TUTELA COLETIVA E PROCESSO DO TRABALHO
DENI DEFREYN
FLORIANÓPOLIS/SANTA CATARINA
2011
1.
INTRODUÇÃO
Em sentido mais amplo pode-se dizer que direitos ou interesses
coletivos estão relacionados aos direitos transindividuais de grupos ou categorias,
como previsto em nível constitucional no Título II – Dos Direitos e Deveres
Individuais e Coletivos, fazendo referência no art. 129, III aos interesses coletivos.
Pouco de depois da vigência da Constituição Federal de 1988, o Código de Proteção
e Defesa do Consumidor deu um conceito restrito, afirmando que são interesses
transindividuais “de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe
de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base” (
art. 81, parágrafo único, II do CDC).
Embora o conceito relativo aos direitos e interesses conste da
legislação pátria há mais de duas décadas, não somente em nível constitucional, o
efetivo exercício de tais direitos tem sido obstado pelo enfoque individualista do
ordenamento jurídico nacional, não restando viabilizado, salvo as exceções de
sempre, garantias fundamentais.
2. DESENVOLVIMENTO
Muito embora positivado há anos, o acesso coletivo ao judiciário
mereceu restrições, inclusive na Justiça do Trabalho, e como exemplo mais
emblemático a Súmula 310 do Tribunal Superior do Trabalho ( antes denominada
Enunciado).
O entendimento constante da Súmula 310 (à época Enunciado)
foi publicado em maio de 1993, portanto após a vigência do CDC que ampliava o
conceito de direitos ou interesses coletivos. Pelo teor da Súmula e com base na Lei
8.073/90 admitia-se a substituição processual mas restringia “às demandas que
visem à satisfação de reajustes salariais específicos resultantes de disposição
prevista em lei de política salarial” .
Vale dizer, a substituição processual estava limitada ao
cumprimento da lei, ainda que pudesse ser ajuizada em favor da categoria. Portanto,
somente em casos muito específicos se admitia o processo coletivo, como exemplo
a ação de cumprimento de sentença normativa (art. 872, parágrafo único da
Consolidação das Leis do Trabalho) e as ações que visavam o pagamento de
adicional de insalubridade ou periculosidade (art. 195, § 2º, da Consolidação das
Leis do Trabalho), aqui também limitada a substituição aos associados do sindicato.
Além das exigências limitadoras da Súmula referida, como a
exigência de individualização dos interessados por ocasião do ajuizamento da
demanda, o que seria necessário somente no momento da execução, a
jurisprudência dominante do Tribunal Superior do Trabalho não admitia a
substituição processo processual por entidade de grau superior, como as
federações, ainda que elas praticassem todos os atos de representação sindical da
categoria, quando não organizada em sindicato.
Em boa hora, ou talvez tardiamente, decisão do Supremo Tribunal
Federal (RE 202.063-0) reconheceu maior amplitude na aplicação do art. 8º, III, da
Constituição Federal, permitindo a substituição processual pelos sindicatos sem
restrições, superando, portanto, o conteúdo da Súmula 310 do TST que restou
finalmente cancelada em outubro de 2003 pela resolução 119.
A legitimação extraordinária reconhecida pela Suprema Corte tem
permitido a representação em juízo pelos entes associativos, na forma do art. 5º, XXI
da Constituição Federal, inclusive os sindicatos, sem exigência de autorização dos
interessados, matéria alegada em defesa com freqüência para inibir a demanda
coletiva, sem sucesso, é verdade.
Ademais, os sindicatos estão legitimados para substituir não
somente os filiados, mas toda a categoria que representa. Em todos os casos
somente na fase de liquidação torna-se imprescindível a identificação dos
beneficiados, conforme art. 95 do CDC.
Esta nova forma de ver o efetivo acesso coletivo deve objetivar a
ordem jurídica justa a todos, em especial o mais vulneráveis, entre os quais os
trabalhadores no sentido de alcançar decisões judiciais democráticas.
Para isso, no dizer de Carlos Henrique Bezerra Leite “é condição
necessária a formação de uma nova mentalidade, que culmine com uma autêntica
transformação cultural ao apenas dos juristas, juízes e membros do Ministério
Público e demais operadores jurídicos, mas também dos governantes, dos
empresários, dos trabalhadores, dos ambientalistas e dos sindicalistas” (p. 43).
E continua:
“A efetivação do acesso coletivo à justiça exige, sobretudo, um
„um pensar coletivo‟, consentâneo com a nova ordem política, econômica e social
implantada em nosso ordenamento jurídico a partir de Carta Magna de 1988” (p. 43).
É bem verdade que alterações legislativas antes citadas e
causadas por um movimento de relativização do individualismo antes existente e
originário do liberalismo, resultaram em novos conceitos de acesso coletivo, ou a
“coletivização” das relações jurídicas, com a supremacia do interesse social sobre o
individual na tutela coletiva.
Não somente os sindicatos, mas também o Ministério Público do
Trabalho está legitimado à busca da tutela coletiva na Justiça do Trabalho, embora
com algumas restrições impostas por decisões judiciais nem sempre em sintonia
com a atual “onda” de acesso coletivo.
Não pode restar dúvida quanto à possibilidade do Ministério
Público de demandar nos casos de trabalho em condições análoga à de escravo,
trabalho degradante ou sem condições mínimas de higiene, trabalho prestado por
crianças e adolescentes, por exemplo. O interesse coletivo a ser tutelado é evidente.
De outro lado, o ajuizamento individual de ações trabalhistas um
modelo tradicional e largamente praticado nas últimas décadas, não sido capaz de
evitar o descumprimento, às vezes reiterado pelo mesmo empregador, de normas
legais e garantias constitucionais, ou mesmo aquelas constantes de acordos
coletivos, não vem alcançando o ideal de justiça a todos interessados.
Aliás, é comum que o empregado somente venha postular
judicialmente quando encerrado o contrato de trabalho, e não todos ex-empregados,
quando grande parte das vezes seu direito está prescrito, ao menos em parte. O
temor de perder o emprego e sua única fonte de subsistência, muitas vezes, impede
a postulação de direitos inalienáveis no curso do pacto laboral.
Em alguns casos, o direito sonegado pelo empregador é de valor
econômico ínfimo se considerado individualmente, mas de grande monta quando
levado em conta o grande número de empregados prejudicados. O empregado,
também por este motivo deixa de pleitear judicialmente, mesmo após a dispensa,
estimulando o descumprimento pelo empregador.
Por todas essas razões, é relevante a tutela coletiva em favor dos
trabalhadores – parte vulnerável na relação contratual – não somente para garantir o
efetivo acesso, mas, também, para inibir a prática deliberada de descumprimento
dos direitos mínimos, legal ou convencionalmente assegurados.
3. CONCLUSÃO
Portanto, é necessária é possível a tutela coletiva na ordem
jurídica nacional, em vista dos textos legais que criaram mecanismos para a
legitimação extraordinária dos sindicatos, que exercem a representação.
Inquéritos Civis e ações correspondentes pelo Ministério Público do Trabalho
na via judicial são as formas usuais na Justiça do Trabalho.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. LEITE, Carlos Henrique Bezerra, Curso de Direito Processual do Trabalho.
6ª Ed. São Paulo, LTR, 2008.
2. LOQUÉRCIO, José Eymard, Os novos Horizontes do Direito do Trabalho,
São Paulo, LTR, 2005.
3. TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Curso de Direito Processual do
Trabalho. São Paulo. LTR. 2009.
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