em última instância, o crescimento econômico. Para esses autores, é o hiato externo o principal limitador do crescimento econômico dos países. A explicação é que, além de ser um dos principais determinantes da capacidade de importar, o aumento das exportações induz o crescimento da demanda agregada através do efeito multiplicador de Harrod. 1.1.3. Hiato Fiscal A restrição fiscal baseia-se na hipótese de que os investimentos estatais, em infraestrutura e indústrias básicas, desempenham papel central nas economias em desenvolvimento. A formalização desse conceito inicia-se com a divisão dos investimentos em privados ( I P ) e do governo ( I G ): I = I P + IG (1.12) onde: _ I P = I + k * ⋅ I G , sendo k * > 0 (1.13) De acordo com a equação (1.13), o investimento privado é função do investimento público e k * é o coeficiente que determina a dimensão desse efeito crowding in. Substituindo a equação (1.12) em (1.6), obtém-se: I G = (S P − I P ) + (T − G ) + (F − J ) (1.14) onde se supõe que toda entrada líquida de recursos ( F ) é destinada para financiar o orçamento do governo e que todo o pagamento líquido de serviços relativos a fatores de produção ( J ) é realizado com a receita do governo. Para financiar seu déficit orçamentário, o governo utiliza a captação do excedente da poupança privada (S P − I P ) através do imposto inflacionário ( ii ) e da emissão de títulos da dívida pública ( ∆B )5: 5 Em regimes de câmbio fixo, quando o governo se financia com a emissão monetária, os agentes utilizam o excesso de moeda para comprar divisas internacionais, e o déficit acaba sendo financiado pela redução de reservas do Banco Central. Até o ponto em que as reservas acabam e há um ataque especulativo. (KRUGMAN, 1995). 7 (S P − I P ) = ii + ∆B (1.15) Substituindo (15) em (14) e seu resultado em (12), além disso, substituindo (13) em (12), encontra-se o investimento máximo permitido pelo hiato fiscal: _ ( ) IT = I + 1 + k * [ii + ∆B + (F − J ) + (T − G )] (1.16) A introdução do hiato fiscal no modelo abre a possibilidade de que o investimento total fique aquém do nível permitido pelos hiatos de poupança e de divisas. Se houver algum problema no financiamento das despesas do governo que restrinja seus investimentos, o investimento da economia como um todo será prejudicado. 1.2. Interações entre os Três Hiatos As interações entre as três restrições ao crescimento econômico são resultantes da inter-relação entre as diversas variáveis macroeconômicas que afetam, de maneira diferenciada, a formação de poupança, o acúmulo (ou perda) de reservas internacionais e os investimentos do setor público. Inicialmente, serão analisadas as relações entre os hiatos de poupança e externo, que é objeto de estudo do tradicional modelo de dois hiatos. Depois, serão analisadas as relações entre os hiatos de poupança e fiscal e entre os hiatos externo e fiscal. 1.2.1. Hiatos de Poupança e de Divisas A interação entre o investimento e o fluxo líquido de capitais estrangeiros (definido pela diferença entre a entrada líquida de capitais e o pagamento líquido de serviços relativos a fatores de produção) é ilustrada pela Figura 1, onde o fluxo líquido de capitais é representado no eixo horizontal e o investimento é no eixo vertical. O hiato de poupança da equação (1.7) é representado pela curva IS e o hiato de divisas, da equação (1.11), pela curva IE. Sendo 0 < m < 1 , (1 m ) > 1 , a inclinação da curva IE é maior que a inclinação de IS e, assumindo que (1 m )E < S *P + (T − G ) , garante-se que, se (F − J ) = 0 , a restrição externa prevalece. 8 Figura 1 – Hiatos de Poupança e de Divisas I IE IS I I IIII IS III IE I IE (F-J) II (F-J)I F-J Como ilustrado na Figura 1, quando o fluxo líquido de capitais estrangeiros é igual a (F − J )' , o investimento é limitado tanto pela restrição de poupança como pela restrição de divisas. Caso haja uma redução do fluxo de capitais, para (F − J )' ' , o investimento cai de I’ para I’’, de acordo com o hiato de divisas. Desta maneira, o investimento fica aquém do máximo determinado pelo hiato de poupança. Haverá, por conseqüência, um ajuste aos moldes keynesianos, no qual o nível de produto ficaria abaixo de seu potencial, sendo determinado pela demanda agregada por bens nacionais. No médio prazo, se o país possuir um parque industrial significativo, as exportações industriais poderão crescer até que o produto alcance seu nível potencial. O resultado é uma recuperação parcial do investimento, de I’’ para I’’’, onde a restrição de poupança é novamente ativa. 1.2.2. Hiatos de Poupança e Fiscal As interações entre os hiatos de poupança e fiscal serão, inicialmente, analisadas através da Figura 2, onde o investimento é representado pelo eixo vertical e a taxa de inflação pelo eixo horizontal. A curva IS é a restrição de poupança, dada pela equação (1.7), e a curva IT é a restrição fiscal, dada pela equação (1.16). Suponha que essas duas restrições prevaleçam sobre a economia, com o investimento I’ e a inflação p’. Se houver uma redução do fluxo de capitais (F − J ) , ambas as curvas são deslocadas para baixo, de IS’ para IS’’ e de IT’ para IT’’. Como k * + 1 > 1 , o deslocamento da curva IT é maior. À taxa inicial de inflação, p’, a restrição ( ) fiscal torna-se ativa e o investimento cai para I’’, gerando uma capacidade ociosa. A fim de recuperar o crescimento, a melhor opção de política econômica seria o aumento do superávit primário das contas públicas. Assim, IS e IT voltariam para suas 9 posições originais, devido à recomposição das capacidades de poupança e de investimento do governo. Uma segunda opção para recuperar o crescimento da economia seria o financiamento dos investimentos do setor público através de imposto inflacionário. Com isto, haveria um deslocamento ao longo da curva IT’’ até o máximo permitido por IS’’, com a recuperação parcial do investimento e o aumento da inflação. Figura 2 – Hiatos de Poupança e Fiscal (1) I I II IS I IIII IS II I I I IT IT p I II II p Considere agora um aumento na entrada líquida de capitais externos, de (F − J )' para (F − J )' ' , conforme ilustrado na Figura 3 – em que o investimento fica no eixo vertical e fluxo de capitais no eixo horizontal. Neste caso, o hiato de poupança passa a prevalecer – o investimento eleva-se para I’’, e não para I’’’, como possibilitado pelo hiato fiscal. Uma alternativa que poderia gerar benefícios para toda sociedade é a utilização de parte do aumento da entrada de capitais para reduzir a senhoriagem. Isto permitiria uma redução da inflação e, posteriormente, a liberação de poupança privada para financiar investimentos. Tais resultados correspondem a um deslocamento da restrição fiscal, de IT para IT’. Figura 3 - Hiatos de Poupança e Fiscal (2) I IT I IT I III IS II I I I IS IT (F-J) I II (F-J) F-J 10 1.2.3. Hiatos de Divisas e Fiscal A Figura 4 demonstra a interação entre o hiato de divisas (IE) e o hiato fiscal (IT). As inclinações destas curvas dependem dos coeficientes k* e m. Nesta figura, supõe-se que o país em análise encontra-se em estágio relativamente avançado de industrialização e tem grande participação do Estado na economia. Portanto, m é menor que k* , de forma que (1 m) > 1 + k * e a curva IE apresenta uma inclinação maior que a curva IT. Figura 4 – Hiatos de Divisas e Fiscal I IE IT I I IIII IT III IEI IE (F-J)II (F-J)I F-J Caso ocorra uma redução da entrada líquida de capitais estrangeiros, de (F − J )' para (F − J )' ' , o investimento também será reduzido, de I’ para I’’, devido à restrição de divisas. Segundo BACHA (1990), uma seqüência típica de eventos seria: primeiro, o governo deixaria as reservas internacionais diminuírem (o que traria F − J temporariamente para a direita); depois, quando as reservas estivessem exauridas, o investimento do setor público seria reduzido e seria implantado um controle sobre o câmbio. Com isso, haveria uma redução do investimento privado, levando o investimento total para I’’, ao longo da curva IE. A próxima etapa consistiria num aumento das exportações. O fato do coeficiente m ser relativamente pequeno indica que esta é uma economia em desenvolvimento relativamente avançada. Logo, seria possível expandir as exportações industriais e deslocar a curva IE para IE’, permitindo uma recuperação parcial do investimento. 11 1.3. A Evidência para o Brasil Estudos empíricos sobre a economia brasileira que utilizam os modelos de hiatos datam de diferentes períodos. MEIRA (1983), com base no modelo de dois hiatos, conclui que o fator que limitou as possibilidades de crescimento da economia brasileira no período de 1965-80 foi a restrição de divisas. O argumento teórico utilizado parte do ponto de que, quanto maior for o crescimento do produto potencial, maior deverá ser a oferta de divisas estrangeiras para cobrir as necessidades de importação de máquinas, equipamentos e insumos básicos; dadas as deficiências dos setores de bens de produção e de bens intermediários brasileiros. Cabe ressaltar que esse argumento é válido até hoje, devido às elevadas elasticidades das importações em relação produto.6 FRITSCH & MODIANO (1988) descrevem que o Brasil – país que absorvia recursos reais do exterior até 1982, quando houve a interrupção dos fluxos de empréstimos voluntários – passou a ter restrições ao crescimento da economia. Inicialmente, porque teve suas importações limitadas pela restrição de divisas, sendo forçado, nos anos posteriores, a transferir parte da renda doméstica aos credores estrangeiros através de expressivos superávits comerciais para cumprir os pagamentos de juros da dívida externa. Com base em uma aplicação empírica do modelo de dois hiatos, FRITSCH & MODIANO (1988) concluem que, como não houve uma elevação equivalente na poupança doméstica e/ou na produtividade do capital instalado, o envio de recursos ao exterior prejudicou a capacidade de crescimento do produto quando foram esgotadas as margens de ociosidade em 1986. Baseados em cenários projetados para a economia brasileira, na ausência de novos empréstimos externos, a economia deveria crescer modestamente em 1987, recuperando-se até o fim da década, embora sempre restrita pelo hiato de divisas. Para a década de 1990, o modelo previa que, mesmo com um aumento da poupança doméstica e sob cenários estáveis da evolução da economia mundial, o crescimento brasileiro deveria continuar a ser limitado pela disponibilidade de divisas. No caso da economia brasileira na década de 1980, ALMEIDA NETO (1991) faz um estudo com base no modelo de três hiatos descrito na seção anterior. Este estudo demonstra que, até 1982, nenhuma restrição ao investimento era ativa. Em 1983, o hiato de divisas torna-se ativo, ou seja, a escassez de divisas passa a limitar os investimentos. A partir de 1984, no entanto, esta restrição deixa de ser atuante devido à melhora das contas externas. De 1985 a 86 há uma piora do hiato de poupança e uma piora ainda maior do hiato fiscal, restrição atuante no período. No entanto, a partir de 1987, há um relaxamento 6 A diferença é que, atualmente, a elasticidade-renda é ainda maior para bens de consumo duráveis. (CARNEIRO, 2001). 12 das restrições e o modelo passa a ser insuficiente para explicar a manutenção de baixas taxas de investimentos no período de 1987 a 89. 7 Alguns trabalhos dão destaque especial à restrição de poupança. No modelo de três hiatos apresentado por CÂNDIDO JÚNIOR (1998), a taxa de poupança é considerada o centro da análise, sendo que as demais restrições – fiscal e de divisas – são “transformadas” em restrições de poupança pública e de poupança externa. No entanto, as poupanças pública e externa já eram levadas em consideração na determinação do hiato de poupança, como é possível ver na equação (1.7). O que esse trabalho faz, portanto, é desconsiderar os possíveis efeitos identificados pelo modelo de três hiatos analisado nas seções anteriores das restrições fiscal e de divisas, conforme as equações (1.11) e (1.16). De acordo com as simulações para 1998-2006, o autor sugere uma restrição ao crescimento econômico até o máximo de 4% ao ano devido aos baixos níveis de poupança. Para a redução desse hiato seria necessária a adoção de reformas fiscais (tributária e previdenciária), uma vez que a principal restrição ao crescimento da poupança doméstica seria a fiscal. Deixando de lado a restrição externa, ALÉM & GIAMBIAGI (1997) fazem uma análise quantitativa da importância da restrição de poupança para a retomada do crescimento a taxas mais elevadas. Esse trabalho mostra que, após apresentar um aumento na segunda metade dos anos 1980 devido à queda do salário real, a taxa de poupança privada voltou a cair com a implementação do Plano Real em 1994.8 Isso ocorreu principalmente porque, com a redução do imposto inflacionário, houve um significativo crescimento do consumo privado. A fim de mensurar o trade-off entre consumo e investimento, foram feitas algumas simulações onde se demonstrou que, quanto maior for o esforço inicial de poupança, maior será a taxa de crescimento, não só do PIB, mas do próprio consumo no longo prazo. Os autores ressaltam que não se trata de diminuir o consumo, que continuaria a aumentar em valores absolutos, mas somente de fazer com que o mesmo se torne menor como proporção do PIB. O argumento de ALÉM & GIAMBIAGI (1997) é que há evidências concretas de que o Brasil não apresenta capacidade ociosa em escala suficiente para viabilizar novos investimentos sem a contenção do aumento do consumo. Esses autores baseiam-se na estimativa de CARVALHO (1996) sobre a evolução do hiato de produto em relação ao seu produto potencial. De acordo com esta estimativa, a ocupação da capacidade atingiu o máximo em 1986 e, devido aos baixos níveis de investimentos observados desde então, 7 Cabe ressaltar que esse estudo possui diversas limitações no que se refere aos dados e às técnicas econométricas utilizadas. Foram estimadas regressões através do método dos Mínimos Quadrados Ordinários sem considerar a possibilidade das séries temporais utilizadas terem ou não raiz unitária. 8 No período pós-real, houve também uma redução da poupança do governo e um aumento da poupança externa. 13 mesmo o nível mais baixo de ocupação (de 93% em 1990) pode ser considerado relativamente alto. Já no ano de 1995 (último ano da série estimada), o nível de ocupação atinge 98%. Utilizando uma metodologia diferente, SILVA FILHO (2001) estima que o PIB atingiu níveis próximos aos do produto potencial nos anos de 1995, 1996 e, principalmente, 1997. É razoável concluir, face à pequena margem de ociosidade, que o aumento do investimento não pode ser efetivado sem um esforço simultâneo para limitar o crescimento do consumo, ou seja, conclui-se que a restrição de poupança estava afetando o crescimento potencial da economia. Conforme destacado anteriormente, existem diversos estudos sobre a economia brasileira que utilizam os modelos de hiatos. Entretanto, as profundas mudanças sofridas pela economia brasileira, principalmente após a introdução do Plano Real em de 1994, justificam uma reavaliação das causas dos hiatos e de suas conseqüências sobre o investimento e o crescimento econômico. Dentre as causas dos hiatos encontradas nos estudos anteriores, pode-se destacar o problema da dívida externa, sobretudo a pública, que causaria o hiato de divisas; a baixa taxa de poupança, que causaria o hiato de poupança; e a piora das contas fiscais, que limitara os investimentos do governo gerando o hiato fiscal. No período de 1994 a 2000, a principal causa da restrição de divisas passa a ser o grande passivo externo líquido 9, que gera uma saída significativa de divisas e do qual a dívida pública externa é apenas um dos componentes. A restrição de poupança é determinada, sobretudo, pela redução da poupança privada e pela elevação da dívida pública interna, que gera necessidades de financiamento do setor público cada vez maiores e, como conseqüência, pressões sobre a escassa poupança privada. Isto significa que, no lugar de financiar os investimentos produtivos privados (fundamentais para o crescimento econômico), a poupança privada interna está financiando o déficit público (poupança pública negativa). Dessa forma, a questão fiscal é importante para explicar a baixa taxa de investimento, através da piora do hiato de poupança. Contudo, a validade do conceito de hiato fiscal é colocada em questão. Isto porque, neste período, houve uma redefinição do papel do governo na economia, que deixou de ser o principal investidor, uma vez que os investimentos privados deixaram de depender tanto dos investimentos do governo como no passado – hipótese básica para a validade do hiato fiscal. 9 Passivo externo líquido é a soma da dívida externa líquida (dívida bruta subtraídas as reservas em moeda estrangeira) com o estoque de capital estrangeiro (incluindo portifólio) líquido do estoque de capital brasileiro no exterior. 14 1.4. O Endividamento Externo e sua Substituição por Dívida Interna A capacidade de pagamento da dívida pública externa de um país é determinada por dois fatores: a restrição orçamentária do setor público e o balanço de pagamentos. O primeiro é definido pela diferença entre a geração de receitas (superávit primário, crescimento da dívida interna líquida, empréstimos externos, ganhos de senhoriagem e com juros das reservas internacionais) e a absorção de recursos (juros da dívida interna e acumulação de reservas cambiais). O segundo fator é definido pela diferença entre a geração de divisas (superávit na balança de bens e serviços não-fatores, juros das reservas cambiais e dos haveres externos do setor privado, transferências unilaterais líquidas recebidas, investimentos e financiamentos estrangeiros líquidos) e a perda de divisas em moeda estrangeira (déficit na balança de bens e serviços não-fatores, serviço da dívida externa, remessa líquida de lucros e dividendos, investimentos líquidos de residentes no exterior, aumento das reservas internacionais e dos haveres externos). Isto pode ser formalizado na seguinte equação: (R − G ) − I g − iB ib + i h H i − i * EB * + i h* EH * = −dM + ( ) [( + d H i − B ib + d E H * − B * )] (1.16) onde: d = diferencial R = receitas do setor público líquidas de transferências e de subsídios ao setor privado, exclusive receitas de juros G = consumo do setor público I g = investimento do setor público i = taxa de juros nominal da dívida pública B ib = dívida pública interna bruta i h = taxa de juros nominal dos haveres públicos internos H i = haveres internos do setor público i * = taxa de juros nominal da dívida pública externa E = taxa de câmbio (R$/US$) B * = dívida externa do setor público (em US$) i h* = taxa de juros nominal dos haveres públicos externos H * = haveres externos do setor público (em US$) M = base monetária O lado esquerdo da equação (1.16) representa as receitas e despesas do setor público, ao passo que o lado direito demonstra como o saldo dessas contas é financiado nos mercados interno e externo. (MEYER e GONZALEZ, 1994). 15 Em meados da década de 70, a economia mundial enfrentava sérios problemas gerados pela primeira crise do petróleo. O Brasil também sofreu pressões devido ao aumento do valor das importações, causado pela alta no preço do petróleo, e ainda teve suas exportações prejudicadas pela queda no crescimento econômico mundial. Não obstante estas adversidades, o país optou por continuar a crescer com base em investimentos estatais – definidos pelo Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND) – e seus efeitos de crowding-in, o que só foi possível dada a grande oferta de crédito externo a juros baixos (os bancos europeus estavam repletos dos chamados petrodólares).10 Através do endividamento externo, o país conseguiu superar as restrição de divisas e a restrição fiscal, evitando que a crise de 1974 gerasse uma recessão, e pôde obter elevadas taxas de crescimento econômico. Isso foi possível até 1980. A partir de 1981, a economia brasileira assistiu à redução de sua taxa de crescimento devido ao “fechamento” do mercado internacional de capital aos países em desenvolvimento e à conseqüente queda dos investimentos estatais. Ou seja, o hiato de divisas gerou o hiato fiscal, dado que os empréstimos externos financiavam boa parte dos investimentos do setor público, e estes foram os primeiros determinantes para a piora do desempenho da economia brasileira. O fechamento do mercado financeiro internacional teve início com a elevação das taxas de juros americanas em 1979, após o segundo choque do petróleo, que também resultou em uma deterioração das relações de troca do Brasil (ao aumentar ainda mais o valor das importações de petróleo). As taxas de juros internacionais também aumentaram, atingindo o recorde histórico em 1981, fazendo com que o custo da dívida externa, que já consumia grande parte das exportações, aumentasse significativamente. Ainda assim, foi possível financiar o pagamento dos juros com a contratação de novos empréstimos até 1982, quando a moratória do México marcou o agravamento da crise de confiança quanto à capacidade de pagamento da dívida, reduzindo bruscamente o crédito aos países em desenvolvimento. Com o objetivo de conter o desequilíbrio das transações correntes, o Governo implementou, já em 1981, políticas de estímulo às exportações e de desestímulo às importações. Foram utilizadas políticas monetárias contracionistas para conter a demanda agregada e a política cambial agressiva para reduzir o déficit em conta corrente.11 Em outras palavras, o Governo teve que forçar a redução da absorção interna (consumo e 10 Foi esse o segundo grande impulso ao endividamento externo brasileiro (o primeiro foi no período de 1969-73, quando os empréstimos tiveram como contrapartida principal a formação de reservas). (CRUZ, 1984). 11 A desvalorização do câmbio teve efeitos negativos sobre as contas públicas, pois a dívida externa, medida em moeda local, aumentava na mesma proporção da desvalorização. Esse efeito foi potencializado devido ao aumento da participação do setor público no endividamento externo total causado pelo processo de estatização da dívida (iniciado na década de 70 e agravado no início dos anos 80) (CRUZ, 1993). 16 investimento) para que fossem gerados excedentes comerciais capazes de atender à necessidade de pagamento de juros. O resultado foi que a taxa de crescimento do PIB caiu de 7,2% em 1980 para -1,6% em 1981 e o saldo comercial tornou-se positivo em mais de um bilhão de dólares. Porém, esse saldo positivo não foi suficiente para equilibrar as contas externas, o que conduziu a uma crise cambial grave já no final de 1982. Somente a partir de 1983, o Brasil conseguiu obter elevados superávits comerciais, que passaram a financiar parte significativa da transferência de recursos ao exterior (CAVALCANTI, 1988; REIS et al, 1988). O fim dos créditos voluntários levou o Brasil a renegociar com os agentes internacionais (bancos, FMI e Clube de Paris) o endividamento externo. CAVALCANTI (1988) analisa todas as etapas do refinanciamento da dívida no Banco Central, instituição que executou a tarefa de intermediária no processo de renegociação. Os acordos firmados englobavam três tipos de operação: obtenção de recursos novos (também chamados de “dinheiro novo”); reescalonamento de amortizações do principal; prorrogamento de linhas comerciais de curto prazo e de linhas interbancárias. O Governo, como maior devedor em moeda estrangeira, teve dificuldades para financiar a transferência de recursos ao exterior somente com o corte de gastos e de investimentos. Por este motivo, foi forçado a recorrer à poupança privada por meio de lançamento de títulos públicos e/ou expansão monetária. Para evitar que essa pressão fosse refletida em expansão monetária, o que poderia prejudicar a obtenção dos elevados superávits comerciais tão importantes no momento, o Governo viu-se obrigado a aumentar significativamente sua dívida interna. Foi assim que se deu, grosso modo, a substituição de dívida externa por dívida interna. Sendo a poupança privada utilizada crescentemente para compra de títulos públicos, houve uma forte pressão sobre o mercado financeiro nacional, que se refletiu em aumento da taxa de juros e, por conseguinte, em desequilíbrio no orçamento público, pelo fato de que as despesas com juros aumentaram com a elevação das taxas (realimentando assim o endividamento interno). Uma conseqüência grave desse hiato de poupança foi a redução dos investimentos públicos e privados, que vieram a comprometer o crescimento econômico no médio prazo. Segundo WERNECK (1987), a retomada do crescimento dependeria da disponibilidade de poupança que permitisse o financiamento adequado da recuperação da taxa agregada de investimento, o que só seria possível através do restabelecimento da capacidade de geração de poupança do setor estatal. Fica claro, portanto, que a melhora observada nas contas externas, gerada pelos mega-superávits comerciais, foi obtida com um indesejado desajuste interno. Apesar dessa melhora nas contas externas, o Governo prosseguiu em um longo processo de renegociação da dívida com as instituições financeiras internacionais, durante o qual o País nunca cumpria as metas estabelecidas nos acordos, principalmente no que se 17 refere aos resultados das contas públicas. Em julho de 1989, o Brasil suspendeu os pagamentos dos juros da dívida externa contratada junto a bancos privados estrangeiros, por causa de uma grave crise cambial que provocou uma fuga expressiva de capital. Foi quando o Governo americano lançou um programa de securitização da dívida externa de países severamente endividados, chamado de Plano Brady, iniciado com a reestruturação da dívida mexicana no mesmo ano. Devido às adversidades políticas presentes durante o período, as negociações com o Brasil demoraram até abril de 1994, quando foi concluído o acordo para a troca da dívida velha por títulos com 30 anos de maturidade (chamados de Brady Bonds ou Bradies), garantidos pelos Zero-cupon bonds do Tesouro norte-americano. Além de ter conseguido a adesão de mais de 97% dos bancos credores, esse acordo teve a vantagem de não impor o monitoramento formal por parte de instituições multilaterais (CARNEIRO, p. 21 e 22, 1996). 1.5. O Ajuste Externo, a Estabilidade de Preços e a Dívida Pública Interna A solução de pendências financeiras externas foi vista por MEYER & BATISTA Jr. (1990) como fundamental para o sucesso de um plano de combate à inflação. E, de fato, o bem sucedido Plano Real foi precedido da reestruturação da dívida externa com o Plano Brady e, também, do importante retorno do fluxo de capitais voluntários estrangeiros às chamadas economias emergentes. Esses autores utilizam vários argumentos para sustentar sua teoria. O primeiro é que as pendências externas dificultam a acumulação de reservas em moeda estrangeira necessárias para dar estabilidade ao valor externo da moeda nacional. Sem a redução dos pagamentos ao exterior, a sustentação do nível de reservas tende a ser conseguida através de freqüentes desvalorizações reais do câmbio, o que estimula o crescimento da inflação, acabando com a estabilidade monetária interna. O segundo argumento é o de que a margem de manobra da política de combate à inflação é influenciada pela possibilidade de complementar a oferta doméstica de bens com as importações. Dessa maneira, é possível perceber a importância da resolução do problema do hiato de divisas, não só para o crescimento, mas também para a estabilização da economia. Por último, os autores argumentam que o serviço da dívida prejudica o reequilíbrio financeiro do setor público, tão necessário para um programa de estabilização. BEVILAQUA & WERNECK (1997) consideram que o sucesso do Plano Real foi conseguido em parte devido às condições fiscais favoráveis que permitiram ao setor público obter um superávit primário de aproximadamente 5,3% do PIB em 1994. Esta situação favorável das contas públicas não durou por muito tempo, uma vez que, em 1995, o superávit primário caiu para 0,3% do PIB e, em 1996, o setor público teve um déficit primário de 0,1% do PIB. 18 A combinação da política de juros altos com a ausência de uma política fiscal restritiva teve como conseqüência o agravamento do problema da dívida pública interna líquida. A política de juros altos foi utilizada intensamente no período de alta inflação da década de 80 e início da década de 90, juntamente com o mecanismo de correção monetária, a fim de evitar a hiperinflação. Entretanto, mesmo com o sucesso do plano de estabilização em meados de 1994, o governo teve que manter a política de juros elevados. Inicialmente, o objetivo era conter o excesso de demanda agregada – ao mesmo tempo em que garantia um maior fluxo de capitais estrangeiros – gerado pelo aumento do consumo (logo após a queda brusca da inflação) e pela a piora das contas públicas em 1995 [BEVILAQUA & WERNECK (1998)]. Esse crescimento da demanda agregada poderia ter gerado a volta da inflação, no lugar de um crescimento maior da economia. Essa é, portanto, uma indicação de que o hiato de poupança limitou o crescimento, haja visto que a taxa de ocupação da capacidade produtiva, segundo SILVA FILHO (2001), atingiu níveis próximos à taxa máxima no período de 1995 a 97. Trabalhos que utilizam metodologias, períodos e variáveis diferentes como SILVA & CAVALCANTI (2000) e BEVILAQUA & GARCIA (1999), entre outros, destacam a taxa de juros como o fator mais importante para o crescimento da dívida. Porém, o crescimento da dívida interna líquida deve-se também a outros motivos como o aparecimento de passivos contingentes (esqueletos)12 e a desvalorização cambial, que aumentou bruscamente a dívida indexada ao dólar. 1.6. Notas Conclusivas Primeiramente, neste capítulo, foi apresentado o modelo teórico dos três hiatos, em seguida, foram apresentados trabalhos empíricos sobre esse tipo de modelo e evidências históricas da presença dos hiatos na economia brasileira. Como foi possível observar nas seções anteriores, há uma vasta literatura sobre o endividamento externo do período que cobre a década de 70 até a renegociação de 1994. A transferência de dívida externa para dívida interna na década de 80 também está bem detalhada pela literatura.13 No que se refere ao agravamento do endividamento interno a partir de 1994, existem diversos trabalhos que tratam de diferentes aspectos do problema. De acordo com a abordagem proposta no presente trabalho, o aumento da dívida pública interna seria o principal fator de pressão sobre a poupança privada e, por conseguinte, sobre a disponibilidade de recursos para financiamentos ao setor privado. 12 “Passivos contingentes (esqueletos) correspondem a dívidas juridicamente reconhecidas pelo Governo, de valor certo, e representativas de déficits passados não contabilizados (o efeito econômico já ocorreu no passado)”. (BANCO CENTRAL DO BRASIL, p. 90, 2000). 13 Ver CAVALCANTI (1988). 19 Dessa maneira, é reconhecida a importância do problema fiscal como entrave ao crescimento econômico, mas o mesmo é analisado de um modo diferente do proposto no modelo de três hiatos. Dentro dessa proposta de explicar os novos determinantes dos hiatos, as grandes lacunas da literatura estão na falta de trabalhos que tratem do problema do passivo externo e que expliquem a relação entre as dinâmicas desse passivo e da dívida interna do setor público no período de 1994 a 2000 e de que maneira esses dois problemas podem afetar o desempenho da economia brasileira.14 A fim de contribuir para preencher essas lacunas da literatura, no próximo capítulo, será feita uma discussão sobre o crescimento do passivo externo líquido e a dívida pública interna com base nos dados de algumas das principais variáveis relacionadas com estes problemas; e, no capítulo posterior, será desenvolvida uma aplicação empírica do modelo de hiatos para a economia brasileira no período de 1970-2000 com o objetivo de esclarecer quais foram as principais restrições ao crescimento da economia brasileira nesse período. 14 A maior parte dos trabalhos que se refere à questão das contas externas trata apenas do problema da dívida externa, um dos poucos trabalhos que utiliza dados sobre o passivo externo é o GIAMBIAGI (1997). 20 CAPÍTULO 2 – A ECONOMIA BRASILEIRA NA DÉCADA DE 1990 Antes de proceder à análise do modelo de hiatos sobre as restrições ao crescimento da economia brasileira, é fundamental levar em consideração algumas importantes mudanças que ocorreram no final da década de 1980 e ao longo de toda década de 1990 na economia brasileira. Nesse sentido, primeiro, serão descritos os impactos da abertura econômica – caracterizada pelo aumento da comercialização de bens e serviços com o exterior e pelo aumento do fluxo de investimentos estrangeiros – sobre a necessidade de divisas e sobre a poupança externa do Brasil. Em seguida, será discutido o significativo crescimento da dívida pública interna, que resultou num expressivo aumento das despesas do governo com juros e na conseqüente deterioração da poupança pública. Finalmente, será descrita a relação entre o passivo externo líquido e a dívida pública interna, fator de importância singular na discussão sobre os impedimentos ao crescimento econômico no Brasil. Com isso, será possível definir de que maneira os problemas determinantes dos hiatos de poupança e externo estão interligados entre si e qual é a origem e o papel de cada um. 2.1. A Abertura Econômica O processo de abertura econômica foi deflagrado a partir da liberalização comercial brasileira, iniciada com as reformas tarifárias de julho de 1988 e setembro de 1989. Em 1990, a liberalização foi intensificada com a eliminação das barreiras não-tarifárias, como o Anexo C (suspensão de guias de importação para certos produtos), as quotas de importação das empresas e os regimes especiais de importação. Com o mesmo objetivo, a partir de 1991, foi efetuada uma série de reduções tarifárias. (PINHEIRO & ALMEIDA, 1994). Apesar do impacto inicial da liberalização comercial verificado em 1989 e 1990, as importações brasileiras mantiveram-se em torno de US$ 20,7 bilhões nos 2 anos seguintes, 1990 e 1992, conforme se pode observar na Tabela 1. KUME (1996) destaca que esse desempenho das importações pode ser explicado por três fatores: ambiente macroeconômico recessivo, câmbio subvalorizado e aumento de produtividade da indústria nacional. Nos anos de 1988 e 1992, quando houve crescimentos negativos do PIB (-0,06% e -4.35%, respectivamente), verificou-se uma redução das importações. Isto mostra que o ambiente macroeconômico recessivo foi o fator preponderante para determinar o comportamento das importações brasileiras do período. Somente a partir de 1993 as compras externas passam a apresentar crescimento elevado, embora a balança comercial ainda tenha obtido um significativo saldo positivo até 1994. 21 Tabela 1 – Balança Comercial Brasileira de 1987 a 2000 (US$ milhões) Ano Exportações Importações Saldo Comercial 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 26.224 33.789 34.383 31.414 31.620 35.793 38.555 43.545 46.506 47.747 52.994 51.140 48.011 55.086 15.051 14.605 18.263 20.661 21.041 20.554 25.256 33.079 49.972 53.346 59.744 57.749 49.296 55.816 11.173 19.184 16.119 10.752 10.580 15.239 13.299 10.467 -3.466 -5.599 -6.750 -6.609 -1.284 -730 Fonte: Banco Central do Brasil. A partir de 1994, as políticas comercial e cambial passaram por novas e significativas mudanças que colaboraram ainda mais para uma maior integração econômica do Brasil com o resto do mundo, ao mesmo tempo em que ampliaram o espaço para o aumento da vulnerabilidade externa.15 A reestruturação da dívida externa em abril de 1994 e a acumulação de reservas internacionais – obtida, principalmente, devido aos sucessivos superávits – permitiram que a política cambial, juntamente com a liberalização comercial, servisse como “âncora” no combate à inflação. Estas duas medidas resultaram na redução dos preços dos produtos importados e, conseqüentemente, na maior exposição dos produtos nacionais à concorrência com os produtos importados, inibindo os aumentos dos preços internos. No que concerne à política comercial, o governo efetuou uma nova redução de tarifas, principalmente de insumos e bens de consumo com peso significativo nos índices de preços, e antecipou para setembro de 1994 a adoção da tarifa externa comum do Mercosul (TEC).16 15 O aumento da vulnerabilidade externa pode ser entendido como o aumento da relação déficit (em Conta Corrente do Balanço de Pagamentos)/PIB. 16 Sem que o governo brasileiro utilizasse a Lista de Exceção Nacional, que dava um prazo de cinco anos para a convergência da tarifa nacional de determinados bens para a TEC. (KUME, 1996). 22 Ao mesmo tempo em que foram reduzidas as restrições às importações, o Banco Central adotou uma política cambial não intervencionista, deixando que a forte entrada de capitais estrangeiros no País – motivada pelas boas perspectivas para economia brasileira, pelas privatizações e pelo aumento do fluxo mundial de capitais para países em desenvolvimento – causasse a sobrevalorização do real frente ao dólar. Inicialmente, quando a nova moeda foi lançada, a paridade do real em relação ao dólar era de um para um. Contudo, a valorização da moeda nacional levou a taxa de câmbio para R$0,846/US$ em outubro de 1994. A valorização da taxa de câmbio, além de estimular as importações (tornando-as mais baratas), teve efeito negativo sobre as exportações. O resultado final dessas políticas um déficit comercial de US$ 408 milhões em novembro de 1994, após longo período de superávit – como pode ser visto na Gráfico 1 e na Tabela 1. Gráfico 1 – Balança Comercial Mensal de 1994 e 1995 (US$ bilhões) 6000 5000 4000 3000 2000 1000 0 -1000 Importações Exportações dez/95 nov/95 out/95 set/95 jul/95 ago/95 jun/95 mai/95 abr/95 mar/95 fev/95 jan/95 dez/94 nov/94 out/94 set/94 ago/94 jul/94 jun/94 mai/94 abr/94 mar/94 fev/94 jan/94 -2000 Sado Comercial Fonte: Banco Central do Brasil. A deterioração da balança comercial foi um dos principais motivos que levaram o saldo em conta corrente do Balanço de Pagamentos, que apresentava apenas um pequeno déficit em 1993 e 94, a apresentar significativos déficits nos anos seguintes, conforme demonstrado na Gráfico 2. Com a deterioração do resultado em Conta Corrente, houve também um aumento da dependência de capitais externos para equilibrar o Balanço de Pagamentos. Boa parte dos crescentes déficits em conta corrente foi financiada pela entrada de investimentos estrangeiros no País. A Tabela 2 mostra o significativo aumento dos investimentos a partir 23 de meados da década de 1990. O fluxo líquido de capitais estrangeiros passou de valores extremamente baixos no início da década para valores nunca antes observados no Brasil. É importante destacar que, apesar de o aumento inicial do fluxo de investimentos ter sido concentrado em investimentos de portifólio, a partir de 1995, há uma melhora qualitativa na composição desse fluxo e os investimentos diretos tornaram-se cada vez maiores.17 Além disso, durantes as crises do México (1995) e da Rússia (1998), verificou-se uma redução acentuada nos investimentos de portifólio. Por sua própria formação, estes investimentos são significativamente instáveis, variando de acordo com as expectativas de curto prazo. Ao mesmo tempo, tem-se um crescimento dos investimentos diretos, os quais são efetuados levando-se em consideração expectativas de longo prazo. Isto porque, investimentos nos setores produtivos ou nos setores de serviço têm como objetivo o retorno de médio e longo prazos e dependem, fundamentalmente, do comportamento da demanda ao longo dos anos. Os ingressos de recursos estrangeiros destinados às privatizações foram fundamentais para esse bom desempenho em vários anos, principalmente no período de 1997 a 2000, quando o ingresso de divisas para as privatizações somou cerca de US$ 27 bilhões, de acordo com dados do Banco Central. É importante destacar também que o crescimento deste tipo de investimento, e o conseqüente aumento do estoque de capital estrangeiro, destacam o aprofundamento da internacionalização da estrutura produtiva brasileira. Gráfico 2 – Saldo em Transações Correntes do Balanço de Pagamentos (US$ milhões) 20.000 10.000 0 -10.000 -20.000 -30.000 -40.000 Saldo em Conta Corrente Saldo Comercial 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 -676 -1.811 -18.384 -23.502 -30.449 -33.450 -25.420 -24.669 13.299 10.467 -3.466 -5.599 -6.750 -6.609 -1.284 -730 Fonte: Banco Central do Brasil. 17 Investimentos em portifólio são aqueles destinados a aplicações em ações e no mercado financeiro de modo geral, como títulos de renda fixa, debêntures e derivativos. 24 O resultado acumulado desse tipo de financiamento do Balanço de Pagamentos foi o crescimento do passivo externo líquido (como pode ser observado na Gráfico 3), assim como uma significativa mudança em sua composição: a participação relativa do estoque de capital estrangeiro líquido no passivo passou de 23,9%, em 1993, para cerca de 51,9%, em 2000; enquanto a participação relativa da dívida externa líquida foi reduzida de 76,1% para 48,1%. Tabela 2 – Fluxos Líquidos de Investimentos Externos (em US$ milhões) Ano 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Estrangeiros Direto* Portifólio 1.266 -58 901 104 972 578 1.580 1.704 713 6.651 1.972 7.280 4.313 2.294 9.976 6.040 17.085 5.300 28.480 -1.851 29.987 1.350 30.613 2.538 Brasileiros no Exterior Saldo -553 -731 -1.015 -137 -1.094 -1.037 -1.560 56 -1.569 -3.398 -1.303 -3.852 656 273 535 3.147 6.270 8.214 5.047 16.071 20.815 23.231 30.034 29.299 Fonte: Banco Central do Brasil. * Inclui reinvestimentos e ingressos nas rubricas mercadoria e conversão. Uma conseqüência direta do aumento do passivo externo líquido é a elevação da renda líquida de capitais enviada ao exterior (juros, lucros e dividendos), o que pode ser comprovado pelo elevado coeficiente de correlação das duas séries (0, 974) e ilustrado pelo Gráfico 4. Esse aumento da renda enviada ao exterior gera uma elevação no déficit em conta corrente, aumentando ainda mais a necessidade de capitais estrangeiros, que, por sua vez, aumenta novamente o passivo externo numa espécie de “ciclo vicioso”. É importante ressaltar que, enquanto o crescimento da dívida externa causa um aumento do pagamento de juros, o crescimento do estoque de capital estrangeiro gera uma elevação da remessa de lucros e dividendos ao exterior. Como o estoque de capital cresceu relativamente mais que a dívida nesse período, o resultado foi o aumento da participação relativa da remessa de lucros e dividendos na renda do capital enviada ao exterior, que era em média de 11,72% no período de 1985 a 1992 e passou para a média de 25,49% nos período seguinte (de 1993 a 2000). Observa-se, entretanto, que mesmo com essa elevação da remessa de lucros e dividendos, o financiamento dos déficits em conta corrente do Balanço de Pagamentos através de investimentos estrangeiros diretos apresenta custos e 25 volatilidade muito menores com relação ao financiamento por meio de empréstimos externos. Gráfico 3 – Passivo Externo Líquido (US$ bilhões) 450 400 350 300 250 200 150 100 50 0 1993 1994 1995 Dívida Externa Líquida 1996 1997 1998 Estoque de Capital Estrangeiro Líquido 1999 2000 Passivo Externo Líquido Fonte: Banco Central do Brasil. Gráfico 4 – Relação entre Passivo Externo Líquido e Renda de Capitais Enviada ao Exterior 25 450 350 300 15 250 200 10 150 100 5 Passivo (US$ milhões) Renda (US$ milhões) 400 20 50 0 0 1993 1994 1995 1996 1997 Renda de Capitais Enviada ao Exterior 1998 1999 2000 Passivo Externo Líquido Fonte: Banco Central do Brasil. Outra observação importante sobre a mudança na composição do passivo externo líquido é que, enquanto o aumento da dívida externa torna o país extremamente vulnerável às instabilidades das finanças internacionais, os investimentos diretos são bem mais 26 estáveis e podem trazer benefícios para toda a cadeia produtiva. Nesse sentido, cabe ressaltar que boa parte dos investimentos estrangeiros diretos foi para os setores de serviços, principalmente de telecomunicações, energia elétrica, comércio e intermediação financeira (ver Tabela 1A no Anexo). Esses setores não geram diretamente exportações, embora possam ter impactos positivos sobre a competitividade dos bens exportáveis. LAPLANE & SARTI (1999) apontam que a modernização destes setores é fator decisivo para a redução de custos e para a melhoria da qualidade dos serviços oferecidos. Estes autores mostram, por outro lado, que a crescente participação do capital estrangeiro pode induzir a maiores coeficientes de importação nos investimentos. 2.2. O Crescimento da Dívida Pública Interna Com o objetivo de manter a atração de capitais do exterior para manter o equilíbrio do Balanço de Pagamentos, evitar a desvalorização cambial (que poderia comprometer a política de controle da inflação) e conter o consumo (a fim de evitar o aumento da inflação e, também, das importações), o Banco Central utilizou uma política monetária contracionista. Dessa maneira, os juros mantiveram-se em níveis excessivamente elevados. A taxa básica de juros (SELIC) chegou a 45,67% ao ano, após a crise dos “tigres asiáticos” no final de 1997; a 42,12%, após a crise da Rússia no segundo semestre de 1998; e a 44,95%, após a desvalorização do real no primeiro semestre de 1999 – como pode ser visto na Gráfico 1A em anexo. SILVA & CAVALCANTI (2000) e BEVILAQUA & GARCIA (1999), por exemplo, apontam os juros altos como os principais determinantes do aumento da dívida interna do setor público, que aumentou de cerca de 20% em 1994 para quase 40% do PIB em 2000, como pode ser visto na Gráfico 5. De fato, o pagamento de juros reais aumentou significativamente e chegou a níveis significativamente elevados, especialmente em 1998 e 1999, como pode ser confirmado pela Tabela 2A (no Anexo) e pelo Gráfico 6. Esse resultado indica que parte do desequilíbrio do setor público pode ser explicado pela fragilidade externa do Brasil, ou seja, que parte do desempenho negativo da poupança pública é conseqüência do hiato externo. De fato, o aumento da dependência brasileira de capitais externos (como demonstrado anteriormente) fez com que o País ficasse mais vulnerável às incertezas causadas pelas crises internacionais. Isto que forçou o governo a aumentar os juros a fim de superar o hiato de divisas, o que acabou resultando numa piora da poupança do governo. Deve-se destacar, no entanto, que os juros elevados não foram os únicos responsáveis pelo grande crescimento da dívida interna. É possível identificar outros fatores importantes, como o aparecimento de passivos contingentes (R$ 97.665 milhões de 27 1995 a 2000)18 e a desvalorização cambial de 1999, que aumentou bruscamente a dívida indexada ao dólar. Por outro lado, as privatizações realizadas no período (R$ 59.862 milhões) compensaram boa parte dessas perdas. Gráfico 5 – Dívida Interna Líquida do Setor Público (% do PIB) 45 40 35 30 25 20 15 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Fonte: Banco Central do Brasil. Gráfico 6 – Pagamento de Juros Reais (% do PIB) 18 “Passivos contingentes (esqueletos) correspondem a dívidas juridicamente reconhecidas pelo Governo, de valor certo, e representativas de déficits passados não contabilizados (o efeito econômico já ocorreu no passado)”. (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2000). 28 8,00 7,00 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Fonte: Banco Central do Brasil. O crescimento da dívida interna com relação ao PIB é um processo que se retroalimenta impossibilitando a redução dos juros no Brasil. Isso porque, além desse crescimento ser um indicador de insolvência, o mesmo também exerce uma forte pressão sobre a escassa poupança interna (frações significativas da poupança brasileira foram utilizadas para financiar o déficit público). Com o objetivo de acabar com esse ciclo vicioso o governo realizou um ajuste emergencial em 1999 e 2000. Por meio de receitas extraordinárias, principalmente advindas de aumentos provisórios da carga tributária, foi possível obter elevados superávits primários – ver Gráfico 7. O problema é que, segundo estimativa realizada por LUPORINI (2001) com base em dados de taxas de juros e de crescimento econômico de 1986 a 2000, essa política fiscal não pode ser considerada sustentável – indicando que os superávits primários obtidos pelo setor público não são suficientes para evitar o crescimento da relação dívida/PIB. Além disso, de acordo com a mesma autora, a relação dívida/PIB não exibe uma reversão da tendência de alta, mesmo quando corrigida pelas variações cíclicas da renda e dos gastos do governo – mostrando, novamente, que atual política fiscal não é sustentável. Para entender porque a dívida continua crescendo, basta analisar os dados da Tabela 2A (no anexo). Apesar dos superávits primários de 3,23% do PIB em 1999 e 3,51% do PIB em 2000, os resultados nominais foram deficitários em, respectivamente, 9,98 e 4,54% do PIB. A insuficiência destes superávits primários pode ser explicada pelas altas taxas de juros que incidem sobre a elevada dívida pública. Gráfico 7 – Superávit Primário (% do PIB) 29 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0,00 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 -1,00 -2,00 Fonte: Banco Central do Brasil. 2.3. Relação entre Dívida Pública Interna e Passivo Externo Líquido CAVALCANTI (1988) demonstrou que, na década de 1980, ocorreu a troca de dívida externa por dívida pública interna. O principal motivo foi a impossibilidade de obtenção de financiamento externo durante esse período, devido ao “fechamento” do mercado internacional de capitais aos países em desenvolvimento.19 O Governo, que detinha a maior parte da dívida externa brasileira, teve dificuldades para financiar a transferência de recursos ao exterior somente com os cortes no orçamento público. Com isso, foi forçado a financiar-se através do lançamento de títulos públicos no mercado interno. Esse processo de troca das dívidas teve sérias conseqüências sobre a economia brasileira, induzindo o país à estagflação e reduzindo os investimentos estatais. Entretanto, pode-se dizer que a principal causa da crise interna da economia brasileira foi, em última instância, a crise internacional iniciada com o segundo choque do petróleo em 1979. Na primeira metade da década de 1990, o problema do endividamento externo já estava controlado devido ao acordo de renegociação da dívida dentro do Plano Brady e aos mega-superávits comerciais obtidos. O endividamento interno público também se encontrava em situação razoavelmente confortável, cerca de 20% do PIB. Com a implementação do Real em meados de 1994, a política econômica passou a dar uma ênfase cada vez maior ao combate à inflação vis-à-vis à obtenção de superávits 19 Conforme detalhado no capítulo anterior. 30 comerciais. O controle da inflação realmente foi bem sucedido. Porém, este tipo de política macroeconômica – baseada em juros elevados e na abertura da economia, conforme detalhado anteriormente – teve também conseqüências negativas, resultando no aumento (simultâneo) da dívida interna pública e do passivo externo, ilustrado pelo Gráfico 8, e no baixo crescimento econômico. Apesar das incertezas com relação aos países em desenvolvimento presentes no mercado internacional terem causado problemas reais para a economia brasileira, devido à maior dificuldade de conseguir-se financiamento externo para o crescente déficit em transações correntes, se o País não tivesse se tornado tão dependente do capital estrangeiro como se tornou, as crises internacionais poderiam ter tido conseqüências bem menores sobre a economia brasileira. Além disso, a insistência na política de bandas cambiais até janeiro de 1999, que “forçou” o governo a adotar taxas de juros excessivamente elevadas durante as crises a fim de atrair o capital externo especulativo e evitar a desvalorização do Real, demonstram a ênfase dada às políticas de estabilização da economia, em detrimento das políticas de crescimento. Gráfico 8 – Relação entre Dívida Pública Interna e Passivo Externo Líquido (% do PIB) 75,00 65,00 55,00 45,00 35,00 25,00 15,00 1992 1993 1994 1995 1996 Passivo Externo Líquido 1997 1998 1999 2000 Dívida Pública Interna Fontes: Banco Central do Brasil. A manutenção desse tipo de política macroeconômica por tantos anos trouxe sérias conseqüências, não só para as finanças públicas, como também para o sistema produtivo brasileiro. Ao mesmo tempo em que a abertura econômica incentivou as empresas a modernizarem-se para competir com os produtos importados, os juros altos e a escassez de linhas de financiamento (de longo prazo e baixo custo) inibiram investimentos produtivos, 31 aumentaram a inadimplência e o número de falências de grandes e pequenas empresas. Os resultados foram o baixo crescimento da economia e o aumento do desemprego. 32 CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DA ECONOMIA BRASILEIRA ATRAVÉS DO MODELO DE HIATOS Neste capítulo, será apresentada a versão do modelo de hiatos através da qual será feita uma análise das principais restrições ao crescimento da economia brasileira nas últimas décadas. Porém, antes de discutir o modelo e analisar os resultados, serão feitas considerações a respeito da metodologia de tratamento estatístico das séries temporais que serão utilizadas ao longo do capítulo. Em seguida, será demonstrado o motivo pelo qual o hiato fiscal não vai ser analisado conforme proposto no modelo de três hiatos – descrito no primeiro capítulo. Por último, nas seções 3.3 e 3.4, serão analisados os hiatos de poupança e de divisas, respectivamente. Cabe ressaltar, entretanto, que não é possível isolar totalmente os efeitos de cada hiato, o que se propõe é verificar qual foi o hiato que realmente limitou o crescimento econômico em determinado ano ou período. 3.1. Considerações Metodológicas Em regressões envolvendo dados de séries temporais, é preciso verificar a estacionariedade das séries20. Isto porque, se as mesmas forem não-estacionárias, os métodos convencionais de teste de hipóteses – testes t e f, por exemplo – não são válidos. Nesse caso, pode haver também o problema de regressão espúria, onde se observa um R2 alto, embora não haja relação significativa entre as duas séries. Se for detectada a presença de raiz unitária, é preciso estimar a regressão utilizando as variáveis em diferença ou testar se as séries são co-integradas e estimar a regressão cointegrante, como será descrito na seção 3.1.2. 3.1.1. Testes de Raiz Unitária O primeiro passo, portanto, é testar a estacionariedade das séries através do teste de raiz unitária. Os testes de Dickey-Fuller (DF) e o teste de Phillips-Perron (PP) são os mais recomendados pela literatura.21 Para ilustrar o uso dos testes de DF, inicialmente, considere o seguinte processo auto-regressivo de primeira ordem – AR(1) – de uma série de tempo yt : 20 Uma série temporal é estacionária se suas médias e variâncias forem constantes ao logo do tempo e o valor da covariância entre dois períodos de tempo depender somente da distância ou defasagem entre os dois períodos, não do período de tempo em que a covariância é calculada. (GUJARATI, 2000). 21 Ver, por exemplo, RAO (1994) e HAMILTON (1994). 33 y t = ρyt −1 + ε t (3.1) onde ρ é parâmetro e ε t é o termo de erro independente e identicamente distribuído (IID). Se − 1 < ρ < 1 , y t é um série estacionária. Se ρ = 1 , y t é não-estacionária (passeio aleatório). O teste de hipóteses para a equação (3.1) consiste em testar: H0 : ρ = 1 contra H 1 : ρ < 1 . A estatística t do DF não possui a distribuição t convencional. Os valores críticos utilizados para rejeitar ou não a hipótese nula foram estimados por DICKEY & FULLER (1979) e, mais recentemente, por MACKINNON (1991). Considerando as possibilidades de y t possuir intercepto e/ou tendência estacionária, foram desenvolvidas mais duas equações: y t = α + ρyt −1 + ε t (3.2) y t = α + βt + ρy t −1 + ε t (3.3) onde α e ρ são parâmetros, t é o termo de tendência e ε t é o termo de erro IID. Subtraindo y t −1 do dois lados das equações (3.1), (3.2) e (3.3), obtém-se: ∆y t = γy t −1 + ε t (3.4) ∆y t = α + γy t −1 + ε t (3.5) ∆y t = α + βt + γy t −1 + ε t (3.6) onde γ = ρ − 1 . Por isso, testar H 0 : ρ = 1 é o mesmo que testar H 0 : γ = 0 , que é a forma usualmente adotada. Os teste descritos anteriormente pressupõem que y t segue um processo AR(1), além da possível presença de tendência linear t . O teste de Dickey-Fuller aumentado (ADF) considera y t sendo gerado por um AR(p), nesse caso, ε t continua sendo uma série IID: p −1 ∆y t = γy t −1 + ∑ δ i ∆yt −1 + ε t (3.7) i =0 p −1 ∆y t = α + γy t −1 + ∑ δ i ∆y t −1 + ε t (3.8) i =0 p −1 ∆y t = α + βt + γyt −1 + ∑ δ i ∆y t −1 + ε t (3.9) i =0 Se há a suspeita de que o termo de erro ( ε t ) não é IID, deve-se realizar os testes de PP. PHILLIPS & PERRON (1988) sugerem que o ε t das equações (3.7) a (3.9) são gerados por um processo de média móvel (moving average) de primeira ordem – MA(1): 34 ε t = et + θet −1 (3.10) Os testes PP fazem a correção para a estatística t do coeficiente da regressão AR(1) usando o estimador consistente de Newey-West: q 1 j γ j , γ j = ω 2 = γ 0 + 2∑ 1 − q + 1 N j =1 N ^ ^ ∑ ε t ε t− j (3.11) t = j +1 onde q é a defasagem truncada e N é o número de observações. A estatística t utilizada nos teste PP são definidas por: (ω 2 − γ 0 )Nsb γ 2t = 0 b − ^ ω 2ω σ 1 t pp (3.12) ^ onde σ é o desvio padrão da regressão, t b e sb são a estatística t e o desvio padrão do parâmetro, respectivamente. A distribuição da estatística t do PP é a mesma da estatística t do ADF. Por isso, são utilizados os mesmos valores críticos estimados por MACKINNON (1991). Assim como nos testes ADF, é necessário fazer os testes: incluindo uma constante; incluindo uma constante e um termo de tendência; e sem constante nem tendência linear. Se a série testada for não-estacionária, a mesma é denominada como série integrada de ordem d, ou I(d). Para encontrar a ordem da integração, ou seja, o valor de d, deve-se testar a estacionariedade da série integrada. Caso a série diferenciada uma vez seja estacionária, conclui-se que a série original é integrada de ordem um, I(1). De modo geral, se uma série temporal tiver que ser diferenciada d vezes antes de se tornar estacionária, diz-se que ela é integrada de ordem d, ou I(d). 3.1.2. Co-Integração Diagnosticada a presença de raízes unitárias e descoberta a ordem de integração das séries temporais em estudo (d), uma solução pode ser estimar a regressão utilizando as variáveis diferenciadas d vezes. Contudo, esta não é uma boa alternativa porque, ao diferenciar as séries, reduz-se ou elimina-se a tendência. Desta maneira, pode-se perder a relação de longo prazo entre as variáveis, o que é, em última instância, a razão da estimação efetuada. (FAVA, 2000). Quando forem co-integradas, é possível trabalhar com as séries em nível (nãodiferenciadas) sem correr o risco de regressões espúrias. As séries são co-integradas se forem integradas de mesma ordem e houver um equilíbrio de longo prazo entre elas. Para que o equilíbrio ocorra, é preciso que as séries, xt e y t por exemplo, mantenham uma distância aproximadamente constante ao longo do tempo, isto é: 35 y t = bxt + u t (3.13) onde, u t é uma série estacionária, ou I(0). Se isto for verdade, a equação (3.13) é uma regressão co-integrante e a relação yt = bxt é uma relação de equilíbrio de longo prazo, que tende a ser restabelecida após um choque aleatório. 3.2. Hiato Fiscal A hipótese básica do hiato fiscal descrito no Capítulo 1 relaciona-se com o papel central desempenhado pelos investimentos do governo em infraestrutura e indústrias básicas nos países em desenvolvimento. Dessa maneira, o investimento privado é função do investimento público e k * é o coeficiente que determina a dimensão desse efeito crowding in: _ I P = I + k * ⋅ I G , sendo k * > 0 (3.14) em que: _ I = investimento autônomo I P = investimento privado I G = Investimento do setor público Os investimentos do setor público foram obtidos através da soma dos valores da formação bruta de capital fixo da administração pública com os valores da formação bruta de capital fixo das empresas estatais. Os primeiros são dados do Sistema de Contas Nacionais do IBGE – disponíveis para o período de 1947 a 2000. Já os valores da formação de capital das empresas estatais são fornecidos, para o período de 1970 a 1994, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Para o período de 1995 a 2000, o Sistema de Contas Nacionais do IBGE passou a divulgar os dados de formação bruta de capital fixo das empresas estatais. Dada a importância dos investimentos das estatais, que caracterizam a entrada do governo como produtor, e tendo em vista a inexistência de dados para anos anteriores a 1970, optou-se pela utilização do período de 1970 a 2000 para a análise do hiato fiscal. Os investimentos do setor privado foram obtidos de forma residual, ou seja, através da subtração entre o total da formação bruta de capital e os investimentos do setor público. Todos os dados, tanto de IP como de IG foram convertidos para preços constantes com base no deflator implícito da formação bruta de capital fixo do IBGE. Antes de estimar a equação (3.14), é necessário testar se as séries IP e IG possuem raízes unitárias. Os testes foram realizados utilizando-se as equações (3.7), (3.8) e (3.9), que são, respectivamente: sem intercepto nem tendência linear; com intercepto e sem tendência; e com intercepto e tendência. Estas equações foram estimadas incluindo uma, 36 duas e três defasagens, nos testes ADF; e três defasagens truncadas nos testes PP, conforme sugerido pelo estimador de Newey-West.22 Como pode ser visto nas Tabelas 3, 4 e 5, os testes PP e ADF não rejeitam a hipótese nula de que as variáveis sejam I(1), contra a hipótese alternativa de que as mesmas sejam I(0), e não indicam a presença de tendência estacionária nem de intercepto. Somente o teste ADF (3) – ao contrário dos testes PP (3), ADF (1) e ADF (2) – indica que a variável IG é I(0) com intercepto e tendência estacionária. Vale lembrar, no entanto, que o Akaike Information Criterion (AIC) e o Schwarz Criterion (SC) sugerem a utilização de duas defasagens no teste ADF da variável IG com intercepto e tendência.23 Com base nos resultados dos testes, é possível considerar que as duas variáveis possuem raiz unitária. Tabela 3 – Teste de Raiz Unitária: sem intercepto nem tendência linear Variável ADF (1) ADF (2) ADF (3) PP (3) IP ΔIP IG ΔIG 0,83722 -3,42506* -0,45630 -2,79640* 0,91450 -4,23671* -0,77477 -3,45272* 1,55532 -3,46739* -0,44964 -2,74013* 1,25403 -4,35800* -0,51798 -5,9239* * Significante a 1% ** Significante a 5% Notas: Os valores críticos de Mackinnon, para rejeitar a hipótese de raiz unitária, são: -2,64 (1%); -1,95 (5%). ADF (d) é o teste de Dickey-Fuller aumentado com defasagem (d). PP (d) é o teste de Phillips-Perron com defasagem truncada (d). Conforme sugerido pelo estimador de Newey-West, os testes PP foram feitos com três defasagens truncadas. AIC e SC sugerem a utilização de uma defasagem no teste ADF. Tabela 4 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto sem tendência linear Variável ADF (1) ADF (2) ADF (3) PP (3) IP ΔIP IG ΔIG -1,40751 -3,67997** -2,02317 -2,73001 -1,42312 -4,64908* -2,54188 -3,36876** -0,03809 -4,07799* -1,93823 -2,65695 -1,33583 -4,5619* -2,20925 -5,82192* * Significante a 1% ** Significante a 5% Notas: Os valores críticos de Mackinnon, para rejeitar a hipótese de raiz unitária, são: -3,68 (1%); -2,97 (5%). ADF (d) é o teste de Dickey-Fuller aumentado com defasagem (d). PP (d) é o teste de Phillips-Perron com defasagem truncada (d). Conforme sugerido pelo estimador de Newey-West, os testes PP foram feitos com três defasagens truncadas. AIC e SC sugerem a utilização de uma defasagem no teste ADF. 22 Todos os testes foram feitos utilizando-se o programa Eviews 3.1. 23 A defasagem ótima é aquela que minimiza os valores de AIC e SC. 37 Tabela 5 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto e tendência linear Variável ADF (1) ADF (2) ADF (3) PP (3) IP ΔIP IG ΔIG -2,86731 -3,60338** -2,76608 -2,84524 -3,13677 -4,61487* -3,52611 -3,58776** -1,52735 -4,11750** -3,69745** -2,69981 -2,4873 -4,45012* -2,51796 -6,05084* * Significante a 1% ** Significante a 5% Notas: Os valores críticos de Mackinnon, para rejeitar a hipótese de raiz unitária, são: -4,30 (1%); -3,57 (5%). ADF (d) é o teste de Dickey-Fuller aumentado com defasagem (d). PP (d) é o teste de Phillips-Perron com defasagem truncada (d). Conforme sugerido pelo estimador de Newey-West, os testes PP foram feitos com três defasagens truncadas. AIC e SC sugerem a utilização de uma defasagem no teste ADF. Sendo assim, é possível proceder ao teste de cointegração para avaliar se IP e IG relacionam-se no longo prazo. A fim de confirmar se as variáveis são ou não co-integradas, utilizou-se o teste proposto por JOHANSEN (1991, 1995), admitindo a inexistência de intercepto e de tendência linear (ver Tabela 6).24 Os resultados indicam não haver cointegração entre as séries de investimento privado e investimento do setor público, o que sugere não ocorrer o efeito crowding-in entre IG e IP no período de 1970 a 2000.Os testes de causalidade de Granger entre IG e IP (não apresentados) confirmam a hipótese de que IG não Granger causa IP.25 Tabela 6 – Teste de Co-Integração entre IG e IP * Valor calculado da estatística de Johansen Valor Crítico a 5% Valor Crítico a 1% 2,356137 0,106664 12,53 3,84 16,31 6,51 *Valores calculados através do programa Eviews 3.1. Analisando o período 1970-2000, nota-se que o coeficiente de correlação de IG e IP (ver Tabela 7 e Gráfico 9), além de ser muito baixo, é negativo – indicando que as séries apresentam direções opostas. Pode-se inferir, portanto, que, da maneira como proposto no modelo de BACHA (1990), o hiato fiscal não se verifica. Isto porque, sua hipótese básica está no papel central desempenhado pelos investimentos do governo como indutor dos investimentos privados (efeito crowding in). 24 Os resultados deste teste são similares aos resultados dos testes que usam o termo de tendência e intercepto. 25 O período 1970-2000 é extenso o suficiente para se supor a existência de quebra estrutural na série, o que necessitaria de teste específico para raízes unitárias na presença de quebra estrutural. Tal teste não foi feito, uma vez que parece claro que o descolamento entre Investimento Público e Investimento Privado ocorre a partir do final dos anos oitenta, como demonstra a Gráfico 9. 38 Tabela 7 – Coeficientes de Correlação entre IG e IP Amostra Coeficiente de Correlação 1970-1980 1981-1993 1994-2000 1970-2000 0,417 0,475 -0,172 -0,097 Para compreender os motivos desse “descolamento” entre as séries de investimento, é preciso analisar separadamente os diferentes períodos desses 31 anos da economia brasileira. O período 1970-73 é marcado por um crescente papel indutor dos investimentos do setor público, principalmente através das empresas estatais. Deve-se destacar o aumento da importância das estatais na produção de aço, mineração, produtos petroquímicos e dos monopólios estatais nos setores de telecomunicações, eletricidade e em outras áreas de infra-estrutura, nas quais nem a iniciativa privada nem os investidores estrangeiros tinham muito interesse. (Lago, 1990). Gráfico 9 – Investimentos Privados (IP) e Investimentos do Setor Público (IG) no período de 1970 a 2000 (R$ bilhões a preços constantes de 1998) 180 160 140 120 100 80 60 40 20 Ip Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e IPEA. Ig 2000 1998 1996 1994 1992 1990 1988 1986 1984 1982 1980 1978 1976 1974 1972 1970 0 39 O marco dessa decisão de política econômica foi a implementação do Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), que consistia num grande programa de investimentos em infra-estrutura e em indústrias básicas e de bens de capital para o período de 1975 a 1979. O II PND apoiou-se basicamente em investimentos estatais e em investimentos do setor privado financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDE), só possíveis devido à disponibilidade do mercado financeiro internacional de conceder empréstimos ao Brasil. Dessa maneira, o PIB continuou crescendo a taxas elevadas, apesar de menores que as do período anterior, através do aumento da participação do setor público na economia e do aumento da dívida externa. O segundo choque do petróleo em 1979 gerou uma piora ainda maior das relações de troca do Brasil com o exterior e a adoção de uma política monetária contracionista pelos Estados Unidos, que resultou num grande aumento das taxas de juros internacionais. Como grande parte da dívida externa brasileira estava indexada às taxas de juros pós-fixadas, houve uma elevação dos custos dos antigos e dos novos empréstimos.26 Uma conseqüência direta desses acontecimentos foi a limitação da capacidade de investimento do setor público. Ainda assim, os investimentos do setor privado continuaram a crescer em função da demanda aquecida no mercado consumidor até 1980. Na segunda metade deste mesmo ano, o governo viu-se forçado a alterar bruscamente sua política macroeconômica. O desequilíbrio das contas externas e a dificuldade em financiá-lo obrigaram o governo brasileiro a reduzir as importações por meio da redução da absorção externa, isto é, através de políticas contracionistas. Estas políticas não foram suficientes para equacionar o problema das contas externas e, devido aos efeitos negativos da moratória da dívida mexicana em agosto de 1982, o Brasil foi forçado a negociar um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que previa a adoção de novas medidas contracionistas. (BAER, 1996). A redução dos investimentos estatais e o ambiente recessivo causaram seguidas reduções nos investimentos privados, que só voltaram a crescer em 1985 e 86 – conforme Gráfico 9. Portanto, o fraco desempenho de IG influenciou negativamente o desempenho de IP. O grande descolamento das séries IG e IP ocorreu a partir de 1994 em função de diversos fatores, como: o aprofundamento da abertura econômica, que estimulou as empresas a modernizarem-se; o crescimento dos investimentos estrangeiros diretos; e com o fortalecimento da política de privatizações e a conseqüente redução da presença do Estado na economia.27 As empresas estatais dominavam setores muito importantes para a 26 Em 1979 o serviço da dívida representou mais de 60% do total exportado pelo Brasil. (BAER, 1996). 27 Este deslocamento fica evidente ao se analisar a Gráfico 9 e o coeficiente de correlação das duas séries, que foi de -0.172 (ver Tabela 7). 40 economia, porém, estavam sem capacidade de investir. Quando privatizadas, muitas destas empresas passaram a investir em aumentos de produtividade e da qualidade dos produtos, o que gerou externalidades positivas para as demais empresas da mesma cadeia produtiva e/ou para as empresas que utilizavam seus serviços. O setor siderúrgico, por exemplo, recebeu investimentos que resultaram em significativos ganhos de produtividade e de qualidade dos produtos, que passaram a ser competitivos tanto no mercado interno como no mercado internacional. O setor de telecomunicações, por sua vez, é um exemplo de serviço que é relevante para toda economia e que, antes da privatização, estava obsoleto e era ineficiente para atender à demanda dos mercados corporativo e residencial. 3.3. Hiato de Poupança Na seção anterior, as estimativas demonstraram que as séries de investimentos dos setores público e privado apresentaram comportamentos distintos. Apesar disto, a questão fiscal continua a ser fundamental para explicar as limitações ao crescimento da economia brasileira, na medida em que os problemas das finanças públicas afetam diretamente o hiato de poupança – através da redução da poupança do governo. Algumas mudanças foram introduzidas na formalização do modelo a fim de deixar clara a influência dos problemas das finanças públicas sobre o hiato de poupança. Para isso, inicia-se a formalização através da seguinte equação: Yd = C + I + (X − M ) (3.15) onde Yd é a Renda disponível bruta e (X − M ) o saldo do Balanço de Pagamentos em Conta Corrente. 28 Da equação (3.15) obtém-se: I = (Yd − C ) + (M − X ) (3.16) Desagregando Yd em renda privada ( Y P ) e renda do governo (T ) 29, assim como C em consumo privado ( C P ) e consumo do governo ( G ), tem-se: I = SP + SG + SE ( (3.17) ) onde S P = Y P − C P é a poupança privada interna, S G = (T − G ) é a poupança do governo e S E = (M − X ) é a poupança externa. 28 De acordo com a metodologia do Sistema de Contas Nacionais do IBGE definida no manual de Contas Nacionais (BLOEM, DIPPELSMAN & MAEHLE, 1993). 29 Líquida de pagamentos de juros reais da dívida pública, de subsídios e de transferências ao setor privado. 41 Quando a renda atinge seu limite potencial, Yd* , obtém-se o investimento máximo determinado pelo hiato de poupança: IS = S *P + S G + S E (3.18) onde S *P = Y*P − C P é a poupança privada potencial. Os dados de poupança externa são obtidos diretamente do Sistema de Contas Nacionais do IBGE e equivalem ao déficit em conta corrente do Balanço de Pagamentos. A poupança do governo é obtida por meio da diferença entre investimento da administração pública (dados do IBGE) e as necessidades de financiamento das três esferas de governo (dados do Banco Central), no conceito operacional e excluindo as empresas estatais. Cabe ressaltar que será utilizado um conceito de poupança do governo distinto daquele adotado nas Contas Nacionais, que não retira o efeito da inflação sobre o pagamento de juros da dívida pública. Desta maneira, numa economia com altas taxas de inflação e elevada dívida pública, a contabilidade com juros nominais (e não com juros reais) superestima a despoupança do governo.30 A fim de manter a compatibilidade dos dados de poupança com os dados de investimento, optou-se por utilizar o deflator implícito da formação bruta de capital fixo do IBGE para convertê-los para preços constantes. Falta ainda mostrar como se chega à poupança privada potencial. Para isto, primeiro, defini-se que a poupança privada interna é calculada de forma residual, isto é: SP = I − SG − SE (3.19) Supondo que a poupança seja proporcional à renda: S P = sYd (3.20) onde s é a propensão marginal a poupar. Logo, ao nível de renda potencial: S *P = sYd* (3.21) O próximo passo agora é estimar a renda disponível bruta potencial, que é um dado fundamental no estudo do hiato de poupança – haja vista que o limite da formação de poupança privada interna é determinado pela própria capacidade produtiva. Contudo, antes é necessário estimar o produto potencial. 3.3.1. Produto Potencial Existem diversas metodologias disponíveis para se estimar o produto potencial. Neste trabalho, utilizar-se-á o método da função de produção. Como demonstrado por 30 Para maiores detalhes, ver ANDRADE & NAJBERG (1997). 42 Silva Filho (2001)31, este método possui várias vantagens, como por exemplo: (i) relaciona insumos à produção – se o nível de investimentos e/ou a quantidade de mão-de-obra aumentarem, o produto potencial aumenta; o mesmo acontecerá se houver melhora na produtividade total dos fatores (PTF); (ii) a própria obtenção de estimativas da Produtividade Total dos Fatores (PTF), que é uma forma agregada de mensurar a eficiência da economia. Supõe-se que a estrutura produtiva da economia brasileira pode ser representada pela função de produção Cobb-Douglas com retornos constantes em escala, retornos marginais decrescentes de cada insumo e elasticidade de substituição unitária: Yt = At K tα−1 L1t−α (3.22) onde 0 ≤ α ≤ 1 , Y é o PIB efetivo, K representa os serviços do capital, L os serviços do trabalho e A é a PTF. Dado que o investimento demora certo tempo para se traduzir em aumento da capacidade instalada e que ele é feito ao longo do ano, optou-se por considerar que o produto do ano “t” seja determinado pelo estoque de capital de “t-1”, apesar da forma tradicional da função de produção levar em consideração o estoque de capital contemporâneo. Para encontrar o produto potencial, é preciso estimar a PTF. Em seguida, estima-se o nível potencial (ou de pleno emprego) de cada insumo e, então, chega-se ao produto potencial através da função de produção. 3.3.1.1. Estimativa da Produtividade Total dos Fatores (PTF) A PTF pode ser obtida tirando o logaritmo da função de produção e derivando em relação ao tempo: • • • • a = y − α k − (1 − α )l (3.23) • onde a é a taxa de crescimento da PTF, que é determinada pela diferença entre a taxa de crescimento do PIB e a média ponderada das taxas de crescimento dos fatores de produção. • Para se encontrar a taxa de crescimento de k é necessário mensurar o estoque de capital. Como não há estimativas oficiais desta variável para o Brasil, será utilizada a estimativa feita por MARQUETTI (2000) para o período de 1950 a 1998 e atualizada para 1999 e 2000 pelo mesmo autor. Marquetti utiliza o “método dos estoques perpetuados”, o qual é recomendado pela Organização das Nações Unidas (ONU) e utilizado em todos os países que fazem estimativas de estoque de capital. O método dos estoques perpetuados consiste na acumulação dos fluxos líquidos de investimentos com base em hipóteses de 31 A estimativa do produto potencial será feita com base na metodologia utilizada por Silva Filho (2001). Para metodologias alternativas, ver Cerra & Saxena (2000). 43 tempo de vida e de depreciação dos ativos. Cabe ressaltar que todos os valores já estão corrigidos para preços constantes de 1998. Após obtidos os valores do estoque de capital, tem-se que levar em consideração as variações na intensidade de uso deste fator de produção, caso contrário seus serviços poderão estar super-dimensionados. Como não há indicadores abrangentes do grau de utilização da capacidade instalada (UCI), utilizar-se-á o índice de UCI da indústria de transformação da Fundação Getúlio Vargas como variável proxy. Com isto, tem-se que: K t = EK × UCI (3.24) onde EK é o estoque de capital. A estimativa do insumo trabalho (L) será obtida pela população economicamente ativa (PEA). Entretanto, assim como no caso do insumo capital, é necessário corrigir a PEA a fim de levar em consideração as variações na intensidade de uso deste fator. O fator de correção será a taxa de desemprego, ou seja, somente serão definidas como L os ocupados que efetivamente contribuem para a produção. Sem esta correção, as estimativas da PTF ficariam distorcidas. Dados da PEA para todo Brasil são encontrados nos Censos Demográficos e nas Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (PNADs), ambos do IBGE, sendo que a PNAD passou a ser realizada somente a partir de 1976, o que irá limitar o período de análise do hiato de poupança.32 Cabe destacar, no entanto, que não é aconselhável utilizar dados absolutos das PNADs, por esta ser uma pesquisa amostral.33 Deve-se utilizar somente dados relativos (taxa de atividade, de desemprego) das mesmas. O primeiro passo para contornar esta limitação é encontrar a população em idade ativa (PIA) dos anos não censitários, que serão estimados com base na taxa de crescimento anual média da PIA entre os anos censitários. Com base nos dados de PIA e nas taxas de atividade das PNADs estima-se a PEA: rt = PEAt PIAt ⇒ PEAt = rt × PIAt (3.25) onde: r = taxa de atividade. Baseado nas PEAs estimadas e nas taxas de desemprego, agora é possível obter a população ocupada (L): Lt = PEAt − PDt , (3.26) sendo que: 32 A definição de PEA foi alterada após 1991, quando se ampliou o conceito de trabalho. Por isso, os dados de 1992 a 2000 foram corrigidos para tornarem-se compatíveis com os dados dos anos anteriores. 33 Em 1994, a PNAD não foi realizada. A solução encontrada foi determinar os valores para 1994 fazendo a interpolação entre os dados de 1993 e 1995. 44 PDt = d t × PEAt (3.27) onde PD é a população desempregada e d é a taxa de desemprego. A partir da obtenção das séries K e L e de suas taxas de crescimento, pode-se então estimar a taxa de crescimento da PTF. Esta última é uma taxa residual, isto é, a parcela do crescimento do PIB que não é explicada pelo crescimento do capital, tampouco do trabalho. Como, neste caso, todos os dados são discretos, a taxa de crescimento da PTF é dada pela seguinte equação: ∆% At = (1 + ∆%Yt ) (1 + ∆% K t −1 )α (1 + ∆% Lt )1−α −1 (3.28) Para obter-se os valores de α e (1-α), supõe-se que a remuneração dos fatores seja determinada por suas produtividades marginais. Isto significa dizer que α é igual à participação do capital na renda, definida como “excedente operacional bruto” nas Contas Nacionais, e (1-α) é igual à participação do trabalho na renda, definida como “remuneração dos empregados”. O problema é que, para as décadas de 1970 e 80, estes dados decompostos só estão disponíveis para os anos de 1970, 80 e 85. A alternativa encontrada foi estimar as participações do capital e do trabalho na renda com base nas taxas de crescimento das participações do excedente operacional bruto e da remuneração dos trabalhadores na renda de 1970 a 1980, de 1980 a 85 e de 1985 a 90. A Gráfico 10 mostra o desempenho da variável “A” de 1976 a 2000. Utilizou-se o filtro Hodrik-Prescott (HP) para “suavizar” a série que será usada na estimativa do produto potencial, evitando-se assim as variações bruscas causadas pelas mudanças de curto prazo na conjuntura econômica. Observa-se uma queda significativa da produtividade em grande parte do período. Apesar deste resultado, é possível verificar uma estabilização e sinais de reversão desta tendência de queda a partir de 1994. Vale notar que, de 1977 a 1980, a PTF sofreu pequenas reduções médias de 0.43% ao ano; de 1981 a 1993, a PTF caiu em média 2,26% ao ano; e, de 1994 a 2000, a PTF cresceu 0,60% em média ao ano (Tabela 8). Antes de analisar a queda expressiva de “A” (tecnologia), é importante lembrar que esta é uma variável estimada de forma residual. Dessa maneira, apesar de representar tecnologia na função de produção e ser conhecida como PTF, esta variável mede não só as mudanças na produtividade dos fatores de produção como também outros fatores que não são considerados e que determinam o nível de produção. Por isso, a PTF apresenta um comportamento pró-cíclico, embora seja corrigida pela intensidade do uso dos fatores. Embora deva ser analisado com cuidado, devido aos problemas mencionados anteriormente, o comportamento da variável “A” pode ser interpretado como uma piora da eficiência do sistema produtivo brasileiro, principalmente na década de 1980. Isto não quer dizer que não houve avanços tecnológicos (em máquinas e equipamentos, computadores, etc.), pois estes avanços são irrefutáveis. Pode-se argumentar que a piora da eficiência do 45 sistema produtivo está relacionada, entre outras coisas, ao ambiente de elevada instabilidade macroeconômica e à queda dos investimentos em infra-estrutura. Gráfico 10 – Índice da Produtividade Total dos Fatores (PTF) 1976-2000 1,05 1,00 0,95 0,90 0,85 0,80 0,75 0,70 A 2000 1998 1996 1994 1992 1990 1988 1986 1984 1982 1980 1978 1976 0,65 HP Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e MARQUETTI (2000). Tabela 8 – Taxas Reais de Crescimento Acumulado Período Y A K L 1977-1980 1981-1993 1994-2000 1976-2000 6,45% 1,62% 3,03% 2,82% -0,43% -2,26% 0,60% -1,13% 10,11% 4,68% 4,21% 5,43% 2,00% 3,16% 0,30% 2,13% Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e MARQUETTI (2000). Além disso, é possível fazer uma relação entre a estabilização da economia, o aumento da concorrência dos produtores nacionais com os importados a partir de 1994 e os sinais de reversão da queda da PTF verificados a partir deste mesmo ano. Neste período, observou-se um aumento dos investimentos privados, conforme destacado em seção anterior, e um crescimento da participação do setor privado em áreas que antes eram praticamente monopolizadas pelo setor público. Deve-se observar também que, como mostra a Tabela 8, a partir de 1994, o PIB passou a apresentar uma taxa média de crescimento mais elevada ao mesmo tempo em que houve uma pequena redução na taxa média de crescimento do estoque líquido de capital e uma significativa redução do crescimento do insumo trabalho. A recuperação do índice da PTF é, portanto, um dos maiores responsáveis pela melhora da atividade econômica. 46 Por último, vale ressaltar que o elevado crescimento médio anual observado entre 1977 e 1980 (6,45%, de acordo com a Tabela 8) deve-se, em grande parte, ao elevado crescimento médio do estoque de capital líquido (10,11 % ao ano). Isto pode ser justificado pelos significativos volumes de investimentos realizados pelo setor público no período – ver Gráfico 9. 3.3.1.2. Estimativa do Produto Potencial O produto potencial (Y ) é obtido substituindo-se os níveis potenciais (ou de pleno emprego) dos fatores de produção e a variável “A” suavizada pelo filtro HP: α 1−α Y t = At K t L t (3.29) O nível potencial do insumo trabalho ( L ) é determinado pela taxa natural de desemprego ( u ): ( ) L t = PEA t 1 − u (3.30) O problema é definir a taxa natural de desemprego. Neste trabalho, optou-se por utilizar a taxa sugeria por SILVA FILHO (2001), que é a taxa média de desemprego entre 1980 e 2000, cerca de 5,7%. Além disso, a PEA foi corrigida a fim de atenuar o chamado efeito “desalento”. Este efeito é caracterizado pela existência de pessoas que não são incluídas na PEA porque não procuraram emprego no período de referência da pesquisa, embora estejam disponíveis e querendo trabalhar. Devido ao efeito “desalento”, há anos em que ocorrem reduções da PEA, mesmo com o crescimento constante da população. A correção será feita da seguinte maneira: r t = rt , se rt ≥ rt −1 PEA t = r t PEAt , onde: r t = rt −1 , se rt < rt −1 (3.31) Logo, quando há uma redução da taxa de atividade (r), a PIA é multiplicada pela taxa de atividade do ano anterior.34 Para se determinar o estoque de capital de pleno emprego é preciso saber o grau de utilização da capacidade instalada que representa o pleno emprego do estoque de capital (UCI ). Para isto, utilizou-se também a taxa sugerida por SILVA FILHO (2001), de 85%. O estoque de capital de pleno emprego é dado por: 34 Apesar de sofrer reduções em determinados anos, a taxa de atividade apresenta uma tendência crescente ao longo do tempo, passando de cerca de 47% em 1980 para pouco mais de 56% em 2000 – segundo dados do Censo Demográfico do IBGE. 47 K t = K t × UCI (3.32) A Gráfico 11 apresenta o comportamento dos Produtos Potencial e Efetivo entre 1976 e 2000. No período de elevado crescimento, de 1976 a 1980, a economia brasileira esteve acima ou aproximadamente no mesmo nível de seu potencial. O mesmo ocorreu nos anos de 1986, 87 e 89. Nos demais anos, o PIB esteve abaixo de seu potencial. Entretanto, de 1994 a 2000 (exceto no ano de 1999), a diferença entre o produto efetivo e seu potencial foi reduzida em função do aumento do grau de UCI. Esta diferença só não foi menor devido à alta taxa de desemprego observada no mesmo período.35 Gráfico 11 – Produto Efetivo e Produto Potencial (R$ bilhões 1998) 1.100 1.000 900 800 700 600 500 PIB Efetivo 2000 1998 1996 1994 1992 1990 1988 1986 1984 1982 1980 1978 1976 400 Produto Potencial Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e MARQUETTI (2000). 3.3.2. Estimativa do Hiato de Poupança Após estimar o produto potencial, deve-se agora encontrar a renda disponível potencial. Para isso, basta subtrair a Renda Líquida Enviada ao Exterior do produto potencial. Aplicando o resultado desta diferença na equação (3.21), tem-se a poupança privada potencial. 35 Como demonstra Silva Filho (2001), esses resultados são muito sensíveis às hipóteses sobre a taxa natural de desemprego e a UCI de pleno emprego. Uma redução da primeira, ou um aumento da segunda, aumenta o produto potencial em todo o período – deslocando sua curva para cima. No entanto a dinâmica da série, que é o mais importante para este trabalho, continua inalterada. 48 Finalmente, é possível estimar a equação (3.18) e obter o investimento máximo determinado pelo hiato de poupança, denominado de IS. O Gráfico 12 mostra a comparação entre os desempenhos do investimento efetivo e da IS na economia brasileira no período de 1981 a 2000. O primeiro ano da série é 1981 pelo fato de que os dados de necessidades de financiamento do setor público – utilizados para calcular a poupança do governo e, por conseguinte, a poupança privada (que é obtida residualmente) – só estão disponíveis a partir deste ano. Analisando os Gráficos 12 e 13, que mostram o hiato de poupança (diferença entre o investimento efetivo e a IS), torna-se clara a semelhança entre os comportamentos do PIB e do investimento. Apesar dos investimentos serem claramente mais voláteis, o hiato de poupança apresenta uma grande semelhança com o hiato de produto – diferença entre o produto efetivo e seu potencial. Esta semelhança é gerada pela própria definição de poupança privada potencial, que é dada pelo potencial produtivo do país. Gráfico 12 – Investimento Efetivo e IS (R$ bilhões, a preços constantes de 1998) 200 190 180 170 160 150 IS 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 1991 1990 1989 1988 1987 1986 1985 1984 1983 1982 1981 140 Investimento Efetivo Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e MARQUETTI (2000). Em grande parte do período de análise, os investimentos estiveram abaixo da IS. Contudo, torna-se claro que, de 1986 a 89, o crescimento econômico foi sim restringido, entre outras coisas, pelo hiato de poupança. A explicação para isto é que, nos anos de 1985 e 86, verificou-se um crescimento elevado no PIB. Dado que, nos anos anteriores, os investimentos haviam caído significativamente, o nível de ocupação da capacidade produtiva atingiu valores bastante elevados, permanecendo assim até 1989. 49 Gráfico 13 – Hiato de Poupança 2,00% 1999 1997 1995 1993 1991 1989 1987 1985 1983 1981 0,00% -2,00% -4,00% -6,00% -8,00% -10,00% -12,00% Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e MARQUETTI (2000). No período de 1994 a 1997 e em 2000, o investimento efetivo esteve próximo de seu nível potencial. O principal motivo foi a aceleração do crescimento econômico, especialmente de 1993 a 1995 e em 2000. Apesar disto, levando-se em consideração apenas a restrição de poupança, havia espaço para um crescimento ainda maior.36 Uma questão preocupante é que, com uma taxa média de crescimento do PIB de 4,19% entre 1993 e 1997, bem abaixo dos 8,79% da década de 1970, o índice de UCI atingiu a média de 81% - pouco menor que os 86,5% da década de 1970. A razão da rápida ocupação da capacidade ociosa foi a acentuada redução da taxa de investimento observada a partir de 1981, como ilustrado na Gráfico 14. Quando se compara a taxa de investimento a preços correntes, percebe-se que esta não foi muito diferente entre os anos de crescimento elevado, de 1970 a 1980, e o restante do período, conforme a Tabela 9. A diferença está no custo do investimento, que aumentou cerca de 56% na comparação entre os períodos de 1970-1980 e 1994-2000. Existem diversas explicações para este fenômeno, dentre as quais destacam-se: a deterioração da infra-estrutura e a baixa competitividade nos setores de bens de capital e de insumos para a construção civil. 36 Embora o nível de UCI estivesse próximo ao nível definido como de pleno emprego, a taxa de desemprego foi bem acima da taxa denominada como natural. 50 Gráfico 14 – Taxa de Investimento 1970-2000 (a preços constantes de 1998) 38% 36% 34% 32% 30% 28% 26% 24% 22% 20% 18% 2000 1998 1996 1994 1992 1990 1988 1986 1984 1982 1980 1978 1976 1974 1972 1970 16% Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE. Tabela 9 – Taxa de investimento e Custo Relativo do Investimento de 1970 a 2000 Taxa de Investimento (% PIB) Período Preços Correntes Preços Constantes de 1998 Custo Relativo do Investimento (1998=100) 1970-1980 1981-1993 1994-2000 21,60 21,15 19,81 32,06 23,41 18,81 67,37 90,37 105,27 Fontes: Elaboração própria a partir de dados do IBGE. 3.3.3. Análise dos Componentes que Formam a Poupança Ao analisar os componentes que formam a poupança, observa-se que, no período pós-real, há uma redução das poupanças do governo e privada e um aumento da poupança externa, como mostra a Tabela 10. Essa dinâmica é resultado das mudanças na economia descritas nos capítulos anteriores. A despoupança do governo advém da piora nas contas públicas, ocorrida a partir de 1995, demonstrando que a administração pública, além de não gerar poupança, apodera-se de uma parte da poupança privada. A redução da poupança privada é, como demonstram ALÉM & GIAMBIAGI (1997), função do aumento do consumo privado ocorrido após a redução da inflação, ao passo que o aumento da poupança externa manifesta-se nos crescentes déficits na conta corrente do Balanço de Pagamentos. 51 Tabela 10 – Taxas Médias de Poupança a Preços Correntes (% do PIB) – 1981/2000 Período 1981-1993 1994-2000 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Poupança Doméstica Poupança Poupança Governo Privada Total Externa Total 0,74 -0,83 5,67 3,48 2,23 2,45 4,38 -1,58 -0,77 -1,75 -4,10 -1,92 -0,08 19,26 17,21 14,19 14,28 17,74 16,65 16,06 19,30 16,89 17,47 19,47 16,25 14,99 20,00 16,37 19,86 17,76 19,97 19,11 20,44 17,72 16,12 15,72 15,37 14,34 14,91 1,15 3,43 0,81 0,35 -1,55 0,18 0,31 2,82 3,15 4,14 4,32 4,76 4,52 21,15 19,81 20,66 18,11 18,42 19,28 20,75 20,54 19,26 19,86 19,69 19,10 19,44 Fontes: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e do Banco Central do Brasil. O problema é que, ao invés da poupança externa estar sendo utilizada para financiar o aumento da capacidade produtiva, está sendo usada para financiar déficit público. Os capitais forâneos são canalizados para aplicações em títulos públicos, que pagam taxas de juros elevadas. As mesmas taxas de juros que ajudam a atrair o capital estrangeiro funcionam como inibidoras do investimento produtivo. Uma maior oferta de crédito, principalmente de longo prazo, poderia não só aumentar a capacidade produtiva do país, como também melhorar a estrutura produtiva nacional, substituindo importações e aumentando as exportações. O resultado final seria uma redução da restrição de poupança e da restrição externa. 3.4. Hiato de Divisas O hiato de divisas, ou restrição externa ao crescimento, será maior quanto maior for o nível do conteúdo importado dos investimentos (m) e quanto menor forem as exportações líquidas potenciais ( E * ), determinadas exogenamente pela demanda mundial. Isto porque, quanto maiores forem os investimentos em aumento da capacidade produtiva, maior deverá ser a disponibilidade de divisas estrangeiras para cobrir as necessidades de importação de máquinas e equipamentos não produzidos em escala suficiente ou simplesmente não produzidos no país. 52 O problema encontrado para aplicar empiricamente o modelo, tal como descrito anteriormente, é estimar E * . Esta variável pode ser interpretada como a capacidade máxima do esforço exportador para sustentar as importações de bens de capital e, por conseguinte, o investimento. A idéia por trás deste conceito é que, se em dado momento as exportações líquidas efetivas estiverem menores que seu nível potencial e houver escassez de reservas internacionais, o governo poderia utilizar-se de políticas de estímulo às vendas externas (como a desvalorização cambial). Com este apoio, as exportações líquidas poderiam crescer até um limite determinado exogenamente pela demanda mundial. A questão que se coloca agora é que este conceito de exportações potenciais é muito subjetivo e difícil de ser estimado empiricamente. Neste sentido, o modelo desenvolvido por THIRLWALL (1979) pode ser útil para estimar o hiato externo. De fato, este modelo pode ser definido como um caso particular do modelo de dois hiatos de CHENERY & BRUNO (1962).37 De acordo com ele, o aumento das exportações impulsiona a demanda agregada e, portanto, o crescimento econômico através da causalidade cumulativa formulada inicialmente por Myrdal e, posteriormente, por Kaldor. O modelo de Thirlwall pode ser descrito através das seguintes equações: x = φ ( p d − p f ) + ρ .z (3.33) m = α (pd − p f ) + π . y (3.34) x + pd = m + p f (3.35) Onde ρ , π e α >0 e φ <0. As elasticidades-renda das exportações e das importações são dadas por ρ e π , respectivamente. φ é a elasticidade preço das exportações e α a elasticidade preço da importações. x, m e z são, respectivamente, as taxas reais de crescimento das exportações, das importações, da renda do resto do mundo. (p d − p f ) é a taxa de crescimento dos preços relativos (taxa de crescimento dos preços domésticos menos a taxa de crescimento dos preços do resto do mundo). A equação (3.33) representa a função de demanda por exportações e a equação (3.34) a função de demanda por importações, enquanto a equação (3.35) é o equilíbrio em conta corrente. Substituindo (3.33) e (3.34) em (3.35) e resolvendo para y, tem-se: y = [(1 + φ − α ) π ].(p d − p f ) + (ρ π ).z (3.36) Substituindo agora a taxa real de crescimento da renda do resto do mundo, z, da equação (3.33), obtém-se: 37 Ver JAYME JR (2001) para uma discussão do modelo de constrangimento do Balanço de Pagamentos de THIRLWALL (1979) no contexto de modelos de hiatos. 53 . 1 − α )].( p d − p f ) + (1 π ).x y = [(1 π )( (3.37) Supondo que a condição de Marshall-Lerner seja válida e que os preços relativos são constantes, se mensurados pela mesma moeda, então (p d − p f ) = 0 , logo: y E = (1 π ).x (3.38) Esta equação, também chamada de lei de Thirlwall, significa que quanto maior for a elasticidade-renda da demanda por importações ( π ) menor será a taxa de crescimento determinada pelo hiato de divisas. 3.4.1. Uma Versão do Modelo de Thirlwall para Países em Desenvolvimento MCCOMBIE & THIRLWALL (1994) destacam que, para países onde a entrada de capitais estrangeiros é importante para equilibrar o Balanço de Pagamentos, torna-se necessário incluir o desequilíbrio das transações correntes no modelo. O fluxo de capitais afeta a versão da lei de Thirlwall apresentada na seção anterior, gerando diferenças entre o crescimento previsto pelo modelo e o crescimento efetivo, pois em geral o saldo de Transações Correntes é negativo, diferentemente do que supõe inicialmente o modelo em sua versão mais simples. Reescrevendo a equação (3.35), admitindo um desequilíbrio nas transações correntes, a fim de incluir o fluxo de capitais, obtém-se: Pd X + F = Pf ME (3.39) onde X é o volume de exportações, Pd é o índice de preços nacionais das exportações, M é o volume de importações, Pf é o índice de preços internacionais das importações, E é a taxa de câmbio e F é o fluxo líquido de capitais estrangeiros mensurado em moeda nacional.38 Transformando as variáveis em taxas de crescimento, tem-se: δ (p d + x f ) + (1 − δ ) f = m + p f + e (3.40) onde δ e (1 − δ ) representam as participações das exportações e do fluxo de capitais no total recebido do exterior. Substituindo (3.40) em (3.33) e (3.34) e supondo novamente que a condição de Marshall-Lerner seja válida e que os preços relativos são constantes, se mensurados pela mesma moeda, obtém-se: y* = [δx + (1 − δ )( f − p d )] π 38 (3.41) Definido pela diferença entre a entrada líquida de capitais e o pagamento líquido de serviços relativos a fatores de produção, ou seja, o F aqui definido é igual ao (F-J) da equação (1.4) do Capítulo I. 54 O crescimento previsto pelo hiato de divisas, com um desequilíbrio inicial em conta corrente, é a soma ponderada do crescimento das exportações com o crescimento do fluxo de capitais, dividido pela elasticidade renda das importações. 3.4.2. Estimativa do Hiato Externo para a Economia Brasileira, 1955-2000 A estimativa do hiato externo será feita com base na lei de Thirlwall. Entretanto, utilizar-se-á as variáveis (PIB e exportações) em nível, e não em taxas de variação como na equação (3.38). Além disso, como o objetivo é mostrar a relação de longo prazo entre as duas variáveis e, em estudos de séries temporais, deve-se utilizar um período longo de tempo para que os resultado sejam confiáveis, utilizou-se um período maior do que vinha sendo usado nas seções anteriores, de 1955-2000, como em JAYME JR (2001). Antes de estimar qualquer relação entre o PIB (Y) e as exportações (X) é necessário fazer o teste de raiz unitária para estas séries.39 Os testes foram realizados como no modelo do hiato fiscal, ou seja, sem intercepto nem tendência linear; com intercepto e sem tendência; e com intercepto e tendência. Estas equações foram estimadas incluindo uma, duas e três defasagens, nos testes ADF, e três defasagens truncadas nos testes PP, conforme sugerido pelo estimador de Newey-West. Como pode ser verificado nas Tabelas 11, 12 e 13, os testes PP e ADF não rejeitam a hipótese nula de que as variáveis sejam I(1), contra a hipótese alternativa de que as mesmas sejam I(0), e não indicam a presença de tendência estacionária nem de intercepto. Dado que ambas as variáveis são integradas da mesma ordem, pode-se testar se as variáveis são ou não co-integradas. Para isto, utilizou-se o teste proposto por JOHANSEN (1991, 1995), admitindo a inexistência de intercepto e de tendência linear (ver Tabela 14). Os resultados indicam que as séries de PIB e exportações de bens e serviços são cointegradas positivamente, seguindo a mesma tendência no longo prazo. Tabela 11 – Teste de Raiz Unitária: sem intercepto nem tendência linear Variável ADF (1) ADF (2) ADF (3) PP (3) Y ΔY X ΔX 0,15961 -4,05610* 2,26667 -6,09152* 0,62767 -3,59869* 4,77623 -2,27086** 0,90608 -4,16158* 2,77593 -1,76961 0,33676 -5,07981* 3,86527 -5,28128* * Significante a 1% ** Significante a 5% Notas: Os valores críticos de Mackinnon, para rejeitar a hipótese de raiz unitária, são: -2,61 (1%); -1,95 (5%). ADF (d) é o teste de Dickey-Fuller aumentado com defasagem (d). 39 As séries do PIB e das exportações foram mensuradas em dólares e transformadas em índice real deflacionado pelo índice de preços ao atacado dos EUA. 55 PP (d) é o teste de Phillips-Perron com defasagem truncada (d). Conforme sugerido pelo estimador de Newey-West, os testes PP foram feitos com três defasagens truncadas. AIC e SC sugerem a utilização de uma defasagem no teste ADF. Tabela 12 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto sem tendência linear Variável ADF (1) ADF (2) ADF (3) PP (3) Y ΔY X ΔX -1,12442 -4,28783* 0,56468 -8,44543* -0,69908 -3,97114* 2,07523 -3,66329* -0,52698 -4,98448* 1,23099 -3,22832** -1,02444 -5,14851* 1,36148 -6,27596* * Significante a 1% ** Significante a 5% Notas: Os valores críticos de Mackinnon, para rejeitar a hipótese de raiz unitária, são: -3,58 (1%); -2,93 (5%). ADF (d) é o teste de Dickey-Fuller aumentado com defasagem (d). PP (d) é o teste de Phillips-Perron com defasagem truncada (d). Conforme sugerido pelo estimador de Newey-West, os testes PP foram feitos com três defasagens truncadas. AIC e SC sugerem a utilização de uma defasagem no teste ADF. Tabela 13 – Teste de Raiz Unitária: com intercepto e tendência linear Variável ADF (1) ADF (2) ADF (3) PP (3) Y ΔY X ΔX -3,47246 -4,23048* -3,13943 -9,43123* -3,26432 -3,89245** -2,16370 -4,15695** -3,03255 -5,09848* -2,28024 -3,76376** -2,77793 -5,08121* -2,65794 -6,69603* * Significante a 1% ** Significante a 5% Notas: Os valores críticos de Mackinnon, para rejeitar a hipótese de raiz unitária, são: -4,17 (1%); -3,51 (5%). ADF (d) é o teste de Dickey-Fuller aumentado com defasagem (d). PP (d) é o teste de Phillips-Perron com defasagem truncada (d). Conforme sugerido pelo estimador de Newey-West, os testes PP foram feitos com três defasagens truncadas. AIC e SC sugerem a utilização de uma defasagem no teste ADF. A Gráfico 15 mostra a semelhança entre os comportamentos do PIB efetivo e do PIB estimado com base no coeficiente de co-integração.40 Esta semelhança, além do fato de que as séries de Y e X sejam co-integradas, indica que exportações e o PIB no longo prazo possuem estreita relação. JAYME JR (2001) estimou um Vetor de Correção de Erros para o PIB e Exportações com o objetivo de analisar os efeitos de curto prazo das exportações no PIB, bem como a decomposição da variância e as respostas que choques 40 Apesar das séries utilizadas para os testes estatísticos serem do período de 1955 a 2000, os resultados que serão analisados são de 1970 a 2000. 56 nas exportações representariam no PIB. Os resultados confirmaram que o crescimento econômico no Brasil é constrangido pelo setor externo. Como explicado na seção anterior, as discrepâncias de curto prazo entre o PIB estimado e PIB efetivo podem ser, ao menos em parte, explicadas pela evolução do fluxo líquido de capitais externos (Gráfico 16). Durante toda década de 1970, o PIB efetivo manteve-se acima do estimado, o que pode ser explicado pelo influxo de empréstimos ao Brasil no período. Os problemas do Balanço de Pagamentos, deflagrados na década de 1980 com a crise da dívida externa, fizeram com que o PIB ficasse abaixo do estimado pela equação co-integrada durante praticamente todo período até 1994. A partir de 1995, com a retomada dos influxos de capitais, o PIB novamente ficou acima do estimado. Tabela 14 – Teste de Co-Integração entre Y e X Valor calculado da estatística de Johansen Valor Crítico a 5% Valor Crítico a 1% Coeficiente de Co-Integração Normalizado 25,04937 2,84222 12,53 3,84 16,31 6,51 1,379711 (0,06986) Nota: O valor entre parênteses é o desvio padrão do coeficiente de co-integração normalizado. Gráfico 15 – PIB Efetivo e PIB Estimado (índice 1955=100) 1.800 1.600 1.400 1.200 1.000 800 600 400 200 PIB Efetivo 2000 1998 1996 1994 1992 1990 1988 1986 1984 1982 1980 1978 1976 1974 1972 1970 - PIB Estimado Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE e Banco Central do Brasil. Torna-se evidente, portanto, que o desempenho do Balanço de Pagamentos é um dos principais determinantes do crescimento econômico brasileiro. Em períodos onde há 57 desequilíbrios nas contas externas, o governo é forçado a tomar medidas que visem estimular o aumento das exportações e conter a absorção interna (consumo e investimento) para que sejam gerados excedentes comerciais capazes de atender à demanda por divisas internacionais. A partir de 1981, por exemplo, o governo utilizou-se de políticas monetárias contracionistas para conter a demanda agregada e de uma política cambial agressiva para reduzir o déficit em conta corrente. No mesmo ano, o PIB decresceu 1,6% e só foi recuperar-se a partir de 1984. Contudo, esta recuperação só foi viável devido à obtenção, a partir de 1983, de elevados superávits comerciais, que passaram a financiar parte significativa da transferência de recursos ao exterior. Gráfico 16 – Fluxo Líquido de Capitais Estrangeiros* (índice 1955=-100) 6.000 4.000 2.000 2000 1998 1996 1994 1992 1990 1988 1986 1984 1982 1980 1978 1976 1974 1972 1970 0 -2.000 -4.000 -6.000 Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Banco Central do Brasil. *Definido pela diferença entre a entrada líquida de capitais e o pagamento líquido de serviços relativos a fatores de produção. Fenômeno similar ocorreu em 1999, quando a redução do fluxo de investimentos (iniciada durante a crise da economia russa em 1998) e os elevados déficits em transações correntes forçaram o governo a adotar uma política de câmbio flexível e uma política monetária contracionista. As conseqüências foram a significativa desvalorização do real e o forte aumento das taxas de juros que, juntos, conseguiram reduzir a demanda agregada e desequilibrar as contas externas. 58 CONCLUSÕES Este trabalho demonstrou que o hiato de divisas é uma das principais restrições ao crescimento econômico brasileiro. Quando há desequilíbrios nas contas externas, como na primeira metade dos anos 1980 e final dos anos 1990, o governo é forçado a tomar medidas que visem estimular o aumento das exportações e conter a absorção interna (consumo e investimento) a fim de que sejam gerados excedentes comerciais capazes de atender à demanda por divisas internacionais. Observa-se que, diferentemente do que é razoável teoricamente pela sustentabilidade intertemporal da Conta Corrente, é a Conta de Capitais que tem determinado o resultado possível da Conta Corrente na economia brasileira. De fato, o resultado do fluxo de capitais acaba determinando o déficit possível em Conta Corrente. Em períodos de redução na oferta de capitais forâneos, o ajuste em Conta Corrente torna-se fundamental para possibilitar o “fechamento” do Balanço de Pagamentos. O efeito de curto prazo é a estagnação, uma vez que – como demonstrado pelo hiato de divisas na aplicação do Modelo de Thirlwall para a economia brasileira – países dependentes de capitais externos como o Brasil acabam também por terem uma conta comercial muito sensível ao crescimento econômico. De fato, com uma baixa relação entre as elasticidades renda das exportações e das importações, qualquer elevação sustentada do PIB vem acompanhada de um crescimento mais do que proporcional nas importações, induzindo a uma maior demanda de capitais externos para sustentar o crescimento. Em períodos de queda na oferta de recursos externos, a indução da absorção interna é obstaculizada, gerando pressões sobre a taxa de câmbio e os juros em uma economia aberta com taxa de câmbio flexível. Isto, por sua vez, gera pressões inflacionárias e fiscais. O hiato de divisas, como demonstrado, acaba tendo um efeito fundamental na restrição ao crescimento em economias como a brasileira. Uma conseqüência direta destas medidas é a estagnação da economia ou, até mesmo, a recessão. Nos períodos em que há oferta suficiente de divisas, seja pelo aumento das exportações ou pelo aumento do fluxo líquido de capitais estrangeiros, percebe-se uma tendência de aceleração do crescimento econômico. O problema é que, como houve uma queda significativa da taxa de investimento (a preços constantes) a partir de 1981, em pouco tempo a ocupação da capacidade produtiva atinge níveis considerados de pleno emprego. Verifica-se, portanto, que o hiato de poupança não permite que o crescimento da economia seja mantido por um longo período. Nos anos 1980, o governo reduziu significativamente seus investimentos. No entanto, o papel do Estado na economia continuou a ser muito relevante, dado que este estava presente em setores produtivos importantes, como aço, químico e petroquímico. Além disso, o governo detinha o monopólio nas diversas áreas de infra-estrutura, como portos, ferrovias, telecomunicações e energia elétrica. Somente a partir de 1994, com o 59 fortalecimento das privatizações, e a conseqüente redução do papel do Estado na economia, juntamente com o crescimento dos investimentos estrangeiros diretos e o aprofundamento da liberalização comercial – que estimulou as empresas a modernizaremse – o setor privado foi estimulado a substituir os investimentos do governo. Apesar do aumento dos investimentos privados, a taxa de investimento (a preços constantes) continuou muito baixa, em parte, devido ao aumento do custo relativo do investimento. Devido a este aumento de custos, para que fosse possível atingir taxas de crescimento do PIB similares às observadas na década de 1970, seria preciso uma taxa de investimento consideravelmente elevada, dadas as disponibilidades atuais de poupança. A fim de que essas restrições ao crescimento econômico brasileiro sejam superadas, torna-se fundamental que haja, simultaneamente, um aumento consistente das exportações e dos investimentos no aumento e na melhoria da estrutura produtiva do País. Somente assim, seria viável reduzir o problema interno (de capacidade produtiva) e de geração de divisas internacionais. Vale lembrar que os investimentos na melhoria da estrutura produtiva poderiam, ao mesmo tempo, reduzir a elasticidade-renda das importações e aumentar a elasticidade-renda das exportações. Além disso, para que estes investimentos fossem viáveis, seria necessária uma elevação da taxa de poupança doméstica (pública e privada). Cabe ressaltar, que devido à necessidade de aumentar as exportações e, com isto, reduzir o déficit em Conta Corrente do Balanço de Pagamentos e a vulnerabilidade externa; não seria razoável imaginar que o aumento da taxa de poupança pudesse ser resultado de um aumento na poupança externa. Dessa maneira, torna-se cada vez mais importante a obtenção de superávits primários nas contas do governo. Somente assim será possível reduzir a dívida pública e disponibilizar mais dinheiro para financiar investimento do setor privado. As conclusões deste trabalho demonstram que, apesar do modelo de hiatos ter sido concebido na década de 1950, o mesmo ainda mostra-se bastante eficiente para o estudo das restrições ao crescimento econômico brasileiro. A escassez (ou abundância) de divisas e de poupança continua sendo muito relevante para determinar períodos de estagnação (ou de crescimento) da economia. Convém ressaltar, no entanto, que o trabalho trata de modelos macroeconômicos agregados, o que impede de analisar a dimensão microeconômica das decisões de investimento. Neste sentido, perspectivas de continuidade da pesquisa apontam para discutir a nível desagregado as decisões de investimentos de residentes e não residentes e os efeitos das restrições agregadas ao crescimento nessas decisões. 60 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALÉM, A. C., GIAMBIAGI, F. O aumento do investimento: o desafio de elevar a poupança privada no Brasil. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, n.8, p.3-30, dez. 1997. ALMEIDA NETO, H. V. Queda do crescimento da economia brasileira na década de oitenta: uma interpretação segundo o modelo de três hiatos. Belo Horizonte, 1991. 47p. Monografia (Graduação em Economia) – Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Ciências Econômicas, 1991. 45p. ANDRADE, S. C., NAJBERG, S. Uma matriz de contabilidade social atualizada para o Brasil. Rio de Janeiro: BNDES, 1997. 33p. (Texto para Discussão, 58) AVERBUG, A., GIAMBIAGI, F. A crise brasileira de 1998/1999: origens e conseqüências. Rio de Janeiro: BNDES, 2000. 40p. (Texto para Discussão, 77) BACHA, E. L. Crescimento com oferta limitada de divisas: uma reavaliação do modelo de dois hiatos. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v.2, n.12, p.285-310, ago. 1982. BACHA, E. L. A three-gap model of foreign transfers and the GDP growth rate in developing countries. Journal of Development Economics, v.32, n.2, p.279-296, 1990. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Finanças públicas: sumário dos planos brasileiros de estabilização e glossário de instrumentos e normas relacionadas à política econômico-financeira. Brasilia: BCB, 2000. BAER, W. A economia brasileira. São Paulo: Nobel, 1996. BEVILAQUA, A. S., GARCIA, M. G. P. Debt management in Brazil: evaluation of the Real Plan and challenges ahead. Rio de Janeiro: PUC-Rio/Departamento de Economia, 1999. 49p. (Texto para Discussão, 408) BEVILAQUA, A. S., WERNECK, R. L. F. Delaying public-sector reforms: poststabilization fiscal strains in Brazil. Washington D.C.: Inter-American Development Bank, 1998. 79p. (Documentos de Trabajo, R-321) BEVILAQUA, A. S., WERNECK, R. L. F. Fiscal impulse in the Brazilian economy, 1989-1996. Rio de Janeiro: PUC-Rio/Departamento de Economia, 1997. 33p. (Texto para Discussão, 379) BLOEM, A. M, DIPPELSMAN, R. J., MÆHLE, N. O. Quarterly national accounts manual: concepts, data sources, and compilation. Washington, D.C.: International Monetary Fund, 1993. CÂNDIDO JÚNIOR, J. O. Poupança doméstica e restrição ao crescimento econômico no Brasil: 1998-2006. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 26, 1998, Vitoria, ES. Anais... São Paulo: ANPEC, 1998. v.2, p.813-834. CARNEIRO, D. D. A restrição externa ao crescimento: nota sobre 2001 e o longo prazo. Carta Econômica Galanto, n.14, p. 17-23, jan. 2001. 61 CARNEIRO, F. G. Dívida externa: do império aos Brady bonds. Conjuntura Econômica, Rio de Janeiro, v.50, n.9, p.20-22, set. 1996. CAVALCANTI, C. B. Transferência de recursos ao exterior e substituição de dívida externa por dívida interna. Rio de Janeiro: BNDES, 1988. 95p. CARVALHO, J. C. R. Estimativas do produto potencial, relação capital / produto e depreciação do estoque de capital. Rio de Janeiro: BNDES, 1996. (Texto para Discussão, 44) CERRA, V., SAXENA, S. C. Alternative methods of estimating potential output gap: an application to Sweden. Washington: International Monetary Fund, 2000 (IMF Working Paper, WP/00/59). apud SILVA FILHO, T. N. T. Estimando o produto potencial brasileiro: uma abordagem da função de produção. Brasília: Banco Central do Brasil, 2001. 34p. (Texto para Discussão, 17) CHENERY, H. B., BRUNO, M. Development alternatives in a open economy: the case of Israel. The Economic Journal, London, v.72, n.285, p.79-103, Mar. 1962. CRUZ, P. D. Dívida externa e política econômica: a experiência brasileira nos anos setenta. São Paulo: Brasiliense, 1984. CRUZ, P. D. Endividamento externo e transferência de recursos ao exterior: os setores público e privado na crise dos anos oitenta. Campinas: UNICAMP/Instituto de Economia, 1993. (Mimeogr.). DICKEY, D.A., FULLER, W.A. Distribution of the estimators for autoregressive time series with a unit root. Journal of the American Statistical Association, v.74, n.366, p.427431, 1979. FAVA, V. L. Testes de raiz unitária e co-integração. In: VASCONCELLOS, M. A. S., ALVES, D. (Eds.) Manual de econometria: nível intermediário. São Paulo: Atlas, 2000. Cap. 12, p.244-252. FRITISCH, W., MODIANO, E. M. A restrição externa ao crescimento econômico brasileiro: uma perspectiva de longo prazo. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v.2, n.18, p.271-296, ago. 1988. GIAMBIAGI, F. A condição de estabilidade da relação passivo externo líquido ampliado / PIB. Revista do BNDES. Rio de Janeiro, v.4, n.8, p.101-118, dez. 1997. GUJARATI, D. N. Econometria Básica. 3 ed. São Paulo: Makron Books, 2000. HAMILTON, J. D. Time series analysis. New Jersey: Princeton University, 1994. HOFFMANN, R. Estatística para economistas. 3.ed. São Paulo: Pioneira, 1998. 430p. INTERNATIONAL MONETARY FUND. Washington : IMF, 1993. Balance of payments manual. 5 ed. JAYME JUNIOR., F. G. Balance of payments constrained economic growth in Brazil. Belo Horizonte: UFMG / CEDEPLAR , 2001. 25p. (Texto para Discussão, 155) 62 JOHANSEN, S. Estimation and hypothesis testing of cointegration vectors in gaussian vector autoregressive models. Econometrica, v.59, n.6, p.1551-1580, Nov.1991. JOHANSEN, S. Likelihood-based inference in cointegrated vector autoregressive models. Oxford: Oxford University, 1995. KRUGMAN, P. R. Currencies and crises. Cambridge: The MIT, 1995. 219p. KUME, H. A política de importação no Plano Real e a estrutura de proteção efetiva. Rio de Janeiro: IPEA, 1996. 23p. (Texto para Discussão, 423) LAGO, L. A. C. A retomada do crescimento e as distorções do “milagre”: 1967-1973. In: ABREU, M. P. A ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana. Rio de Janeiro: CAMPUS, 1990. LAPLANE, M., SARTI, F. Investimento direto estrangeiro e o impacto na balança comercial nos anos 90. Brasília: IPEA, 1999. 47p. (Texto para Discussão, 629) LUPORINI, V. The behavior of the Brazilian federal domestic debt. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 29, 2001, Salvador. Anais... Salvador: ANPEC, 2001. MCCOMBIE, J. S. L., THIRLWALL, A. P. Economic growth and the balance of payments constraint. London: St. Martins, 1994. MCCOMBIE, J. S. L., THIRLWALL, A. P. Growth in an international context. In: DEPREZ, J., HARVEY, J. T. (Eds.) Foundations of international economics. London: Routledge, 1999. Cap.3, p.35-90. MACKINNON, J.G. Critical values for cointegration tests. In: ENGLE, R.F., GRANGER, C.W.J. (Eds.). Long-run economic relationships: readings in cointegration. Oxford: University, 1991. MCKINNON, R. I. Foreign exchange constraints in economic development and efficient aid allocation. The Economic Journal, London, v.74, n.294, p.388-409, Jun. 1964. MARQUETTI, A. A. Estimativa do estoque de riqueza tangível no Brasil: 1950-1998. Nova Economia, Belo Horizonte, v.10, n.2, p.11-37, dez. 2000. MEIRA, J. P. C. P. Crescimento econômico e estrangulamento externo: uma aplicação do modelo de dois hiatos ao caso do Brasil, 1965/80. Rio de Janeiro, 1983. 106p. Dissertação (Mestrado em Economia) – Departamento de Economia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 1983. MEYER, A., BATISTA JUNIOR., P. N. A reestruturação da dívida externa brasileira. Estudos Econômicos, São Paulo, v.20, n.2, p.163-194, maio/ago. 1990. MEYER, A., GONZALEZ, M. J. F. A capacidade de pagamento da dívida externa do setor público no Brasil. Estudos Econômicos, São Paulo, v.24, n.1, p.5-53, jan./abr. 1994. PINHEIRO, A. C., ALMEIDA, G. B. Padrões setoriais de proteção na economia brasileira, Rio de Janeiro: IPEA, 1994. (Texto para Discussão, 355) 63 PREBISCH, R. The economic development of Latin America and its principal problems. New York: United Nations/Department of Economic Affairs, 1950. RAO, B. B. (Ed.). Cointegration for applied economist. New York: St. Martin’s, 1994. REIS, E. J., BONELLI, R., RIOS, S. M. P. Dívidas e déficits: projeções para o médio prazo. Pesquisa e Planejamento econômico, Rio de Janeiro, v.2, n.18, p.239-270, ago. 1988. SILVA FILHO, T. N. T. Estimando o produto potencial brasileiro: uma abordagem da função de produção. Brasília: Banco Central do Brasil, 2001. 34p. (Texto para Discussão, 17) SILVA, N. L. C. da, CAVALCANTI, M. A. F. de H. A administração da maturidade da dívida mobiliária brasileira no período 1994/97. Rio de Janeiro: IPEA, 2000. 50p. (Texto para Discussão, 744) SIMONSEN, M. H., CYSNE, R. P. Macroeconomia. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1995. TAYLOR, L. Oct.1994. Gap models. Journal of Development Economics. v.45, n.1, p.17-34, THIRLWALL, A. Balance of payments constraints as an explanation of international growth rate differences. Banca Nazionale del Lavoro Quarterly Review, v.32, n.128, p.4553, Mar. 1979. WERNECK, R. L. F. Poupança estatal, dívida externa e crise financeira do setor público. In: LOZARDO, E. (Org.). Déficit público brasileiro: política econômica e ajuste estrutural. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p.99-128. 64 ANEXO Tabela 1A – Estoque e Fluxo de Investimento Estrangeiro Direto por Setor de Atividade Discriminação 12/1995* Estoque % 1996 Fluxo % 1997 Fluxo % 1998 Fluxo % 1999** Fluxo % 2000** Fluxo Agricultura, pecuária e 689 1,6 111 1,4 456 3,0 142 0,6 423 1,5 649 extrativa mineral Indústria 23.402 55,0 1.740 22,7 2.036 13,3 2.766 11,9 7.002 25,4 5.087 Serviços 18.439 43,4 5.815 75,9 12.819 83,7 20.362 87,5 20.140 73,1 24.139 Eletricidade, gás e 0 0,0 1.626 21,2 3.554 23,2 2.202 9,5 2.970 10,8 2.972 água quente Comérc. atacado e 2.105 5,0 207 2,7 691 4,5 1.089 4,7 1.550 5,6 886 interms. comércio Comérc. varej. e 668 1,6 406 5,3 85 0,6 1.109 4,8 1.114 4,0 660 repar. de objetos Correio e 195 0,5 611 8,0 831 5,4 2.565 11,0 7.797 28,3 10.897 telecomunicações Intermediação 1.255 3,0 380 5,0 1.596 10,4 5.916 25,4 1.677 6,1 6.352 financeira Seguros e previdência 149 0,4 148 1,9 191 1,3 46 0,2 64 0,2 14 privada Atividades 1.057 2,5 83 1,1 40 0,3 26 0,1 84 0,3 21 imobiliárias Serviços prestados a 11.455 26,9 2.016 26,3 5.351 35,0 6.217 26,7 3.327 12,1 815 empresas Outros serviços 1.555 3,7 338 4,4 479 3,1 1.192 5,1 1.558 5,7 1.522 Total 42.530 100,0 7.665 100,0 15.311 100,0 23.271 100,0 27.564 100,0 29.876 Fonte: Banco Central do Brasil. * Dados do Censo de Capitais Estrangeiros, realizado em 1996. ** Inclui conversões para investimentos diretos Obs.: 1. No período de 1996 a 2000, consideram-se os recursos destinados a empresas que totalizaram mais de US$ 10 milhões ao ano. % 2,2 17,0 80,8 9,9 3,0 2,2 36,5 21,3 0,0 0,1 2,7 5,1 100,0 65 01.07.1996 01.08.1996 01.09.1996 01.10.1996 01.11.1996 01.12.1996 01.01.1997 01.02.1997 01.03.1997 01.04.1997 01.05.1997 01.06.1997 01.07.1997 01.08.1997 01.09.1997 01.10.1997 31.10.1997 01.12.1997 02.01.1998 29.01.1998 05.03.1998 16.04.1998 21.05.1998 25.06.1998 30.07.1998 03.09.1998 11.09.1998 08.10.1998 12.11.1998 17.12.1998 19.01.1999 05.03.1999 25.03.1999 06.04.1999 15.04.1999 29.04.1999 10.05.1999 13.05.1999 20.05.1999 09.06.1999 24.06.1999 29.07.1999 02.09.1999 23.09.1999 07.10.1999 11.11.1999 16.12.1999 20.01.2000 17.02.2000 23.03.2000 29.03.2000 20.04.2000 25.05.2000 21.06.2000 10.07.2000 20.07.2000 24.08.2000 21.09.2000 19.10.2000 23.11.2000 21.12.2000 Gráfico 1A - Taxa Selic (% ao ano) 50 45 40 35 30 25 20 15 10 5 0 Fonte: Banco Central do Brasil. 66 Tabela 2A – Necessidades de Financiamento do Setor Público (Em percentagem do PIB*) Discriminação 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Total nominal Governo federal e Banco Central do Brasil Governos estaduais e municipais Empresas estatais 64,83 23,96 27,12 13,75 26,97 10,15 12,08 4,74 7,28 2,38 3,57 1,33 5,87 2,56 2,71 0,61 6,04 2,60 2,75 0,69 7,93 5,40 2,01 0,52 9,98 6,87 3,17 -0,07 4,54 3,17 2,11 -0,75 Total operacional ** Governo federal e Banco Central do Brasil Governos estaduais e municipais 0,80 0,68 0,08 -1,14 -1,57 0,80 5,00 1,74 2,37 3,40 1,27 1,81 4,25 1,76 1,97 7,40 5,13 1,78 3,41 3,17 0,50 1,17 1,31 0,70 0,03 -0,37 0,88 0,32 0,52 0,50 -0,26 -0,83 Total primário Governo federal e Banco Central do Brasil Governos estaduais e municipais Empresas estatais -2,19 -0,81 -0,62 -0,76 -5,21 -3,25 -0,77 -1,19 -0,27 -0,52 0,18 0,07 0,09 -0,37 0,54 -0,08 0,87 0,24 0,45 0,18 -0,01 -0,55 0,19 0,35 -3,23 -2,35 -0,22 -0,65 -3,51 -1,88 -0,55 -1,08 Total juros nominais Governo federal e Banco Central do Brasil Governos estaduais e municipais Empresas estatais 67,02 24,77 27,74 14,50 32,18 13,41 12,84 5,93 7,54 2,90 3,39 1,25 5,78 2,93 2,16 0,68 5,16 2,36 2,30 0,51 7,94 5,95 1,83 0,16 13,20 9,22 3,39 0,59 8,05 5,05 2,66 0,33 Total juros reais 2,98 4,07 Governo federal e Banco Central do Brasil 1,49 1,68 Governos estaduais e municipais 0,70 1,57 Empresas estatais 0,79 0,82 Fonte: Banco Central do Brasil. * Reflete a relação dos fluxos com o PIB a preços correntes. ** Deflator = IGP-DI (centrado). 5,26 2,26 2,19 0,81 3,30 1,64 1,27 0,39 3,38 1,52 1,52 0,34 7,42 5,68 1,59 0,15 6,64 5,53 0,71 0,40 4,68 3,19 1,25 0,24 Empresas estatais 67