A Prática do Marketing de Relacionamento na Conquista da Lealdade do Cliente: Um
Estudo no Setor Farmacêutico.
Autoria: Walmon Magalhães Leal
Resumo
O propósito deste estudo foi verificar a influência das práticas do marketing de
relacionamento das empresas farmacêuticas na conquista da lealdade dos médicos.
Inicialmente foi realizada uma pesquisa exploratória junto a seis empresas farmacêuticas a
fim de levantar as principais ações, benefícios e serviços realizados, bem como conhecer a
atuação do vendedor no relacionamento com os médicos. Dez variáveis foram identificadas
como as mais representativas das práticas do marketing de relacionamento. Posteriormente,
foram entrevistados 203 médicos, utilizando-se um questionário estruturado fechado, a fim de
verificar como estes avaliavam as práticas do marketing de relacionamento das empresas
farmacêuticas. A principal técnica utilizada para análise dos dados foi a análise discriminante.
As três variáveis que mais diferenciaram o grupo de médicos leais daqueles classificados
como não-leais foram: a) ajuda financeira fornecida pelas empresas farmacêuticas, b) a
freqüência com que as empresas visitam os médicos e, c) o conhecimento que as empresas
possuem dos médicos. A realização deste estudo permitiu conhecer em maior amplitude o
relacionamento existente entre as empresas farmacêuticas e os médicos, uma vez que esse
tema ainda é pouco estudado no mercado brasileiro.
Introdução
A importância de se relacionar com os clientes a fim de conhecer e atender suas
necessidades e, com isso, ganhar sua lealdade é um tema discutido a mais de quatro décadas.
No início dos anos 60, no conhecido artigo "a miopia do marketing", Levitt (1960) já
chamava atenção para a necessidade das empresas adotarem uma estratégia orientada ao
cliente e não apenas ao desenvolvimento de produtos. Posteriormente, já na década de 80,
Berry (1983) introduzia, pela primeira vez, o termo marketing de relacionamento como uma
opção estratégica para criação de uma relação de longo prazo com os clientes, com o
propósito de mantê-los leais a empresa (GRONROOS, 2003, p. 37), mas foi apenas no final
dos anos 90, segundo Stone, Woodcock e Machtynger (2001, p. 20), que as empresas
realmente passaram a adotar o marketing de relacionamento como estratégia para fidelizar
clientes.
A busca das empresas na construção e manutenção de relacionamentos duradouros e
lucrativos com os clientes tem sido uma tendência (KOTLER, 1998, p. 377), uma vez que
muitas empresas estão se afastando do marketing exclusivamente de transação, cuja ênfase é a
venda, para praticar o marketing de relacionamento. Essa é uma tendência que ocorre,
segundo Gordon (2000, p. 118), principalmente em função da alta competitividade gerada a
partir da enorme quantidade de novos produtos com tecnologia e preços muito parecidos que
são introduzidos no mercado a cada ano.
No setor farmacêutico, a competitividade também tem se mostrado cada vez mais
acirrada. Atualmente os médicos raramente dispõem de uma única opção de medicamento
para tratar uma mesma doença. O tempo que uma droga permanece exclusiva no mercado tem
diminuído ao longo dos anos (PHRMA, 2000), pois dezenas de novas drogas são lançadas no
mercado todos os anos e algumas são muito semelhantes na eficácia e segurança com as já
existentes. Esse tem sido um dos motivos que tem levado as empresas farmacêuticas a
ampliarem seus investimentos em marketing (WAZANA, 2000). Segundo Kotler e Simon
(2004, p. 91), nove empresas farmacêuticas dos Estados Unidos gastaram, no ano de 2001, em
marketing e propaganda, pelo menos o dobro do que gastaram em pesquisa e
desenvolvimento de novos produtos.
A rivalidade enfrentada nesse setor tem representado um grande desafio para as
empresas. Competir no mercado farmacêutico com base apenas no diferencial que os produtos
podem oferecer já não parece tão simples, entretanto pensar que o marketing de
relacionamento possa influenciar o comportamento do médico na escolha de um medicamento
pode também parecer, a princípio, algo contraproducente, uma vez que existem diretrizes de
tratamentos padronizados a serem seguidos, além de publicações científicas, que exercem
grande influência na escolha feita pelos médicos.
Isso, de fato, acontece quando da adoção de drogas inovadoras (CARVALHO E
TEIXEIRA, 2002), porém, após alguns anos, surgem outras opções da mesma classe, e as
recomendações, diretrizes e publicações científicas acabam sendo direcionadas para a classe
do produto e não para uma droga específica. A intensificação da concorrência com a chegada
de novos produtos em tempo cada vez menor tem forçado a indústria farmacêutica a buscar no
marketing uma nova forma de agregar valor aos produtos e, segundo Kotler e Simon (2004, p.
232), o marketing ainda continuará sendo uma das principais fontes geradoras de valor no
setor farmacêutico.
Os gastos mundiais com marketing feitos pela indústria farmacêutica permanecem
dominados, principalmente, pela promoção dos produtos feito aos médicos pelos
representantes de vendas. Esse gasto responde por cerca de 75% do investimento total
(KOTLER E SIMON, 2004, p. 248). Nos Estados Unidos, em 2001, o número total de
representantes de vendas da indústria farmacêutica chegava a oitenta mil, conforme Kotler e
Simon (2004, p. 255).
No Brasil, se considerado apenas os quarenta maiores laboratórios atuantes no
mercado farmacêutico, que respondem juntos por cerca de 90% das vendas do setor (IMS,
2004), tais como a Pfizer, Glaxo, Norvartis, Merck Sharp, Aché e outros, somam-se
aproximadamente oito mil representantes de vendas atuando nesse segmento. Esses
profissionais visitam os médicos mensalmente, na tentativa de levar mensagens promocionais
de marketing e desenvolver um relacionamento a fim de conseguir a preferência do médico
pelo produto.
Quando se pesquisa o tema relacionamento com clientes, especificamente no setor
farmacêutico, encontram-se evidências de que existe uma relação entre a atuação dos
representantes de vendas e o comportamento de prescrição do médico. Uma pesquisa
realizada na Áustria por Scharitzer e Kollarits (2000) confirmou, mediante um estudo
empírico, que existe uma forte relação entre a satisfação dos médicos com relacionamento que
mantém com os representantes dos laboratórios e o comportamento de prescrição desses
médicos. Outro estudo realizado por Andaleeb e Tallman (1996) também mostrou existir uma
relação de parceria entre médicos e representantes de laboratórios. Para os autores, os médicos
percebem os representantes como uma importante fonte de informação e costumam valorizar
e reconhecer esse relacionamento, prescrevendo os produtos promovidos por esses
representantes.
Por outro lado, apesar dessas evidências entre a atuação do representante de vendas e o
comportamento dos médicos, alguns estudos demonstram que também existe um certo nível
de insatisfação por parte dos médicos em relação ao trabalho do representante de vendas. O
resultado de um estudo realizado por Prounis (2003) com 150 médicos demonstrou que a
maioria desses médicos já não atenderiam mais os representantes, caso estes não entregassem
amostras grátis. Para os médicos, os representantes foram considerados muito jovens, muito
parciais, pouco atualizados, com menor experiência em saúde e muito pouco informados.
2
Alguns dos achados de Prounis (2003) coincidem com um estudo exploratório
realizado no Brasil por Teixeira e Carvalho (2002). Para os autores brasileiros, há uma clara
demonstração de que é cada vez menor o tempo reservado aos representantes dentro do
consultório e muitos médicos consideram a apresentação de detalhamento dos produtos feita
pelos representantes como enfadonha e apenas suportável.
Kotler e Simon (2004, p. 258) afirmam que o gerenciamento do relacionamento com
os médicos ainda deverá ser a principal vantagem competitiva para empresas farmacêuticas,
porém ainda é preciso pensar em novas abordagens de marketing de relacionamento que
consigam oferecer valor aos clientes, fazendo com que o médico deseje novamente
estabelecer uma interação freqüente com a indústria farmacêutica.
Diante do quadro atual, em que tem sido cada vez menor o tempo que uma droga
inovadora consegue permanecer sozinha no mercado e que o gerenciamento do
relacionamento entre a indústria farmacêutica e os médicos tem apresentado algumas
dificuldades e alguns sinais de insatisfação, especialmente quanto ao trabalho do vendedor,
esse estudo foi realizado com o objetivo de verificar a influência da prática do marketing de
relacionamento das empresas farmacêuticas na conquista da lealdade dos médicos. Dessa
forma, a hipótese do estudo foi a seguinte:
H1: A prática do marketing de relacionamento desenvolvido pela indústria
farmacêutica influencia na conquista da lealdade dos médicos.
Quadro Referencial Teórico
Marketing de Relacionamento
Diversos autores (KOTLER, 1998; GORDON, 1991; CHRISTOPHER, 1999;
MCKENNA, 1996; GRONROOS, 2003) concordam que o marketing de relacionamento é o
oposto do marketing de transação, por isso para entender as definições de marketing de
relacionamento, é preciso distinguir os conceitos de transação e de relacionamento.
A ênfase no compromisso contínuo de atender às necessidades de cada cliente tem sido
um dos elementos centrais que distinguem os dois conceitos (CHRISTOPHER, 1999). A
palavra “contínuo” assume uma importância relevante nessa diferenciação, pois a idéia de
tempo difere bastante os dois conceitos. A transação está voltada para uma venda única, não
preocupa-se com as próximas compras do cliente, enquanto o enfoque básico do
relacionamento visa o cliente em longo prazo, a conquista da lealdade à empresa.
Outro aspecto que diferencia os dois conceitos envolve a relação de dependência entre
as partes. Na transação, o cliente decide de uma forma totalmente independente, sem vínculo
algum com o fornecedor, enquanto no relacionamento, o cliente não se sente totalmente
isolado para decidir, existe uma interdependência.
Levitt (1990, p. 123) usa o casamento como metáfora para explicar a relação de
interdependência que ocorre no marketing de relacionamento. Assim como marido e mulher
possuem expectativas distintas e necessidades específicas, o cliente e a empresa também
possuem, porém é inevitável que exista um relacionamento de interdependência entre as
partes envolvidas. É como Vavra (1993, p. 32) coloca: "Manter clientes exige um
relacionamento com eles, mas esse relacionamento une dois pontos de vista diferentes".
Essa relação de interdependência entre cliente e empresa também é abordado por
Gronroos (2003, p. 40) para se referir a diferença entre transação e relacionamento. Para o
autor, a abordagem do marketing de transação fundamenta-se em uma noção de mercados de
consumo em massa nos quais os clientes são individualmente anônimos. O ponto principal é
3
que o cliente não quer comprar, ele precisa ser persuadido a fazê-lo. Em contrapartida, no
marketing de relacionamento, que é baseado na criação de valor através do contato entre o
fornecedor e o cliente, existem interações e cooperação em algum nível, o cliente e fornecedor
não estão totalmente isolados um do outro. Há uma interdependência mútua entre as duas
partes.
A relação de interdependência entre a empresa e o cliente não ocorre, porém, de forma
imediata. Trata-se de uma evolução que ocorre em etapas, que vai desde a definição dos
clientes a serem atingidos até o gerenciamento seguro do relacionamento, no qual as duas
partes já se conhecem. É como Stone, Woodcock e Machtynger (2001, p. 21) afirmam: “Os
clientes não passam simplesmente de clientes potenciais para clientes 100% leais”.
Para Berry e Parasuraman (1995, p. 162), o desenvolvimento do marketing de
relacionamento pode ser praticado em três diferentes níveis, dependendo do tipo e do número
de elos que uma empresa utilize para promover a lealdade do cliente, quer seja financeiro,
social ou estrutural. Quanto mais elevado o nível em que o marketing de relacionamento é
praticado, mais elevada será a potencial recompensa.
No primeiro nível do marketing de relacionamento é comum a referência como
marketing de "freqüência" ou de "retenção". Neste nível, os que fazem o marketing, usam os
incentivos do preço para estimular os clientes a continuarem fazendo negócios com a
empresa. Já no segundo nível, as empresas vão além dos incentivos de preços. Não deixam de
lado a competição de preço, mas procuram formar elos sociais acima dos elos financeiros.
Esse nível de relacionamento dá ênfase à prestação de serviço personalizada, valorizando o
contato pessoal com o cliente e o conhecimento de suas necessidades e desejos. No terceiro
nível, o marketing de relacionamento procura consolidar o relacionamento com elos
estruturais, além dos elos financeiros e sociais. Os elos estruturais são criados por serviços
valiosos para os clientes, que nem sempre estão disponíveis em outras fontes, como serviços
relacionados a tecnologia.
Quando se aborda o segundo nível de relacionamento na formação de elos sociais com
os clientes, uma personagem que assume um papel fundamental para que a empresa consiga
desenvolver seu relacionamento com os clientes trata-se do vendedor, especialmente em se
tratando de empresas fabricantes de produtos complexos, como as empresas farmacêuticas
(CROSBY, EVANS E COWLES, 1990). O vendedor, muitas vezes acaba assumindo o papel
de "gerente de relacionamento", pois a qualidade do relacionamento que a empresa consegue
desenvolver com os clientes pode estar diretamente relacionada a atuação do vendedor, uma
vez que este é o representante da empresa que normalmente mais mantém contato direto e
freqüente com os clientes.
O desenvolvimento do relacionamento com os clientes, quer seja ou não através do
vendedor, ocorre sempre em etapas ao longo do tempo e, de maneira geral, a literatura aponta
para um consenso nesse aspecto. Diversos autores (CROSBY, EVANS E COWLES, 1990;
BERRY E PARASURAMAN,1995; KOTLER E ARMSTRONG, 1995; STONE,
WOODCOCK E MACHTYNGER, 2001; GRONROOS, 2003) consideram que o
relacionamento com o cliente envolve um processo contínuo de interações, algumas vezes
realizado pelo próprio vendedor e que resultam no desenvolvimento de laços mais fortes a
medida que o gerenciamento do relacionamento é feito com esse propósito. Partindo-se do
estágio inicial do relacionamento, ele normalmente progredi de modo a alcançar um nível e
um vínculo maior com o cliente, garantindo que suas necessidades sejam atendidas e que o
cliente valorize esse relacionamento. Quanto maior o nível do relacionamento, maiores são as
chances da empresa manter clientes leais.
4
Lealdade
Como o objetivo final do marketing de relacionamento é fazer com que o cliente
permaneça fazendo negócios com empresa, em vez de partir para outro concorrente
(KOTLER, 2000), abordou-se também o tema lealdade, com intuito de elaborar um constructo
que servisse de apoio ao entendimento e a resolução do problema de pesquisa.
A definição de lealdade adotada no presente estudo se baseou na abordagem de Griffin
(1998, p. 47), que define lealdade a partir do comportamento de compra do cliente. Para o
autor, cliente leal é aquele que:
• Realiza compras regulares e repetidas;
• Compra as diversas linhas de produtos e serviços da empresa;
• Recomenda os produtos e os serviços a outras pessoas;
• Mostra-se imune aos apelos da concorrência.
A idéia de Griffin (1998, p. 15) é que a lealdade baseia-se exclusivamente no
comportamento dos clientes e é definida por ele como as compras não aleatórias feitas ao
longo do tempo. O termo "não-aleatório" é destacado pelo autor, pois o cliente leal tem uma
tendência específica em relação aquilo que compra e de quem compra. Suas escolhas não
ocorrem aleatoriamente. Além disso, o termo lealdade denota uma condição relativamente
duradoura, exige que a ação de comprar ocorra no mínimo duas vezes.
Porém essa idéia não é compartilhada de forma unânime na literatura. Stone, Woodcock e
Machtynger (2001, p. 134) sugerem uma definição contrária a de Griffin (1998), apontando
que lealdade não envolve apenas o comportamento de compra do cliente. Para os autores,
lealdade é, antes de tudo, um estado de espírito, um conjunto de atitudes, crenças e desejos. A
empresa se beneficia do comportamento leal de seus clientes, que é conseqüência do estado de
espírito, ou seja, lealdade envolve tanto um estado de espírito quanto um comportamento.
A definição de Stone, Woodcock e Machtynger (2001) é compartilhada por Datta (2003),
que afirma não concordar com a idéia de que lealdade seja apenas uma repetição de compra.
Para o autor, repetição de compra pode não representar um verdadeiro comprometimento, mas
apenas aceitação ou comodidade. Lealdade vai além da repetição de compra, pois repetição de
compra pode ocorrer, inclusive, por uma situação de monopólio ou quando existem poucas
opções disponíveis.
A inexistência de um consenso exato e preciso na literatura a respeito do conceito de
lealdade é reforçado por Buttle e Burton (2002) que consideram a existência dos dois pontos
de vistas. O primeiro se referindo a lealdade simplesmente como outro termo para retenção de
clientes, ou seja, um cliente que continua a comprar uma mesma marca é um cliente leal,
enquanto o outro ponto de vista aponta para lealdade também como um componente afetivo,
referindo-se as experiências consideradas importantes que são vividas pelos clientes,
representando um vínculo mais emocional que racional.
Considerando as diferenças apontadas na literatura, decidiu-se adotar para realização da
presente pesquisa, a definição proposta por Griffin (1998), que associa lealdade
exclusivamente ao comportamento de compra do cliente, por se tratar de uma definição
operacionalmente viável, ao contrário das definições que abordam a lealdade a partir dos
vínculos emocionais dos clientes. A adoção dessa definição permitiu uma medição mais
precisa, possibilitando a operacionalização da variável dependente lealdade.
Metodologia da Pesquisa
Para implementação do presente estudo, decidiu-se realizar a coleta de dados junto a
dois públicos distintos. Uma primeira etapa, junto às empresas farmacêuticas e a segunda,
junto aos médicos.
5
A primeira parte do estudo constituiu-se de uma pesquisa qualitativa do tipo
exploratória junto a seis empresas farmacêuticas com objetivo de conhecer como elas
gerenciavam o relacionamento com seus clientes, levantando quais ações, benefícios e
serviços as empresas ofereciam aos médicos e a atuação do vendedor nessa relação. Para isso,
foram entrevistados seis executivos de vendas de empresas farmacêuticas, responsáveis pelo
atendimento aos clientes (médicos) na cidade de São Paulo. A decisão de realizar uma
pesquisa exploratória partiu da necessidade de conhecer a realidade atual da forma como o
setor farmacêutico buscava se relacionar com os médicos, além de garantir uma melhor
validação da pesquisa.
As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para que fosse feita a
análise de conteúdo, seguindo os critérios de qualidade de categorização sugeridos por Bardin
(1977). Como resultado da análise de categorização temática, obteve-se dez variáveis como as
mais representativas das práticas do marketing de relacionamento realizado pelas empresas
farmacêuticas. Foram elas: O conhecimento do cliente (X1), o atendimento ao cliente (X2), a
freqüência de visita (X3), as informações científicas fornecidas (X4), a ajuda financeira (X5),
as amostras grátis (X6), o relacionamento do representante (X7), o conhecimento técnico do
representante (X8), a habilidade de comunicação do representante (X9) e o respeito ao tempo
do médico (X10).
Na segunda etapa do estudo foi realizada uma pesquisa quantitativa descritiva junto
aos médicos, com objetivo de verificar como eles avaliavam as variáveis referentes as práticas
do marketing de relacionamento levantadas junto à indústria farmacêutica na pesquisa
exploratória realizada previamente.
Para tanto, foi utilizado um questionário fechado estruturado dividido em quatro
blocos. No primeiro bloco, o médico selecionava uma empresa farmacêutica que desejasse
avaliar. O segundo bloco continha quatro assertivas numa escala nominal e servia para
classificar o médico como leal ou não-leal, de acordo com a definição adotada no presente
estudo. O terceiro bloco, com dez assertivas, se referia as práticas do marketing de
relacionamento, que eram avaliadas pelos respondentes. Por fim, o quarto bloco serviu para
identificação e caracterização do entrevistado. O questionário foi previamente testado junto a
seis médicos de modo garantir melhor qualidade do instrumento.
A confiabilidade do questionário foi testado com base no alfa de Cronbach. Quando
considerado o conjunto total das assertivas que se referem às práticas do marketing de
relacionamento das empresas farmacêuticas, obteve-se um alfa de Cronbach no valor de
0,818, que pode ser considerado como muito bom (HAIR et al.,2003, p. 172) para medir a
confiabilidade da escala que foi utilizada para avaliar o constructo das práticas de marketing
das empresas farmacêuticas.
O processo de amostragem utilizado foi o não probabilístico do tipo intencional, tendo
sido enviado inicialmente cerca de 3.400 e-mails para médicos da cidade de São Paulo
solicitando
que
respondessem
a
pesquisa
através
do
site
<www.suapesquisa.com.br/marketing>, que foi elaborado especificamente para esse fim. Os
endereços eletrônicos dos médicos foram obtidos junto às empresas farmacêuticas
entrevistadas na fase exploratória do estudo.
O tamanho final da amostra obtida foi de 203 médicos. O objetivo inicial era
conseguir uma amostragem que ultrapassasse o tamanho ideal recomendado por Hair et al.
(1998, p. 258), que sugerem vinte observações para cada variável independente para uma
melhor validade dos dados interpretados através da análise discriminante. Como a presente
pesquisa dispõe de 10 variáveis independentes levantadas no estudo exploratório, o objetivo
era conseguir uma amostra que fosse superior a 200 observações.
6
Para análise inferencial dos dados, a principal técnica utilizada foi a análise
discriminante. A decisão de utilizar essa técnica estatística para analisar os dados coletados
baseou-se na recomendação de Malhotra (2001, p. 483), que considera esse método bastante
adequado quando tem-se apenas uma variável dependente, no caso da presente pesquisa, a
lealdade do cliente, e múltiplas variáveis independentes, que no contexto da pesquisa se
referem as práticas do marketing de relacionamento realizado pelas empresas farmacêuticas.
Análise dos Dados e Resultados
Dos 203 médicos que responderam a pesquisa, a maioria se concentrou basicamente
em três especialidades, clínicos gerais, cardiologistas e ginecologistas, representando 63% do
total de respondentes. Uma característica peculiar aos entrevistados se referiu ao potencial
destes para as empresas farmacêuticas, que normalmente tentam atingir médicos que atendem
pacientes com bom poder aquisitivo para compra de seus medicamentos. A grande maioria
dos participantes da pesquisa, ou seja 95% dos médicos, trabalham em consultórios e atendem
pacientes particulares ou com convênios médicos. A característica dessa população pode ser
explicada a partir da lista de endereços eletrônicos utilizada para solicitação de respostas.
Como ela foi obtida junto as empresas farmacêuticas, esperava-se realmente que esse fosse o
público da pesquisa, uma vez que esses são os clientes alvo dessas empresas
Após a caracterização dos respondentes, iniciou-se a análise dos dados dividindo-se as
observações em dois grupos distintos de acordo com as respostas fornecidas. Somente foram
classificados como clientes leais, os médicos que responderam de modo afirmativo todas as
assertivas do bloco 2 do questionário, que se referiam ao conceito de lealdade adotado neste
estudo. As assertivas eram as seguintes: Prescreve regularmente um mesmo medicamento da
empresa selecionada, prescreve outros medicamentos dessa mesma empresa, já recomendou
um medicamento dessa empresa a outro médico e, continua prescrevendo o medicamento
dessa empresa apesar de tomar conhecimento da existência de outras opções. Seguindo esse
critério, dos 203 respondentes, 71 (35%) foram classificados como médicos leais e 132 (65%)
como médicos não-leais.
Para o cálculo da função discriminante foi utilizado o método direto, no qual todas
variáveis independentes são incluídas simultaneamente, independentemente do seu poder
discriminatório, uma vez que se pretendia verificar a influência do conjunto de todas as
variáveis que compõem as práticas de marketing de relacionamento. Os parâmetros da função
discriminante foram estimados de tal forma que a mesma oferecesse a separação máxima
entre os grupos. Como existiam apenas dois grupos, clientes leais e clientes não-leias,
estimou-se apenas uma função discriminante. Para evitar erros na classificação das
observações, tomou-se o cuidado de realizar o escore de corte de forma ponderada, uma vez
que o tamanho dos grupos era diferente, 71 médicos leais e 132 médicos não-leais.
O Quadro 1 mostra o resultado da análise discriminante. A correlação canônica
associada a esta função foi de 0,668. O quadrado dessa correlação, (0,668)² = 0,446, indica
que 44,6% da variância na variável dependente (lealdade) são explicados por esse modelo.
Porém, além de verificar quanto da variância pode ser explicado por esse modelo, é preciso
determinar também se a função discriminante estimada é estatisticamente significativa.
7
Quadro 1 – Sumário da função discriminante canônica
Função
Autovalor
1
,806
Percentual de
variação (%)
100,0
Correlação
acumulada
100,0
Correlação
Canônica
,668
Para testar a hipótese nula de que as médias da função discriminante dos dois grupos
de médicos eram iguais foi realizado o teste com base no λ de Wilks, mostrado no Quadro 2,
que é o produto dos λ univariados de cada função. O nível de significância foi estimado com
base em uma transformação qui-quadrado da estatística. O λ de Wilks associado a função é de
0,554, que se transforma em um qui-quadrado de 115,805 com 10 graus de liberdade. Isso é
significativo acima do nível α = 0,05. Portanto a hipótese nula pode ser rejeitada, pois existe
uma diferença estatisticamente significativa entre as avaliações dos dois grupos.
Teste da
função
1
Quadro 2 – Determinação da significância - Wilks' Lambda
Graus de
Nível de
Wilks' Lambda
Qui-Quadrado
liberdade
significância
,554
115,805
10
,000
Uma vez que a hipótese principal da pesquisa foi confirmada, é possível interpretar os
pesos ou coeficientes discriminantes de cada variável previsora para verificar quais
contribuíram mais para a discriminação entre os grupos. Porém, antes de fazer essa
verificação, é preciso examinar algumas premissas, especialmente a ocorrência de correlação
entre as variáveis independentes.
A matriz de correlação combinada entre as variáveis independentes, mostrada no
Quadro 3, permite a verificação da presença de multicolinearidade, que se refere a presença
de altas correlações entre as variáveis independentes. A presença de multicolinearidade
poderia interferir sobremaneira na avaliação da importância relativa de cada variável
independente na discriminação entre os grupos. Uma alta correlação entre duas variáveis
independentes dificultaria identificar qual delas ofereceu maior contribuição na variável
dependente.
Para avaliação da presença de multicolinearidade foi seguida a recomendação de Hair
et al. (2003, p. 303), que consideram uma forte evidência de problemas com
multicolinearidade, coeficientes de correlações maiores que +0,7 ou menores que -0,7. Caso
houvesse correlações acima desse nível, seria preciso retirar essas variáveis e realizar
novamente a análise discriminante.
Quadro 3 – Matriz de correlação combinada
Variáveis
X1
X2
X3
X4
X5
X1
Conhecimento do Cliente
1,00
X2
Atendimento ao Cliente
,457
1,0
X3
Freqüência de visita
-,049
,065
1,00
X4
Informações Cientificas
,414
,585
,079
1,00
X5
Ajuda financeira
,080
,228
,208
,234
X6
Amostras Grátis
,278
,321
,020
,137 -,044
X6
X7
X8
X9
X10
1,00
1,00
8
X8
Relacionamento do
vendedor
Conhecimento do vendedor
X9
Habilidade de comunicação
,294
,434
,110
,563
,259
,053
,574
,418
1,00
X10
Respeito ao tempo do
médico
,194
,475
,128
,358
,258
,165
,326
,263
,304
X7
,326
,483
,111
,518
,201
,138
1,00
,554
,461
,108
,425
,222
,218
,386
1,00
1,00
Conforme pode se observar no Quadro 3, não existem correlações maiores que +0,7 ou
menores que -0,7, portanto é pouco provável que a multicolinearidade venha se constituir
como um problema, o que possibilita a verificação da importância relativa da contribuição de
cada variável com maior segurança.
Além da verificação da presença de multicolinearidade, tomou-se também o cuidado
de examinar uma outra premissa necessária para realização da análise discriminante antes da
continuidade da interpretação dos dados. Foi calculada a simetria (skewness) e o achatamento
(kurtosis) para verificação das formas de distribuição de freqüência das variáveis. Segundo
Hair et al. (2003, p. 244), apenas valores de Skewness maiores que +1 ou menores que -1 é
que indicariam uma assimetria substancial na distribuição e, somente existiriam curvas com
grandes picos ou muito achatadas se os valores de Kurtosis excedessem a +3 ou ficassem
abaixo de -3. Como todos os valores de simetria e achatamento ficaram dentro do intervalo
sugerido pelos autores, pode-se inferir que a normalidade da distribuição encontra-se dentro
de níveis aceitáveis para realização da análise discriminante.
Cabe ressaltar ainda que houve uma diferença significante nas matrizes de variância e
covariância entre os dois grupos de médicos, (significância de 0,01 pelo teste Box’s M). O
teste Box’s M avalia a similaridade da matriz de dispersão das variáveis independentes entre
os grupos. A situação ideal seria que não houvesse qualquer diferença na variância entre os
grupos. Porém, como esse teste é muito sensível ao tamanho da amostra, em especial quando
atendida a recomendação de 20 observações para cada variável, não há necessidade, segundo
Hair et al. (1998, p. 297), de medidas corretivas.
Feita as análises prévias, partiu-se então para verificação do poder preditivo de cada
variável independente através do teste de igualdade da média dos grupos de clientes para
verificar quais variáveis possuem diferenças estatisticamente significante entre as médias,
quando avaliadas isoladamente. Conforme mostra o Quadro 4, todas as variáveis, exceto
respeito ao tempo do médico (X10), apresentam uma diferença significante entre os grupos e, a
princípio, parecem ser bons previsores para conquista da lealdade do médico.
Quadro 4 – Teste de igualdade da média dos grupos
Wilks'
Lambda
,847
,856
36,310
33,831
Nível de
significância
,000
,000
F
X1
X2
Variáveis
Conhecimento do Cliente
Atendimento ao cliente
X3
Freqüência de visita
,830
41,062
,000
X4
X5
Informações Científicas
Ajuda financeira
,917
,690
18,235
90,135
,000
,000
X6
Amostras Grátis
,964
7,447
,007
X7
Relacionamento do vendedor
,893
24,107
,000
X8
Conhecimento do vendedor
,921
17,226
,000
X9
Habilidade de comunicação do vendedor
,943
12,110
,001
X10
Respeito ao tempo do médico
,988
2,434
,120
9
Como o teste de igualdade entre as médias dos grupos, mostrado no Quadro 4,
examina a diferença a partir de uma perspectiva univariada, é preciso considerar a
importância relativa de cada variável independente a partir de uma perspectiva multivariada,
utilizando-se para isso a matriz de correlação estrutural, conforme apresentada no Quadro 5.
As variáveis com cargas mais altas oferecem maior poder de contribuição.
Quadro 5 – Matriz estrutural
X5
X3
X1
X2
X7
X4
X8
X9
X6
X10
Variáveis
Ajuda financeira
Freqüência de visita
Conhecimento do Cliente
Atendimento ao cliente
Relacionamento do vendedor
Informações Científicas
Conhecimento do vendedor
Habilidade de comunicação
Amostras Grátis
Respeito ao tempo do médico
Função 1
,746
,504
,474
,457
,386
,336
,326
,273
,214
,123
Os valores apresentados na matriz estrutural, no Quadro 5, representam a correlação
entre as variáveis individualmente e a combinação linear de todas variáveis independentes.
Suas cargas estão listadas em ordem decrescente de valores. Segundo Hair et al. (2003, p.
386), recomenda-se utilizar a matriz estrutural gerada através da análise discriminante, pois
ela é considerada como a mais acurada para identificar as variáveis que mais contribuem na
diferenciação dos grupos.
Considerando a recomendação de Hair et al. (2003, p. 366) para interpretação das
cargas geradas na matriz estrutural, onde valores maiores que 0,3 devem ser considerados
como aceitáveis, valores maiores que 0,5 como moderadamente importantes e valores maiores
que 0,7 como muito importantes, pode-se inferir a seguinte análise.
A ajuda financeira (X5) fornecida pelas empresas farmacêuticas foi a variável mais
importante na discriminação entre os grupos, seguida da freqüência de visita (X3). As
variáveis conhecimento do cliente (X1), atendimento ao cliente (X2), relacionamento do
representante (X7), informações científicas (X4) e conhecimento técnico do representante (X8)
foram consideradas também como bons previsores da lealdade do médico, apesar de não
serem as mais importantes. Apenas as variáveis habilidade de comunicação (X9), amostras
grátis (X6) e respeito ao tempo do médico (X10) não se mostraram tão relevantes na
contribuição para conquista da lealdade do médico.
Apesar da variável ajuda financeira (X5) ser a que mais contribuiu na diferenciação
entre os grupos, cabe ressaltar que a avaliação foi feita a partir do conjunto das práticas do
marketing de relacionamento numa perspectiva multivariada, portanto, deve-se considerar a
importância do conjunto, em especial das sete variáveis que mais contribuíram na
confirmação do modelo, variáveis com cargas maiores que 0,3.
A confirmação da diferença na avaliação das práticas de marketing das empresas
farmacêuticas feita pelos grupos de médicos, classificados como leais ou não-leais pode
também ser observada no Quadro 6 pelo centróide de cada grupo, que representa o valor da
função discriminante calculado nas médias dos grupos. O grupo 1 (médicos leais) tem valor
positivo, enquanto o grupo 2 (médicos não leais) tem um valor negativo. Isso reforça mais
uma vez que os dois grupos realmente avaliaram de forma diferente as práticas do marketing
10
de relacionamento das empresas farmacêuticas e que, portanto, essas variáveis podem estar de
fato exercendo uma boa contribuição na conquista da lealdade dos médicos.
Quadro 6 – Centróides dos grupos
Lealdade
Grupo 1
Grupo 2
Função 1
1,218
-,655
Leal
Não Leal
Avaliação da Validade dos Resultados
A maneira frequentemente utilizada como procedimento para validação da função
discriminante é a divisão aleatória da amostra em dois grupos distintos, uma apenas para
análise e outra para validação. Porém, Hair et al. (1998, p. 275) afirmam que existe evidência
na literatura de que é possível obter maior confiança e consistência na validação da função
discriminante se, ao invés de dividir uma única vez a amostra em duas partes, repetir esse
mesmo procedimento diversas vezes.
Seguindo esse modelo, chamado de validação cruzada, a validade da função é testada
diversas vezes e ao final obtém-se uma medida única que representa a média de todas as
medidas. Esse método é baseado no princípio do leave-one-out, no qual a função
discriminante é calculada a partir de amostras retiradas repetidamente da amostra original. A
validação é obtida a partir de n – 1 amostras, eliminando-se uma observação de cada vez do
total de n amostras, até que todas as observações tenham sido classificadas.
Uma consideração que precisa ser feita antes de utilizar esse método para validação,
segundo Hair et al. (1998, p. 276), é certificar-se que o menor grupo tenha ao menos três
vezes o número de variáveis independentes. No caso da presente pesquisa o menor grupo foi
de médicos classificados como leais, com 71 respondentes. Considerando-se 10 variáveis
independentes, o mínimo necessário seria 30 respondentes. Portanto a quantidade de
observações no menor grupo (clientes leais) é bem superior a quantidade mínima necessária
para utilizar esse método de validação.
O Quadro 7 mostra a matriz de classificação que contém a capacidade previsora da
função discriminante, utilizando-se o método de validação cruzada. Os números na diagonal
da matriz (em negrito) representam as classificações corretas e os números fora da diagonal
representam as classificações incorretas. A proporção total de sucesso, ou porcentagem de
casos classificados corretamente, é determinada somando-se os elementos na diagonal e
dividindo-se pelo número total de casos.
Quadro 7 – Classificação dos resultados
Lealdade
Afiliação prognosticada
Leal
Não Leal
15
116
21,1
87,9
16
115
22,5
87,1
Leal
56
Não Leal
16
Original
Leal
78,9
%
Não Leal
12,1
Leal
55
Contagem
Não Leal
17
Validação
cruzada (a)
Leal
77,5
%
Não Leal
12,9
84,7% dos casos originais grupados classificados corretamente.
83,7% dos casos grupados em validação cruzada classificados corretamente.
Contagem
Total
71
132
100,0
100,0
71
132
100,0
100,0
11
Com base na classificação dos resultados obtidos, conforme mostra o Quadro 7, temse 84,7% dos casos classificados corretamente, quando considerado todo conjunto de amostra
incluído na análise. Quando realizada a validação cruzada, tem-se 83,7% dos casos
corretamente classificados. Esse valor, a princípio, parece comprovar a boa capacidade
previsora das variáveis do marketing de relacionamento na conquista da lealdade do médico.
Porém, para certificar-se de que o valor obtido através da validação cruzada possa ser
considerado como um bom previsor, é preciso comparar esse resultado com o que seria obtido
aleatoriamente. Hair et al. (2003, p. 384) sugerem que uma boa classificação de resultados é
aquela que possui valor 25% maior do que poderia ser obtido de forma aleatória e, quando os
grupos não possuem tamanhos iguais, deve-se considerar a pior possibilidade, que é a
classificação de todas observações no maior grupo.
Considerando o maior grupo da análise, 65% de médicos não-leais, caso todas
observações fossem erroneamente classificadas para esse grupo, essa seria a pior
probabilidade. Portanto, seguindo a sugestão de Hair et al. (2003, p. 384), pode-se considerar
a classificação como aceitável, caso tenha um valor que seja 25% acima de 65%, ou seja,
acima de 81,25%. Como a porcentagem de casos corretamente classificados através da
validação cruzada foi de 83,7%, maior que o mínimo necessário, pode-se afirmar que a função
discriminante realmente possui uma boa capacidade previsora.
Baseado nos resultados obtidos através da análise discriminante e validados pelo método
da validação cruzada, é possível então inferir que as práticas de marketing de relacionamento
das empresas farmacêuticas exercem, de fato, influência na decisão do médico de preferir
continuar prescrevendo o produto de uma determinada empresa.
Conclusão
A partir das análises dos dados, verificou-se que houve uma diferença significativa
entre a avaliação feita pelo grupo de médicos classificados como leais daqueles classificados
como não-leais, confirmando a hipótese principal do estudo, demonstrando que o conjunto de
variáveis que compõe o marketing de relacionamento, analisado a partir de uma perspectiva
multivariada, são avaliados de forma diferente por cada um dos grupos de médico,.
Em relação as variáveis incluídas na pesquisa, do total de dez, sete demonstraram
oferecer maior contribuição na confirmação do modelo. Foram elas, relacionadas da mais
importante para a menos importante: A ajuda financeira (X5), a freqüência de visita (X3), o
conhecimento do cliente (X1), atendimento ao cliente (X2), o relacionamento do representante
(X7), as informações científicas (X4) e o conhecimento técnico do representante (X8). Os
médicos classificados como leais avaliaram esses aspectos de forma significativamente
diferente dos médicos classificados como não-leais. As variáveis amostras grátis (X6),
habilidade de comunicação do representante (X9) e respeito ao tempo do médico (X10) não
demonstraram oferecer muita contribuição na diferenciação dos grupos.
De modo geral, os achados deste estudo confirmam conceitos existentes na literatura
sobre o marketing de relacionamento. Uma característica marcante do marketing de
relacionamento, segundo Christopher (1999, p. 46), é o contato constante com o cliente. É por
meio das interações freqüentes ao longo do tempo que a empresa consegue atender as
necessidades específicas dos clientes e conquistar sua lealdade. Essa mesma consideração
também é explicitada por Griffin (1998) e Raphel e Raphel (1996) ao abordarem a escalada na
conquista da lealdade do cliente. Ficou evidenciado na pesquisa que os médicos classificados
como leais perceberam que são visitados com uma freqüência maior pela empresa que
12
selecionaram para responder o questionário do que os concorrentes delas. Esse resultado
reforça os conceitos que tratam desse tema.
Outro aspecto que ficou evidenciado no resultado da pesquisa e que encontra muita
similaridade com a literatura pesquisada se refere ao conhecimento do cliente (X1) e ao
atendimento prestado ao cliente (X2). Segundo Griffin (1998, p. 231), um dos principais
motivos que leva o cliente a abandonar a empresa é a falha no seu atendimento. Mais uma
vez, os médicos classificados como leais avaliaram de forma significativamente diferente dos
médicos não-leais, o interesse da empresa em conhecer suas necessidades e atendê-las da
maneira que esperavam.
Em relação ao trabalho do representante, a análise dos dados demonstrou que o
relacionamento (X7) que estes mantém com os médicos e o seu conhecimento técnico (X8) são
os aspectos que mais contribuem para conquista da lealdade dos médicos. Para Berry e
Parasuraman (1995, p. 162), a ligação pessoal estabelecida com os clientes através dos
funcionários que atuam na linha de frente pode realmente encorajar o cliente a permanecer
num relacionamento na ausência de razões poderosas para mudar. Isso é ainda reforçado por
Mckenna (1996, p. 105) ao afirmar que “uma relação pessoal é uma forma de manter a
fidelidade do cliente”. Além do relacionamento, o conhecimento do representante parece
exercer uma contribuição importante. Segundo Crosby, Evans e Cowles (1990), o papel da
expertise do vendedor em relação a sua oferta pode reforçar a qualidade do relacionamento
estabelecido com o cliente.
Os achados deste estudo em relação ao representante de vendas corroboram as
conclusões de outros estudos que já exploraram o mesmo tema (SCHARITZER E
KOLLARITS, 2000; ANDALEEB E TALLMAN,1996). Na presente pesquisa, também ficou
evidenciada a relação entre o relacionamento do representante de vendas e o comportamento
do médico, pois observou-se que os médicos classificados como leais fizeram uma melhor
avaliação do relacionamento que mantém com os representantes (X7) do que aqueles
classificados como não-leais.
Como o marketing de relacionamento ainda é um tema relativamente novo na literatura, os
achados desse estudo certamente contribuem para seu desenvolvimento, especificamente na
geração de um conhecimento maior sobre esse tipo de marketing praticado no setor
farmacêutico, onde ainda existe uma quantidade limitada de estudos. No campo da prática
organizacional, esse estudo possibilita aos gerentes das empresas farmacêuticas um melhor
conhecimento do impacto das práticas de marketing que estão sendo adotadas, podendo
aperfeiçoar aquelas que têm contribuído mais fortemente para lealdade dos médicos e revendo
outras que não têm se mostrado tão eficientes na diferenciação dos dois grupos.
Sugestões Para Pesquisas Futuras
Como recomendação para pesquisas futuras são feitas duas sugestões. A primeira se
refere aos aspectos éticos do relacionamento entre os médicos e as empresas farmacêuticas e a
segunda, em relação a atuação dos representantes de vendas.
Como a variável de maior relevância foi a ajuda financeira (X5), cabe comentar que
isso poderia certamente gerar uma discussão acerca dos aspectos éticos e legais sobre a
atuação da indústria farmacêutica e do comportamento do médico frente a essa variável.
Apesar desses aspectos não representarem alvo de análise do presente estudo, considerou-se
prudente tecer algumas considerações para aqueles que pretendem explorar o mesmo tema a
partir dessa perspectiva.
13
Em relação ao aspecto legal, a Anvisa, agência nacional de vigilância sanitária, órgão
do Ministério da Saúde responsável pela legislação nessa área, não proíbe que as empresas
farmacêuticas contribuam financeiramente com o aprimoramento profissional dos médicos,
através, por exemplo, de pagamento de passagens, hospedagens e inscrições em congressos
nacionais ou internacionais. A Anvisa proíbe apenas que o médico aceite essa oferta, se esta
estiver vinculada a alguma exigência de prescrição de algum produto específico. A legislação
mais atual sobre esse assunto se refere a resolução número 102 de 30 de novembro de 2000 da
Anvisa.
Como as empresas farmacêuticas usufruem o respaldo da lei para investirem no
aprimoramento profissional dos médicos, a discussão sobre esse tema tem sido travada
normalmente em relação aos aspectos éticos, ou seja, se os médicos e as empresas
farmacêuticas estão estabelecendo algum tipo de compromisso informal em função do apoio
financeiro.
De fato, existem na literatura diversos artigos que tratam sobre esse tema, em sua
maioria nas revistas médicas científicas. Para aqueles que pretendem se aprofundar nos
aspectos éticos do relacionamento entre médicos e indústria farmacêutica, um ponto de
partida útil pode ser o levantamento realizado por Wazana (2000). A autora fez um exame
crítico de 29 publicações científicas, analisando a influência da indústria farmacêutica sobre o
comportamento de prescrição dos médicos, discutindo os aspectos éticos dessa relação e
alertando para os riscos desse tipo de interação.
Outro aspecto que pode ainda ser estudado em maior profundidade, se refere ao trabalho
do representante de vendas das empresas farmacêuticas. Na presente pesquisa foi feita apenas
uma avaliação quantitativa por parte dos médicos que, de modo geral, não se mostraram
insatisfeitos com o trabalho dos representantes de vendas, mesmo aqueles médicos
classificados como não-leais. Porém, como existem evidências na literatura (PROUNIS, 2003;
TEIXEIRA E CARVALHO, 2002), de que muitos médicos consideram como insatisfatória a
atuação desses profissionais, um estudo qualitativo que explorasse esses aspectos poderia
oferecer um melhor conhecimento sobre a avaliação dos médicos e sobre as necessidades de
mudanças na atuação desses profissionais.
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